terça-feira, 31 de janeiro de 2017

O pecado e a Consciência

Qual macaco vadio, invade o salão branco da Consciência e sai destruindo tudo levado da breca, feito touro bravio em loja de porcelana, a confrontar o que lhe vem à frente. Bichos desengonçados, colhe nas suas malhas a irresponsabilidade dos incautos e devora o sonho, abandonando lástimas ao relento. O custo disso aparecerá na sequência dos acontecimentos, deixando peias do fracasso. Quisera, no entanto, cobrir o Sol com a peneira; usar um pouco de lama e fuligem aqui ali acolá, insuficiente a trazer tranquilidade ao céu das almas nas culpas do remorso.


Há um livro de Albert Camus que reflete tais circunstâncias, o peso nas consciências. A queda, eis o título. Ele, o titular da história, cruzava uma ponte, noite tardia, quando avista pessoa em gesto suspeito de quem quer abandonar a vida. Ver a situação, reconhece o quanto de risco o outro corria naquele instante, porém se faz desentendido, indiferente. Passa perto, com chances de evitar o desenlace, e nada faz, ciente do que implicava se jogar no rio gelado, turbulento. E deixa acontecer. Com isto, ainda ouve a pouca distância o som mórbido da queda do corpo.

Daquela data em diante, no entanto, jamais desfrutará de paz, se sabendo o único que testemunhara a ocorrência. E carregará a marca da omissão face ao desespero, conivente que fora perante o desvario da vítima. A partir do dia em que fiquei alerta, veio-me a lucidez, recebi todos os ferimentos ao mesmo tempo e perdi de uma só vez as minhas forças. O universo inteiro pôs-se então a rir à minha volta. 

Nem a morte vencerá, pois, a fraqueza da derrota do homem, que reclamará todo tempo do pecado que acumpliciou e escondeu na indiferença. Lembrar que um dia trouxera consigo, e perdera, a Salvação da boa paz. Adeus.

(Ilustração: Munch, O grito).

Dias de alegria

O fluir das horas vivas no girar do firmamento fala disso. Oportunidades mil da mais plena felicidade, o trilho de cada fração de segundo e o sonhar das gerações falam disso, na força do instante presente e a limpeza da Consciência, que nutre a constituição do Universo prodigioso. Isto em nós, no íntimo do ser que somos e cientes de tudo quanto há, forma e rito das possibilidades infinitas. Sem falar nas certezas que alimentam virtudes e esperanças. Na beleza das flores mais bonitas. No verde das matas. Nos mares em constante movimento. No sabor das águas que suprem a sede do chão. Pássaros, vôos e cânticos inigualáveis. O riso das crianças. A disposição de reconstruir as ações que, no passado, falharam. A honestidade do trabalho mais justo. O ar que respiramos, sem igual e persistente. As descobertas da ciência. A maravilha que é o tempo. A existência e suas chances e revelações. Tudo, afinal, motivo de plena satisfação de paz e saúde, instrumentos da realização dos dias na alma da Verdade.

Em volta os meios de tocar adiante o foco desse instante face à Eternidade. Somos disso a fórmula da revelação do que aqui viemos e veremos. Luzes na paz dos corações. Ainda que diante das limitações da compreensão, no entanto existem as horas e os seres que dispõem das práticas de trazer à tona o futuro. Palavras claras de poder. Otimismo. Positividade. Cordialidade. Respeito. Amizade. Solidariedade. Amor. 

Quantos recursos de real valor. Claridade. Paciência. Persistência. Alimentos da continuidade e harmonia. A lindeza das músicas boas. A luminosidade dos quadros genais. Os filmes bons. Os artistas, os santos, os líderes fiéis dos sentimentos autênticos. Reunir em único bloco o brilho do Sol, a suavidade dos ventos, o gosto saboroso das chuvas. Notícias boas, que alegram a gente, no campo sem limites dos sonhos. 

