Certo dia, no meio do sertão onde habitava, quando às costas trazia fardos e mais fardos de cruéis decepções, ele encontrou a pessoa de compreender melhor as suas urgentes necessidades. A vida clamava por paz, transe que desde muitos dias lhe rasgava as entranhas. Nas poucas palavras que trocou com o maltrapilho empoeirado, vislumbrou a força de quem aprendera na escola do mundo, vagando nos territórios ásperos e ressequidos. Alguém temperado no tacho do sofrimento, desses mestres rudes que andam viajando, fugitivos das generalidades. Sábio simples, filho de gente rude. Doido sem eira nem beira.
Depois, atencioso, guardou os detalhes do ensino que recebeu no
inesperado encontro. Na ocasião, uma energia diferente fervilhou-lhe as
entranhas. Por tudo, pautou-se pelas condições indicadas de chegar na
felicidade.
Tratou de aplicar no dia-a-dia os conselhos, desde a humildade até o
trabalho honesto. Respeito. Paciência. Objetividade. Na conta disso, atravessou
firme longos trechos de provação, seguro pelos valores sólidos adquiridos no
estranho exótico com o ancião.
Após mais de quarenta anos envolto nos afazeres do viver ensolarado,
belo dia o homem se reencontra o andarilho que tanto lhe impressionara no
passado. E na sombra de frondoso juazeiro, à margem de um desses caminhos
estreitos que cortam as matas sertanejas, o velhinho repousava de tarde
escaldante. Nisso, ao avistá-lo, o visitante exclamou:
- Grande professor! Que oportuno achá-lo outra vez. Quero contar que
segui à risca suas instruções daquela única vez que nos avistamos, há tanto
tempo. Lembra da minha pergunta, o que fazer para viver bem e ser feliz sem
precisar tirar dos outros a felicidade desejada?
A princípio, o ancião se fez de surdo, com olhos absortos no vôo
distante de um gavião peneirador, lá bem longe cruzando a soalheira intensa dos
brejos de buriti.
Mas, ante os apelos do interlocutor, resolveu escutar:
- Pois bem, o senhor me forneceu a orientação a qual utilizei para
solucionar os meus problemas principais e realizar o sonho que muito procurava.
Hoje posso dizer que cheguei à plena realização.
Passaram-se alguns instantes de completo silêncio varridos no chiar das
folhas ao vento, enquanto o andarilho apenas olhava a copa das árvores como
procurando as razões quebrar o seu distanciamento dali.
- Muito bom isso, meu amigo – num sorriso retrucou o peregrino,
cofiando nos dedos a barba esfumaçada. – Muito bom alguém ter ouvido minhas
palavras. Porém fique certo de uma coisa, com elas ou sem elas o senhor
chegaria ao que chegou, ainda que nunca nos houvéssemos avistado. Pois, de um
jeito ou de outro a gente sempre chega aonde quer chegar, se esse querer vier
de dentro do coração – e de novo regressou ao silêncio, tal jamais dissesse
qualquer coisa antes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário