segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Sentimento número um

As imagens ali estão intocadas, dele, que vivem a essência do Ser. Íntimo coração, lugar recôndito de todos os mistérios, nesse ponto dorme sereno o Amor aos braços de Si mesmo, regaço dos sonhos. Solo de países abençoados e deuses infinitos, guarda a brancura das retinas na visão dos seus olhos santos, nas qualidades incríveis da flor das maravilhas. A beleza da música, êxtase da total felicidade, realiza milagres e prodígios na planície dos Céus. Luzes. Suspiros profundos. Uma vez além de todas, para sempre, o Amor e a Eternidade reúnem os minutos definitivos do presente num casal mais que perfeito de Lua e Sol.

Bom andarilho das cavernas da alma, impera no desejo de muitos, porém pede aceitação e liberdade. Alma limpa, exige renúncia e dedicação. Espírito Santo das religiões, Amor acima de tudo, segredo absoluto das buscas humanas, em nada impõe o furor das aves de rapina. Deixa fluir naturalmente o seio dos outros sentimentos e a altivez da Justiça, leve, solto, fiel, que crê na Verdade e suporta testes doridos que a vida impõe.

Na resignação dos que sabem o caminho de chegar aos outros corações, longe de exigências e imposições, sobrevive diante das condições inevitáveis da busca firme por valores dignos. Respira o universo das certezas, o Amor, amigo justo da Fé, és a voz dos tempos nas noites de luar, calma sinfonia dos astros no carinho dos que amam em silêncio. Querer bem, união de dois, de tantos; as lembranças de momentos nas histórias jamais esquecidas, guardadas junto dos planos da tranquilidade, sem risco de nunca perder, ou fugir, ou desaparecer.

Pouso alegre das aves do Paraíso nas árvores da plenitude, nos gestos da sinceridade, bem aqui em nós, pomo da Consciência, Ele mora e aguarda sereno atitudes que irão transformar o Mundo e revelar as certezas do Pai, em um dia de festa, e sermos o Bem no palco das estrelas.    

domingo, 29 de outubro de 2017

Os sinos de minha aldeia

Langor distante nascido de dentro de tardes mornas, silenciosas, dos sonhos abissais, trazem vozes veladas dos metais que multiplicam e falam o trino dolente dos sabiás sob as copas do Sertão. Refolhos da alma. Tons que soam nas encostas dos corações distantes. Quantas, quantas harmonias chegam do definitivo nos vãos eternos do tempo, limbos da essência e do desconhecido. Eles, os sinos e as histórias que persistem gravadas entre os crivos da memória. Além de tudo, onde existirão, nalgum lugar do imaginário, tais dobrões inesquecíveis de permanecer sonorizando acordes nos segredos da gente solitária? Sons das nuvens que, suaves, deslizam ao poente alaranjado, inevitáveis timbres perenes; gritos dos sentimentos que escrevem melancolias e existências. Só assim, agora, leio, nas paredes do mistério, as lembranças que restam e que ninguém jamais apagará.

Eles, no repetir da criação, noticiam que seremos para sempre, no mar desta Vida, arautos de realidades imortais. Testemunhos das tantas fábulas colhidas no pomar de aldeias longínquas, depois deles eu serei; nós seremos. Contam disso narrativas infinitas, a todo momento, trabalho persistente dos heróis e das esquadras invencíveis que tocam fibras mágicas e conquistam mundos lendários, na pureza dos Céus.

Aos fins das tardes, pois, espalhados nos corredores do Destino, ouço constantes os sinos que dobram e reorientam as aves no regresso dos ninhos. Espécie de roteiro arcaico, com elas também voltam sinais de esperança e fé que dizem ser do Amor o lenitivo. Explicam aos Espíritos o sentido único de tudo que nos mantém a nós humanos, em longa epopeia através das sombras imensas, viajores que escrevem o pergaminho dos astros.


Foram muitas vezes as de escutar a nostalgia desses altares sinfônicos que fervilham o íntimo das existências. Vagos, vadios, suaves; trazem por si guardados códigos secretos e motivos justos de andar nestes firmamentos. Claridades das nossas jornadas rumo à Impermanência, circunstâncias de todos os seres, e jamais esqueçamos a força dos deuses trazida na pele dos fiéis às leis da Natureza. Recorrem, multiplicam, alimentam, os sinos de minha aldeia. 

A certeza da Fé

Diante de tudo, de todos os percalços, das intempéries, e se ter a certeza firme da existência de um Poder maior que a tudo rege e domina. De um lado os desafios e de outro a crença no sustentáculo da espiritualidade. Resistir a qualquer custo face aos momentos de dor e dificuldades, porém substituir o desânimo, a depressão, através do que nos fala a razão da Luz em nossas consciências. 

Viver significa, destarte, caminhar na direção desta luz superior que há de clarear o segmento das criaturas humanas. Sustentar a paz das almas por meio da confiança em um bem que olha por todos, indiscriminadamente. Fazer, assim, da vida o atributo da fé. Construir e reconstruir sempre o gosto de ser feliz, ainda que, nalgumas situações, os elementos em ação pareçam dizer diferente. 

Esta certeza vem acompanhando as histórias e as pessoas desde seus primeiros registros. Ninguém, que se preza, mesmo que exercite o prazer como fator principal e queira evitar olhar de frente o mistério perene da convicção, ninguém passa longe de anotar o quanto de força persiste dentro de nós nas horas ingratas. 

O materialismo evita admitir a força de que dispõem os humanos quando utilizam valores da religiosidade e vencem as fraquezas do desespero. Escola de respostas inigualáveis, a oportunidade na vida indica a coragem moral de aceitar o invisível tal instrumento da sobrevivência do Ser. São muitas vezes quando isto acontece. Submetidos às limitações da materialidade, quantas e tantas ocasiões veem-se no palco das angústias, e só a energia do mais profundo da Consciência é que responderá pelas nossas esperanças, daí vindo milagres, maravilhas, revelações de impossíveis com toda possibilidade. O nome deste Poder Infinito apenas a própria criatura falará ao seu íntimo, no silêncio dos dias perante a Eternidade. 

(Ilustração: Monte Fuji, de Oyama Yukio).

