sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Os livros e seus autores

De comum a gente gosta de um ou dois livros de certo autor, nunca de todos eles escrevem. Quais relíquias, permanecem na nossa lembrança vidas afora, guardando as emoções da época da leitura e mantendo a afinidade original. Daí os grandes nomes da literatura existir na memória de livros inesquecíveis. Lembro um tanto deles, na força desta definição. Isso tem tudo a ver com as músicas e os compositores, e os cantores, e os pintores, etc. Permanecem para sempre no sentimento, guardadas aquelas que marcaram as fases de quando foram trazidas a lume; fixaram raízes dentro da cultura humana através da alma das pessoas e nunca mais querem sair.

As obras de arte são, assim, peças do que restou do que passa indecorosamente nos dias, nas gerações. Totens indeléveis, significam nosso eu no tempo que se dissolve aos nossos dedos. Chegam e vão numa velocidade impressionante. Grandes angústias daí atravessam os que as produzem, de querer mantê-las eternas, no entanto só frustradamente. Os pintores, por exemplo, anseiam descobrir pigmentos que possam suster as criações, deixando ao máximo que desenvolvam a permanência, lá depois, porém, sendo retocadas ao léu no intuito de chegar mais adiante pela sobrevivência dos museus.

Outro dia escutei na televisão que dos registros humanos apenas 3% permanecem após o transcorrer dos anos. Enquanto isto, li numa entrevista de Steve Jobs, o mago das comunicações digitais, que esta fase da história será a que menos registros deixará, tendo em vista o excesso de confiança na mídia eletrônica, pois esta finge conservar seus nos frágeis back-ups o valor da fixação, instrumentos estes que longo irão apagar e nem saudade deixarão, em flagrante contrariedade ao que antes se imaginava das invenções. 

Mesmo desse modo, contudo, ficam na memória obras imortais da literatura, da música, do cinema, que se não fossemos nós já haveriam desaparecido desde tanto tempo. Isso de Eternidade perpassa a consciência do que fizemos que restou, e seremos, sim, os autores dos autores da continuação de tudo.

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

O outono das cidades

De observar as ruas da cidade, notamos forte tendência nos atuais moradores para se transferir ao campo, escapar do barulho, dos engarrafamentos, insegurança, e respirar libertos da fumaça. Nos fins de semana, então, a coisa ocorre sem deixar dúvida. Os grandes centros viraram só compromisso de segunda a sexta-feira. Depois, fuja quem puder.

Tal avaliação sugere a falência de um sonho que alimentou muitos séculos. O instinto de procurar vilas e repartir preocupações lotou o espaço das cabeças todo tempo, que povos não pensaram em mais nada como outro modo de racionalizar o povoamento.

A proposta seria somar forças. Entretanto a sofisticação da vida em grupo gerou dificuldades, no princípio superáveis pelo trabalho partilhado, depois intransponíveis face ao crescimento, rompendo previsões e limitando alternativas para ocupação de toda a mão de obra concentrada.

Os núcleos de prosperidade em que se haviam modificado as povoações resultaram nas baías interiores, com classes sociais dilatando o fosso divisório do abismo social, desvirtuando o impulso gregário dos indivíduos subtraídos da ordem natural que ficara no campo. A tendência afluente se reverte agora num isolamento coletivo, hoje bebido com náusea nos passeios neuróticos das madrugadas urbanas.

De qual maneira as chagas têm sangrado que maioria incalculável de cidadãos passou a descrer das soluções comuns, adotando iniciativas particulares, mesmo em detrimento dos que nada podem fazer.

Seriedade não falta para o estudo de sintomas. Congressos, mesas redondas, discursos, prepotência, pirotecnia. Interesses próprios mascarados de usurpação de atribuições. Fórmulas mágicas preenchem as prateleiras - critérios exclusivos e bilionários nos programas de governo.

Em compensação, risco ocorre no achatamento dessas intenções, vez ficar difícil dizer quem pode ou quem quer só o poder; saborear o mel e descartar o fel. Do pecado na escolha ruim fica um preço a ser pago, tamanho do tempo perdido, multiplicado pelas vidas em jogo, milhares que habitam os guetos das cidades; seria, talvez, a democratização da miséria, invasora dos lares e destruidora da vida social, espécie de submissão aos valores piores, quando se descartou a chance de escolher melhor, vezes perdidas para sempre.

No passado, as guerras reviravam ordens estabelecidas e desfaziam os problemas críticos a toque de caixa. Depois, técnicas potencializaram a riqueza, comprimindo exércitos no atributo de forçar direitos. Resultado: polos urbanos transformados em campos de concentração e desavenças. Os instrumentos de lazer eletrônico restaram desmantelados nos cubículos escuros sem ar, nem paz, quais sucatas de luxo.

O retorno ao seio da floresta mais do que nunca antes parece lenitivo provável; estudiosos da alma acreditam que trazemos o mapa desse percurso, algo semelhante ao que perfizeram os hebreus, na saída do Egito empós da Terra Prometida.

segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Sabor das palavras

Chegar aos outros através desses recursos, sons e significados, que muitos silenciam na escuta de dentro do instrumento que habitamos, corpos de carne que tantos nem de longe imaginaram donde vem e aonde irá. E as multidões param a fim de ouvi-las, se as questionam quem sabe? Caladas, quietas permanecem de olhos fixos nas cavernas dos próprios céus interiores. Que transmitem sentimentos além de pensamentos sabem os que fixam atenção naquilo que falam ou presenciam. 

