sexta-feira, 30 de abril de 2021

Sons de carrilhão


Vindos de longe, lá de outras horas silenciosas, de quando a cidade transpirava cheio de incenso e mirra pelas calçadas das igrejas. Havia qual o que espécie de religiosidade pelo ar. Um respeito às normas das mãos de ferro dos costumes europeus trazidos nas malas dos portugueses. Bom, sem querer avaliar resultados que estão aí ao dispor de quem quiser, lembro desse tempo de padres e freiras, e colégios, e rituais, pedaços de memórias de quando criança, de quando íamos às missas, às bênçãos, ouvir os cânticos acompanhados de órgãos e rebatidos ao ribombar dos sinos.

Depois, diante da aceleração dos séculos sem fim, vieram os ecos da deusa Razão e tanto se modificou o quadrante dos costumes. As encíclicas dos papas, a missa que deixaria de ser rezada em latim, as práticas dos credos e das cerimônias, o texto das orações. Mas bem isso que marcou a percepção do movimento dos astros nas praças e nos templos.

Primeiros foram os filmes que chegavam toda semana, de que íamos logo na segunda-feira ver os cartazes dos lançamentos. Isso principiava de acontecer a ponto de mudar em quase tudo as minhas concepções antes firmadas em conceitos da religião católica. Fiquei à margem de tudo aqui de antes. Dos sacramentos que recebera com a família, das rezas que Tia Vanice ensinava a gente à noite na véspera de dormir. Os conselhos dos meus pais sempre calcados na formação religiosa trazida do berço.

E me jogaria de corpo inteiro no mundo profano, nas festas, nas farras, nos passeios, política clandestina, bebida, cigarro, ritmo alucinado de finais da década dos 60, com hippies, rock, Guerra do Vietnam, tantos e quantos chamamentos vadios, nas hordas do desespero de uma época alucinada.

Ouço, agora, lá distante, o badalar daqueles carrilhões de outros tempos, sonoros sinais dos momentos outros abafados pelos instintos de uma geração macerada no caldo grosso das consequências históricas. Acalmo por dentro e reavivo o clima dessas lutas internas que atravessei e ora obtenho a oportunidade rara de poder ouvir de novo, na alma, o vigor de uma fé que mora nos meus sentimentos de saudade que restaram intactos.

quinta-feira, 29 de abril de 2021

O mundo e o Paraíso


Os mitos significam isso, a metáfora do que representa o que contam. Eles, os mitos, buscam simbologia que corresponda ao que não poderia ser dito de outro modo. Dá-se um jeito de contar, nem que tenha de chegar a níveis de imaginação por vezes quais correspondentes ao universo mágico do religioso, transcendentes aos valores materiais e intelectuais.

Assim o mito do Paraíso Perdido, de quanto, na mitologia judaico-cristã, os humanos veem-se expulsos da perfeição original, da primeira inocência, pelo exercício frio do raciocínio, e vivenciam mundo do prazer no vão da própria sorte. Perdem a inocência no troco de revelar a si o poder da criação de outro padrão de consciência, onde o desejo individual toma conta do querer e esquecem as primeiras benesses de filhos diletos da pureza do que antes foram.

Ao defrontar o mundo diante das responsabilidades pelos seus atos, a criatura recria a essência que implica no ser senhor das atitudes, e diretamente comprometido nas consequências dessa nova possibilidade, isto quase nunca admitido.

Enquanto passam a agir pelas decisões pessoais, arca com os resultados, que sejam ruins ou bons, porém apenas daqui do Chão, do mundo em volta, sem os frutos divinos da essência de que fizeram parte certa vez. É andar em território livre, no entanto sob o crivo de razão insuficiente; de criatura em criador de outros paraísos, só que artificiais, sem merecer o mais sagrado da Criação original.

...

Já doutro modo, o Fim do Mundo, de que falam também os mitos em algumas civilizações, vem de significar a perda desse império de contradições a que vieram de cair depois de rejeitar o Paraíso, sujeitando-se agora ao encontro de Si Mesmo e ao regresso a planos transcendentais da pureza original, perdida no tempo da queda e fuga da inocência. Nisso descobrem novo paraíso dentro da consciência e reconquistam o Paraíso original, após o fim de um mundo até então visto sob o prisma da desobediência, desta feita com o mérito da plena Salvação.

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Busca incessante do equilíbrio


Mesmo quando transitamos nas áreas mais escorregadias, todos andam na intenção de achar os meios de ser feliz, seja assim quem quer que seja. Tantas vezes bater em portas representa isso de existir nas histórias deste mundo. Sair diariamente à cata dos instrumentos de equilibrar os dias, eis o ofício de todos. Vontade é que não falta de encontrar as tais expectativas de acalmar os sentidos e viver bem.

Contudo, defrontamos a necessidade urgente do autoconhecimento. Saber, na verdade, os motivos de estar aqui. Saber trabalhar os segredos deste equipamento primoroso que sustentamos às mãos e exercer as funções ideais daquilo que buscamos, sem perder o prumo e respeitando as leis da Natureza. Isso bem que significar existir, portanto.

Além de trabalhar com a gente, temos que desvendar os mistérios dos relacionamentos com as outras pessoas e com a natureza de que fazemos parte. Nisto, agimos diante da escola deste chão. Aprendemos de nós e aprendemos dos demais seres, nas oportunidades de vir até aqui. Simples, às vezes difícil, mas sempre dispondo, em nossas mãos, dos dispositivos de exercitar a missão de conhecer e se conhecer.

Enquanto permanecemos no exercício de aprimorar as normas de viver, desfrutamos das maravilhas de poder praticar o que aprendemos, respeitar os outros e manter o ritmo de nós mesmos. Trabalhar as condições de manter a ordem do Universo em nós. Descobrir que todos estamos num só barco e que os mares são idênticos. Aperfeiçoar e crescer, tais valores essenciais durante todo tempo. Quando ainda não conhecemos, no entanto, cabe respeitar os limites e aguarda a hora certa de cada elemento.

