domingo, 31 de agosto de 2025

A idade da chuva

Isso que vem do querer de a tudo selecionar, esquecidos daqueles que nem pensam e vivem, sonham e desaparecem na mesma velocidade do vento e das flores. Pedaços de universos depois desfeitos em cinzas ao sabor dos dias, nas varandas de tantas casas, a meio de lágrimas e risos. Nós, portanto, parceiros da infinitude, retalhos das lembranças, num movimento circular de gerações inteiras. Olhos vesgos nas pequenas vezes, passados que sejam os trinos e as aves, e logo na sequência querem olhar as cenas feitas dos ecos imaginários do Paraíso no outro lado da rua.

Afeitos, por isso, ao ritmo de uns tambores dali distantes, mergulham de alma inteira nessas aventuras criadas nem se sabe onde, ou quando, porém, mesmo assim encantadoras oportunidades de sabor inigualável. Ser-se fiel consigo próprio perante o fluir das gerações. Saber dos ritos, das virtudes aqui guardadas no tramitar das máquinas, que alimentam e pedem certezas, capuchos do algodão das eras. Corações que padecem, no entanto se desfazem na melodia das eternidades. Essas imagens deixadas em monumentos e para sempre entranhadas nas horas sem conta, pois. Reflexos de palavras inteiras, seres vivos nascidos na consciência de todos, depois desfeitas nas dúvidas e nos tempos. Dramas, longas epopeias de romances eternos, quais suaves recordações que inscrevem de nuvens o firmamento, assim persistem os heróis ao sabor dos invernos pelas cores espalhadas no caldeirão das paisagens aí de fora, no país de miragens sem conta.

Talvez que ressurja nalgum momento a trilha sonora de quantas ilusões perdidas pelos porões das memórias. Conquanto imortais, sobrevivem aos valores que os constroem e consomem, nessa indústria do Tempo. Vislumbram mares mais profundos e adormecem nos braços do desejo, senhores de si e pendores das religiões. Nisto, as formas de um catálogo aos nossos pés onde apenas pisamos e lá, certa feita, habitaremos de todo, tais minúsculos confinantes de uma perene Felicidade.

sábado, 30 de agosto de 2025

Um salto no desconhecido


Antes de quaisquer outras considerações de ordem prática, posso também dizer que essa coisa de morte não me atrai nem um pouco, seja para falar dela ou nela, porquanto desconheço o assunto do mesmo tanto que a grande maioria das humanas criaturas, com a exceção de haver lidado com as coisas do Espiritismo em inúmeras palestras, e repetidas vezes abordei o tema da reencarnação, que diz que o espírito não morre, retornando ao plano espiritual, ou mundo errante, para se preparar e de novo vir à Terra, seja na família donde se foi, ou noutra, aonde irá desenvolver seus estudos de eternidade e resgatar débitos antigos, das vidas anteriores, até chegar o dia da purificação, estágio a que todos se conduzem no fio das vidas.

Nada melhor para manter as afeições deste mundo do que a reencarnação, quando nos apegamos aos com os quais vivemos, achando nisso justificativa bastante para os reencontros futuros.

Morrer, transação solitária o suficiente a que se arme paralelo com o nascimento, o que representa, no entanto, um desaparecimento das percepções dos sentidos aos que vêem sumir adiante os que somem, nos bastidores da vida, indo a portos distantes fora do invisível mundano.

Não poucos dão notícias, via mediúnica, daquilo com que se depararam do outro lado, após deixarem o corpo físico aqui no chão dos mortos. Os materialistas, no entanto, aguardam provas provadas do que irão defrontar no seguimento dessa matéria em estado perecível. As pessoas que perdem entes queridos se ressentem da ausência de instrumentos comprobatórios dessa vida após a morte, rendendo-se, nos instantes de aflição, oportunidades ímpares, às mensagens que venham de receber pelos médiuns, ou através de sonhos, visões, intuições.

Na época da Segunda Guerra Mundial, em Londres, Inglaterra, proliferaram à fartura os mensageiros do outro mundo, para efeito de consolação das famílias que perdiam seus filhos amados nos campos de batalha do Continente. Jovens bem formados, descendentes de estirpes tradicionais e afeitos aos confortos do capitalismo, perdiam o corpo físico face à agressão hitleriana invasora, alastrando de sombras a civilização inglesa. Vem desta fase o livro Raymond, escrito por Conan Doyle, o autor conhecido das aventuras de Sherlock Holmes, que aderiu às idéias espíritas, inclusive a escrever uma “História do Espiritismo”. Doyle foi um desses pais que perderam filhos nos combates da guerra, reunindo, em conseqüência, os elementos que lhe deram a real convicção dos trâmites posteriores à vida, quando se registra o extremo desaparecimento por motivo de cessação do corpo.

A sombra que circunscreve a extinção da vitalidade persiste na área do impalpável para faixa enorme da cultura, nos diversos povos. As obras Allan Kardec falam detalhes de como ocorre essa passagem, em “O livro dos espíritos”, que aborda a parte filosófica da doutrina dos espíritos e responde às inúmeras perguntas sobre a vida depois da vida, com dados recolhidos por meio da mediunidade e lançados em livro no ano de 1857, em Paris, França.

Enquanto isso, cada um por si busca compreender a necessária condição da morte junto aos fenômenos do Universo, procedimento a que a Natureza condiciona o encerramento dos dramas e dos prazeres num único gesto, mistério profundo da vida que se fecha sem deixar rastros.

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Réquiem a um eu que sumirá


Desistir, jamais. Sustentar, no entanto, significaria a luta insana de estar aqui, continuar e conquistar o senso deste um tudo compreender. E só então se recolher ao panteão do Infinito de alma lavada e dever cumprido. Ele, o senso comum e razão de haver realizado em si próprio o destino dos justos. Nisto, a missão desse eu que lá certo tempo inteira o estágio final da evolução aqui, na terra dos amores desfeitos, lavas e lembranças, nisto de perguntar: O que será de tudo isso, desta hora, aos braços do mistério tocar em frente os céus dentro das existências?