Quantas vezes nas músicas, transformadas em saudades e sonhos, vagando soltas no universo das pessoas, ao ritmo das cantigas vindas das outras gentes lá de fora, contudo nascidas nalgum lugar do firmamento. Assim a longa esteira dos humanos, que espelha o tempo e segue o credo das gerações, sustenta que sabe o quanto vale conhecer os conteúdos e essas palavras levadas ao vento ao lombo dos animais largados nas selvas.

Há de perguntar os incrédulos quais os que justificam aceitar e confortar a si o balanço das horas ao sabor das palavras, porém que existem milhões espraiados nos países daí a fora nem de longe duvidar. Santos, fiéis criaturas do desconhecido, quedam assim as esperanças nos braços da certeza de que tantos desanimam e eles seguram suaves nos trilhos da alma. 

Nisso desejam a firmeza da fé e teimam consigo no igual conhecimento das palavras sempre novas, ao gosto da consciência dos que aceitam de bom grado o bem de luz na consciência. Dizer dessa maravilha aos que nunca abrem mão dos pontos de vista da incredulidade é entregar ao léu os meios de salvação de como transmitir a esses o que eles jamais quiseram saber até agora, certezas que fogem impenitentes sem, no entanto, reconhecer o poder perene que elas têm.

Perante as contradições das criaturas restam tão somente admitir que o paladar com que recebem as palavras reflete o limite no padrão das possibilidades individuais, sujeitos a leis diversas que restringem o senso ao quanto de sua igual proporção. 

domingo, 26 de agosto de 2018

As oportunidades



Nada melhor do que, em meio de tarde de domingo calmo, ensolarado, tipo este, e tratar desse tema, das quantas vezes nos aforam na existência formas de vida que esvaem desde sempre, por fração de segundos; e nem disso a gente se dá conta. Delas, das chances de parar e ver lá dentro a santidade dos sentimentos que vêm e envolvem, e vão pelas páginas do mistério depois de atravessar os viventes. Das promessas que bem poderiam ser e as esquecemos de reverter em felicidade aqui nesse instante do presente, no meio das horas que somem pela brisa suave entre as árvores; os bichos que caminham a pisar as folhas secas; alguns pássaros solitários a gorjear baixinho sem querer quebrar o silêncio dessas ocasiões mágicas, grandiosas. São saudades vadias, nacos de tempos largados fora que os deixamos, apreensivos em querer justificar dalgum modo aquele gosto de viver sem aproveitar com sabedoria a leveza das pessoas, dos planos, sonhos, ideias, realizações; todos virados em saudades contundentes no âmago do coração e das horas. 

Entretanto aquilo tudo parece que se foi nas despedidas que deixávamos escorrer dias a fora, nos saltos apressados, nos passos seguintes, indiferentes quais de fugitivos da própria sombra. Foram muitas as doces visões de ser possível mudar o mundo, transformar problemas em soluções e fáceis conquistas, contudo enorme fastio ora deixa a sós, abandonados no calor de apegos vãos e egoísmos estridentes, sobejos de vitórias e ilusões, pequenos que fomos nós, aprendizes inexperientes, e desse modo perderíamos boas prendas e nelas os bons parceiros dessas vilas abandonadas antigamente.


Nem pensar naquelas virtudes reviradas em meros interesses, nas companhias maravilhosas que andaram conosco nas trilhas dos céus abençoados, espécimes raras de jamais perdê-las, porém de quem nunca mais saberíamos o paradeiro. Que fizemos de mim de tanto amor, tantas alegrias, instrumentos que fomos das infinitas produções genais, apenas figurantes de peças inexistentes, filmes inacabados e inspirados autores? Bom isso, de poder imaginar que ainda agora somos essas oportunidades únicas do amplo sentido de acalmar os ânimos e dotar a história de paz e consciência. É este, pois, o portal dos infinitos libertos que somos nós vidas adiante.


A realidade somos nós

O quanto disso tudo em volta somos cada um que determina. Espécie de demiurgo (ser místico e poderoso), nisso manifesta as formas várias dos acontecimentos, que crescem de nossas mãos, da nossa alma, através do jeito de viver. Sistema complexo, a soma de nossas mentes gera isso que resolveram chamar realidade, o lado externo das criaturas humanas, diretamente vinculado ao todo universal.