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A flor atirada

A história de místico árabe conta que enquanto se via apedrejado em sacrifício das práticas religiosas que professava, contrárias que foram à tradição dos poderosos, ele observou cair aos seus pés bela flor atirada junto com as pedras da turba ensandecida. Até ali resistira com altivez aos gestos rudes da multidão formada de criaturas ignorantes no trato com a mensagem salvadora que oferecera. 

Nessa hora, contudo, sentiu fraquejarem as forças, e viu-se rendido, dominado de pranto convulso. Daqueles despreparados, que exercitavam instintos vingativos, outra atitude jamais esperaria além de jogarem pedras para ferir corpos e eliminarem existências físicas. De quem jogava a flor, porém, que, então, demonstrou conhecer algo mais a propósito dos ensinos e das práticas fiéis, aguardava mais sinceridade, no mínimo saindo em defesa dos ideais superiores. Negara, fraquejara, no momento extremo do testemunho.


Às vezes, sentimentos de nostalgia sujeitam atingir pessoas que sentem a força da autenticidade, ainda que distingam o tanto que lhes resta de chegar às relíquias sagradas, assunto dos religiosos.

Existem situações em que discípulos deixam de lado a prática do Amor para aceitar fugas de prazeres, esportes, vícios e acomodação. Nisso, esquecem a coerência e os pressupostos que adotariam em nome de Deus, demonstração do abandono e da pouca sinceridade interior que deixam transparecer.

Aquele que jogou a flor no instante no martírio do árabe lapidado, mesmo que pretendesse cumprir, no gesto, solidariedade e reconhecimento na hora extrema do testemunho, permaneceu vinculado às sombras da covardia, sabedor dos conceitos, no entanto sem praticá-los de verdade.

Não poucos agem de qual jeito, motivo, inclusive, da parábola do festim de bodas contada por Jesus, dos muitos chamados e poucos os escolhidos. Chamados às hostes do Bem todos somos. Raros, talvez raríssimos, exercitam a feliz oportunidade, razão das dores de saber o quanto adiante ainda sofrerão presos às malhas pegajosas dos transes imediatos.

Invés de jogar flores nas homenagens tardias, caberá, isto sim, cultivá-las no íntimo coração e exalar o justo perfume através dos campos do dever superior.  

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

O anjo de mármore

Esta história a ouvi de meu pai. Dá conta de familiar nosso, João Augusto Bezerra, médico em Crato nos princípios do século passado, que aqui desenvolveria a clínica geral. Casado com Maria Prisce Augusta Bezerra, tiveram um filho, Aloysio, que, criança de quatro anos, seria acometida por doença rara, vindo a falecer a 11 de novembro de 1911. Os pais, perdidamente lacerados com a triste perda, nem quiseram permanecer no Cariri e buscarem outro destino. Contudo, no auge do sofrimento, antes de partir providenciariam, ao filho desaparecido, a lembrança de bem cuidado mausoléu encimado por pequena estátua de um anjo de mármore branco, peça bem trabalhada, de exímio artista, que deixaram a constituir decoração na sepultura do filho amado. 

Adiante, isto décadas passadas, comerciante vinculado a famílias cratenses, que vivia na Capital paulista, negociante de objetos artísticos, imagens de santos e relíquias sacras das igrejas, soube da existência da raridade estética do anjo e tratou de revertê-la ao comércio dos colecionadores.

Contou meu pai que desde o momento em que o anjinho de mármore pousou no estoque do santeiro que desandaram os acontecimentos no meio das raridades sacras; não só na vida pessoal dos proprietários, quanto na suas vidas profissionais, nada dando certo no empreendimento do dito homem. Aos primórdios, nem de longe desconfiou das causas daquilo tudo. No entanto, lá numa noite, em sonho, lhe seria determinado que devolvesse a escultura, repondo-a na real localização, o que logo tratou de fazer sem maiores adiamentos.

Durante algum tempo, o monumento permaneceu encostado perto do altar da capela do cemitério, onde avistei em várias ocasiões. Quase esquecido desse assunto, recente avistei o anjo já na composição de um dos mausoléus do Cemitério de Nossa Senhora da Piedade, em Crato. E juntamente com meu amigo Huberto Tavares (Bebeto), a quem narrei os acontecidos, graças ao anjinho de mármore, visível sem esforço, identificamos o túmulo de Aloysio. Está logo na entrada à esquerda de quem chega, posto no alto da construção, ainda com uma das asas danificadas, talvez cicatriz da viagem distante a que teve de se submeter às terras do Sudeste, na tal jornada clandestina, mas que ao término bem sucedida. 

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Contos zen

As vertentes místicas das religiões cumprem seus deveres de ensinamentos através das narrativas simples que tocam a faixa intermediária entre a razão e o sentimento, área neutra por meio de que será possível vislumbrar a essência do mistério. Toda religião leva em conta esse braço mais prosaico, menos afeito a tiradas filosóficas propriamente ditas. São os místicos do Catolicismo os Padres do Deserto, além dos santos, que buscam a solidão dos montes, os mosteiros, os conventos. Do Judaísmo, os rabis do hassidismo. Do Islamismo, os sufistas. Do Budismo, os mestres zen.

O Zen-Budismo dispõe a seu modo de historinhas simples, os koans, os contos, que oferecem meios de interpretação da Verdade à luz dessa neutralidade mística que não significa teoria nem prática, e significa as duas alternativas a um só tempo. Na ocasião em que o discípulo galga o nível da compreensão profunda, ocorrerá um insight, qual seja um relâmpago interior, que ocasiona infinita lucidez, também denominada samadhi, ou satori. Eis o início da vida de mestre, em que sairá pelo mundo a oferecer tais percepções a outros noviços.

Essa iniciação acontece, portanto, através de exercícios de concentração e meditação, nos espaços próprios dos monastérios, até esse dia quando a luz lhe tocar a consciência. Bom, uma vez trazido este assunto, cabe mostrar alguns koans, ou contos zen.