Contudo sempre haverá de ser assim, na trindade universal das horas da solidão, no sequenciar das histórias que restarão intactas nalgum lugar, quem sabe? Olhos abertos de tantas vezes largadas aos séculos, e uma caravana de visagens a sumir entre as árvores dessa floresta imensa dos depois jamais esquecidos.

Segredos desde sempre deslizavam a meio das quantas aventuras errantes, pois, razão das circunstâncias desfeitas em largas esperas, indagações e fortunas escorregadias nos mitos e nas lendas. Instantes de acalmar as chamas que antes preencheram esse vazio das ausências. Porém que este seria o objetivo derradeiro de todas visões.

Sujeito do quanto existe, toca adiante o comboio dos finais das tardes ali guardados nas memórias que ora lhe integram o sentimento nas saudades dos dias que passavam feitos sons que preenchiam a visão angustiada de muitas cores aos poucos desfeitas pelos sóis. Saber-se-ia, viver-se-ia, na consciência plena, lá um instante, esse limite inevitável de tocar a outro lugar a razão do quanto existia. Também ele, um ser dotado de sabores novos e definitivos, mais ciente, mais adequado, traz consigo a certeza das existências.

Que será disto, da busca voraz das outras vidas fincadas no vento, quando procurarem as luzes de antigamente nas novas presenças, até que os trens chegaram às estações e desceram aqueles fiéis passageiros de uma maior compreensão.

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

Outrossim


Foi durante os primeiros estágios da consciência humana que nasceram as iniciativas que seguem acontecendo desde então. São os rastros da espécie deixados na lama do Infinito, por mais que considerem evolução no entanto evoluíram tão só sob determinados critérios, se é que isso seja evolução no real conhecimento. Indicam avanços técnico-científicos vinculados ao senso prático da funcionalidade, enquanto que, diante do crivo de outros aspectos, deixam muito a desejar em termos de Civilização.

No âmbito dos valores da fraternidade, por exemplo, persiste o egoísmo individual ou de grupos, nessa fome exacerbada de dominação. Quando não uns sobre os outros, face à fome de poder e riqueza, de agressividade no sentido das posses físicas e de uma agressividade milenar, no propósito das vaidades e dos desejos. A que se busque conhecer, o processo evolutivo da criatura humana há em si um vazio imenso a superar.

Nisto, existem os tantos credos, as filosofias, avanços e teses psicológicas, descrições profundas de autores que se dispuseram às experiências vividas na própria pele. Eis, nisso, a herança mística de onde ainda ficam desertos inteiros de atravessar.

Vivemos, pois, uma era de conceitos em decomposição, face aos sintomas deste mundo contemporâneo em que as nações apenas obedecem, numa deslavada perdição, a persistir pelas gerações inteiras, qual embriaguez de inutilidade. Quer-se vencer medos, apreensões, mas esquecidos de rever o conteúdo a que obedecer nos séculos adiante, na desigualdade, nas guerras, perdições e prazeres.

Em poucas palavras, esse diagnóstico indaga uma sequência lógica do vir a ser. De ouvir do Tempo. Saber aonde. Num rápido vislumbre, dizer o provável destino das histórias trazidas e esquecidas. Silêncio contundente das horas grita códigos secretos de mistérios sem conta, rescrever os frutos da aventura dos seres ditos pensantes, resposta por demais do âmbito íntimo de todos, afinal. Os passos significam, por isso, a longa caminhada de transformação que nos espera.

(Ilustração: Estradas perigosas. Paisagens exuberantes. Click Viajar).

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Autocrítica severa


Mas escrever tem dessas coisas. Ninguém se faça de besta a pensar que domina o ofício da escrita. Até quem sabe, cai nos barrancos, a pretender acertar, levado pela enxurrada de vez em quando, escreve bonito, contudo revela-se pessimista, niilista, ocasião de perda a quem lê ou escuta o que disser.

O jogo da redação pede humildade aos que se sujeitam desperdiçar gol feito debaixo do travessão, perna-de-pau dos jogos de subúrbio.

A gente chega no papel, ofuscado nessa máquina acesa chamada computador, e repousa o espírito a contar o que lhe desce no juízo. Há dias em que tudo parece fácil, as imagens afloram na tela da memória, e tudo sai certinho. No entanto, outras horas, fecha-se o tempo, branco total em tudo que é direção. E para não dar o braço a torcer, o autor ajunta raia miúda e tome letra como vem.

O resultado, algumas vezes dá nisso que deu naquela crônica. Cochilo que implica ausência de oportunidade para ficar calado, pois, dizem os mais sabidos, palavra é de prata e silêncio, de ouro. Num desses embarques, o instinto vence a pouca inspiração.

Por isso, que dizer mais? Que se deve cuidar melhor dos ouvidos e dos olhos dos que param à frente dos textos, em consideração aos raros que escrevem, nessa época de movimento febril e pouco caso, quando jornais, revistas, transmitem, aos borbotões, pancadarias de escândalos e falsetas.

O que mais angustia o autor é a perspectiva do isolamento absoluto, nos cômodos escuros de mundos indiferentes, aonde vive a maioria acomodada. O rádio, ao seu modo, supre essa carência. Transmite, transmite, independente de saber quem sintoniza suas programações. Ele, que persiste como importante meio de comunicação, tambor tribal nas praças, desde as raças antigas. Já o jornal, perde atualidade no momento de sair à rua. Cai no esquecimento, nos balcões de carne, nas mercearias e nos açougues. Charmosa, a revista, cheia de cores, repercute duas, três semanas, e só volta nos museus ou bibliotecas, seguindo adiante, nos registros da história.

A crônica intrusa se oferece, obstinada, bisbilhoteira, comenta, critica, ou se critica, sem, entretanto, perder o senso da informalidade, ao sabor das ondas de humor dos cronistas. Um dia, a tirania da autocrítica acorda só meio-dia, olhos inchados, postos no horizonte da cara, grogue, tonta da vertigem dos noticiários quentes, na busca de um álibi para brincar de fazer comentário da própria cara. A propósito, há de se considerar que tudo é perigoso e exige o preço de narrar qualquer história, seja de fora, seja de dentro de cada um, motivo da crise de pouca lucidez por que passam os autores, nestes dias atuais.