Mundos em movimento e os atores a formar o roteiro das peças que ocorrem no girar dos elementos, isto é a realidade. Por isso o conceito de ser importante a saúde da mentalidade, o outro nome de consciência. Aprender e viver com arte. Transformar o mundo em nós mesmos, na afirmação de Hahatma Gandhi, que Seja a transformação que quer para o mundo. Detalhes absolutamente reais formam, pois, as manifestações do real durante todo tempo, séculos e séculos. Pessoas conscientes resultam universo consciente, tanto nos grupos sociais quanto nos procedimentos da Natureza.
...
Há uma ordem no Universo e as pessoas a compõem à medida que vivam e operem suas atitudes. Mais que meros coadjuvantes, os humanos formam e regem as instituições no decorrer das existências. O instrumento dessa vinculação com o todo é a Consciência, qual exerce seu papel por meio do denominado por Carl G. Jung de Inconsciente Coletivo, que, por sua vez, se vincula ao Inconsciente Individual. Ninguém foge dessa condição de artífice da grande realidade, função primordial da razão de estar aqui.
...
Face ao fluir das gerações, quanto já realizamos e mais iremos realizar no transcorrer das evidências tudo contará, sobremaneira, naquilo a que dirigirmos nossos passos e concretizarmos nossos sonhos... Nutrir sonhos de perfeição e consumar os desejos na forma ideal de praticar o que diz e crê naquilo que providenciar, eis a equação da espontaneidade e da paz. Leve ação de paciência e trabalho, isto envolve atos e planos sadios a eras promissoras e pródigas na realização de humanidade harmoniosa, feliz, próspera.

(Ilustração: Carl Gustav Jung).

sábado, 25 de agosto de 2018

Balzac

Nas suas memórias, conta o escritor Dino Segre Pitigrilli que, certo dia, numa das visitas do explorador Alexander von Humboldt a Paris, este revelou ao seu amigo Dr. Blanche, conhecido pelo tratamento revolucionário que desenvolvia junto aos doentes mentais, o propósito de almoçar com um dos pacientes medicados pelo célebre estudioso, reconhecido precursor na arte da cura nervosa.

- Coisa nada fácil, nesse momento, Humboldt – advertia o médico. – Mesmo assim, verei o que posso fazer para atender-lhe o pedido.

Dessa forma, logo no dia posterior, encontraram-se à mesa da refeição Humboldt, Blanche e mais dois outros senhores, um dos quais trajava longa casaca preta, abotoada de cima a baixo, fechada por gravata escura, larga, que repontava, no ambiente, longos olhares sombrios de homem taciturno e misterioso.

Durante todo o almoço, tal cavalheiro permaneceria fiel à impressão que de início despertara no visitante. Ao chegar, dirigiu-se a Humboldt cumprimentando-o com gestos eloquentes, indo aquietar-se formal numa das extremidades da mesa. Comeria moderado. Beberia algumas taças do vinho que serviram, sem, todavia, nada pronunciar que lhe identificasse mínimos sinais de personalidade.

O outro senhor, por sua vez, ao contrário do primeiro, parecia um vulcão ativo, flamejante; de cabelos desgrenhados, casaco azul e alguns botões fora da casa, depunha os cotovelos impacientes sobre a mesa, que, a cada instante sob o seu peso, sacolejava de causar medo. 

Ansioso, comia em ritmo acelerado. Engolia quase sem mastigar. Falava, falava, e perguntava muitas e insistentes vezes. Impaciente, era ele quem se respondia, antes de aguardar as respostas solicitadas. Cortava pelo meio as falas dos interlocutores. Despejava palavras através de todos os poros. Emendava assunto em outro, uma história na outra, o presente no passado, e esse no futuro. 

Tempos após, à hora da sobremesa, Humboldt chamou de lado o seu anfitrião para, juntos, tecerem alguns comentários a propósito dos pacientes convidados, segundo imaginou o visitante. 

Nessa hora, indicando com os olhos o segundo personagem, aquele da casaca azul, de atitudes eufóricas, que multiplicava palavras, chistes, anedotas e extensas tiradas filosóficas, balbuciou-lhe ao ouvido:

- Muito interessante o doente que me trouxeste. Seu paciente bem que nos diverte bastante, nesta ocasião. Parabéns pela feliz escolha do que solicitei.

Nisso, ligeiro, o médico reagiu contrafeito diante da avaliação do amigo:

- O quê? Não, não, senhor! 

E insistiu a objetar: - Mas o doido que eu lhe trouxe não é ele, não, o que está pensando. É, sim, o outro, o da casaca escura – acrescentou Dr. Blanche.

- O que nada falou e permaneceu calmo todo o tempo? – indagou admirado o célebre alemão.

- Sim, sim! É ele o meu paciente, em fase de bem sucedido tratamento. Vê-se no controle do comportamento apresentado.

– E esse que pensei que fosse ele, então, de quem se trata? – quis saber Humboldt.

- Esse é Balzac, meu amigo Honoré de Balzac, o inigualável gênio da literatura francesa – com isso, ambos, silenciosos, voltaram aos seus lugares a fim de concluir o repasto.

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Nuvens de algodão

Depois avistaria os mesmos traços livres também nas costas dos lápis de cores múltiplas, num abstrato solto de tintas derramadas e que antes já contava nas nuvens lá do sítio da minha infância. Agora sei bem a razão deles olharem sempre no Nascente. É que no Sertão existe quase um compromisso de todos vigiarem saber quando vêm as chuvas das nuvens escuras feitas do Nascente. Quando ainda não escuras, ou carregadas (qual dizem), são os torreões da distância longínqua, a indicar na raiz as futuras formações, pois a chuva chega de longe, das terras da Paraíba, donde as nuvens nascem. Nisso a gente ganha aquela hipotenusa de querer olhar o Nascente a todo instante, a qualquer motivo, mania boba dos jeitos infantis daquele tempo de fixar olhos e cedo principiar a descobrir outros acontecidos vindos na barriga das nuvens. Se não, limpo de tudo, as nuvens vêm claras, brancas, mas formações constantes de seres e objetos dos diferentes estilos, artes do firmamento. Animais, castelos, gigantes, arvoredos, mutações, rostos, desenhos impossíveis em permanente evolução a novos quadros.