Um espaço ideal a preencher, um tempo restrito de sobreviver e utilizar os recursos do trabalho e da consciência de ser deste modo; aprender que sonhar representa o espelho de realizar a missão de estar na presença do desconhecido, e amar a vida com toda intensidade.

terça-feira, 27 de abril de 2021

Paraísos artificiais


Um mundo velho, atoleimado, vindo abaixo numa velocidade estúpida, e tantos ainda se achando meio cobertos de razão, atolados até o eixo na lama das ilusões que artificializaram. Que mundo, que estrelas, que gentes. Cercadas de falsos motivos de viver, amam mil trastes, lágrimas de langor, troços perdidos no pântano de uma corrupção generalizada nos espaços toscos da ignorância. Que mais esperar de uma gente que se arrasta pelo trilho de mentes sem cura. Bem isso de olhar pela janela dessa nave, enquanto cavam as próprias perdições, desfiladeiros de ausências logo ali na curva do Destino.

Existem, pois, soltos nas crinas dos laboratórios os tais instrumentos de enganar a si, isto a preço módico, no alcance das castas ditas de poder, que nutrem falsos luxos da matéria preciosa dos dias. Daí, correm soltas aos mercados tecnológicos à buscam de enganar seus pedaços de carne em decomposição, fertilizantes da história, o que vem passar depois da estupidez acelerada. Políticos, líderes de fancaria, pobres mortais das massas tóxicas. Capengas vilões da sorte alheia. Vão desfilando no picadeiro dos circos de horror em que produzem as crias da pobreza espiritual, transportam no bornal a falta de conhecimento.

Mesmo desse jeito, ocupam lugares e transferem ao lixo tantas oportunidades do que melhor poderia ser a rica imaginação humana. Refazem de sucata os sonhos vagos dos pobres enganos guardados debaixo de injustiças e sofrimento. Mas irão, sim, chegar ao dia, aos pousos certos, no alho das dores que fermentarem. Nem de longe ficarão impunes, enganchados naqueles abismos dos que perderam o prumo e querem, agora, corrigir a multidão. Ninguém foge ao crivo da Verdade, luz acesa de tudo, uma vez que só criar fantasias jamais encobriria a força descomunal do Tempo no seu eterno movimento. Mais perto estão os frutos dos desejos de Paz. Quem viver verá.

(Ilustração: Juízo Final, de Ticiano).

domingo, 25 de abril de 2021

Testemunhas de nós mesmos


Assim é viver. Conhecer a própria história. Seguir os acontecimentos qual se deles nem fôssemos também os responsáveis. No entanto, observadores fieis dos movimentos dos astros na nossa consciência. Parceiros de todos os detalhes, atores de todas as cenas, instrumentos de nossas reações e sujeitos de nossas atitudes. Ninguém, ainda que o deseje, viverá à margem das ocorrências em volta. Pelo não, pelo sim, haveremos de determinar o quanto mereçamos. Disso vêm interpretações de como participar da natureza, oferecer o melhor do que somos e aceitar as consequências do passado, porta aberta de um futuro promissor.

Somos nós as nossas escolhas diante dos dias. Há, entretanto, padrões eternos que determinam o jeito exato em que firmar os passos e conduzir as ações, isto que bem caracteriza a liberdade. Somos livres à medida que agimos conforme leis morais superiores, pois as nossas simples escolhas fazem delas apresentar os frutos do que façamos. Daí os conceitos de tantos pensadores que trabalham esse modo de agir dos humanos. Livres enquanto pautam seus praticados nos limites do aprimoramento, os quais nascem do tempo em nossa consciência. São leis efetivas, semelhantes a leis materiais, por exemplo. Ninguém foge ao destino que assim determinou, por isso.

De tal modo, o sonho de felicidade significa sonho de harmonia com o ritmo e a melodia das existências, até compreender o valor de obedecer aos tais padrões inevitáveis e enxergar o equilíbrio diante das leis eternas sob que nos vemos submetidos, a rumo de evoluir, espécie de determinação inderrogável de tudo quanto existe. Quase que meras testemunhas, pois, da Salvação, eis aqui o itinerário da evolução de que somos sujeitos e objetos em um único ser. O que nos cabe, porém, nesse percurso universal das criaturas representa a fórmula ideal de conhecer e exercitar os ditames desta sinfonia de que significamos os principais protagonistas durante as eras sem fim.

(Ilustração: O pagamento, de Pieter Brueguel o Jovem).

Nem tanto esotérico assim


Aonde se virar e escutar falar de crise, enxergar em que resultou isso espalhar que as notícias ruins servem de parâmetro da existência de hoje. Olhar o tempo e sofrer da síndrome de que a natureza parou e o homem venceu na corrida destrutiva da poluição com requintes de ignorância. Andar nas ruas desconfiado de todos, olhos presos nos alarmes e telefones sem sinal. Isso de perda de tempo em tudo por tudo, qual funcionário atrasado nos compromissos para com a empresa. Aguardar grudado as últimas notícias à espera do final dos tempos e contar os pontos a apresentar nos tribunais da Eternidade. Quadros dantescos nas horas dessas dagoras, no entanto de encher qualquer saco de quem quer paciência de viver, esperanças de criar uma família unida, formar filhos com visão de sucesso, trabalhar e ser feliz. Ninguém, ninguém, de senso sadio aguentará só pensar assim, andar de pés doidos por causa da pouca imaginação, pessimismo crônico dos que divulgam material recolhido nas bocas sujas e jogam no coxo das tradições contemporâneas.

Houve desleixo das nações e seus pobres comandos, decerto houve; e consequências virão no rastro das horas; é a justiça natural dos elementos, produto de resultados nos sistemas existentes. Porém fazer disso profissão merece avaliação imediata, pois o trilho permanece à frente da composição, direito de continuar e tange o rebanho nas manhãs seguintes.