O gesto espontâneo de escrever se parece com as atitudes para atender às exigências do momento. Vem a sede, busca-se água. O frio, cobertor. A fome, alimento. Assim como querer responder a perguntas, no intuito de satisfazer impulsos da pura necessidade. Livre de coação, busca erguer os olhos dos afazeres. Sobrevoar o presente e formular um instantâneo relanceado daquilo que se contorna, qual estando no centro de bolha infinita, cercada de feixes invisíveis, correntes contínuas e alternadas. Recolhe-se que nem caramujo, fruto de idéias em palavras, tópicos a pousar no papel, sujeitos visíveis por vezes lidos por outros seres humanos.

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O jaburu


Há poucos dias, estudava com Virgínia, minha filha, as aves brasileiras, quando nos deparamos com o jaburu (ou tuiuiú, uma das maiores aves do continente americano e símbolo do Pantanal mato-grossense. Além do seu tamanho avantajado, chama a atenção pelo ninho trançado nos galhos de arbustos como o manduvi, a piúva, ou em troncos de árvores secas).

Retornei no tempo e cheguei à época quando participei do jornal A Ação, ao lado de Antônio Vicelmo, Pedro Antônio, Armando Rafael, Huberto Cabral, Padre José Honor, dentre outros mais. Lá, um dia, recebemos a notícia de que pássaro diferente achado por caçadores no município de Mauriti.

Sem demora, na madrugada do dia seguinte rumamos ao lugar do acontecido para registrar o assunto.

Abatido por disparo de espingarda, o pássaro não resistira ao ferimento. Tratava-se de espécie desconhecida na região, bicho pernalta de penas brancas, papo vermelho e patas e bico negros.

De início, opiniões se dividiram entre as pessoas do sítio e que sabiam alguma coisa na área de passarinhos: Seria um grou ou um jaburu, era a dúvida?

Anotamos os dados para o jornal e fizemos algumas fotografias do que sobrara da ave, cujo corpo viria trazido na carroceria da camionete que transportava a equipe, para ser oferecido ao laboratório de biologia do Colégio Diocesano, em Crato, onde seria empalhado, condição a que se submeteu o proprietário das terras da incomum localização.

Semanal, A Ação circularia no fim de semana com a notícia logo na primeira página, ilustrada com duas fotografias do pássaro. Eram precários os meios de edição da época. Mandava-se a Fortaleza as fotos e devolviam-nas em clichês, chapas de zinco gravadas com as imagens, avós do atual fotolito da impressão off-set e da moderna policromia. Devido à pouca qualidade da técnica, as reproduções, por vezes, saíam truncadas, borradas, escuras, ou claras em demasia.

Vistos limites gráficos, a técnica ficava devendo em termos de nitidez. Daí, quando vieram as fotografias da edição com a notícia do jaburu, numa delas Pedro Antônio sustentava o pássaro à sua frente, com a mancha da cabeça a se fundir no desenho do rosto do repórter, formando uma só figura. 

Jaburu é ave de corpulenta e chega 1,15m de altura. Seu bico, grosso e afilado, mede até 30cm de comprimento. De pescoço preto, tem a parte do papo vermelha, dotada de elasticidade. O branco é a cor predominante das penas. Vive em bandos em lagoas e rios piscosos. Voa a grandes distâncias em elevadas altitudes. Assim, num desses largos percursos, o belo exemplar da ave pantaneira pousaria em terras caririenses, no entanto sem chances de sobreviver, naqueles idos de 1966.

(Ilustração: Jaburu-tuiuiú (http://renatogrimm.com/bemtevi/pantanal/).

O correr das histórias


Certa vez, meu pai me contou a história de um morador do sertão de Pernambuco que sonhara indo encontrar um tesouro no interior do Paraná. Tratou de vender os poucos bens que possuía e se deslocou com a família até aquele lugar.  Lá distante, tendo localizado o canto onde acharia o tesouro, no entanto foi alertado por outro vivente da região que deixasse de lado a ideia do sonho, que esquecesse de imaginar facilidades, o que ele já fizera quando sonhara com um tesouro no interior de Pernambuco, na fazenda assim, assim, de características semelhantes às de onde residira o nordestino. Desse modo, considerou a possibilidade e retornou às suas origens, fazendo disso o motivo de cavar no ponto aonde lhe dissera o homem, achando ali o tão sonhado tesouro.

Depois, eu leria no livro O alquimista, de Paulo Coelho, história com o mesmo enredo, de alguém que sonhara achando um tesouro em lugar remoto, indo à busca. Ao chegar, contudo, seria alertado de procurar exato naquele sítio de onde viera, sendo esse o argumento da história, o que também viria, com sucesso, acontecer.

Já mais recentemente, conheci um conto do sufismo de quem sonhara com um tesouro noutro pouso, ali chegando na intenção de localizá-lo nas proximidades de uma ponte. Enquanto cavava a dita localidade, seria abordado por pessoa que quis saber do seu objetivo, sendo alertado de estar movido pela ilusão, e que este também sonhara com tesouro num recanto que descreveu semelhante ao de onde procedia o buscador. Este, ao regressar, contente acharia o que lhe fizera ir tão longe na missão de encontrar o tal tesouro.

Quantos e quantos largam tudo na ânsia de ser feliz, à margem, porém, de reconhecer o tanto que procuram na essência de si mesmos, razão fundamental do que existia desde sempre no próprio ser, este qual sentido único dessas histórias que falam do segredo maior da condição humana.

(Ilustração: Tesouros piratas enterrados: É verdade, ou mito? (https://www.lrarcano.com/tesouro-pirata-existem-tesouros-enterrados-por-piratas/).



 

domingo, 24 de agosto de 2025

Heróis do anonimato


Entre as montanhas e os abismos perduram as cenas sucessivas. Protagonistas vários ali sacodem os papeis, vidas e vidas a par. Seres por demais saem nas estradas afora submissos aos picadeiros abertos nas esquinas dos céus. Isto, este mundo, de paredes disfarçadas em letreiros, artes, cores, são as cercas e muralhas que cercam o labirinto dos mais variados temas, ao sabor das criaturas. Nisto, os dramas, roteiros repetitivos de lendas esquisitas, espalham o apetite das feras florestas inteiras, no entanto.

