segunda-feira, 3 de março de 2025

Ser assim


Ao contemplar tudo quanto existe em volta, ver-se-á tão o próprio discernimento. Daí, o quanto existe à luz da consciência individual. Buscar, buscar a si mesmo face ao tanto que existir, eis o motivo de presenciar a História. Em ponderar a essência que persiste entre tempo e espaço, nisso onde transitam as espécies. Umas discernem relativamente o plano deste chão; eles, os humanos. Enquanto isso, quantos seres mais compõem o quadro infinito de normas e discernimentos, eis o mistério das horas.

Tantos vivem sob condições inatingíveis pela compreensão antropomórfica, no entanto sob harmonia inalcançável ao pensamento humano. Quais parte integrante da ordem universal, sobrevivem aos impasses da Natureza e desafiam sortes outras distantes do pensamento da gente.

Conquanto dotados, quem sabe?, de alguma razão, tocamos as bordas do Infinito feitos aprendizes da certeza, reflexos de uma provável liberdade agora pouco exercitada, a experimentar sabores e atitudes em aprendizados duvidosos.

Outrossim, desse modo havia de ser como o que ocorre à luz das tantas vidas em movimento. De longe, observamos os rastros deixados na lama dos destinos e quase pouco ou nada aprendemos do que ficou na caminhada. Senão, vejamos as marcas nas paredes dessa caverna da Civilização, os trastes largados pelos vazios, desgastes vários no equilíbrio dos fenômenos, o fabrico desesperado de instrumentos letais à cata de poder que logo some pelos ares. Animais assim descrentes das possibilidades em volta, preenchem de fome as leiras do desejo, numa carência de sentido daquilo que façam.

Bom, mas há nisto também uma real finalidade, vista a perfeição desde as origens do que presenciamos. De alunos desta escola, chegar-se-á, nalgum momento, ao teto da clareza, e de lá, então, divisaremos o significado do quanto nos trouxe até aqui.

domingo, 2 de março de 2025

Um dia especial


Quem ama desses amores que não têm tamanho e sente o peito crepitar da mais ardente fogueira, espécie de dor e prazer sem conta, de que se quer fugir, porém recusa por conta da dimensão do mistério a envolver tudo em volta, a esses resta a pergunta descomunal de quando se reunirá em definitivo com a pessoa amada, querendo ser um único ente pelos milhões de anos eternos do depois, jamais sair de perto, jamais afastar um do outro para sempre. Essa pergunta certo dia esses personagens responderam com o amor definitivo... Num conto de conseqüência permanente, eles despertaram nos braços da fusão dos seres, amálgama das individualidades, esperança dos que aspiram pela constância do maior dos sentimentos.

Depois de uma noite chuvosa do mês de junho com neblinado constante por seguidas horas, veio nascer sol radiante, a iluminar coisas e pessoas nas planuras do mundo. No peito, corações doídos, mas felizes...

Há pouco, na cama noturna, ao lado dela, viajara por dimensões nunca imaginadas, caminhos de campos soltos no ar, cheiro perfumado de amores acesos.

Houve momento enquanto a chuva lá fora insistia prosseguir de jeito teimoso para essa época do ano, que o calor pareceu dominar as ações do amante aflito na busca de encontrar o corpo dela e querer maior aproximação da pele aquecida no fogo do amor, para não lhe gerar desconforto e despertar.

Contudo, na alta madrugada, o frio sorrateiro a tudo envolveu, sem desligar a forte intercessão dos dois num barco de afetos singrando mares azuis, sinais da felicidade pura, cantada por poetas em todo estilo de poemas e línguas pelas gerações adentro.

Com isso, na manhã, o impaciente coração, arrebatado nos dias próximos e seus dramas íntimos, tornou-se uma integração de vida e acontecimentos costurados a quatro mãos.

As movimentações do sono, os acordares entrando em sonhos de ambos, enriquecendo as paisagens da alma, nutriam-lhes os universos interiores. Aonde olhar, marcas de passos na superfície macia dos corações trepidantes.

Enquanto as pessoas chegavam para participar do colóquio, ele organizou os pensamentos nas lembranças da noite. Seus olhos ainda queimados de sono a deixaram dormindo mais linda do que em tantos outros tempos, na mesma cama dos abraços dadivosos.

Saíra e levara consigo saudades sacudidas ao vento da manhã que circulava pescoço, rosto, cabelos, no dia claro, matriz de lembranças da infância distante, de características semelhantes pelos amores vivos na beleza da virtude sertaneja.

Afinal passaram dias pródigos de apreensões. A noite representara a cicatrização das feridas antes abertas e pegajosas. Ele preservou na memória o traço escultural das curvas do seu corpo que há pouco afagara, cheiroso, leve, brisa bailando no desenho das nuvens, na manhã festiva.

O dia amanhecera com a imagem dela a se superpor na sua consciência, através dos elementos da luz refulgindo em milhões de pedacinhos espalhados na estrada, vidrilhos de carinho e amor, quando o espaço reuniu o tempo num só beijo indivisível, foi que notou as duas impressões da noite no dia especial a surgir no formato de flores vivas, soma das duas metades em completude.

Nisso revelou-se nítida certeza do dia entrar na noite e a noite entrar no dia, igual ao que ocorria agora, dele somar a ela e ela somar a ele, novo ser do amor, dia e noite, noite e dia, para sempre um, felizes por serem um só assim.