Enquanto adiante seriam cenas constantes de cinema, televisão, equipamentos de perder de vista, naquele eito de criança, eu, ali sentado na varada de nossa casa no sítio, próximo de minha mãe que costurava numa máquina Singer, viajava à solta nas nuvens que ofereciam as cenas e cenas. Filmes e filmes produziam epopeias, odisseias, jornadas siderais, histórias mil, lendas, situações. Eram roteiros internos da imaginação que as figuras provocavam, durante horas, no mormaço das manhãs, acalmando o sentimento e percorrendo cúmulos celestes a perder de vista pelas cascatas do Infinito.

Assim, bem adiante, dado meu gosto pelas artes visuais, conheci de perto o poderio das imagens aleatórias através das escolas atuais, na pintura, na fotografia, no cinema. Reconheci com facilidade a impressão visual na interpretação dos desenhos espontâneos da natureza e no modo de expressão de liberdade nas cores e no movimento dos pinceis. Sem largos esforços, por isso, ora compreendo também a música e sua fluidez ocasional de sons e ritmos, ao modo liberto dos que escolhem a variação das notas por meio de intuição artística.

Naquelas visões originais ao sabor da brisa sertaneja a tanger os fiapos de nuvens nos céus da visão de um menino, aprendi o quanto de sensibilidade e sonhos vaga no íntimo à busca da consciência cá fora, nas letras e ficções.

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Sussurros do Infinito

Esses sons que percorrem o Universo também atravessam os ouvidos das pessoas e os objetos na mesma intensidade, ocasionando diversas interpretações de tudo em volta. Delas, das interpretações, advêm modos variados de comportamento, o que enche as páginas e os livros, os becos e as vilas. Quais murmúrios de origem na própria pele das palavras, blocos de significados preenchem o tempo e em seguida denominam memórias, lembranças, e regressam às mentes e criam novos sons e significados. Quais sendo assim, há círculos de visões e audições a produzir que resolvam classificar a vida consciente. Isso se demora, depois, nos hábitos e costumes, alimenta as mentalidades e os períodos, as modas e os valores. Pois bem, daí nascem pensamentos e mentalidades, crenças e poderes.

Viajar nesse motivo das civilizações demonstra o quanto frágeis são a formações e o nível das percepções; as leis e os ordenamentos; os pecados e as instituições. Balizamentos quase que naturais, exigem forte determinação de vencer tais barreiras e criar novas formulações, necessárias ao crescimento de outras possibilidades. Ficar presos nos vagões do Destino nisso parece corresponder os gestos ditos inteligentes das criaturas, só raramente superados nos momentos críticos. A acomodação representa, destarte, o quadro típico da história durante todo tempo.

As massas fogem assustadas de alternativas que exigem maiores conhecimentos, renúncia e esforço. Deitam e rolam nos braços de aventureiros de plantão quase que abandonando, jogando ao mero acaso, soluções e providências preciosas. Sobremodo isto acontece nos turnos eleitorais, fases definidoras do futuro dos grupos sociais. A raça humana, que desenvolve os instrumentos da política, por vezes simplesmente faz vista grossa da importância da participação nas escolhas, e atira pela janela o bem fundamental da oportunidade, qual ignorando por inteiro os sussurros do Infinito a lhe oferecer mensagens coerentes de selecionar os bons representantes e aprimorar a prática administrativa da sociedade onde vive e aguarda melhores momentos.

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Esfinges

Nesta hora há esfinges cinzentas espalhadas nas ruas da cidade. A toda esquina uma esfinge lê nos homens os princípios feitos de enormes interrogações a sua maioria, quais a mim que ainda o sou das dobras de todas as fronteiras e gravetos deste mundo. Esfinges por vezes agressivas, autoritárias, semelhança das ocorrências do mais recente dos dias. Isso agora dói em muitos, porquanto vagam pelas ruas esses animais de pedra em antigas dores que, nessas ocorrências inevitáveis, avançam por dentro das pessoas a andar frágeis nas ruas, afeitas aos humanos compromissos. Perante o astral desses dias, ali, porém, apenas um rubor nas faces do tempo bem defronte da igreja e dos paramentos que ilustram a praça. Em tudo, fortes marcas e a sensação de ausência que se seguiu depois do mistério dos acontecimentos, uma amargura de contradições dos que desaparecem e deixam consigo saudades e lembranças que ficaram lá atrás.

Inútil indagar aos que veem soltas nas ruas as esfinges alucinadas a que vieram. Selvagens, elas cumprem papel de milênios e das gerações que sucedem, querendo ardentemente dizer aos viajantes a resposta do enigma de viver e penetrar o reino da Eternidade, entretanto, nessa missão exclusiva, não sabem deixar passar quem vinha, porém que não soubessem responder na hora e na ponta da língua. Enquanto tal, ardem de dor os sentimentos, as almas e os santos, testemunhas do que houve na praça sob o véu sombrio da morte e das tragédias. Pedidos fervorosos de amor persistem na face da existência dos que andam pelas largas avenidas. Por que assim? A que, assim?