sábado, 28 de janeiro de 2017

Voz do povo

Fácil dizer que a tecnologia entortou a Geração. Que o progresso virou razão de subjugação e sacrifício dos muitos. Aumentou a capacidade autodestrutiva. Etc. Porém há que se reconsiderar tudo isso perante novos pontos de vista. Chega de execrar o que a raça promoveu quando tal condena o que trouxe tanto tempo de produção a inteligência humana até o brilhantismo dos dias presentes. Quando a gente peca no usar significa não que o instrumento deixa de oferecer uso bom, de prestar ao bem. O artista tem sim que melhorar naquilo que faça. Aprender a utilizar a beleza da invenção e gerar bons frutos do que elaborou. Em tudo por tudo vem sendo desse jeito. Melhorar para mais. 


Um mínimo de coerência portanto entre a coisa em si e o uso que dela façamos. Esses instrumentos de comunicação dos dias de hoje por exemplo. O primeiro computador funcionava em prédio de quatro andares, segundo consta. Depois de cinquentas e pouco tempo já agora resta só implantar no pulso da pessoa feito chip o andar do firmamento. Simplesmente computador de bolso eis o em que o telefone primitivo virou. Maravilha das ideações nos seus aventurandos, dispomos dos valores técnicos necessários a ser gente de qualidade. Admitir e praticar.

Caso ainda cheguemos apenas distantes do sonho da velha felicidade, temos entretanto dever suficiente de galgar maiores níveis de compreensão e entendimento. Nunca qual agora o juízo da invenção obteve tantos prêmios de sucesso no mercado internacional. Desde voar, comunicar, controlar, conhecer, até saúde, bem estar, entretenimento, segurança, o bicho homem merece muitos abraços de elogio. Outrossim logo veremos transformar sucesso em satisfação da humana convivência.

Este o foco das palavras de falar a voz de Deus na fala da gente inebriada dos bairros distantes, protótipos da inventividade, imaginação sem fronteiras de tecnologias de gênios que ora passeiam livres nas mãos interessadas da adolescência e dos sonhos.  

Brincar de terrorista

Essa foi a primeira das ideias de brincadeira com que, reunidos na casa de madeira, os meninos do Condomínio resolviam iniciar o movimento da tarde. Em cinco ou seis, os dispositivos que eles dispunham, quatro bicicletas e as próprias camisas de meia com que envolveram o rosto, deixavam de fora quase que apenas os olhos, olhos assustados, queimados nos equipamentos eletrônicos. Largavam à margem compreender que já conheciam, eles de 10 a 12 anos, a lojista das guerras das ruas nos dias atuais. Ali ao lado, outros três meninos, acomodados num dos bancos do sombreado, prendiam a atenção em um celular e nalgum jogo de defesa e perseguição.


E logo lá fora o ritmo incessante das faixas da avenida em alta velocidade, clima de pura voltagem, a lembrar circos e globos da morte com cinco motos a se entrecruzarem nas frações de segundo e destino incerto dessa mundo ainda troncho. Tudo pelos detalhes mínimos, e pescadores que, ao saber disso, dão um tempo ao peixe e um tempo aos anzóis, na mesma tarde a distância de poucos passos.

Ah, dalgumas nuvens, o céu fala de urgências mil no coração daquelas crianças sadias e suas brincadeiras perigosas de fazer de conta que tudo não irá além do mal entendido de assassinar a esperança de tantos jovens nos becos escuros das madrugadas cinzas. Que dizer, que fazer, que sirva de lenitivo, de resposta, a quanto de desamor ronda o universo das pessoas dentro das horas que voam?! O que contar nos livros dos antigos testamentos no futuro?! Quais dúvidas haver vencido deliberadamente na consciência espúria de quem chega ao poder no intento de transformar a vida numa moeda passível de uso comum e falham?!

O vento frio do escurecer reacendeu a vontade daquela gente que decerto buscará paz e alegria invés de guerra, e construirá o berço da nova humanidade dentro de outros jogos de fraternidade e amor... 