Lembro de quantos que me fizeram a cabeça, às vezes desconhecidos atores, figurantes de romances, contos, filmes, a fustigar na sorte as escolhas e o movimento do Tempo em volta dos dias, o que depois ficaria gravado nas entrelinhas das lembranças. Eles, os aventureiros de plantão a julgar os sentimentos. Marcos largados nas telas, nas vistas, nas histórias, de um a um. Pelas ruas, praças, palcos; sujeitos às mesmas condições dos demais, porém afeitos a vencer, ou a perder, quem sabe?! com igual felicidade.

Assim se edificam os monumentos, os campeonatos, os prêmios. Pousos por vezes desnorteados, deixam cicatrizes profundas nas dores da consciência. E ainda que tal, há que tocar adiante, pelas frestas da noite, a figura dos mártires de si, sujeitam às jornadas e aos caprichos individuais. Desvendam, no mistério, os vazios profundos da alma e de lá convergem de palavras e sentimentos as recordações presas ao pescoço. Luas e luas, vagam solitárias pelos desertos da ausência e do nada constroem outros nadas, conquanto vão, que têm de ir, pertinentes.

A gente revive essas existências, numa soma estonteante com nossa presença sobre o corcel das massas em movimento. Silenciosos, hoje, seguir-se-á pelos becos do desconhecido em vãos fantasmagóricos, nos trilhos do passado. Trazem, todavia, as relíquias e fazem delas outros modos de ser do que ficara atrás, numa condição de sujeitos dos períodos abandonados à margem dos caminhos. Almas doridas, ilustram dessas legendas as próprias refeições de agora.

Vértices do que virá, longa esteira de solitários grava na face da inexistência os antigos sóis de antigamente. Eles, esses nós, a todos reunidos em um só universo, desfazem do Infinito a razão de estar aqui, reais significados e inevitáveis sentidos em tudo que existe.

(Ilustração: Centro de Cultura Mestre Noza, Juazeiro do Norte CE).

quarta-feira, 20 de agosto de 2025

E há algo sempre assim acontecendo


Todo e qualquer sentimento encontraria os mesmos arquivos donde jamais imaginaria haver nascido, então. Isso replica no Infinito tais meteoros impacientes que viajam vencidos aonde, ninguém haveria de saber. Nisto, os personagens daqui observam ao longe o furor dos movimentos dos astros brilhantes espalhados no Universo. Pontos neutros, eles deslizam todos, os vivos e objetos, nesse caudal das histórias, a percorrer de desejos as sombras. Pausam, por vezes, contudo de novo pouco a pouco se desfazem nas ilusões e desaparecem pelo anonimato das inexistências, talvez sem nunca haver habitado o campo das tantas luas que viveram certa feita.

Isso bem que consistem nos dramas humanos perante o solo das aventuras. Pisam as próprias carnes e refazem seus velhos planos, sujeitos a espantos e dúvidas. Os horizontes padecem, portanto, das milenares condições deste mundo, fixos no quanto ainda resta de sobreviver até o sempre que lhes aguarda. Espécie de equação do imprevisível, preenchem as alturas de sinais imaginários, logo depois desfeitos em poeira.

A intuição das ideias com isto converte o mistério no que possa acontecer daqui adiante pelos mares das buscas. Somam partículas do imaginário e destroem a realidade em volta de si. Fabricam artefatos destrutivos à cata de prazeres, sujeitos da inutilidade agressiva. Misto de aproximação e distanciamento das luzes que lhes deram origem e ao que existe, tão só transformam em ausência o que de longe parecia ser a pureza original da transformação em novos sonhos reais.

Este o perfil dos segredos imprudentes da ambição. Alimentam de feras o coração da esperança. Vacilam e caem no sumidouro das Histórias mais antigas. Divergem, quiçá, na interpretação desses equívocos, face ao gosto de contar aquilo que melhor satisfaça aos bons propósitos deixados na lama de que ora procedem os tais mandatários de poder.

segunda-feira, 18 de agosto de 2025

O azul da perenidade


Dos poucos rastros deixados pela imensidão dali nascem os sonhos. Sair a procurar do crivo dos desejos. Pontear guitarras estonteantes nas danças dos derradeiros significados de antigamente. Folhas sucessivas de imagens guardadas lá no íntimo, que em breve se apagarão, quem sabe quando? Nisto, o barco das madrugadas desce pelas encostas do mistério. Conquanto repetir as façanhas dos heróis a isso constituam as horas inexistentes.

Transcorridos lá que foram séculos e séculos a fio, logo depois vêm as cinzas. Passos incertos largam no vazio seus derradeiros espasmos e somem dentro dos céus quais seres resistentes ao Sol. E nessa aventura de compreender as cores do Universo eis que de novo reveremos os sinais daquilo que ora somos, imortais em movimento. Há qual o que um espelho inesgotável de tudo, por isto, nas migalhas ao vento, relíquias das primeiras histórias, dos primeiros monarcas.

Vistos, pois, a olhos nus, esses derradeiros encantos preenchem o tato do firmamento. Construções. Alaridos. Silêncio. Dotes do Infinito assim resistem ao furor do Tempo. Somos tais o quê, qual, portanto. Minúsculas fábulas de noites calmas. As imagens que regressam e brilharão outra vez ao nascer dos novos dias, que justifiquem o amor de estar aqui na face do Destino. Sons. Visagens. Impulsos. Um tanto de riscos quase invisíveis ora cobre os edifícios da imaginação e mergulha na alma das criaturas feito alicerces do que virá certa feita, passados que sejam os apegos só imediatos.

Isto vemos nítido ao divisar a claridade dos invernos na clama das derradeiras ilusões. Adormecem no seio da visão aqueles mesmos senhores de antes. Nós que o fomos, aqui de novo a conter o coro dos anseios. Quaisquer sobrevoos indicam a quantas luas pereniza o futuro dessas almas.