Ninguém de sã consciência dormiria naquela noite sem ouvir distantes gritos e os gemidos da sobrevivência no movimento dos corações. Espécie de penitência clamava união de todos em vigília e prece. No meio das pedras desse deserto como que de carne mãos pediam misericórdia a todos os céus e aos monumentos que vagam agressivos pelas cidades. 

domingo, 19 de agosto de 2018

Dimensões

Quais camadas superpostas assim somos nós. Espaços imaginários que circulam possibilidades, gravitamos sozinhos feitos ciganos em bandos em volta do núcleo das existências ainda que admitamos viajar outras órbitas, contudo estas são outros seres que também somos. Jamais percorremos, pois, as outras dimensões conquanto a outros astros elas pertencem no curso infinitos destas condições humanas. Nutrimos, no entanto, a sede nas aventuras alheias, à busca dos espelhos que significariam diversos mundos, porém doutros atores de si, o que só em nós, de longe, desenvolvemos revelar na essência definitiva, ora vagando em nossas mãos, por certo carentes e inexperientes, ou nas mãos dos outros.

Os dramas, as angústias; medos, desespero; luas, humores; peças do território desta vida, apenas trocamos de roupa e de leve fugimos de nós mesmos, tais bichos ariscos e largados no universo absurdo que deixaremos de ser tão logo revelemos a consciência. Foram muitos por inteiro dos céus que frequentamos nas sequências deste modo de aprender que a Natureza oferece dias e dias, meras dúvidas e repetições que sustentam as vaidades e alimentam o desejo de continuar sem limite. Criamos o jardim das delícias dos sentidos e neles maneiramos mágoas e queixumes, vórtices apaixonados de prazer e apetites. E refazemos os sonhos no objetivo de achar a porta de sair dos dilemas e frustrações. Nutrimos leis, deveres e relacionamentos. Nisso largamos as cascas e os corpos na lama das horas, mergulhamos apreensivos no saber a que viemos acender luzes e, por vezes, nem nos apercebemos que o tempo desmancha no ar as notas da presença do passado que nunca mais voltará, e o futuro é agora. 

Doces ausências nós o somos, camadas superpostas das dimensões a que alçamos, pouco a pouco, duendes saltitantes nas florestas do conhecimento escondidos debaixo dessas quantas camadas do ser que em nossas mãos solicita a força de todas a maior, de habitarmos a intensidade e aguardar a certeza na semente de fomos dotados desde o princípio de Tudo.

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

A verdadeira natureza

Até quando o lucro será mais importante que a natureza?
                                  Greenpeace

Eis a grande indagação desses tempos escuros da fome dos mortos vivos pelo carbono em elaboração na matéria. Jogados às traças, os seres humanos vagam soltos nesse mar das ilusões perdidas. Velhos lobos da Estratosfera, sonham com visões e vivem pesadelos criados deles mesmos, espécie ainda vazia de sentimentos e alimentada nos calmantes e antidepressivos. Contudo assim não fosse, habitaríamos astros diferentes do espaço entre naves e morcegos, outros corpos circulantes do Infinito, e talvez detentores das respostas, ou senhores de antigos mausoléus de vanglória. 

O pitoresco disso tudo é sermos os protagonistas do destino de tantas outras espécies largadas em nossas mãos diante dessa ignorância. O que alimenta o estômago do ente corrosivo desse animal do lucro, irresponsável garganta que significa buscar respostas e incessantes finalidades, porém que transporta ao Cosmos pequenos seres predadores insatisfeitos e resistentes, bactérias impacientes, devoradoras de paz.

A que viemos, de que sóis, de que surpresas matemáticas, fervilhando ambições e pouco grupal?! Folhas ressequidas nas árvores do Paraíso, tangemos os rebanhos em retirada e trituramos lixo e sobras de alimentos, entretanto dotados de inteligência e vontade geniais. Apostamos na supremacia dos antropoides, todavia sem maiores convicções ou júbilo.

Ali adiante, sim, existirá o encontro dessa união com a realidade definitiva do Universo de que sejamos parte, o que reclama atitude mental reservada aos anjos. Bem ali adiante. Traçamos os próprios pés nesse caminho de libertação, contudo pessoal, intransferível, rumo da verdadeira natureza de todos. E nisto nada de sobrenatural, justo na medida e no furor das multidões. Equivalente ao próximo estágio de evolução e conquista. Achar a essência, a impermanência dos corpos em queda livre, donde virá o grito da vitória na tarde primaveril dos amores vãos. O contato inevitável e direto com a Verdade mãe, a isso nos aguardam as esferas, mundo íntimo de possibilidades e certeza. 

(Ilustração: 2001, Uma odisseia no espaço (50 anos).

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

As malhas do silêncio

Tão perfeitas, alvas e puras, elas envolvem de beleza o senso da alegria de que carecem os humanos em peregrinações vítimas dos martírios. Ordenamento de valores que iluminam através das derradeiras réstias do sol que se esvaem num passado ingrato. Depararam trâmites de angústia e nem assim dobraram viver diante das dores. Receberam gestos agressivos dos que fugiram da consciência e do amor. Perdoar qual atitude única de corresponder às infinitas religiões e aos idiomas diversos de transformar penhor em luz mais elevada.