Ainda que pesem as corrupções e os políticos nefastos que chegaram no poder graças ao voto dos inconscientes, que a indústria das armas fabrique para destruir vidas e seja a que mais movimenta capitais, que a violência sirva de profissão a tantos alienados de cidades grandes e sujas, explosões de incompetência da humanidade em crescimento, ainda que assim se apresentem os noticiosos da mídia sensacionalista, ainda assim existem os dados positivos, as conquistas da civilização, os instrumentos musicais, os artistas geniais, as mães afetuosas e zelosas dos filhos, o sorriso enorme das crianças alegres, o prazer impagável da brisa gostosa nos dias quentes, as viagens inesquecíveis, os livros saborosos, eternos, os filmes inteligentes, o carinho dos que gostam da gente e nunca se esquecem dos verdadeiros amigos, os infinitos sonhos bons de preservar o lado bom da vida, de viver com arte um exercício valioso de fé e confiança; que bom que seja diferente, para melhor, e existir dentro da realidade maior e verdadeira.

sábado, 24 de abril de 2021

Notícias daqui de dentro


Nesse tempo de viver, há que se achar o jeito de melhor rever o mundo e aceitar de bom grado viver da melhor forma, isso de adotar as existências quais instrumentos de revelar a si mesmos o eterno diante do inesperado, numa velocidade extrema de sonhar em falas diferentes, e credos, e luzes. Admitir a condição de que nada muda se a gente (você) não mudar. Abraçar de corpo e alma os detalhes das histórias de contar a nós mesmos, o quê desse tudo afinal, verdades que significam isto de abraçar a vida neste viver com paixão lances e passos, na sequência natural dos dias. Conhecer o mínimo que seja do que até aqui transportamos, de almas inquietas, leves, sem medo, nem culpa, porquanto ainda que nos acusemos de haver abandonado a liberdade em nome das pequenas aquisições, desse modo tem que valer em nós os gestos nossos de transformação que, todo momento, nos indicavam as horas que passam e nos pediam licença de acontecer nas estradas dos céus.

Nisso, escrever o tanto que as palavras pedem e suportam de serem ditas, no transcorrer das gerações desses momentos avassaladores do Infinito, quando a gente para um pouco e observa o processo ocasional que nos envolve, enquanto perguntamos a que viemos largados nas asas do firmamento. Alimentamos, pois, a vontade mais intensa de querer, de somar vontade e desafio numa força denominada poder, o impulso da coragem de andar através do inesperado e sustentar a estrutura de sobreviver perante tudo quanto. No entanto chegamos face a face às muralhas do desconhecido, e só então sustentamos o dever de continuar, noites e dias, mortais defensores da felicidade que o seremos de ser, minúsculos filamentos da Luz em forma de súditos da nossa humana proporção. Seguir, portanto, eis a lei e os destinos em quaisquer circunstâncias, venham de onde vier.

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Resgate coletivo


Faz perto de quatro décadas quando isso aconteceu. Era junho de 1982 (O Voo VASP 168 foi um acidente aéreo ocorrido em 08 de junho de 1982, quando um Boeing 727-200 com destino a Fortaleza se chocou contra a Serra da Aratanha, na cidade de Pacatuba, Ceará.) Wikipédia

Dentre as 137 vítimas fatais estava meu cunhado Wagner Dantas, esposo de  Lydia, minha irmã, ele um jovem empresário bem sucedido da confecção cearense, digno trabalhador e pai de quatro filhos. Foi um choque tremendo a nossa família, o que acompanhei passo a passo, inclusive na reorganização dos negócios da empresa e permanecendo junto de sua família durante 22 dias, eu e minha mãe. Dias difíceis, dolorosos, que marcaram profundamente a todos nós.

Nesse período, espírita que sou, frequentava às 16h dos sábados, reuniões privadas que ocorriam na União Espírita Cearense, à Rua Carapinima, em Fortaleza, quando havia manifestações mediúnicas de psicografia através de D. Maria de Lourdes, médium respeitada e eficiente. Recebia mensagens de entidades espirituais, dentre elas, naquela fase, pude presenciar comunicação escrita de um espírito que desencarnara no fatídico acidente aéreo. A pessoa se identificava como um dos passageiros, e revelou que naquele voo estiveram reunidos antigos membros do Império Romano à época da perseguição aos primeiros cristãos, os quais foram responsáveis pelas mortes das chacinas, com fieis sendo jogados de penhascos, queimados em fogueiras, atirados a feras e gladiadores, no Circo Romano.

O carma coletivo então adquirido viera, pois, de ser resgatado na ocasião do citado acidente. Mensagem equivalente eu leria, mais adiante, num dos livros mediúnicos de Francisco Cândido Xavier, que passaria à minha irmã, dessa vez também de outro passageiro, uma enfermeira que estava entre as vítimas e relatava idêntica explicação a propósito da ocorrência.

No transcorrer das consequências imediatas, de todas as vítimas restaram por volta de 200kg dos corpos, sepultados em cerimônia única, a meio de grande comoção pública, exatamente no Dia de Corpus Christi daquele ano.


quinta-feira, 22 de abril de 2021

Luz do amanhecer


O poder da Natureza revela sua pujança logo cedo, ao nascer do Sol. Daí em diante, o tempo desenrola as tantas qualidades de luz e cor, transformando os dias em manancial de riqueza ao dispor das massas humanas. Longos itinerários de possibilidades em que todos, sem exceção, experimentam o fruir das oportunidades, crescem no trabalho e buscam evolução. As horas assim oferecem os meios de encontrar caminhos de si mesmos e indicam o senso do aprendizado através das experiências, por vezes difíceis, porém sábias, aos moldes da perfeição que nos aguarda de braços abertos, e logo ali em frente.

Isto cabe a todos nós espalhados na face do Planeta. A escola desta vida disponibiliza os instrumentos da compreensão à inteligência das pessoas, dispositivos de revelar o objetivo de ser partícipe da sinfonia magistral da Criação em andamento. Pela força viva dos elementos que movem esse laboratório criativo, desvendamos os mistérios de conhecer a nós e ao Todo universal, vez contar em nossas mãos com o grande livro dos destinos absolutos que o somos.

Durante o percurso da existência, aqui formulamos o melhor projeto de aprimorar o nosso ser ainda primitivo, contando sempre com a sabedoria dadivosa do Amor, furto primordial do Tempo e do Espaço, ao qual votamos nossos desejos de Luz e Paz. Por meio do trabalho honesto, do estudo e dos praticados, construímos a certeza da Fé e moldamos nosso espírito no rumo do Infinito, porquanto já possuímos a cartilha da Salvação, bênção de todos e degraus da esperança porvindoura.