Daí o senso a bem dizer impossível das flores, dos filhotes, dos autores. As letras, as palavras, os acordes que crescem a todo momento e nutrem de sonhos o vazio, nos seus antes e derradeiros espasmos...  

(Ilustração: Arte egípcia).

domingo, 17 de agosto de 2025

Porcentagens naturais


Essa ordem das coisas impõe vontade soberana e guarda força suficiente a uma rendição incondicional aos acontecimentos. O pulsar das horas implica numa condição ordenadora do caos. Diante de folhas que amadurecem e cobrem a terra, resta obedecer ao mistério, zona fronteiriça das estradas e suas bifurcações enigmáticas.

Essa fome de alternativas virou moda, enquanto repastam vorazes os animais. Oferece, porém, milhões de produtos, entretanto não satisfaz a ânsia de saciar angústias à disposição do prazer, catadores de gozo em que se transformaram os humanos seres com o passar das gerações.

Números falam em tom pausado de vozes que hipnotizam. Maestros buscam termos ideais para acalmar a multidão impetuosa à porta das lojas fechadas.

Houvesse trecho persistente na memória coletiva e haveria números percentuais que enchessem as comportas da certeza. Outrossim, tudo reclama justo ganho, que decorre da quilometragem dos séculos sumidos nas nuvens interiores das criaturas.

Passadas milhões de luas e as moendas do Céu conduzem às portas do instante. Quer-se crer proporcional ao desejo dessas almas valer mais um gosto do que cem mil réis, dos plantadores de sonhos de lajes e monumentos à incerteza certa.

Ontens, tais datas marcantes de conquistas fugidias, escorrem no mel cristalizado sobre o monturo da civilização, lixo encharcado nas dentaduras postiças, reluzentes, vaidosas. Pouco, um quase nada, percorre os fios das consciências. Perguntas por gestos e confirmações e o tempo responde com velas acesas de sons articulados às pressas, que se derramam em becos e afastados subúrbios. O ritmo e o espaço aberto de linhas e o silêncio existem na mesma proporção do vazio dessas notas, importância justa das catracas do sistema que se sucede contínuo nas madrugadas, com o nascer do Sol.

Isso indica fé, convicção, coerência, em meio ao jogo da Natureza. Dar-se ao jeito sincero da permanência, no balanço dos barcos, significado de regras, letras e pensamentos, atitudes e desenhos, fluir de correntes e ondas que vão e vêm ao sabor das eras.

Respostas que chegam e contagiam multidões em porões escuros, quais duendes matemáticos, vírgulas, pontos e outros sinais, pausas e recomeços. Virar as esquinas, providência mecânica, vez em quando reclama parada obrigatória de rever as classes gramaticais, no itinerário da razão ao coração.

As máquinas esfriam pelos cantos de salas. Pessoas faceiras repetem antigas gravações de famintas idéias e pouca prática. Só um, o Si Mesmo responde aos códigos particulares, após o derradeiro ato. Passos indecisos de cavaleiros e flamejantes espadas, que mostram o futuro e definem prioridades, o perfume das flores que crescem na festa vivaz das eternas maravilhas.

(Ilustração: Peça do Centro de Cultura Mestre Noza, Juazeiro do Norte CE).

sábado, 16 de agosto de 2025

A busca interior


Num frigir de tudo, a que buscar, então?! Passados todos esses dramas de antigamente, as flores, as dores, os sonhos e lembranças, excursões e petulâncias, ali estaria bem depois o quanto se largava às portas da infinitude, sem haver de encontrar o tanto da procura, pasmos que ficaram, às bordas das loterias e dos desejos, armas e servidão. Ali, naquele deserto encantado, ainda persistem os mais afoitos, no entanto ora cientes das ausências e desencontros. A esfinge, de olhos fechados, observa no íntimo, todavia, a guarnecer, silenciosa, o trilho da realização, qual que indiferente ao resultado de tudo aquilo.

Todos hão de passar, conquanto sucessores dos velhos códigos da História. É de querer saber aonde chegar, onde estariam nesta hora, os mórbidos, os santos, face a face com os monumentos deixados pelo caminho.

...

Desta primeira aventura delirante, o que restaria, pois? Pequenos gestos de bondade e enormes construções de pedra e pó, cascalhos, metais, ruínas, frutos de explosões sucessivas das tantas aventuras já guardadas no cofre dos desencantos?...

...

Assim, que tocar adiante neste caudal de vivências e sóis? Que dizer às gerações enfileiradas nos montes e nas paisagens da distância? Que dizer e que fazer, o que hoje quer persistir na consciência de muitos? E as indagações proliferam, nessa noite escura da alma.

Viver de existir, tão só, enquanto dorme astuta a verdade dos corações enamorados; sobreviver, outrossim, perante a crosta da Eternidade que adormece fiel na alma das gentes. Saber, distinguir entre as palavras o sentido absoluto de andar aqui pelos céus à cata das certezas da iluminação a que vieram a este lugar. Desvendar o mistério dos enigmas e rasgar véus e véus do Infinito por meio de escolhas e conquistas. Daí, ser o desencanto, a mãe maior do quanto existe, na interpretação de Heráclito.

E trazer à tona o princípio da presença a este hoje eterno, motivo único das histórias que nos percorrem as veias e movem os sentimentos. Nós, por nós próprios, neste sorver sem conta das marcas pelo firmamento do que sempre fomos e seremos desde sempre.

sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Cativos da vontade


Mergulhos que se dariam à medida dos tempos, eis a que destino significa estar no Chão e cumprir tal sina. Viver, portanto. Diante algo mais, percorrer as bordas do Infinito de olhos abertos aos abismos e às cores nisto caravanas inteiras transitam pelas telas das horas, ausentes, talvez, do quanto depois haver-se-ia de responder aos ditames de um ser astuto que ora impera nos transes das histórias.