Que contrapor face aos desvarios deste mundo esdrúxulo? Dar faces no abismo sem perder de vista o valor da gratidão? Aceitar de bom grado as garras do destino, as latanhadas de feras, dos erros; pesar e medir, e nunca jogar os pés pelas mãos. Exercitar princípios da exatidão e da crença na justiça que em tudo prevalece. Um dizer contido nas marcas do sentimento, rasgos de dragões pela alma; saber que ninguém viverá longe dos olhos do Ser maior e presente no Universo inteiro.

Agora, essa leveza no interior das pessoas que padecem os traumas da amargura e sabem que têm de sobreviver perante o trilho deserto de tanto suor e sofrimento. Ali nuvens escuras cobrem esse fio azul dos olhos e pedem contribuição da inesgotável paciência. Procurar palavras no dever da conformação, entretanto respeitando que existem as vestimentas de quem padece sozinho e só eles devem sentir e transcender as dores deste mundo.

Saber suportar o silêncio nas transições de nossa evolução a níveis superiores, convicções entranhadas de resistir aos desafios e às provas. Domar os sentidos machucados ao jeito de santos e devotos, quase super-homens dos poderes inatingíveis. Ouvir palavras da misericórdia quais lágrimas de humildade e certeza nos dias bons logo a caminho, aonde seremos todos iguais nas bênçãos de novos Céus e alentos da Felicidade.

Temas

Escrever pede o nome desde os começos, os temas. Eles mexem dentro do viveiro da inspiração indo minerar assuntos que preencham o motivo do texto. Devem atender ao momento de quem escreve no fim de tocar o gosto da ocasião, nos caprichos imaginários que vagam soltos pelas palavras e desenvolvem o sentido das frases nas metas da escrita. A busca dessa inspiração deixa fluir o pensamento, caçador das razões das letras, apresentando lugares do que dizer qual cicerone de significados ocasionais. Nisso, nessa hora de escolher o vilão, há tal parecença com quem compra numa feira livre em que eles quase viram objetos das escolhas no presumir a quem eleger, bem senhores de si.

Houvesse sempre uma boa história a contar, satisfaria desenvolvê-la por demais e restaria agradecido quem de longe procurava demasiado, pois a forma nasce lado a lado com o enredo de eleição. No entanto só de raro acontece tamanha naturalidade, a não ser num raro golpe de sorte. Às vezes um sonho, uma episódio cotidiano, uma pagina solta em algum livro; ocasionalmente, pois. Daí parecer que as musas nos auxiliam apenas quando estão de bom grado, simpáticas. E vivamos nós. 

Contudo a fúria do escrevinhador precisa acalmar, quer haja ou não tema, espécie de cápsula salvadora dos maníacos na crise das abstinências. Prudentes, saem a caminho à busca das flores que mereçam falas e ouvidos. Passo a passo, nada justificaria desistência diante do desejo extremo de produzir. Dalgum lugar do juízo virá o pro mode da canção literária. Sede cáustica de visões, profetas de si mesmos, vagabundos da solidão impaciente, lá seguem pelas esquinas vazias das noites estreladas.

Por isso os temas ser-se-ão importantes a quem deseja quebrar o silêncio do isolamento e levar distante o rochedo de Sísifo morro acima, obstinado, ainda que saiba vir abaixo e de novo continuar a missão tanto eterna quanto vida.

(Ilustração: Wassily Kandinsky).

sábado, 11 de agosto de 2018

Amplidão

Nalgumas dessas paisagens que vêm assim cheias de letras e palavras e imagens nalgumas delas há repetições de títulos, o que leva a mudar noutros a fim de chegar mais perto de contar as visões do interior dos túneis internos os corredores da alma da gente. Isso de querer falar o que todo mundo sente e também quer dizer e diz ou não diz de vez em quando. Na vontade incontida, pois, do trabalho da expressão delas das palavras nascem outros nomes de forma insistente do ato de narrar os acontecimentos das moléculas nas células, e dessas nos elementos do corpo através dos sentidos, busca de ampliar o ímpeto e reverter o quadro harmonioso do silêncio em outros quadros, jeito de sobreviver ao instante e narrar os acontecimentos interiores. Foram inúmeras as oportunidades de calar, porém do outro lado existem os que também querer conhecer o que ocorre dentro dos demais, nos sobressaltos dos caminhos e das histórias. 

Diversos abrigos escondidos nas pessoas vagam decerto soltos nas prateleiras do mundo em gestos de papel, de sinais expostos ao vento do desaparecimento, convites ao sentido de procurar o sentido nos objetos e nos corpos em constante movimento. Eles, os pensantes humanos, nós, enfim, trocam de postos a todo dia, insetos fervilhantes nas letras em ação. Novecentos e sessenta e tantos suspiros viraram nisso literatura atirada nas calçadas do firmamento, e as perguntas continuam persistentes. Umas indagam da razão de estar aqui; outras o valor do perdão; as dores do espanto aberto dos corações enamorados; as nuvens que circulavam o sentimento dos poetas e dos heróis nas lendas; os vastos campos da compreensão que pedem maiores interrogações face ao desamor que circula nos presídios e nas fugas da culpa; por isso além de querer contar e levar adiante o impulso das gestas, vem daí alvoreceres dos poucos esquecidos deixados fora da sorte que ainda impera na força do pensamento a vencer as visões fantasmagóricas da ignorância. Ampliar nalgum lugar a consciência em atitudes de purificação dos seres que abrem os olhos pouco a pouco à visão do Paraíso.