- Um monge acercou-se do Mestre e perguntou:
Qual o nome que podemos dar a uma pessoa que entende a verdade, mas não a consegue explicar por palavras?
Respondeu: Um mudo comendo mel.
E a uma pessoa que nada sabe sobre a verdade, mas fala sempre dela?
Um papagaio repetindo as palavras que ouve.

- Um noviço queixou-se ao Mestre: Como se está a tornar difícil meditar. Ou me distraio, ou partes do corpo, em especial as pernas são assoladas por dores terríveis. Por vezes, invade-me uma sonolência letal, que me obriga a dormir. Estou plenamente desiludido comigo mesmo.
- Verás que tudo isso é passageiro, respondeu o velho Mestre com suavidade.
Decorrido algum tempo, retornou o noviço: - Mestre, que felicidade a minha. A mente atingiu um estado de suprema tranquilidade. Meu corpo não tem dores e está perfeitamente descontraído. Sinto-me em paz, em união com todos os seres, com o Universo, um estado de maravilha constante.
- Isso também te passará.


(Do livro Textos do agora II, de José Maria Alves (www.homeoesp.org).

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

As histórias sufi

Muitas, muitas, tão preciosas quanto as estrelas do céu e os minérios escondidos nas profundezas do mar, são as histórias sufi. Sufismo, vertente mística existente dentro do Islamismo. Baseia-se na ideia de que o espírito humano é uma emanação do espírito divino. (www.namu.com.br/filosofia/sufismo/o-que-e). 

A supor o que sejam essas histórias, se saiba que As mil e um noites são histórias originariamente vindas através do Sufismo. Prenhes da riqueza inigualável da imaginação oriental, trazem consigo a plena oralidade dos países do Crescente, preservada assim da voragem dos tempos. Desde criança, busco minerar os contos do Oriente, que mantêm vivo meu gosto pelas descobertas constantes dos sonhos literários.

Nem de longe, talvez, a gente avalie que essas narrativas hajam vindo pelas caravanas do deserto, varridas pelo vento dos sete mares, penetrado os rincões sertanejos da colonização portuguesa e adentrado a literatura oral sobretudo no Nordeste. Estão nos versos improvisados, danças e folguedos, crenças e seitas dos interiores. Já hoje, diante dos dotes industriais, dormem nos livros abandonados às traças, nos altares silenciosos das igrejas, nos benditos das festas populares, nos terreiros escuros das casas perdidas nos sítios lá distantes. 

A literatura árabe, persa, afegã, teve seu apogeu durante a dominação junto a Península Ibérica por volta de seis séculos. Nisso ganhou expansão ao Norte da África, influenciando as culturas portuguesa, italiana e espanhola, às margens do Mediterrâneo. Elas estão aqui ainda hoje; vale procurar nas ruas, nos becos. Quais o capital, as forças vivas da cultura jamais desaparecem, apenas mudam de lugar.

A propósito, transcrevo aqui duas dessas historinhas simples e cheias de ciência mística: 

-  História de uma gota de chuva: Uma gota de chuva caiu de uma nuvem de primavera e, vendo a grande extensão do mar, sentiu vergonha. Onde está o mar e onde estou eu?, refletiu. Comparada com ele, na verdade, eu não existo. Enquanto se julgava assim, com desdém, uma ostra a tomou em seu regaço e o Destino lhe deu forma em sua trajetória de maneira que uma gota de chuva se converteu, finalmente, em uma famosa pérola real.

Foi exaltada porque foi humilde. Chamando à porta da extinção, tornou-se existente.

(Saadi de Shiraz, Al-Bustan)

- Ilusão ou realidade: Um quitandeiro tinha um aprendiz que, por ser vesgo, via tudo duplo. Certo dia, o quitandeiro lhe disse: Quero que vás ao depósito e tragas a jarra de azeite que está na estante. O aprendiz foi e retornou dizendo: Há duas jarras, qual trago?

O quitandeiro enfadou-se e disse com sarcasmo: Rompa uma e traga a outra!

O aprendiz fez o ordenado, mas quando rompeu uma, a outra desapareceu.

(Farid ud-Din Attar) 

(www.gnosisonline.org/teologia-gnostica/contos-sufis-de-sabedoria/).

domingo, 22 de outubro de 2017

O padre baloeiro

Esses tempos eletrônicos são mesmo esquisitos. Sem mais, nem menos, a gente se torna próximo de pessoas distantes, e distante das pessoas próximas, qual dizem os cartões espalhados nas redes sociais. Conhece desconhecidos ilustres, e ignora o verdureiro dali da esquina. Bom, a propósito desses fenômenos do tempo das máquinas no poder, também comigo se dá assim aos menores descuidos. Exemplo disso foi de alguns anos transatos, quando apareceu na mídia televisiva um sacerdote católico de lá das bandas do Paraná, que viajava pelas paróquias diocesanas a celebrar missa e distribuir os sacramentos planando pelos céus em balões coloridos. 

Padre Adelir de Carli, 41 anos, que era pároco na Igreja São Cristóvão, em Paranaguá, no litoral paranaense, receberia prestígio das grandes emissoras nas diversas ocasiões noticiosas. Era ovacionado ao chegar e sumia festivamente largado pelos ares cheio de entusiasmo, nos braços do vento, em suas andanças aéreas. Lembro que o vi na reportagem derradeira, quando saía no derradeiro voo religioso. 

De rosto sorridente, corado, estatura mediana, pouco acima do peso, tipo característico dos teutos brasileiros, distanciara-se nas planuras siderais já com o pouso previsto noutra freguesia daí a 20 horas de voo. 

Mas nunca assentaria no destino... Era época de monções nas terras do Sul do Brasil e o missionário sumiria para sempre. Apenas um irmão seu, Moacir, depois, emocionado, viria aos meios de massa prestar derradeiras homenagens àquele que tanto fizera na missão de propagar a crença através dos instrumentos voadores. 

Em nós, os comuns mortais, restaram essas lembranças tardias que ainda vagam soltas nos firmamentos da memória, desses personagens que circulam as ondas magnéticas, nos tocam, e desaparecem quais nunca existissem, tais o tal abnegado sacerdote das alturas. Sumiria já a uma menor distância dos campos celestiais, aonde, decerto, aquietou suavemente os balões da fé que tanto dedicou nas viagens aventureiras. Possível até que hajam sobrado restos nenhum dos esdrúxulos instrumentos que utilizava, mil balões de aniversário. No entanto o amor que dedicou aos fiéis permitiria que largasse, com menores esforços, o ímpeto abençoado da coragem mística nos braços magnânimos do Criador.   