A percorrer, portanto, estradas desertas, vez em quando achar degraus já preenchidos das outras experiências que não as próprias. Existir qual norma inevitável de andar aqui face a face consigo. Assim, esses significados de estar onde teria de ser, viram cicatrizes das mesmas dores dos outros. Perguntas acesas nas dobras do coração, ainda que escritas nas letras garrafais deixadas ao acaso, porém permanecem no movimento inigualável.

De um tudo, em tons monótonos seguem os dias, a gerar passados foscos largados ali nas calçadas toscas. Paredes inteiras inscritas de frases prontas insistem marcar os céus de antigamente neste vale dos anônimos esquecidos. E nisto, a juntar palavras e formar conceitos vagos doutros dramas já desaparecidos no colo dos contentes, escrevem de carvão as lendas, os credos.

Lá entre arquivos das máquinas, certo dia deixei um texto a que regressaria, quem sabe quando?!, e nunca encontrei de volta, perdido que esteja entre as falas esquecidas nalgum momento; haverei de descobrir e rever aos pensamentos ali escondidos, pois. Destarte, as falas, blocos de significados nem sempre alimentados de interpretações, qual as pessoas que vistas somem nesse vale de sombras das frases, restos da gente buscam nos rever, o que quer que seja alguma ocasião no futuro.

De regressos quantos às origens quais que somos, visagens de entes há tempos sumidos pelas frestas das madrugadas, na ânsia da perfeição nascida do íntimo deles mesmos, e refazem os velhos percursos da imaginação, e adormecem nos sentidos. Ao som dos estios pelas florestas, observam lentamente as manchas de sol entre a folhagem e admiram os santuários antigos cravados nos troncos das outras civilizações de antes, agora desaparecidas.

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Nessas horas mornas


Estados esses a meio de tudo e nada, bem ali que seguem incontáveis os delírios de tantos, onde nasce o Tempo na sua severidade, sujeito de luas, sóis e silêncio. Entremeios e temperaturas deslizam no vento. Vidas assim, chegam no desejo de justificar as razões do quanto existe nas perguntas definitivas, nas buscas de justificativa, de motivo, pelos subúrbios das memórias em movimento.

Daí, as filosofias que crescem, luzes na imensidão. Explicações e sentimentos. Vidas absortas nas horas, nas letras; marcas largadas no estio de tantos corações que ora padeceram, no entanto. Uns que bem explicam, outros que compreendam e exerçam a função das palavras, dos conceitos. Isto das virtudes práticas, invés de meros adjetivos. Almas que ardem de dentro e despejam, nas lareiras do Infinito, aquilo que lhes dói profundamente. O querer, o existir, rochedos indivisíveis e solitários.

Essa vontade insana de ser feliz, sorrir, adorar, terce o bordado  com as sete chaves da consciência, a meio de interrogações e sufocos, caravanas de sustos e mágoas, prudentes valores de almas até então esquisitas.

Saber dos desencantos de riquezas, poderes, famas, trastes esquecidos nas caminhadas e só depois vistos de longe pelas frestas de nunca mais. Os prazeres, delírios, desgastes. Gritos na escuridão que se desfazem pelos corredores da dúvida, das ausências. Quanto mistério há nisto de perder na inexistência o fastio dos calendários. Contudo, erguer esperanças e fé aos degraus dos próprios pés. Exercitar as certezas da Verdade pelas trilhas das dores abertas de estar aqui.

Vezes ocorrem à inspiração encontrar, nas portas abertas do firmamento, a claridade, os sonhos. Sobreviver a si mesma através da presença que lhe conduz. Transformar-se, transformar. Quantas histórias persistem no íntimo das gentes, todos que pequenos somos, porém algo, alguém, suficiente ser, de encontrar o caminho em que abismar os sentidos e converter em luz a força dos instintos. Além de falar, as palavras gritam, pois. Divisemos tais certezas e alimentemos os dias nas paisagens em volta.

terça-feira, 12 de agosto de 2025

Blow-Up


Transcorriam os finais da década de 60 e o mundo vivia período atípico em forma de modificações nas idéias, a revirar o pensamento dos jovens, numa escalada que correspondia aos excessos da política americana para o Sudeste da Ásia, em países quais Vietnam, Laos, Cambodja e Tailândia, aonde guerras multiplicavam às reações estudantis nas principais universidades da Europa e das Américas.

Enquanto isso, artistas populares repercutiam seus instintos rebeldes contra o neocolonialismo das invasões russas na África, plena Guerra Fria, nos centros ricos do poder econômico, no meio desses povos subdesenvolvidos.

A Geração Beat ganhara adeptos com experiências psicodélicas, adotando a maconha e o LSD nas diversas formas de manifestações e criando linguagens rebeldes nos estilos literários, musicais, coreográficos, cinematográficos, teatrais. A moda integrava outras visões e desnudava a mulher das roupas tradicionais, impondo cores intensas e cortes inesperados.

Algo acontecia saído da Grã Bretanha. The Beatles e The Roling Stones levavam às platéias ao delírio. Cabelos grandes. Guitarras estridentes. Depois a morte feria  ídolos mártires de overdoses. Palcos feéricos. Altares de sacrifício. Amores. Paz. Largas interrogações.

Surgia o cinema de autor. Os festivais de protesto. Woodstock. Hippies nas estradas. O tropicalismo renovava a música popular brasileira. Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa, Tom Zé, Maria Bethânia, Capinam, Torquato Neto, Rogério Duprat, Rogério Duarte, Os Mutantes e vários outros nomes, reviravam as estruturas tradicionais da arte nacional.

Coisas mil aconteciam, prenúncios intensos da Era de Aquarius, no dizer das tribos espalhadas nos acampamentos, praias e montanhas, shows das praças, repressões nas esquinas. Sonhos. Pesadelos. Cheiro de pólvora. Perfume de flores, fuzis e baionetas.

No quadro dessas lembranças indeléveis que escorrem das paredes cinzas, nas noites insones do passado, as imagens acesas de um filme, Blow-Up; em português, Depois daquele beijo, de Michelangelo Antonioni, que sacolejou as cabeças enfumaçadas. No elenco, Vanessa Redgrave, Sarah Miles, David Hammings, John Castle, Jane Birkin, em produção anglo-italiana de 1966.