Foram muitos amanheceres, pois, que permitiram superar a materialidade e apaziguar instintos, fazendo disso uma jornada às estrelas, roteiro da humana purificação. Destarte, seremos herdeiros universais de tudo quanto há, durante todo tempo. Bem clara esta visão cósmica de fazer surgir em nós próprios a luz de um amanhecer definitivo.

quarta-feira, 21 de abril de 2021

O instinto das palavras


Quando as palavras querem virar texto, elas ficam batendo nos pés da gente assim tais ondas nas praias, insistindo nascer lá de dentro feito fetos na hora do parto. A propósito, dia desses tive um sonho de quando morava com meus pais na Rua Padre Ibiapina, em Crato, antiga residência construída por Pergentino Silva, no Bairro Pinto Madeira, duas ruas depois da Estação Ferroviária. Lá vivemos em torno de 12 anos, meus pais e seus cinco filhos. Nos sonhos, em velocidade cinematográfica, passaram dezenas de momentos guardados na memória e que nem sabia mais que existiriam. Feitos um caleidoscópio, retornaram intensamente, sucessivamente. Isso através de vários meios de cenas. Sempre, no entanto, carregados das mesmas emoções antes vividas. Lembranças das muitas ocasiões preenchidas de afetos, dramas, aprendizados, que permanecem em mim quais pedaços da individualidade. Encontros e desencontros, notas de rodapé dos dias, trechos de livros lidos, imprudências cometidas, marcas deixadas dos relacionamentos íntimos, circunstâncias, apreensões. Houvesse instrumento de gravar sonhos, dali dar-se-ia produção digna de festivais, trechos diversos ricos de voltagem, cargas fortes de circuitos psicológicos, dores e prazeres vários. Nem precisei ir buscar; vinham à tona feitas ocasiões guardadas nalgum qualquer lugar deste Universo, tais arquivos que não se acabam mais. Resquícios perenes das histórias pessoais, que agora sei que todos os temos naquela biblioteca das vidas para sempre, quando, pois, quisermos visitar nossos passados e reviver os lances dos tempos registrados a ferro e fogo, serão motivos, talvez, de novas interpretações e reaproveitamentos. Transitei nessa incursão em transe de formas e cores, movimentos e sentimentos, bem aos moldes dos que descobrem tesouros de si mesmos, naquilo dos teosofistas chamam de registros acásicos, que jamais desaparecem. Testemunhos, portanto, dessas existências definitivas acondicionadas em dimensão além do tempo aqui conhecido, em gleba das existências de que somos partes integrantes, quem transcorrer pelas cavernas de todos os entes da Natureza infinita de que somos peças e consciências, saberá, decerto, do que estou dizendo.

terça-feira, 20 de abril de 2021

Outras dimensões


Seria por demais pretensão dos humanos que houvesse tão só o esquadro onde vivem nas suas limitações e energias. Conquanto de tamanha perfeição, isto existe apenas no que tange aos corpos e a natureza. Já os resultados de uso deixam a desejar em termos do aproveitamento a que viemos. O corpo de matéria chega às raias da exatidão, no entanto os que o manuseiam são meros aprendizes, haja vista os frutos e a utilização do espaço. Claudicam até os extremos da pouca habilidade no uso, ferem tanto a si quanto aos outros, vez que habitam a carne quais donos absolutos do que nem de longe assim parecem ser.

Doutro lado, persiste o Universo ilimitado, profundo, infinito, de maravilhas pouco conhecidas pelos viventes da Terra. Lá, então, a existência das dimensões inexploradas, morada dos deuses. Isto no que diz respeito ao território exterior; quanto ao continente interior das criaturas, sempre ao livre dispor dos que pretendem desenvolver o senso do inexplorado, podem mergulhar aos abismos dos mistérios mais profundos. Bem próximo de nós e em nós se contêm as chances do aprimoramento, isso que estudam os sábios nas buscas incessantes da revelação dos segredos que, um dia, nos libertará dos laços primários ao mundo animal.

São elas as outras dimensões além do visível, além dos cinco sentidos e do pensamento, as quais vibram intensamente em volta das dúvidas e que podem abrir de par em par as portas da consciência, caminho da evolução de tudo quanto há. Enquanto autores, portanto, de novos níveis de aprimoramento e senhores da humana salvação, vemo-nos a braços com os desafios da sobrevivência e desfrutamos os prazeres da história pessoal, entretanto meros aprendizes dos meios de reconhecer a finalidade que nos traz a este chão. Lado a lado, seguimos o curso das eras e demonstramos, no dia-a-dia, quanto adquirimos de conhecimento através das nossas práticas de vida.   

domingo, 18 de abril de 2021

18 de abril de 1857


Há precisos 164 anos, nesta data, em Paris, Allan Kardec lançaria O livro dos Espíritos, a primeira manifestação da Doutrina dos Espíritos, sendo esta a obra que enfoca o seu aspecto filosófico. Dentre as repercussões do livro, à época, a Academia de Ciências de Paris, em pronunciamento coletivo, avaliaria que nesse trabalho, de 1.019 perguntas feitas por Kardec aos espíritos, e respondidas através da mediunidade psicográfica, ali estaria respondidas todas as indagações que qualquer cientista de sã consciência faria sobre a vida após a morte.

Depois de O livro dos Espíritos, seria lançado em janeiro de 1861, O livro dos Médiuns, ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores, o aspecto científico da Doutrina, considerado por muitos, ainda hoje, o maior tratado de parapsicologia até agora produzido. Logo adiante, em abril de 1864, viria O Evangelho segundo o Espiritismo, o aspecto religioso, a inteirar as três dimensões do Espiritismo, de filosofia, ciência e religião. Nesse livro estão comentários às máximas morais de Jesus, seguidas de mensagens psicografadas de espíritos luminares da Humanidade a propósito dos temas vistos nos capítulos do livro.

Allan Kardec, pseudônimo de Hippolyte León Denizard Rivail, educador francês, discípulo de Johann Heinrich Pestalozzi, em vida, ainda editaria duas outras obras com base nos conceitos doutrinários espíritas, a saber, O Céu e o Inferno (a Justiça Divina segundo o Espiritismo), em agosto de 1865, e A Gênese (os milagres e as predições segundo o Espiritismo), em janeiro de 1868, que somadas às lançadas no princípio totalizam o Pentateuco Kardequiano. Existem outros livros de sua autoria também lançados em vida, porém estes citados são os básicos a quem queira conhecer os ensinos do Espiritismo.