Artes do merecimento

Coração qual fonte de equilíbrio, pois ele é quem manifesta em nós o fator do sentimento. A dor ensina a gemer, diz o povo. O sentimento decide, quando dói, aonde correr e sarar, e não fazer de novo. Nisso, também, a sede da liberdade, ou livre arbítrio. Quando a cabeça não pensa, o coração que padece. Querer sempre o conforto do nosso interior. A gente escolhe melhor diante dos vendavais. Dá de cara com a realidade, e esta impõe condições às vezes contrárias ao travo forte da vontade. Então, vem o discernimento de evitar escolher aspectos contrários a resultados que desejamos. São as sementes de que fala Jesus; de querer flores e ter de plantar flores. Árvores boas dão bons frutos. Eis a Lei, matriz do equilíbrio universal.

Tudo acontece ali bem no íntimo coração, terra em que ninguém anda além de nós; porta que só abre de dentro. O Poder oferece individualidade, vida e liberdade, no sentido de sermos artífices do crescimento individual intransferível. 

Viver significa semear praticados, sendo, no entanto, necessária luz na consciência que habita no centro do sentimento. Nunca fazer aos demais o que não queira a si próprio. Merecer, portanto, qual sinônimo de colher o que germina através do sentimento consciente. Os objetos e as conquistas do Chão servem ao corpo de carne. De que vale ao homem ganhar esta vida e perder a Eternidade (Jesus). As virtudes são esses caminhos que abrem possibilidades de vencer o desaparecimento físico. Desvendar tais mistérios representa superar estágios mortais e usufruir da evolução necessária a sonhos de plena felicidade. 

Quanto ao fiel da balança de viver em paz, este nasce do sentimento maior, do Amor, nas palavras e ações, que vem nas iniciativas pessoais cuja sede está na liberdade do Coração das pessoas. 

sábado, 21 de outubro de 2017

Amigos e diamantes são eternos

Há poucos dias, em João Pessoa, revi um grande amigo, Paulo Tasso Teixeira Mendes. As frações do tempo se perpetuam, sim, nos amigos. Quanta sobrevivência do Ser nesta oportunidade veio à tona dos sentimentos. Muitas lembranças de emoções e das situações, e localidades.


Paulo Tasso significa bem a época de minha vida em Crato quando, trabalhando em Brejo Santo, regressava aos pagos de antes, a fim de manter vivas experiências de recentes infância e adolescência. Ele viera de Roma trazendo na bagagem a atualidade europeia, de quando estudara Teologia no Colégio Pio Brasileiro. Sua monografia fora a propósito do Existencialismo. Eu, vidrado em Jean-Paul Sartre e Albert Camus, nele encontrava o que de melhor poderia haver à época que alimentasse meus estudos. 

Juntamente com José Roberto França de Sá (Zé Roberto), formávamos trio constante nos passeios pelas encostas da Serra, nas noitadas do Telhado do Céu, no Bairro do Sossego, onde Paulo construíra seu refúgio. Mais Tarcísio Tavares e Lirismar Macedo, ali nutríamos de aventuras errantes os saraus das belas músicas e largas histórias. 

Visitei um tanto de vezes sua residência à Rua Santos Dumont, quase objetivo persistente nas minhas vindas aos finais de semana cratenses. Tudo o que contava de Europa me fascinava, sobretudo no campo das ideias. Chegara perto de ser padre; um ano mais e celebraria sua primeira missa. No entanto concluíra pelo caminho dos leigos, sem, contudo, renunciar aos meios filosóficos e à cátedra. Durante o período quando viveu em Crato, naquela fase, seria Diretor do Colégio Madre Ana Couto, professor da Faculdade de Filosofia do Crato e participaria da Sociedade de Cultura Artística, sempre dotado de forte liderança e carisma, a influenciar toda a nossa geração, sendo de seus ídolos destacados.

Adiante, fixaria residência na Paraíba, titular da cadeira de Filosofia da Educação junto à Universidade Federal. No estado vizinho permanece até hoje. Profícuo e metódico, publicou recentemente o livro genealógico Famílias Alves Pequeno e Teixeira Mendes, obra de referência histórica de bem cuidado trato.

Sempre que advêm ocasiões, gosto de reencontrar meus amigos. Não são muitos. Digo aos meus filhos que os dedos de uma mão são suficientes a contar os amigos verdadeiros desta vida. Mas eles existem de verdade, e são eternos, quais eternos os diamantes. 

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

De uma lenda romena

Esse gosto de contar histórias nunca perderá oportunidade. Achou pretexto, traz à tona o tema. E lendo, outro dia, num dos livros que me tocam as mãos, ora que encontro o enredo desta lenda no livro Sobre a rocha, de Mark Finley.

Viviam, no interior da Romênia, vizinhos de terra, dois proprietários da gleba, agricultores e criadores de gado. Um de maior porte, que ansiava o dia quando tomaria de chofre a terra do parceiro do lado, esse de menor porte e de menos poder aquisitivo, que ele desse qualquer vacilo.


Noite escura, contratou agregados para tanger aos seus domínios os poucos animais do vizinho menor. De manhã, estavam a pastar nos campos do rico as poucas reses do pobre. Aquele que é que fez, correu à aldeia próxima e denunciou a invasão, e exigiu indenização correspondente às posses do responsável pelos bichos invasores. 

Julgado em praça pública, viu-se o pobre sem mais vintém. Enquanto o ricaço, além de lhe tomar os poucos bens, ainda cuspiu na sua face, deixando-o arrasado e tendo que mendigar a sobrevivência nos desvãos da sorte. 