A trama de suspense contava história de um fotógrafo de moda que registra, em parque londrino, cenas amorosas de casal desconhecido e na revelação das imagens testemunha um homicídio. Proposto a desvendar o delito, percorrer trilhas inesperadas e bizarras, quando nota o jeito indiferente da sociedade face aos valores essenciais à vida. Ninguém parece preocupado com as provas que consegue, acabando envolvido no absurdo da realidade em volta.

Ganhadora da Palma de Ouro, no Festival de Cannes, a película criava linguagem cinematográfica prenhe de simbolismo quase hermético e indicava momentos questionadores das atitudes no apego a ídolos pops e posições existenciais indiferentes que prevaleciam na época.

O filme fez adaptação livre de um conto do argentino Julio Cortázar (Las babas del diablo) e exerceu forte influência também no campo da fotografia de moda. 

(Ilustração: Blow-Up, de Michelangelo Antonioni).

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Circunstâncias mil


Épocas assim, quais tempos em transformação acelerada, cresceram à luz do dia, nesta fase estreita de tantas expectativas e visões contraditórias.

Decerto, algum vivente doutras planícies consideraria semelhante aos mesmos desafios impostos naquelas condições originais. Ver-se-ia estrangeiro de visões assemelhadas às tempestades de mísseis ora difundidas pela renda mundial de computadores. Frotas a singrar os mesmos mares em propósitos equivalentes, na fome sem conta de poder dos mortais alucinados que sobrevoam iguais destinos das fantasias.

Os filmes são tais; nas telas, os instintos, as dores... Roteiros de dramas e sustos na face do Planeta, olhos arregalados aos desvarios, às contradições. Nisso, palavras preenchem os ares de traços que rasgam o silêncio e adormecem a consciência de poucos. Vivem perenes, pois, ao senso da compreensão desde sempre prevista de tantos, em quantas circunstâncias vagas, enquanto as pessoas percorrem o Infinito a desafiar os momentos que lhes escorrem pelas veias, na procura da sorte vária.

A gente escuta, distantes, sinos de esperança, contudo revestidos das notas surdas de um amor imaginário, mais que nunca tão necessárias, todavia guardadas há milênios no coração dos santos. Daí vêm as melodias sentimentais, os conceitos filosóficos destituídos das práticas que os correspondam. Buscar nas ruas, nos mercados, nas noites, os céus das memórias tardias, ainda que de longas histórias avisassem dos riscos e das incertezas.

Conquanto os saltos e os parágrafos se assemelhem às verdades eternas, mesmo que sejam, raros dispõem do espírito crítico de modificar a si próprios diante das muitas expectativas do que aguarda essa grande humanidade. Foi de antes imaginar mudanças coletivas. Grupos inteiros jogavam cartas nesse jogo atabalhoado, o que só então virou mero desengano. Perante isto, sobra o poder individual da pura transformação que virá de dentro, única forma definitiva das firmes modificações e do quanto resta a cumprir.

Valores, destinos, alternativas, enfim vivem na alma das criaturas num movimento constante aos olhos do mistério. A matéria prima, a força do querer individual, portas e ânsia das sonhadas possibilidades aos poucos lhes chegam no braços do futuro.

sábado, 9 de agosto de 2025

O triturador de tudo


As raízes do ilimitado mergulham soltas na essência do Universo, a reduzir as existências ao nada absoluto. Forma solta de silenciar a imaginação mais aguçada, fervilha na alma dos sentidos a velocidade do Infinito. Nisso, nessas marcas, vêm deixadas pelas tantas luas os desejos, as horas, os percalços, tudo enfim. Qual o que pensar houvesse de ser, apenas isto significa um sumidouro por meio do Tempo, esse que também não existirá tão logo tenha passado de si pela superfície do que se pensara haver nalgum dos mistérios em movimento.

Conquanto persistam objetos e sujeitos, porém meros defeitos em ação na orla dos oceanos, pequenos seres desfazem em largas vagas o peito das criaturas. Assim, de que valeria tantas e tantas atitudes nefastas com que buscam, faceiros, desvendar os segredos de antes e depois, reunidos no bloco dos instantes que também vira pensamentos e nada além que o seja.

Por isso, as avaliações que ora preenchem o vasto coro dos contentes, animais destituídos de certezas que somos. Vertentes tardias disso tudo, no entanto sucedâneos das longas histórias contadas noites adentro no prisma da suposição. Daí, correm aflitas as letras na face do papel e deixam abandonados sentimentos e dúvidas, artimanhas do destino. Falar qual seja querer decodificar o firmamento em forma de sonhos, eis a que se destina o vento às faces dos dias incontáveis. Trazem nítidos sinais de existências, todavia de olhos calados no escuro das madrugadas insones desses tantos que andam calados e sós. Espécie de necessidades urgentes, destarte reúne sucessivamente a melodia dos sóis e desmancham fortes relíquias, agora esquecidas e redivivas na arte de crer e viver intensamente.

Quantas foram, pois, as dúvidas transformadas em suposições e lançadas ao espaço na procura do imaginário, multidões sem fim das paisagens ali guardadas na consciência de todos desde então.

(Ilustração: Tai Chi Symbol ]https://www.taoistwellness.online/blog/what-does-tai-chi-symbol-mean).

terça-feira, 5 de agosto de 2025

A música do Tempo


Ritmo velado, assim quais outros tantos mistérios do Infinito, porém constante na alma das criaturas humanas. Invadem as interpretações dos sentimentos na forma de sons, largando lembranças aos quatro ventos. Preenchem de certezas a consciência e enlevam a outras dimensões o viver, qual quem arrasta aos céus os instantes. Marcas profundas. Melodias. Suaves sinfonias de errantes, largadas no coração das pessoas. Quer-se voltar ao começo, no entanto jamais ouvir-se-á mesmos solfejos. Nalgum lugar de dentro, regressam a permitir reaver o instante, tal nunca houvesse existido ou desaparecido, aqui, então.