Com a morte de Kardec, ocorrida em 31 de março de 1869, foram reunidos escritos diversos do autor, os quais vieram publicados sob o título de Obras póstumas. No decorrer dos seus esforços de codificar a Doutrina dos Espíritos, Allan Kardec editaria uma publicação denominada Revista Espírita, onde apresentou os mais diversos registros de estudos e fenômenos mediúnicos verificados pelo mundo afora ao tempo de seu trabalho de codificação.  

Corpo intacto

Ao terminar sábia conferência que proferiu na cidade de Juazeiro do Norte, ocasião de um evento de Direito, o renomado jurista baiano Fernando da Costa Tourinho Filho transmitiu anotação no mínimo instigadora, face à originalidade histórica que apresenta. Em conseqüência, achei de bom alvitre recontar, fazendo-os parceiros de igual oportunidade.

Quando no fechamento de suas palavras voltadas aos aspectos vários da prisão no Direito Penal brasileiro, teceu considerações sobre achado incomum verificado em Roma, entre fins do século XVIII e começos do século XIX. No decorrer de escavações arqueológicas realizadas na Via Apia, trabalhadores localizaram uma urna mortuária, resquício da antiga civilização romana. Logo em cima da peça rara evidenciava-se a inscrição: Júlia, filha de Cláudio.  

Adotados os métodos próprios, foi aberta a urna e revelado o seu interior. Continha os restos mortais de bela jovem de aproximados 15 anos, com longos cabelos louros derreados sobre alvo e despido dorso, quedando-se todo o corpo no mais perfeito estado de conservação, livre das marcas destruidoras do tempo na matéria, o que sói acontecer, mas inocorrera.

A insólita descoberta causou espanto no seio dos que executavam o trabalho, motivando a rápida divulgação da notícia aos demais habitantes da comunidade, que afluíram em multidão para ver o estado inalterado daquela fisionomia, tantos séculos depois de retornar à natureza. 

O caso não demorou a chegar aos ouvidos das autoridades eclesiásticas, que, apreensivas com os rumos do episódio, nele anteviram evidências prováveis de manifestações pagãs voltadas a esse mistério, e, sob pretexto de melhor examinarem a relíquia, depositaram-na em sítio secreto, fora da visitação pública, jamais informado até os dias de hoje. 

Nas expressões persuasivas do Prof. Tourinho Filho, homem íntegro, por isso merecedor da credibilidade de quem priva do seu convívio, a visão maravilhosa daquele corpo eternizar-se-ia na alma de quantos ainda puderam contemplar a  incolumidade da sua beleza. 

sábado, 17 de abril de 2021

As manhãs aqui


Nesses tempos de isolamento, anos 2021, as horas ficaram como que mais agarradas dentro da gente onde passam numa busca perene de novidades quais sejam. Dali, os sons das manhãs claras de sol intenso na vegetação da serra orvalhada. Pássaros que percorrem as árvores à cata dos motivos de cantar, e cantam. O cacarejar e o cocoricó de galos e galinhas vagado no terreiro. Latidos de cães desocupados contrapõem as falas desencontradas dos outros animais. Ao longe, vindos daqui de onde moram vizinhos músicos, ouço acordes de um trompete, seguidos das notas suaves de um piano, a preencher de lucidez as pautas do silêncio. Nisso, a necessidade rasante de dominar o instinto de correr pelas distâncias do passado, enquanto, do outro lado de mim, as penas do presente querem impor a qualquer preço visões intermitentes do futuro só inexistente. No entanto vago apreensivo na trilha estreita entre eles dois, ora vencido, ora vencedor dessas imaginações inesperadas, vadias e corriqueiras, dos dois senhores à procura de cativos, o passado e o futuro, duas ficções das circunstâncias, no entanto pura abstração do presente raquítico de nós em nós carentes de maiores convicções.

Vagas manhãs estas de tempos esquisitos, depois das agruras sanitárias que invadiram o mundo. Disso tudo, resta o senso das indagações de quando será diferente, o que tanto aguardamos e nele desenvolvemos nossos projetos de vida regular. Quando, afinal, abriremos as janelas da alma e deixaremos entrar a luz da consciência plena que já chega às mentalidades, contudo deve nutrir o espaço entre as sombras preguiçosas desta civilização. Após o que mais haverá de chegar ao poder o valor da realidade, livre dos cascalhos e dos escombros?! Algo assim de querer saber o que existe logo ali, transcorridos próximos dias de tanta dúvida, quanto ao que herdaremos disso tudo.

Em meio, pois, às forças da natureza, isto de querer solucionar de uma vez por todas o problema do mal que ainda aflige a humana incoerência, nos dias da véspera de novas possibilidades, sempre a vicejar no coração das pessoas, instrumentos de alegria e paz.

sexta-feira, 16 de abril de 2021

O lugar do coração


Nessa busca incessante de achar paz dentro da geografia da gente, quantos pontos cardiais de esperança o coração e a vontade experimentam na revelação das flores e dos frutos, estando a alma em sintonia consigo mesma. Andam devagar nas estradas desta vida; olham insistentes o crivo dos sentimentos; e caminham de olhos atentos às margens de tanto amor pelos desvãos das promessas. Os sinos da alegria que sacodem o valor de sonhos e sorrisos contêm o impulso extremo de vislumbrar os jardins de mais além, nos pequenos louvores das estrelas, de contemplar o firmamento no íntimo das nossas canções.

De palmilhar, pois, as gretas de nós mesmos, lá certo dia se aprenderá o jeito bom de acreditar nos valores da satisfação de nossos instintos no nível mais alto da consciência. Coragem de sustentar normas de bondade sem perder tempo nas longas escolhas que fluem feito folhas e logo em seguida desaparecem como que por encanto no horizonte da pureza do tempo. Nisso, alimentam os gestos de união das criaturas, força inigualável de tempos novos cheios de felicidade.