Alguns tempos depois, eis que vem o Rei em visita à pequena povoação. Num descuido da escolta, o esmolé obtém conversar de perto com Sua Majestade e conta toda sua desdita, detalhe a detalhe, o que confirma o governante de junto dos cidadãos, no lugar. Sensibilizado, honesto, o Rei logo julgou e sentencia restituir o prejuízo do pobre camponês, ofertando de sobra parcelas em ouro a que começasse de novo a vida. Na ocasião, magnânimo, desce do estrado real e beija no rosto o agricultor, dizendo: − Conte para todos que, no lugar em que aquele homem mau cuspiu, o rei beijou. Com este beijo, você está livre de toda vergonha.

Assim, o autor do livro faz analogia com a presença de Jesus na Humanidade, que veio até nós reverter o quadro de injustiças e dramas, e somos beijados em ambas as faces pelo Rei do Universo, nisto a permitir nova e feliz existência. Bonita história.

(Ilustração: Arte rupestre, EUA).

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Império da vontade

Eles, os humanos, querem assim do jeito que querem, e pronto. Improvisos de experiências afoitas, avançam nos nacos de desejos quais rios cheios e chuvas de verão. Saboreiam de vontade e fogem, ombros baixos, à busca dos próximos repastos. Animais carnívoros, recuperam a fala passados grandes sustos e deliciam a própria carne de outras carnes frescas. Descrição apressada quanto aos famigerados bichos de monturo em que transformaram a oportunidade daqui, isso demonstra o sacrário e os dramas a que se veem submetidos. Horas imediatas. Fomes de nada. Luzes escuras de grotões fantasmagóricos. Filmes sombrios no mistério desses seres intermediários entre sombra e luminosidade.


Bom, fôssemos mergulhar nos átomos dessas consciências em elaboração, muitos subsolos de mistérios há de existir dentro bem dentro do inseto gigantes dos tais seres aquáticos. Lontras. Rinocerontes. Girafas. Camelos. Leões. Vacas. Carneiros. Formigas. Dinossauros. Pastores. Luminares. Gigantes. Anjos. Tradições. Guerreiros. Carrascos. Feras. Santos.

Nisso o forte instinto de mandar sem se conhecer o mínimo que fosse de si mesmo. Livre arbítrio. Independência. Autossuficiência. A cápsula manda mais do que o protagonista do comando. Domina o autor e impõe todas as condições nefastas e ou felizes com que irão reencontrar, nos dias posteriores, as ações que praticaram. Espécies de responsáveis às avessas pelo que praticou, só descobre o final do resultado após receber a sentença terminativa. Tais vítimas do desejo não resolvido e da ansiedade mortal da fome, rezam amargurados diante dos altares a que foram sacrificados na incúria. 

Isto o império de que reina e domina, sem, no entanto, deter os resultados daquilo que promoveu, nas farras homéricas deste mundo. Qual pensar de antes fossem, quase inexiste apelação ou defesa quando arrastam as caudas no lodaçal das amarguras que criou. 

Contudo a moeda de compra da morte significa chance de viver a paz das experiências. E nunca digam que doutrino além da conta.  Misto de paciência e sonho, vivem aqui bem perto as aves da Salvação.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Senso de posse

O apego aos bens do Chão. O desespero dos desejos que flutuam nas asas da ilusão mais à toa. Fome dos obesos insaciáveis, lá de quando jamais alimentará a imaginação avassaladora dos famintos sem pátria. Quanta vontade fora de domínio em momentos inesgotáveis. A ânsia da liberdade endoidecida nas hostes das batalhas perdidas. Fuga do presente, abandono de matas ressequidas e distantes, nas vastidões do coração. Isso de querer o que nem caberia nos olhos, muitos menos na caverna dos buchos abarrotados. Fome, fome de tudo; ganância gananciosa das cólicas desesperadas.

Falar nisso, na ânsia tal dos desesperados do que nem sabem, falar no senso de posse inconsequente. Bicho bruto esse de angariar o pasto das estações, fera que devora a própria carne dentro da carne dos outros irmãos famintos. Angústia na pele de cordeiro. São muitos esses animais sem conta. Vagam soltos nas noites, lobisomens de latas enferrujadas, amantes das instituições públicas. Andam vagando nas encruzilhadas, bocas deixando escorrer a baba e o fel dos infelizes. Eles, que ensinaram a renúncia, a vitória sobre o medo, aos que precisavam crescer, aprender a ser diferentes. Mas esqueceram aonde seguiam e mudaram o rumo da história. 

Há permissão da Natureza, porque os demais careciam dos desafios do perdão, que nas carências vem a bonança. Assim, sem querer, dilatam o coração dos humanos. Que não existissem, teriam de inventar e pôr nos olhos das ruas, nos becos e calabouços. 

Jesus conta a história de um fazendeiro bem sucedido que construiu grandes armazéns para guardar forte safra dos grãos. E da varada do palácio observava soberbo que teria pela frente largos anos de abundância, que com isto poderia repousar em paz face aos bens acumulados. Bem no alto, entretanto, alguém observa o que ocorreria daí a pouco, e diz: - Pobre mancebo, nunca imaginaria que nessa mesma noite a morte virá buscar a sua alma.

Na inexatidão das matemáticas dos sórdidos, dormirão avisos mil de tantas certezas largadas nos desvarios. Crer nas luzes que clareiam nossas aldeias interiores, eis o pacto das horas da felicidade, pois. 

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Heróis do meu tempo

Eles vêm de vez em quando à aldeia da memória e falam, e contam o que fizeram, que marcaram suas presenças naquele mundo de então, idos recentes. Eles são vários. Mostraram diferentes motivações de cumprir o papel histórico que lhes pediam. Chegaram na vida do cotidiano através da mídia, os famosos meios de comunicação de massa, indústrias da informação. Desde diferentes povos, espalharam neste chão exemplos expressivos que só não sabe quem não quer saber.

Por exemplo, Dom Oscar Romero, Óscar Arnulfo Romero Galdámez, conhecido como Dom Romero (Ciudad Barrios, San Miguel, 15 de agosto de 1917 — San Salvador, 24 de março de 1980). Diante das contradições políticas de El Salvador, cumpriu papel corajoso face ao totalitarismo e viu-se executado em pleno altar, quando celebrava missa na Capital do país. Uma lenda de coragem e fé cristã. 