A pátria da libertação

Quando você conquista o coração, ele se torna ponto importante em tudo. Obtém êxito em conhecer e morar na terra da Salvação para sempre. Conquista o desejo de dominar o mundo e domina o mistério da Criação no íntimo da alma; nisso vive o eterno dos sonhos, o interior da presença. Queira e vencerá o mundo de dentro, aonde imperavam instintos desde os começos da pessoa humana. Reverte com isso o quadro de enxames das velharias que antes prevaleciam e que agora nem de longe interessa que tenha o mínimo de importância no jogo das contas de vidro do tempo. Querer tal fator de sobrevivência e razão de tudo quanto há eis o conquistar do coração.

Bom, falar de conquistar o coração... O que é? Que é o coração de conquistar? Sede essencial dos valores desta vida, tem no entanto explicação noutros níveis de consciência. Além da carne existe uma vida que continua quando esta daqui termina. É o túnel de chegar a esse território novo da libertação depois da matéria; é o coração. Espécie de passagem secreta, ele conduzirá a Deus. 

A rendição ao equilíbrio do Universo tem ali o instrumento da sua realidade, isto na essência, o Ser real da criatura. Sol de luminosidade intensa, permite a transformação dos solitários animais de existência ocasional em fonte perpétua e júbilo. Isto enquanto acontece a aceitação definitiva da verdade, marca indelével da paz. São, por isso, muitas luas no céu, fogueiras mil e esforços contínuos de aceitação até galgar a percepção que aspirava.

Deixar de lados todos os chamamentos que dispersavam a visão tão só nos apelos deste mundo, à busca do setor próprio da alma da gente. Pois exatamente nesse princípio que vem de ser compreendido é que habita o coração qual sentimento, gosto de viver com arte o Amor.  

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Outra vez aqui


E nisso regressar sempre mais perto ao ponto em que, nalguma ocasião, o sentimento criara raízes e ferira de morte a solidão. Bem no âmago de si, no auge das cordilheiras da alma, e mergulhar os abismos da consciência numa espécie de atitude presente em tantos chamamentos. Quando a disposição de reviver o momento refaz essa disposição interior de seguir solto nas ondas desse mar imenso, alheio que seja aos sentidos só aparentes da realidade das sombras. Admitir existisse vida em tudo, ainda que as marcas deixadas pelo desespero insistissem guardar na desistência os valores da Eternidade presente.

Sucumbir no tom ácido dos objetos em decomposição, entretanto ciente das certezas em dias menos bizarros, quais atores imbatíveis das aventuras, mocinhos de novas histórias, andarilhos das florestas imaginárias aonde há uma luz que nos aguarda... Nessas horas, chegam antigas dívidas, restos das paixões alucinadas, feiticeiras das noites de sábado. Contudo elas andam pelas calçadas que transformam.

Crescem nisso as nuvens e marcas dos astros que percorrem o trilho das possibilidades, sinais indicativos de grandiosas mudanças logo ali adiante de erros que nesse lugar um dia se deram. Foram muitas as oportunidades, no entanto largadas no querer das massas. Preencheram o fastio das madrugadas em jeito de duras equações de prazer no trinco das contradições. Dormiram todos e jamais reviverão passados remotos que alimentavam de amores tortos através de dores profundas.

Até este dia, hora de rever as paisagens da infância e sorrir lá dentro por meio dos animais, olhar nos raios de sóis infinitos, persistentes, constantes, de memórias que resistem ao tempo, ou são partes do poder de querer no seio da vontade. Olhos acesos nas saudades vivas no coração e na paz dos seres, a força do inesperado toma conta de tudo em volta.

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Liberdade perene

Nesses tempos enigmáticos que parecem controlar as pessoas através de filamentos presos a reinados sórdidos, paro e escuto o som do vento nas árvores. Sei bem da voz das lufadas na escuridão, que querem dizer algo, mensagens que as devoro em compreender. Sei, sim. Ninguém nunca disse, mas sei, porque ouço no silêncio a melodia das folhas no idílio carinhoso delas e do tempo, um dizer sucessivo do que somos e quero intensamente desvelar. E sinto também vagando o perfume das flores nas outras plantas, a invadir narinas adentro nas vozes santas da natureza. Nisso, longe até dos pensamentos e das contradições, dois senhores dominam o meu jeito de ver, impulsos de quem fala e eu que a eles sobrevivo calado, quieto; os escuto e sinto, e analiso, sem, no entanto, sequer saber doutras alternativas senão continuar. Apenas observo, sonho e testemunho a imensa criação dos viventes no escuro dessas noites dadivosas. 

Bem no instante quando tudo vira musicalidade e parece querer existir longe dos intrusos que escutam o gotejar dos sentimentos, bem ali, moleque vadio entre o nada e as existências, vem esse desejo forte de libertar firmamentos, astros acesos na distância, e mergulhar solto por demais na brisa que balança as árvores impacientes. Logo depois mais calmas.

