Naquele 28 de setembro, numa das salas do Cariri Shopping, vi O caminho das nuvens, filme do diretor Vicente Amorim, que há coisa de dois ou três meses teve algumas cenas rodadas nesta Região, utilizando também mão-de-obra local.
Calcado na história real de um
cearense de Penaforte, o argumento relata a epopeia de família pobre de
nordestinos, pai, mãe e cinco filhos, que realiza percurso da Paraíba ao Rio de
Janeiro, passando por Juazeiro do Norte, montados na sela de bicicletas.
Incidentes variados e encontros
fortuitos marcam o itinerário, vistos sob ângulos subjetivos de cada um dos
personagens, sem preocupações cronológicas, diante da trilha de canções do rei
Roberto Carlos, a quem o filme vem dedicado, nalguns momentos interpretadas
pelos próprios atores.
A meiguice de Cláudia Abreu
suaviza os estirões ásperos da paisagem de sertão e periferias interioranas por
onde o autor conduz a trama, por vezes sob lances extremos de tensão emocional,
quais na abertura, quando o filho mais novo, esquecido no meio do asfalto, por
pouco não causa trágico acidente, e na ocasião em que Antônio, o mais velho,
defende a mãe das garras amoladas de capataz inescrupuloso.
A luz da caatinga nordestina
revela no cinema o fervor do sol ardente das
temperaturas elevadas como elemento fílmico, a lembrar o clima de O cangaceiro, de Lima Barreto; Deus e o Diabo na terra do Sol, de Gláuber
Rocha; e Vidas secas, de Nélson Pereira dos Santos.
A marca da religiosidade promove
o nexo causal do desenrolar dos acontecimentos, identificando personagens e
existências com a busca extrema dos valores eternos. Vêm ao Horto do Padre
Cícero na intenção de juntar forças de continuar até o Rio. E junto à estátua
do Cristo Redentor, pedem coragem de seguir até Brasília.
O pai alimenta a certeza de achar
um emprego que lhe remunere com R$1.000,00, valor que considera indispensável
para a manutenção justa da sua família, motivo presente nas razões externas do
projeto.
Um aspecto negativo desse
trabalho, no entanto, prende-se aos resultados do patrocínio recebido da Cia.
de Cigarros Souza Cruz, cujos créditos ficam logo na apresentação, ao lado de
outras marcas conhecidas (Petrobras, BNDES, etc.). A contrapartida não poderia
dar noutra: repetidas vezes o pai, além de fumar, coisa fora de moda e viciosa
(vistas advertências legais dos anúncios de televisão), chega a oferecer
cigarro ao filho mais velho, gesto nocivo, que nem para custear a heróica
indústria cinematográfica brasileira se justificaria (os fins não justificam
os meios).
No Alto do Corcovado, após todos
os percalços da impossível viagem, quando o marido procura na paisagem os rumos
da Capital Federal, o casal reatualiza seus planos, e a mulher quer resguardar
a família, propondo a desistência da jornada. A isso, porém, contradizem os
olhares cúmplices trocados entre ambos, na linguagem silenciosa do sonho de
prosseguir com a aventura, nos moldes do título, de andar pelo imaginário do caminho
das nuvens.
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