Outro, Benigno Aquino. Lembro bem as imagens de televisão quando ele voltava do exílio. Seria entrevistado no voo que o levaria à morte em face de cruel ditadura filipina. Ainda vimos nas imagens quando descia as escadas do avião e seria preso pelas forças militares que defrontava. Nunca mais se saberia notícias suas. Benigno Aquino Junior. Nascimento: 27 de novembro de 1932, Concepcion, Tarlac, Filipinas. Assassinato: 21 de agosto de 1983, Aeroporto Internacional Ninoy Aquino, Filipinas. Cônjuge: Corazón Aquino (de 1954 a 1983). Sua esposa chegaria à Presidência do país e governaria com a aprovação popular.

Outro mais, Salvador Allende. Eleito pelos chilenos em pleito democrático, iniciando no Chile grandes transformações sociais e políticas que provocariam a intolerância das forças totalitárias, vindo a ser executado em pleno Palácio de La Moneda, em Santiago, inclusive por meio de bombardeio aéreo. Daí se seguiria repressão avassaladora de trágicas consequências. Salvador Allende Gossens foi um médico e político marxista chileno. Fundador do Partido Socialista; governou seu país de 1970 a 1973, quando foi deposto por um golpe de estado liderado por seu chefe das Forças Armadas, Augusto Pinochet. Wikipédia

Mais um, Olof Palme, primeiro ministro da Suécia de extrema popularidade e exímio administrador da coisa pública. Vivia espontaneamente junto do povo sueco. Fazia caminhadas noturnas sem escolta ou guarda- costas. Lá um dia seria assassinado à saída de um cinema em Estocolmo. Sven Olof Joachim Palme, político sueco. Membro do Partido Social-Democrata foi primeiro-ministro da Suécia entre 1969 e 1976 e de novo entre 1982 e 1986, ano em que foi assassinado. Wikepédia 

Há vários e vários nomes que enchem os dias do passado de grandes valores que demonstraram um tanto da boa qualidade dos humanos ainda em fase de transformação e aprimoramento. 

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Na força do Tempo

Quadros mil espalhados pelas estradas, mostram o senso inesgotável do Tempo no sucesso das suas decisões. No candomblé, ele, o orixá Tempo merece o destaque diante das tantas outros santidades. Senhor absoluto de situações e fenômenos, aqui está de olhos bem abertos, independente do ponteiro dos relógios. Livre dos horários, Tempo desfila no transe das agonias e oportunidades. Qualquer humano que se preze respeita o Tempo, valor inestimável e pródigo nas ações dos acontecimentos. Já os gregos, lá possuíam deus Cronos, que paria e devorava os próprios filhos. Máquina de proporções fora de quaisquer cogitações, vive solto no ar da Liberdade pura e circula solto no eito das limitações e dos desesperos de quem resolve confrontar seus embates e suas determinações, neste chão das maravilhas.

Houvesse super-heróis que fossem, surgiriam prudentes perante as garras do Tempo. Dariam nenhum passo fora do circuito incorrigível desse mágico universal das Estrelas. Bem dissera Felipe Camarão, junto das lutas da Independência, quando bradou no tribunal que o julgava a título de perversidade: - O Tempo é o senhor da Razão.

Assim, de todos nós, dormirá feliz aquele que respeita o dono absoluto das prudências, o autor e senhor de tudo quanto há, nos mundos possíveis e imagináveis, e inimagináveis. De armas em punho, ninguém vencerá todo exército e suprirá todas as carências dos procedimentos do nosso ator principal. Inimigos dos inimigos, e amigo dos amigos, descerá nos raios e subirá através das naves espaciais que nem saíram do solo ainda. Músculos imortais, sobreviverá nas mais destruidora hecatombes. Porquanto depois da tempestade vem a bonança eterna.

Quadros mil espalhados pelas estradas... Sorrir na inocência dos simples e adormece de tédio face à imperícia dos mórbidos. Suave perfume das  perfumadas flores, apenas observa na alma o quanto de saudade resistirá nos corações amantes passadas as tormentas da paixão. Doce amigo, irmão leal e artista magistral, acalma, pois, os aflitos e abraça, feliz, a Esperança, a boa esposa de todas as horas. Ah, que santo milagreiro, a tudo preserva e nada existe que lhe fuja ao domínio. Senhor.

sábado, 14 de outubro de 2017

As definições

Quantas atitudes no dizer sem voz. Querer explicar o inexplicável diante de tudo, naqueles momentos cruciais de existir, de buscar justiça nas palavras, o que nelas não cabe. Florestas de respostas prontas virou este mundo. O desejo incontido das justificações, nos conceitos de errado ou certo. Tapar o sol com peneira de folhas e cipós, de dominar o indominável. Palavras. Palavras. Palavras.

Esse instinto dos humanos em controlar o tempo de respiração nas falas, acalmar o desespero em discursos ou coisas físicas, eis o ato de plantar raízes mortas no fluir das horas que sumiram há pouco. Ah, qual quisessem evitar o inevitável, de sumir pelos buracos negros dos depois. Gigantes seres os bípedes sem penas. Dormem presos a si mesmos e acordam aflitos da angústia da má companhia que assim representam. 

Mas, nas definições, amortecem a própria morte, e nisso adquirem bagagens que as largam à porta do cinema da Eternidade. Só de memórias vivem tais espécimes dos guerreiros esquisitos. Sobrevivem à custa do que juntam no decorrer das vaidades. Transpiram nas competições consigo mesmo, ao impulso das dores que anestesiam na indiferença para com os demais.

Presos a cabaças que deslizam secas nos rios da memória, sustêm os fiapos de inutilidade no prazer que foge. Definem. Escrevem. Postulam nos tribunais. Marcam encontros secretos. Preenchem as agendas do inútil no troco do nada. Enganam e se enganam. Contudo definem, deixam seus registros nas pedras, marcos nos fins dos caminhos e lápides de frases emocionadas, quando partem.

Ingênuos componentes dos átomos que se decompõem ao vento da sorte. Pequeninos animálculos desconfiados e esbeltos. Aves presas aos chãos da dúvida até da existência e do Eterno. Primatas inveterados da única solidão a dois que jamais deixará o palco com respostas definitivas, que pedem algo além das definições vagas com que encheram o Velho Mundo. Somos, pois, a pergunta e a resposta. No entanto. Diga. Mostre. Exista.

