terça-feira, 9 de abril de 2024

Domingueira


Meus avós maternos constituíram família morando em um sítio dos brejos da Batateira, em Crato, o Monte Alegre. Ali mantiveram engenho de rapadura e alambique de cachaça, atividade tocada, com a morte de meu avô, Antônio Bezerra Monteiro, sob as ordens de meu tio Quinco, o irmão mais velho que passaria a conduzir os irmãos devido aquela ocorrência, em 1946.

Os brejos do Crato ainda hoje preservam a cultura da cana-de-açúcar, adaptada às terras arenosas e férteis, realimentadas no húmus das cheias anuais do rio Batateira, a transferir o rescaldo das matas da chapada através das encostas da Serra do Araripe.

Na minha infância, conduzido pelos irmãos de minha mãe, passei inesquecíveis momentos de moagens junto da comunidade formada pelos habitantes do lugar. Que lembro, havia o engenho de Tio Ramiro, irmão de meu avô, vizinho ao deste; o de dona Morena, um pouco mais distanciado para as bandas do São Bento, na seqüência do rio; o de Felipe Bezerra; o de Dr. Antenor; o de “seu” Aldegundes; estes os principais, todos movimentados de cambiteiros, moradores, proprietários e familiares; animais de trabalho, de criação; sobretudo nas épocas da quebra da cana, por volta do mês de julho, período das férias escolares.

Tio Quinco, também meu padrinho de batismo, trabalhava com empenho durante toda semana, porquanto sobre os seus ombros pesou a educação dos irmãos. Desde jovem, chamou a si tal responsabilidade que cumpriria à altura nas décadas posteriores.

Os domingos, contudo, reservava a passeio tradicional ao Crato, aonde se chegava por três quilômetros de caminhos precários. Depois da semana de trabalho, vestia do bom e do melhor. Impecável, adotava quase sempre calça branca de linho, engomada “no capricho”; a pano passado, uma camisa distinta, de cambraia em azul claro; cinto de couro de jacaré, adornado com estojo dos óculos “Ray-ban”, companheiro inseparável; sapato de cromo alemão; e os cabelos castanhos engomados de fortes camadas de brilhantina, grudavam no couro cabeludo, resistentes a qualquer pé-de-vento.

Galã típico dos anos 50, padrão imortalizado nos filmes de Hollywood em fase de ascensão, desfilaria seu charme na praça Siqueira Campos, depois da missa matinal da nove, junto dos amigos de turma, a flertar belas jovens da fina flor interiorana. E ao cavalgar o lombo da moto BSA verde que possuía, enfeixava os detalhes restantes do modelo característico daquele período dourado.   

Lá um dia, no entanto, registrou-se quebra de roteiro.

Após ultrapassar a cancela da propriedade, fiel aos trajes descritos, em cima da ligeira motocicleta, logo, logo, num dos sulcos da estrada de jipes e burros do eito, defronte do engenho de Felipe Bezerra, cruzar-lhe-ia o percurso graúdo exemplar de porca impaciente, a receber no meio do espinhaço os pneus ligeiros do transporte, jogando no meio de larga poça de lama preta da moagem o lépido motoqueiro.

Esse encontro foi um Deus nos acuda! Naquele dia, desfizeram-se os planos de Quinco, pintado dos pés à cabeça da tiborna mais escura, que apenas ergueu a moto e voltou para casa, desfazendo o itinerário habitual da sua costumeira fidalguia de rever as pessoas da cidade naquela vez.

Meus avós maternos constituíram família morando em um sítio dos brejos da Batateira, em Crato, o Monte Alegre. Ali mantiveram engenho de rapadura e alambique de cachaça, atividade tocada, com a morte de meu avô, Antônio Bezerra Monteiro, sob as ordens de meu tio Quinco, o irmão mais velho que passaria a conduzir os irmãos devido aquela ocorrência, em 1946.

Os brejos do Crato ainda hoje preservam a cultura da cana-de-açúcar, adaptada às terras arenosas e férteis, realimentadas no húmus das cheias anuais do rio Batateira, a transferir o rescaldo das matas da chapada através das encostas da Serra do Araripe.

Na minha infância, conduzido pelos irmãos de minha mãe, passei inesquecíveis momentos de moagens junto da comunidade formada pelos habitantes do lugar. Que lembro, havia o engenho de Tio Ramiro, irmão de meu avô, vizinho ao deste; o de dona Morena, um pouco mais distanciado para as bandas do São Bento, na seqüência do rio; o de Felipe Bezerra; o de Dr. Antenor; o de “seu” Aldegundes; estes os principais, todos movimentados de cambiteiros, moradores, proprietários e familiares; animais de trabalho, de criação; sobretudo nas épocas da quebra da cana, por volta do mês de julho, período das férias escolares.

Tio Quinco, também meu padrinho de batismo, trabalhava com empenho durante toda semana, porquanto sobre os seus ombros pesou a educação dos irmãos. Desde jovem, chamou a si tal responsabilidade que cumpriria à altura nas décadas posteriores.

Os domingos, contudo, reservava a passeio tradicional ao Crato, aonde se chegava por três quilômetros de caminhos precários. Depois da semana de trabalho, vestia do bom e do melhor. Impecável, adotava quase sempre calça branca de linho, engomada “no capricho”; a pano passado, uma camisa distinta, de cambraia em azul claro; cinto de couro de jacaré, adornado com estojo dos óculos “Ray-ban”, companheiro inseparável; sapato de cromo alemão; e os cabelos castanhos engomados de fortes camadas de brilhantina, grudavam no couro cabeludo, resistentes a qualquer pé-de-vento.

Galã típico dos anos 50, padrão imortalizado nos filmes de Hollywood em fase de ascensão, desfilaria seu charme na praça Siqueira Campos, depois da missa matinal da nove, junto dos amigos de turma, a flertar belas jovens da fina flor interiorana. E ao cavalgar o lombo da moto BSA verde que possuía, enfeixava os detalhes restantes do modelo característico daquele período dourado.   

Lá um dia, no entanto, registrou-se quebra de roteiro.

Após ultrapassar a cancela da propriedade, fiel aos trajes descritos, em cima da ligeira motocicleta, logo, logo, num dos sulcos da estrada de jipes e burros do eito, defronte do engenho de Felipe Bezerra, cruzar-lhe-ia o percurso graúdo exemplar de porca impaciente, a receber no meio do espinhaço os pneus ligeiros do transporte, jogando no meio de larga poça de lama preta da moagem o lépido motoqueiro.

Esse encontro foi um Deus nos acuda! Naquele dia, desfizeram-se os planos de Quinco, pintado dos pés à cabeça da tiborna mais escura, que apenas ergueu a moto e voltou para casa, desfazendo o itinerário habitual da sua costumeira fidalguia de rever as pessoas da cidade naquela vez.

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