Disto, permanecem pessoas, vivências, lugares, na cadência do regresso naqueles que antes foram. Quais pedaços inteiros de eternidades, viajam altivas as canções, os acordes, num preenchimento do quanto persistem os passados que sumiram tantos. São paisagens acesas na memória. Saber de si a tocar pelas estradas de quantas histórias, força descomunal das saudades talvez esquecidas que regressam contrafeitas aos viventes.

A mais que desejassem, ainda destarte adormecem nas folhas do silêncio, reafirmam a singeleza dos gestos antigos, as danças, os saraus, amores, espécie de certezas inesquecíveis do que existiu na escuma dos mares. Permanecem constantes naqueles ouvintes de apresentações, programas de rádio, filmes, madrugadas a sós, discos, novelas, viagens...

Nem de longe pudessem desfazer o que dali ficou guardado nas sombras da imensidão. Desde sempre, no entanto, vem sendo fiel ao desiderato dos séculos. Descobertos meios, ficam inscritas nas tradições, inteiras, dominantes, a vir de novo através dos grupos, dos instrumentos, na voz das pessoas, descomunal significado daquilo que sobrevive ao custo das civilizações.

A herança imortal da inspiração registrada em páginas perfeitas, emoção do que restou de continuar em forma de som, fala nas gerações uma linguagem sublime, nítidos sinais doutras possibilidades, algo pujante daquilo que demonstra o ser espiritual dos humanos.

domingo, 3 de agosto de 2025

Abismo


Não sou poeta.

Jamais serei poeta.

Nunca suportaria cruzar a travessia infinita entre dois versos,

Vertigem que, de um sorvo, me devoraria a alma.

 

Por isso, não sou poeta.

Casa tomada


Este o título de um dos contos de Júlio Cortázar, escritor argentino do realismo mágico, editado em 1946, dentre os que fizeram sucesso nas décadas posteriores. Narra a história de dois irmãos que viviam onde viveram seus ancestrais e, dada ocasião, principiam a notar que gradualmente perdiam o espaço original da casa, indo recolher-se aos cômodos menores, sentindo-se expulsos da condição anterior. Nos lugares onde antes habitaram passam a surgir entes desconhecidos que invadem a residência, impulsionando-os a mudar de canto, num desconforto inesperado e devastador.

A história cresce à medida dessas apreensões, numa clara simbologia do que, passo a passo, assim os indivíduos observam o decorrer da existência. Nos inícios, tudo aparenta facilidade. A trama lhes abre os braços aos largos sonhos. Jovialidade. Pessoas próximas. Energia por demais. Algo tal qual descer de ladeira abaixo. Lá noutro instante, porém, vêm os primeiros limites. As intenções registram fortes aperreios. Normas sociais. Urgências de sobreviver. Deslocamentos. Saudades. Tais presenças invisíveis, encargos constrangedores impõem restrições aos valores dourados no princípio. Nisso, a casa que era aparentemente ampla, confortável, pessoal, sofre nítida redução de espaço e determina constrangimentos desavisados.

Ser-se-ia, por certo, doutros universos até ali ignorados, e não daqui?, portanto. Então, advêm temas exóticos na forma de perdas, medos inevitáveis do desconhecido e a fragilidade do que fora o real experimentado. Naquilo, a leveza dos séculos sofrerá transformações de segurança e conforto, nítida contrição das presenças desconhecidas, doutras identidades e das sombras do irracional a restringir as ânsias lá do imaginário na realidade cotidiana.

O conto Casa tomada foi publicado pela primeira vez na revista Los Anales de Buenos Aires, dirigida por Jorge Luis Borges, e hoje consta do livro Bestiário, de Júlio Cortázar.

Nesse intuito de considerar o roteiro das gerações, seus impulsos e verdades, também nos tempos dagora, lembrei desse conto de Cortázar, autor de livros apreciáveis da literatura latino-americana, dentre eles O jogo da amarelinha, de amplo sucesso na segunda metade do século anterior.

sexta-feira, 1 de agosto de 2025

A liberdade e os sonhos


Vagos murmúrios de imaginação e novas aventuras crescem lá de dentro, no instinto original de encontrar o que pudesse preencher esse desejo esquisito de mergulhar nas noites mais distantes e ali permanecer noutros espaços. As palavras bem que se prestam a isso, de sons articulados entre sombras solitárias e espectros fantasmagóricos de si mesmas, seres nascidos do íntimo e soltos no Tempo. Há que se criar, pois, conceitos e acreditar serem eles verdades inevitáveis, pergaminhos e restos de perdidas aventuras.

As tais imagens assim crescem na medida doutras razões a bem dizer inacreditáveis. É tanto que logo depois desaparecem no condão dos pensamentos e jamais voltarão à tona, quais tivessem (ou tendo) um poder sem par. Daí surgem dúvidas de quem resolvera apresentar aquelas cenas sem precedentes, esplendorosas, desfeitas em série pelas marés do Destino.

Esforço existe de querer lembrar o que viera na tela do imaginário, naquelas madrugadas por vezes frias desse universo. Porém qual o quê, nem de longe restam, talvez reduzidas a meros artesanatos de pensamentos sem maiores consequências. Nisso o empenho de adotar o impulso daqueles heróis antigos, senhores de poder transcendental, contudo partes inúteis, talvez, do instinto de querer conhecer as normas dessa vontade soberana, dominadora, e a liberdade que seja não permitir.

São muitas pequenas histórias trazidas a todos, depois desaparecidas no rio das horas. Súplicas, repetições, repastos dos entes que ali estiveram e sumiram sem deixar nenhum vestígio. Enquanto aqui permanecem de novo a fustigar as emoções, apreensões, e os destinos. Perante mistérios incontáveis, tudo permanece minúsculo, agora inexistente nas frestas dessas aventuras trazidas desses autores que escrevem o que significa sonhar, no entanto. A sustentar enredos nítidos e, em seguida, apagados entre os dentes das criaturas, deles simplesmente, ignoradas, deslizam nessa multidão de humanos de olhos presos em seus próprios interesses. Narram a  si as deduções quiçá possíveis, todavia ausentes daquela supra realidade anterior de que perderam a chance de guardar consigo, desfeitas em aparentes vastidões infinitas.