(Ilustração: O alquimista, de Pieter Brueghel, o Jovem).

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Sentimentos

Imaginemos os amores da natureza original, quando diante de si apenas fluíam meras oportunidades no sentir o movimento dos astros lá nos céus distantes. Seres esquecidos de pensar vagavam soltos às portas do Paraíso. Variadas formas e cores preenchiam a paisagem necessária ao Criador no seu trabalho. Diversos, muitos que fossem olhavam desfilar criaturas quais fragmentos e detalhes das telas geniais do Autor até então desconhecido. Nisso, alguém resolveu nascer do sentimento. Vem de alma aberta e observa os instrumentos de libertação. Sabe de antemão que a solidão contará o todo tempo na saudade imensa da Eternidade. Que sentir implica conter as fronteiras do Universo no prazer único de ser feliz.

Portanto, individuais, perdidos nos próprios sentimentos, desde aquele dia eles andam na busca da realização do Ser. Tocam leves as dobras das condições materiais e perfumam as flores, nos jardins do firmamento; contudo cientes de haver pela frente o instinto de sentir face ao sentir dos demais seres. Pisam soltos nas folhas secas e nas nuvens, antes de serem amantes de si mesmo, egos, entretanto, que precisarão da paz nas outras emoções que vivem aqui por perto. 

O somatório disso determinou a força de continuar, saber encontrar na alma dos irmãos a luz inevitável de iluminar seus mesmos caminhos. Ninguém viverá partido, na harmonia da Criação. Pudessem, talvez aceitassem recusar o prazer infinito de amar. Pudessem, o que nem de longe será possível. Nas trilhas da escuridão, ainda presos ao sentimento, observam os que vão ansiosos à cata da liberdade que alimenta o título das ilusões. 

Decerto determinados por leis superiores intocáveis, silenciosos, deslizam cenário a fora, espécies de vítimas de sentir, a título de existir, preço alto, porém único. Sonham com os dias quando se verão aceitos nos reinos do Destino. Recolhem os amores no seio da virtude e da igualdade; firmam os amores nos séculos de revolução de luz imensa. Sentem-se também criadores do Infinito, e amam ainda mais.

(Ilustração: Andrei Rubliov).

terça-feira, 10 de outubro de 2017

A energia infinita do Amor

Presente em todos os fenômenos universais, ali vive, sob as definitivas condições, a imortalidade da Luz na paz dos bens inestimáveis. Sustenta soberanas as mínimas possibilidades que logo irão gerar o poder do Infinito e habitar na força da Eternidade sem conta no interior das criaturas. Suprema e acendrada bênção que supera obstáculos e anima o fator inextinguível do coração, persiste ao impulso de preservar a sobrevivência dos valores puros.

Numa firme demonstração da existência dessa energia, vêm nos dizer os místicos, mestres, santos, profetas, testemunhos do sonho feito realidade, a demonstrar nas existências o quanto de elevação podem os humanos, chegam e apresentam os caminhos através do exemplo. Resta avaliar o firmamento e aceitar as histórias dos tempos, abrir caminhos dentro da alma e reverter os quadros instáveis do impossível. 

São tantas aventuras espirituais que indicam a chance de ser feliz que poucos ou raros admitem poder cumprir o ritual da Salvação. Igualmente os fiéis que aceitam a fraternidade entre os seres desvendam o mistério nas dobras das horas de rezar, amar e obedecer aos ditames e jeitos de tratar os irmãos. Quanta sinceridade é preciso aos que pedem e aceitam a vontade do sagrado. Estão bem aqui junto de nós tais instrumentos da realização do Ser, missão das criaturas diante dos dias. Lembrar os bons momentos da honestidade, a dignidade e o respeito aos caminhos certos da Verdade. Julgamentos de si mesmos, eis o senso de construir o novo.

Assim o Infinito existe na consciência dos humanos, que apenas necessitam estender a vontade e transformar o Universo por meio das próprias forças, maestros do bem senso. Foram muitas as lidas que lhes trouxeram até agora. Vamos, pois, acalmar o coração e receber de bom grado o direito que o Poder nos concede, aceitar a existência plena do divino em nós.   

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Histórias alheias III

Quero contar algo que, outro dia, encontrei no livro Sobre a rocha, de Mark Finley. 

Disse o autor que o premier russo Nikita Khrutchev, ao fazer importante pronunciamento diante do Soviet Supremo, na antiga União Soviética, discurso no qual denunciava os excessos da liderança de Stalin à frente do Império russo, em que cometera as piores misérias e assim caía no ostracismo, em seguida recebeu um bilhete que o deixaria por demais furioso. Lera no papel o seguinte: Premier Khrutckev, o que o senhor estava fazendo quando Stalin cometeu todas essas atrocidades?

A primeira reação do líder russo seria desafiar o autor das mal traçadas linhas a que possuísse hombridade suficiente e quisesse revelar a identidade diante de todos, naquela ocasião.

Mediante o silêncio que se fizera de resposta, Khrutchev outra alternativa não lhe houve senão abrir do verbo e gritar que fazia, naqueles trágicos tempos, o mesmo que o autor do bilhete. Isto é, que estava fazendo exatamente nada!, pois tinha medo de ficar marcado e sofrer consequências inimagináveis.

Quantos são assim, quase de comum mornos, convenientes, coniventes, omissos... Não só no antigo Império dos russos, porém nos outros impérios da hipocrisia humana. O medo de ser, de manifestar a urgência das atitudes e fugir ao mesmismo da neutralidade circunstante, indiferente...

O gesto dagora significará as razões do futuro, no entanto. O plantio desse instante importará sobremaneira no desenrolar dos acontecimentos posteriores. E tantos baixam a cabeça aos desmandos administrativos, às arbitrariedades e aos engodos que nutrem os aleijões da história. Isso em tudo por tudo, face aos mil motivos que regem fatores inexplicáveis da raça humana.

Ora cruzamos oceanos de palidez dos líderes interessados tão unicamente na projeção de valores individuais ou de grupos. 

