Nisso, nesse assunto, o primordial não é o limite em si próprio, mas quem escapará das situações que se apresentem por mérito do talento de vencê-las, quando atravessar a correnteza dos extremos, através dos mares da dor, da dúvida, solidão, etc.
A tudo que existe corresponde um
resultado de ordem prática, real, aquilo em forma de produto ligado às origens,
resultante do objetivo que lhe deu início, à primeira vontade, levado ao seu
fim derradeiro, nessa empresa chamada vida, existência, ou missão. Não importam
as circunstâncias e seus variados matizes; pois, chegado o final, isso também
ficará para trás.
O que pesa, no entanto, vem no
jeito de encarar os limites, casamento feito pelo hífen da palavra (situações-limite),
nos moldes de uma ponte resistente. Os demais fatores valem por detalhes
ocasionais de menor importância, companheiros de meio de viagem, coisa dita com
frieza, que se torna fundamental só no trato das circunstâncias, na vala comum
das ocorrências de rotina.
Assim como o verbo “ser”, que
representa estado de permanência, as situações fazem a ligação do que se acha
antes com o que virá depois, do ser que define o circunstancial das situações,
ligando-as aos sujeitos que permanecem até sumir a estrada, enquanto existe
algo, este, sim, que jamais sumirá.
O tempo marcha sempre, parado no
mesmo lugar, qual fonte universal de um tônico invisível, imaterial, um sol que
a tudo purifica, fazendo e desfazendo, eterna presença da realidade, a luz no
fim de todos os túneis por onde se penetrar.
Ou seja, o que vale é o
equilíbrio entre as partes, entre a queda e a coisa que cai, entre a queda e a
coisa que se levanta, para depois, de novo, desaparecer e reaparecer em outras
formas e oportunidades, a essência daquilo que lhe gerou, nas eras silenciosas,
infinitas, persistentes.
A propósito desse aparente estado
de indiferença com que a natureza trabalha os seus fenômenos e das pessoas
terem de cruzar de algum modo problemas extremos, ditas situações-limite, a
História registra que Thomas Morus, filósofo inglês vítima de contradições
religiosas, na Grã Bretanha do século XVI, já enfermo, sem poder mais se
movimentar direito com das forças pernas, ao chegar no cadafalso para ser
decapitado dirigiu-se a um dos guardas que lhe acompanhavam e pediu:
- Amigo, ajuda-me a subir, que ao
descer não te darei mais esse incômodo.
Quis dizer ele, noutras palavras,
que dali apenas sobrariam retalhos de memória elaborados nos padrões da
dignidade com que se opôs aos cruéis perseguidores. Depois, então, mais nada
restaria dos momentos que fogem, dentro da coerência e dos valores imortais
desse chão.
Em gesto simples, contou que o
tempo não passa; nós passamos e, conosco, as acontecidos, pelo movimento
provisório dos relógios e dos moinhos, iguais ao brilho das ondas de oceano
imaginário, no sopro cadenciado de fole que sobra as brasas, na oficina do
eterno destino, forjando um bloco único, indivisível no futuro.
(Ilustração: Thomas Morus (reprodução).
Nenhum comentário:
Postar um comentário