Assim, depois de longos desfiladeiros de solidão, por fim deparam com o senso da razão de ser o amigo fiel das lonjuras. E amar define o senso da evolução perante os seres, modo perfeito de satisfazer a eterna procura dos melhores momentos. Quantas vezes, neste afã de revelar tais meios de harmonizar o universo dos aventureiros, neste procedimento, somos vistos pelas normas do divino instante qual milagres da Criação, e rimos de tão merecedores, na realização do Ser.

Bem isto, seremos os autores da humana concretude face ao movimento persistente das ondas deste mar infinito de histórias sem fim. Suaves parceiros dos segredos do equilíbrio de luzes e sons, enfim abriremos a porta do silêncio e habitaremos o país das emoções em festa.

quinta-feira, 15 de abril de 2021

O poder dos acontecimentos


Incrível a força que as coisas parecem ter quando têm de acontecer.
 Nietzsche                                     

São essas as ilustrações do livro da natureza, no fluir dos fenômenos. Tantas e quantas vezes, devido a um mínimo, ocorrem aparentes acasos, jamais imaginados que houvessem sido exequíveis, porém dotados de plena coerência (Deus não joga dados, nas palavras de Einstein). Quando, então, algo vem à tona, efeito de mil de milhões de fragmentos, traz em si o processo espontâneo dos acontecimentos.

Isso de considerar coincidência fica por conta das poucas (ou nenhuma) justificativas aparentes, quais numa orquestra monumental regida pelos magos da história. Aonde ir, pois, ali impera a força viva de leis inderrogáveis, o que significa a pedra de toque dos céus às mãos de uma Inteligência Suprema.

Espécie de universo integrado, objetos e gente circulam este planisfério da ordem dessa harmonia. Assim, em meio ao painel infinito que gira pelas horas, sem cessar um só momento, desliza faceira a humana consciência, na busca de si própria, em nuvens planetárias vagando entre a sombra e a luz da existência; sustentam no território da matéria estes aventureiros da razão, ora vestidos de palavras, ora de emoções. Desejos em ação, paixões por vezes alucinadas de revelar perfeições a qualquer custo, no entanto sujeitos bater de frente nos sonhos de felicidade, e padecer as dores dos partos alucinados, vidas adentro.

Outrossim submetidos às ordens do mistério, rendem graças aos diversos deuses que lhes traz a vontade aparentemente soberana, porém autora, nalguns instantes, de cruéis enganos das tais criaturas humanas. Serem meros sujeitos das consequências, dão de cara nas cavernas do desconhecido, e padecem de não saber ainda qual rumo irá seguir nesse roteiro dos instrumentos. Bem isto, aprendizes das cicatrizes que adquirem, tatuam na carne os meios de guardar consigo o senso da Razão maior, lá um dia.

terça-feira, 13 de abril de 2021

Esses messias indecisos


A que viemos aqui... Qual sentido extremo de viver neste chão... A porta do definitivo... Quantas vezes assim de mergulhar e querer saber, no entanto de susto voltam apressados aos afazeres das ausências deste objetivo que olha de longe o movimento da gente. Lá dispersos, agarrados na vegetação das margens, tantos buscam esquecer a que vieram.

Fugir, porém, não consta desse roteiro, porquanto nem aonde fugir existe. E lustram as estradas de rastros incertos, elas, as criaturas. Escrevem milhares de cartas aos céus, definem sonhos de querer o melhor, ordenam as horas de acordo com suas próprias interrogações... Plantam, colhem; vivem, revivem; alimentam desejos de perfeição quais mergulhadores de mares desconhecidos, sem saber jamais nem o que buscam afinal.

Contudo só aguardar, que existe, sim, real finalidade (Sois deuses e não o sabeis, disse Jesus). A todos há essa fatalidade, concretizar o projeto da Criação, mesmo que omitam de si a condição essencial de estar e ser diante dos segredos guardados. Solene imaginar isto, de ser messias em crescimento, até um clímax de maturação. Fortes vínculos nos prendem ao desconhecido, algo religioso, original, astrofísico, eterno...

Desde que aceito no íntimo da solidão cósmica das existências, antes somos isto a improvisar desempenhos no teto das dúvidas, meros experimentadores dos destinos. Arrastar correntes enquanto isso, nas vidas que se sucedem. Quantas e tantas luas e baladas, e filmes, e livros, e encontros, e desencontros, ainda que instrumentos de forças até então abstratas, poderosas, outrossim.

No sol quente das manhãs, ali, gelados por dentro, impera esse instinto de sobreviver aos impactos inevitáveis de um viver provisório. Queremos, todavia, desvendar os enigmas destas horas que projetam cores, luzes, movimentos, pedaços de sentimentos e pensamentos, que desmancham as idades e burilam os corações na forma de uma verdade definitiva, que o seremos para sempre. Somos, pois, a semente do Infinito plantada no mais profundo de nosso ser. Tais fagulhas, significamos o primeiro instante da revelação original.

segunda-feira, 12 de abril de 2021

Hora de passar o mundo a limpo


De que adiantou saber tanto e não praticar, ou praticar pela metade. Ou não saber. Nunca se descobriu tantos mistérios, no entanto a natureza permanece a nós desconhecida nos momentos mais críticos. Há que haver uma autocrítica severa diante disso tudo que vem ocorrendo. Repensar a finalidade e o que significa existir. Rever objetivos. Crer verdades nas potencialidades que nos sobram, a fim de construir o mundo novo de que falavam os visionários. Sonhar acordado, mas exercitar o direito de sonhar de todos. Exercitar as virtudes que decantam os filósofos, os santos e profetas. Aonde foram parar os planos de viver em paz numa sociedade justa das histórias que contavam nossos avós em volta da fogueira? Por que encontrar as respostas e as deixarmos de lado quis fossem apenas ficções?

Enquanto isto, as leis da natureza prosseguem inevitáveis frente às estações, senhoras de si, por vezes severas, exigentes daqueles que as utilizam ao bel-prazer das humanas vaidades. Quanta exclusividade nas classes sociais dominantes, nas imposições da força bruta que arrasta os séculos, quantos gastos em armas, em sistemas de sacrificar populações no interesse de alguns, das elites hegemônicas... Quanto descaso no exercício da honestidade, do respeito aos demais, da ganância, interesses escusos... E querer respostas diferentes daquilo que apresentam, vê-se nisso as garras afiadas da ilusão que exigem justiça inevitável no decorrer das gerações, nas muitas ciências que devíamos guardar com zelo. Nada ficará impune nos delitos praticados em detrimento da paz.