Chegará decerto o momento quando, de dentro da multidão silenciosa, ser-se-á indagado o que fazíamos perante tamanhas arbitrariedades e desmandos. Desde agora preparemos o discurso que revidará em dizer que apenas imitávamos os outros indiferentes, que vivem as injustas contradições da acomodação das horas neutras que o passado apagou das consciências.

O ajudante de caminhão

Viajando com Ciro pela Rodovia Padre Cícero, qual filme passando na minha cabeça, revi os tempos da infância quando subíamos e descíamos a Serra de São Pedro em busca do Tatu, aonde desfrutávamos as férias do meio do ano depois de irmos morar em Crato. Lembrei, dentre outras vivências, das vezes em que ali percorríamos a famigerada Curva da Morte, lados do Cariri central, ponto nevrálgico da estrada. Quanta aventura viveram os heroicos motoristas dos caminhões, a sofrer agruras sem par naquele trecho da estrada, sobretudo. Às vezes em períodos invernosos, com cargas pesadas, máquinas precárias, quando defrontavam verdadeiras loterias de vencer o abismo das encostas. Por mais força tivessem os carros, andavam sempre junto de um profissional imprescindível , chamado ajudante, que, nas horas de perigo, saltava e corria próximos, a calçar o cepo nas rodas traseiras dos veículos, metro a metro, na intenção de conter o peso da carga e deter a incapacidade física do motor face aos íngremes desafios. 

Nenhum caminhão deixava de possuir o ajudante, nas suas viagens pelo Sertão. Estradas de terra em precárias condições assim o exigiam. O tal cepo era uma peça de madeira triangular acrescida de um cabo de manuseio, que calçava o transporte naquelas horas extremas. O profissional também assessorava o motorista na troca de pneus ou consertos do mecanismo, além de auxiliar na carga e descarga dos caminhões. Eles eram de reconhecida importância em muitas ocasiões, havendo alguns de boa qualidade técnica, o que lhes garantia facilidade na obtenção do emprego.

Relembro, pois, esses personagens ora inexistentes, que tanto contribuíram no desenvolvimento dos interiores à época da abertura das primeiras vias do automóvel, com ênfase na primeira metade do século XX. Que não fossem tão habilitados quanto os profissionais do volante, no entanto por demais necessários à convivência da tecnologia e a rusticidade dos caminhos que trouxeram o progresso da atual civilização. 

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Que o sal nunca perca o sabor

Dias desses, quando o Sol parece querer dissolver a Terra nas bênçãos do seu calor insofismável, nessas horas renasce dentro das pessoas a vontade superior dos destinos intensos. Há um plano em tudo quanto há. Desde mínimos pássaros que, nervosos, catam no chão o sustento ao Pai Nosso que está nos Céus e em toda parte. Vencer o instante no favor das eternidades e sonhar planos de viver agora toda perenidade. O sal e seu sabor, que alimenta a fome de vencer a inutilidade do inexistente. 


Nas asas de Xangó, amanhece o mundo e o jeito nas suas criaturas ainda impenitentes. A justiça das pedreiras invade o Universo e chega o fulgor da luz do Sol. O brilho dos olhos dos seus filhos, que preenche o gosto de sobreviver diante das impurezas do passado, do novo que renasce a cada manhã, nos corações em festa.

A força do sabor do sal na alma da gente, eis o que alimenta o instinto de tocar o poder da Felicidade. A família das criaturas humanas sustenta no Amor o domínio da floresta sobre as sombras que passam ao raiar da luz. Pai de todos os deuses, transporta no peito o sal que jamais perdera seu sabor, quando as tropas tomam de assalto os territórios antes abandonados pela imprevidência dos séculos.

Quantas e tantas possibilidades nasceram do espírito das pedreiras e das águas. Chegou o dia quando as flores vencem os espinhos, esperança feita multidão e transformação constante de melhorar o mundo. Abertos os segredos, aceitos os ventos da paz, a história vem à tona em forma de mudança perfeita, o que tantos puderam imaginar.  Já o furor deixará de preencher a tela dos contentes e o mar abrirá a boca da noite dos dias bons para sempre.

Memórias apagadas

Vou contar uma narrativa de Seu Chico Ferreira da Silva, amigo meu que mora em Juazeiro do Norte, Ceará, de quando viajava pelo sertão pernambucano vendendo miçangas, ele e outros camaradas. Lá um dia, ao pegar o ônibus de Araripina ao Crato, sentou ao lado de um senhor de modos calmos e educados. Logo entre os dois estabeleceu-se diálogo cordial, o que duraria o itinerário suficiente ao surgimento dalgumas histórias.

Numa delas o dito senhor começaria a falar que sua vida daria um romance. Que vivera com a família numa pequena propriedade no interior do Rio Grande do Norte. Ganhava o suficiente a manter a todos sem grandes dificuldades ou sacrifícios, até o dia quando cruzou problema sério na saúde da esposa, companheira de 35 anos de casamento harmonioso. A grave situação chegaria aos limites da medicina da época. Nenhuma esperança mais de curar assim presenciava.

Nisso, naquelas horas, mediante o desengano da mulher, seria convidado a escutar dela revelação estonteante. Em desencargo de consciência diante do final que esperava, algo causava amargura bem profunda. Ela disse com todas as letras que lhe havia traído quando fizeram cinco anos de casados, o que ele jamais imaginava tamanho absurdo.

Independente de tudo o que ouvira, seguiu a lutar pela cura da companheira, investindo recursos possíveis e impossíveis, até que obteve sucesso. Para alegria de todos, viu a saúde regressar à família. Então, na vitória sobre a moléstia, presenciou com gosto a normalidade de novo tornar do lar.  

Ali depois de pouco tempo, numa madrugada escura, organizou o que pode, selou um cavalo e recolheu poucos pertences, saindo mundo afora, deixando atrás o passado, o sítio, a casa, a mulher e os filhos, a nunca mais regressar. 

Viera habitar essa região do outro lado da Serra do Araripe, imediações donde viajavam para o Crato naquela noite. Agora negociava queijos e produtos da pecuária nos comércios do Cariri e proximidades. Era a história que contou a Seu Chico, de olhos baixos e silenciosos.