Há profusão de seres reunidos em meio do perfume e das folhas que se agitam. E saber o que isto significará uma resposta ao desejo de interpretar o curso do Universo e das almas. Há que largar pedras e caminhos e abandonar conceitos e respostas, antes de a consciência desistir de procurar, e aceitar só a inexistência qual razão luminosa de além do horizonte. Entretanto antigos ídolos ainda vagam pelas sombras feitos fantasmas de almas em perdidas aventuras, e choram abandonados diante de quem ali os deixara assim ausentes e solitários. 

(Ilustração: Valdimir Kush).

domingo, 5 de agosto de 2018

Os instrumentos da felicidade

Vezes sem conta me pego a considerar que existe um poder acima dos poderes menores, e que dele provém o sabor dos acontecimentos. Qual regente das possibilidades, esse poder transcendente conduz a orquestra dos destinos na proporção certa do que compete em termos de direitos e obrigações, e acompanha as espécies na perfeita maestria que passa despercebida de parte das criaturas humanas. Que faz e desfaz, alimenta e corrige, produz valores constantes e preenche a tábua dos dias, a oferecer meios e realizações pessoais que chamamos felicidade. 

Noutras ocasiões, desde quando as primeiras nuvens se formavam no céu e iniciava a formação dos mundos, isto desde sempre, que há obediência dos que promovem a sonhada felicidade, realidade exercida de acordo com os desejos da satisfação e da paz. Entretanto requer providências até desfrutar a sonhada felicidade. Saber trabalhar as condições na natureza quais os corpos que circulam as regiões da Terra, o clima, as condições de sobrevivência, água, luz, temperatura, mares, rios, fontes, florestas, inteligência, harmonia, família, sociedade, paciência e as outras virtudes cruciais de usinar os padrões universais até chegar às civilizações ideais. Apesar, contudo, de quantos a isto contrariam pelas hostes da ignorância, ainda, destarte, o fluir continuará a todo vapor. 

A vontade, eis um desses possantes instrumentos do ser, de transformação da massa informe de corpos em movimento rumo do fim em um valioso condutor das multidões aos tempos de felicidade. Saber trabalhar a força do querer, e querer de verdade. Ninguém nasce feito, porquanto se elabora todo momento. A força dessa iniciativa por isso representa forte dispositivo de poder. Promover o sonho em forma de substâncias no espaço físico. Trabalhar isto, trabalhar, afinal. O condão do trabalho, além de prece ao futuro desconhecido, significa sobremodo o instrumento maior de avaliar o quanto de valor move o Universo, e o trabalho honesto este, sim, supera todos os outros instrumentos de poder e felicidade.

(Ilustração: Tumba de Rekhmire - Antigo Egito).

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

Viajores do tempo

Além de dependentes diretos do espaço desse lugar que ocupamos aqui no Chão, forçados sob a tonelagem do próprio peso, somos também prisioneiros diretos do eterno presente, que suspira obter a essência do momento nas malhas da consciência. Ainda que filosoficamente assim não fosse, de que adiantaria imaginar diferente, porquanto as garras existem a nos suster os passos, e nessa carência cônica, formidável, de conhecer o futuro, ele caprichosamente foge de nós, impetuoso, semelhante ao coelho corredor e seu relógio, em Alice no País das Maravilhas. Quais despertados de sonho que queremos lembrar os detalhes e o enredo, quanto mais quiséssemos mais ele escaparia rumo do desconhecido, nos sumidouros da memória, sombras, horas, do movimento, lembranças, idades.

Totens do que fomos de nós mesmos, dançamos à volta dessa fogueira intermitente da existência numa síndrome inevitável, adoradores do fogo sagrado que queima vivo dentro sem cessar jamais. Espécies dos faquires dançarinos do Sufismo, arrodeamos nossa imagem e o que fazemos de cada um, em aspiração frenética de liberdade, porém às tontas na roda do destino inimaginável. Vez enquanto, somos surpreendidos nessas migalhas de mel de aparentes felicidades que escorrem das nossas bocas, favos das abelhas radiosas que desejamos ser, outrossim semelhantes a meros criadores de personagens fantasmagóricos, sonhadores de sonhos impossíveis, fugitivos dos países habitados nas quimeras que formamos.

Contudo ninguém a sumir do ansiar das descobertas que farão de nossas almas rainhas do Universo, forças intensas da criação do ser que já somos e não podemos ainda conduzir com exatidão nessas estradas tortuosas do Infinito. São séculos, milênios de contradições a reclamar esse encontro definitivo da perfeição de que dependemos nos gestos atuais e nas buscas repetidas de tempos. Nisso, de uma hora a outra, numa das esquinas dessas miragens, bem ali, nalgum espelho, noite ou dia, haveremos de esbarrar conosco e fazer as pazes com medos, culpas; angústias e aflições; dos credos e das dúvidas largadas fora. Abraçar-nos-emos, então, repousados de nós, depois de tantos gestos de desesperos, e dormiremos em paz, feitos crianças, nos nossos braços enternecidos dessas jornadas de solidão e esperança que realizamos nas vidas imortais.