Ainda que perfeito, maravilhoso, o Universo detém, infinito, o poder das vidas em todos os sentidos. E esse mundo principia dentro de cada um de nós, no espaço restrito de um tempo em movimento. Que estamos fazendo de nós mesmos, das nossas potencialidades em favor de revelar os valores positivos de existir em harmonia com as leis da Criação, apenas os indivíduos são capazes de responder, pois as determinações da existência assim impõem. O fazer do que nos resta face ao futuro desconhecido, só os seres humanos haverão de mostrar, nestes tempos de uma sobrevivência quase que tardia.

domingo, 11 de abril de 2021

Convicção


Além das certezas, logo ali perto, onde existe o território franco em que impera a entrega absoluta, isto livre de outras considerações, numa firme representação do que denominam Fé. Conceito por demais elaborado nos estudos das religiões, tal seja o Amor, tal disposição do ser contém valores adquiridos no decorrer das existências. Bem quando os conceitos das verdades várias deixam cair por terra os princípios só intelectuais, há que se adentrar o âmbito desse mecanismo guardado a sete chaves nos mistérios da consciência mãe. Reunir, assim, tudo enquanto vivência e valores, e mergulhar de corpo e alma no universo inesgotável da crença numa verdade única, indizível, insofismável, depois das considerações dos povos, tempos e costumes. Adiantar nos séculos e milênios e conhecer a claridade do poder divino.

Nisto impera o silêncio das horas, mares de infinitudes, sonhos de paz, ausência de preconceitos, divisões, obstáculos que sejam... Apenas a serenidade dos deuses na fronte das criaturas, passados que foram tempos de solidão e desventura. Novas florestas de esperança, desejos de serenidade, olhos de transcorrer as alturas e obter meios de cruzar os abismos mais profundos. A força plena do ânimo que sacode as bases da indiferença e impõe urgência de acalmar os pensamentos frívolos. Voos siderais às plagas celestes de que somos herdeiros e viventes.

Quantos disso necessitam, porém deparam laços de dúvida, amarguram intransigências da matéria, padecem a fome das alturas sem, no entanto, elevar aos céus o ímpeto das dores em princípio de vitória. Mesmo que limitada, a nossa humanidade atravessa, ardorosa e vadia, essa barreira do som das circunstâncias, por vezes longe de conhecer a que veio aqui. São gerações sucessivas de aprendizado pelas escolas deste mundo. Ardorosos aprendizes dos tantos sinais, contudo meros serviçais de sortes incertas, instrumentos de marcos ilusórios, transpiram necessidades desta condição dos entes fieis, heróis de novas danças e lúcidos donatários da Eternidade.

sexta-feira, 9 de abril de 2021

As portas da ilusão


Largas, imensas, rasgam as vistas... Escancaradas bem na margem dos passos dessas criaturas humanas, por via do pensamento vacilado, torna-os meros escravos de si mesmos, entregues às ganas dispersas da ilusão entontecida, imprudente, das longas noites de loucura, vastos campos de amargas visões, dorsos amolados na fraqueza daquelas almas inebriadas de alucinadas perdições, dromedários dos vícios e das sombras.

Foram, pois, muitas daquelas horas de coragem às avessas, nas aventuras de abelhas de fastios exasperados, longas filas de zumbis lançados aos universos inexistentes, pecados de religiões invertidas e à toa, no tempo e no espaço fugido, ao longo das patas daqueles animais enfurecidos no deserto.

E pensar que a morte não é o fim, só um novo recomeço. Regras imortais das calandras desse mundo de surpresas, viemos aqui tão apenas experimentar viver e aprender, reconhecer as tantas oportunidades na aplicação do fenômeno vida, instrumentos de elaboração da consciência que o somos e seremos sempre. Nesse dizer, resta aprender, guardar o definitivo das luzes que percorrem o firmamento, experimentos de segredos tenebrosos.

Insistir em renunciar a tudo isso na intenção dos acertos, construir novos seres e salvação no íntimo da criatura em crescimento espiritual, foi assim e será o ofício da natureza, no coração de todos nós. Aprendizes do destino, talhamos vencer a ilusão num esforço necessário à libertação que nos aguarda mais dia menos dia.

Conquanto ainda em aprimoramento, no entanto seres de poderes incríveis, na força suprema de criar o painel das histórias individuais, qual função inevitável, no gesto de existir nas dobras do tempo onde habitamos. Senhores desta possibilidade às nossas mãos, construímos o futuro ao sabor do presente. Somamos força ao poder infinito dos mistérios, e dormimos no seio do Eterno quais minúsculas partículas da perfeição de que já somos dotados.

terça-feira, 6 de abril de 2021

O rei de cada barriga


Nesses tempos que é de guerra e paz, dormentes e impávidos lá vão eles, os donos do poder de tudo, ou nada. Umas, vestais de credos desconhecidos; outras, senhoras dos ares e dos mares. Que vale dizer tangem os rebanhos das consciências nas trilhas das lendas. Claro que existem os menos inúteis, no entanto que carregam consigo do pouco que juntaram das tralhas dos vagões. Olhos acesos nas sombras do que deveriam carregar, esquecem o peso e transportam multidão de ilusões em forma do vazio que significam viver. Sóis e luas, arrastam cruzes e matulões de vaidades soltas, cacarecos da ansiedade, das dores atrozes do desespero, de amanhã, de horas desejadas de ambições perdidas. Eles, muitos, bichos de lata e cavaleiros da solidão.

Isso bem dos tempos quando as amarras dos navios começavam a virar fiapos de lã num mar de vícios. E as luzes do alvorecer pedem mais sinceridade às criaturas, estas peças de reposição do destino cheias de certezas artificiais e cicatrizes de combates que nunca aconteceram dentro de si. Apenas saltimbancos doutros filmes jogados à lama dos séculos, à lata de lixo da história. Neles, que as esperanças viraram feras sem dentes e lâminas de papel toalha. Quase isso, de alimentar o firmamento de seres destinados a outros planetas vindos bem de longe, certo dia, à cata dos seus habitantes.