Novos tempos de ficção


Houve época, ali pela década de 70, quando tudo parecia chegar aos limites e entraríamos na Era de Aquarius, tal ouvíamos e dizíamos sem conta. Fase doutras histórias nas manifestações da literatura, da música, do cinema, etc. Lembro alguns dos títulos de livros, Admirável mundo novo, 1984, Laranja mecânica, Utopia 14, Crônicas marcianas, As portas da percepção, Sidarta, O despertar dos mágicos, entre outros. Na música, a explosão do rock, o movimento hippie, Woodstock, o Tropicalismo, os festivais da canção. No resto, o fim da Guerra do Vietnam, a Primavera de Paris, mudanças na Cortina de Ferro e nos diversos continentes. No cinema, 2001, uma odisseia no espaço, Contatos imediatos de terceiro grau, O franco atirador, Darsu Uzala, Apocalypse Now, o Cinema Novo, os filmes de diretor, de sempre apreciados. Nisto, a fragmentação dos meios de comunicação que explodia o universo daquele período cheio de inquietações e dúvidas, indícios das mudanças em andamento nas novas gerações.

Em um salto exponencial, agora o que se vê, nesse contexto da História, uma espécie de expectativa do que virá, no entanto, com o mínimo de clareza, a grosso modo sem clareza suficiente. A superpopulação das grandes cidades, o desassossego nas áreas críticas, o excesso de arsenais armazenados pelas grandes potências, avanços na tecnologia da informação, indecisões doutrinárias quanto aos métodos administrativos nos países e incerteza generalizada quanto ao que há de vir, este o quadro generalizado, bem aos moldes de novas expectativas e apreensões decerto iguais ou maiores do que naquele final do século anterior. A população já beira 9 bilhões, grande quantidade sobretudo em nações do Oriente, China e Índia, com excelência.

Face a tanto, surgem os intérpretes do futuro no presente. Repassam as antigas profecias, os olhares aos céus dos astrólogos, religiões em profusão, busca de extraterrestres pelos registros e céus, sinais de novos rumos ou inúteis confrontos bélicos, nas ânsias e preocupações várias. Talvez, mais que antes, novos tempos de ficção, rondam o espaço. A mídia descaracterizada no interesse público que lhe dera início e fora das antigas bancas de jornais; a força nunca vista da comunicação eletrônica; novas energias emergentes, refugiados espalhados no exilio; o atraso das nações pobres; fome e subdesenvolvimento na América Latina, na África e em países da Ásia, isso a definir incapacidade humana em resolver seus desafios, passados que foram tantos séculos.

Nesse instante, sente-se o peso da imaginação a percorrer meios outros de rever os conceitos e transformar a mentalidade, que seja, porém, em turno ainda deficiente a reconsiderar o que estamos vivendo, perdidos nos instintos sórdidos além que sejam de um puro egoísmo coletivo, pois. Decerto haverá o tempo bom de tantas cogitações até hoje cortejadas através dos livros e sonho de todos nós.

(Ilustração: https://www.opantaneiro.com.br/colunistas/post/vivendo-os-sonhos-de-deus/2872/).

sábado, 1 de março de 2025

No oceano das palavras


Ser nada é o primeiro degrau da liberdade
. Jiddu Krishnamurti

Primas-irmãs dos pensamentos e dos sentimentos, nascem ao primeiro sopro de uma brisa qualquer e norteiam seguir pelas entranhas da gente. Vasculham passados decerto inexistentes feitas luzes que apagam e acendem constantemente nas mil noites seguidas da vontade. Desejam a custo reviver, no entanto vivem, sim, pois avistam sentido no que seja, que haja. Sabem ser assim quais vultos pegajosos das ilusões até então perdidas. Alimentam de cores e formas as imagens dos quantos filmes da alma, esquecidos no vazio largado das casas antigas. Vêm, sim, aos pedaços, através das vivências sacudidas fora, dos trastes inúteis apenas ali deixados à margem do quanto existiu, e tornam ao foco da razão munidas, quem sabe? de estoques ferrenhos dos destinos, cobranças inevitáveis daquilo posto de lado, ainda que tanto elas insistem refazer nas lembranças dagora, modo esquisito de sobreviver ao longo dos assuntos aparentemente inválidos, desfeitos, distorcidos.

Vezes sem conta, são personagens, acontecimentos, caminhos... Mundos exóticos que insistem na memória, voltam nos laços das visões soltas doutras histórias talvez sem nexo que foram embora. Nisto ganham força ninguém sabe de onde. Fustigam as horas, sustentam monumentos ancestrais no colo das alturas e convidam às vivências repetidas daquelas espécies de seres que nem mais habitam as profundezas, não fossem tal sejam, mas insistem continuar. Todavia dominam a pulso o quanto querem percorrer desse universo interno, tiranas flores de plantas exóticas.

Conquanto ausentes da realidade, persistem no seio das consciências, força poderosa da imensidão do Tempo. Foram. Existiram. Residem no céu das pessoas. Entes dessas dimensões, pululam a matéria orgânica dotadas de inúmera possibilidade a todo instante; regressam espontaneamente e preenchem as teias da presença, súditos independentes e senhores dos tantos mistérios de que ora somos feitos. Elas, as palavras, origem de tudo e do que virá desde agora e sempre.