Fôssemos recorrer aos sonhos da ficção, diríamos só que já atravessamos o lodaçal dos resultados aqui plantados no decorrer das civilizações, conquanto aguardamos nova fase de alegria e uma coletividade fraterna, fruto do que até agora aprendemos a ferro e fogo. Nada, porém, foi para sempre, se assim o será nalgum momento perante as ilusões de um chão de tanta fantasia. Há que haver, por isto, solo fértil de verdades absolutas, oportunidades da visão plena e dos valores eternos, que persistem acesos em nossos corações.

segunda-feira, 5 de abril de 2021

A lenda da Pedra da Batateira


Eis o título do livro de Fátima Teles, que traz por subtítulo Uma história do Cariri, há pouco lançado, contendo ilustrações de João Alves, numa confecção gráfica da Premius Editora, de Fortaleza CE, 2020. Obra de cunho etnográfico, aborda em detalhes o mito maior da região do Cariri cearense, narrativa esta por demais conhecida, segundo a tradição, fruto dos tempos da colonização portuguesa. A autora desenvolve o tema distendendo sua narrativa em estilo prosaico e cordial, qual de uma avó, Dona Maricotinha, que conta aos netos esses feitos de quando os índios foram daqui expulsos de suas terras em nome do progresso e da civilização europeia. Resultado disso, esses tempos de agora e suas características profanas industriais.

A autora, no entanto, distende sua proposta a eras mais remotas, tratando do período Cretáceo, que bem caracteriza esta parte de mundo da Era Mesozóica, de quando surgiram as flores na Terra, enfocando, com isso, detalhes da nossa paleontologia regional, exaustivamente estudada, que marca presença nos anais acadêmicos. Vê, em paralelo, o aspecto ecológico conservacionista, por sermos detentores da primeira floresta nacional do Brasil, a Floresta Nacional do Araripe.

Assim, ao momento em que a escritora Maria de Fátima Araújo Teles, neta do emérito educador de Brejo Santo, Professor José Teles, nos conduz pelo universo da cultura original do povo e suas lendas, a publicação evidencia o talento de João Alves de Queiroz Neto, jovem desenhista que revela talento e criatividade neste livro que mereceu a revisão de Cleide Souza Teles, equipe esta que vem, com esta obra, enriquecer nossos acervos e aprofundar os conhecimentos de tradição rica e surpreendente, patrimônio, agora, também das novas gerações.

domingo, 4 de abril de 2021

Aos olhos da noite


Desde quando, lá adiante no céu do poente, o Sol esquece um dos lados da serra, nesse exato momento nasceu a noite, manto de negrume desenhado de estrelas. Bem ali, nas dobras do silêncio da natureza, outra realidade principia. Assim também nas pessoas, exames mais profundos da condição humana arma laços de busca lá dentro. Quais reflexos de si mesmos, caçam mistérios e respostas aos enigmas na Criação que vivem nas entranhas desses mundos que o somos. Saber de nós, das sombras que envolvem a compreensão de tudo, querer conhecer do que nos resta. Desvendar as histórias que acontecem e quase nem as dominamos. Pedaços de pessoas largadas no extremo de todo dia. As graves perguntas dessa existência que vêm mais fortes nessa hora.

Espécie de fantasmas da própria consciência, esses hominídeos vagueiam nas sombras à cata de reaver o que o dia os levou a deixar vidas que se consomem no furor do tempo. Fitam o vazio da compreensão e querem descobrir a que vieram, tais escravos de senhores esquecidos nas sombras que chegam.

A humanidade atravessa, pois, tempos tais, de tantas e largas indagações, porém certezas desconhecidas que lhes escapam à fome de saber. Marcas e filamentos dos lençóis esquisitos que os dominam, feitos fragmentos inúteis, lançados ao solo nas sementes e criaturas numa velocidade inevitável, nessa fase da história.

Qual manto de severa culpa, movem as estatísticas os números dos que se foram, aumentando inexplicavelmente novas perguntas, preenchendo o teto das condições deste chão. Vorazes senhores da transformação dos seres em objetos, seguem seu curso independente da ciência desses homens. Ninguém quer sumir de repente, no entanto aumentam os números ausentes, numa fase que já demora passar. De tão distantes e tão perto, a escuridão desses dias lembra as sombras noturnas que invadem a Terra, e os homens fixam no horizonte a sede do desejo de uma vida longa, saudável.

(Ilustração: Noite estrelada, de Vincent van Gogh).

O poder infinito da oração


Pouco antes de sua morte, o Rabi Haim disse a um visitante: - Contasse eu nove amigos fiéis, com cujos corações o meu batesse em uníssono, cada um de nós meteria um pão na sacola e sairíamos juntos para o campo, e juntos andaríamos juntos pelo campo, e oraríamos e oraríamos até que a oração fosse ouvida e viesse a redenção.
Martin Buber (Histórias do Rabi)

 Há alguns que oram dentro de tamanha convicção que as portas do Infinito se abrem e deixam passar a contrição. O fervor dos corações em plena coincidência daquilo a que oram e propicia o reviver as certezas e transformar o instante no que de melhor pedem os fiéis na força da convicção do Absoluto.

A oração qual fonte que vem dos que reconhecem a presença de Deus nos indícios do poder sem limites da Verdade. Abrem de si a leveza da emoção superior e deixam nascer a possiblidade de partilhar a força do mistério tenebroso na imensidão da vontade pura. Orar, que possibilita os meios reais de encontrar a própria essência do ser.

Daí o valor inestimável da prece com toda a intensidade da alma. Buscar uma forma de encontrar a resposta adequada aos nossos pensamentos de conforto. Fazer valer a fé em ação nos refolhos da consciência e chegar mais além das limitações do pensamento. Viver de dentro a experiência de falar com Deus. Circunscrever a vivência de guardar na certeza a glória infinita do Amor. Viver, afinal, o que de melhor possa, no sentido de responder ao vazio que, por vezes, quer tomar de conta dos dias escuros e trilhar as respostas que correspondam à conformação, e tranquilizar crises, situações inesperadas.

Uma forma de responder ao senso das fragilidades humanas. Sonhar com o impossível em termos de convicção e fervor.

(Ilustração: Angelus, de Jean-François Millet).