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Um lugar bem aqui

No livro A erva do diabo, Don Juan, o feiticeiro mexicano que instruía Carlos Castañeda, autor da obra, depois de longo período de iniciação, ao concluir as instruções junto ao discípulo, isto num fim de tarde no deserto, na varanda de casa abandona, entrega-lhe um palito de fósforo e orienta a que, no escuro da noite, à medida daquele pequeno instrumento, viesse localizar seu lugar no chão escuro e poeirento daquele alpendre. 

Nisso, Don Juan se despende e mergulha pelas sombras da noite, deixando Castañeda a braços com a rude tarefa pessoal. Enquanto media o território usando o palito de fósforo também cabia descobrir aonde assinalar o ponto exato a ele destinado no piso em que se arrastava. No início de bruços, depois do jeito que pode, à busca de achar o espaço nítido que lhe cabia.

O dia principiava a raiar quando isso aconteceu. Sentiu a mais plena identificação dele com o quadrante mínimo de solo qual previra Don Juan. Assim, harmonizado por conta do cumprimento da águia do mestre, ali mesmo estirou o corpo e adormeceu a sono solto.      

Isto também na vida face aos mistérios de viver e descobrir os meios de ajustar a existência perante os trâmites da jornada. Quais cavaleiros andantes de país imenso, sempre novo e insólito, os interiores da presença individual em que viajam pensamento e sentimento empreendem o esforço de acalmar esse instinto da procura constante. Utilizando tão só a fração infinitesimal do ser, medem cada fração do solo sagrado da vivência e ajustam, momento a momento, nos vales e montanhas da alma a correr nas horas inevitáveis.

Quantas e tantas vezes apalpar as superfícies de dentro, lugares inesperados, frios, quentes, mornos, azuis, encarnados, amarelos, verdes; e a memória a guiar os passos no impulso de sobreviver a todo custo diante do desaparecimento. 

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Os exilados de Capela

Era uma vez... (Bom, vamos passar o assunto pelo preço que nos venderam)... Sim, era uma vez, em um planeta da constelação de Cocheiro denominado Cabra, ou Capela, uma civilização no nível espiritual dos de hoje aqui no Chão, no grau dos mundos de Expiação e Provas. Lá os acontecimentos evolutivos andavam nessa proporção tecnológica dos dias de hoje na Terra. Pelas matemáticas, ciências exatas, haviam galgado avanços inimagináveis da racionalidade física na exploração dos bens naturais. E divergiram entre eles a ponto de encetar uma guerra autodestrutiva de larga dimensão. Os armamentos desenvolvidos foram suficientes a prejudicar a existência inteira dos que habitava aquele mundo.

Depois, bem depois, no decorrer das eras, e já na terceira raça mãe dos que vivem aqui na Terra, aqueles habitantes de Capela viriam seguir aqui sua experiência reencarnatória. Estariam distribuídos entre os povos egípcios, árias e judeus. Dotados da experiência anterior, espiritualmente trouxeram em si o desenvolvimento, a caldear com isso os primeiros habitantes terráqueos das duas primeiras raças que surgiram na Terra antes deles reencarnarem quais esses povos citados.

Apreciamos o tema, localizado em alguns compêndios, sobretudo das literaturas espírita e esotérica. Há um livro com esse título, Os exilados de Capela, do escritor Edgard Armond,  Editora Aliança, 1987, que narra detalhes e explicações, deixando margem a interpretações avaliativas. 

Cabe estudar até onde sustentar tese tão remota, vinda dos tempos arcaicos e siderais da tradição. Porém, dentre os argumentos, o que faria João (1:11) dizer de Jesus: Veio para o que era seu e os seus não o receberam? Espécie de missionário que propiciaria orientação a povo decaído naquela guerra de antigamente, traria consigo por dever assistir a nova jornada das vítimas da própria incúria da vivência passada, agora liderando rumo à libertação, rumo à Luz universal. 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Os apelos e a Vontade

Onde apelos são as mobilizações dos instintos, desejos impulsivos, que utilizam o pensamento no sentido de dominar a Vontade. Espécies de átomos de energia soltos em estado bruto dentro do território da existência, o indivíduo carece sobremodo de dominar e dirigir aos territórios do equilíbrio. No entanto os frutos hão de ser recolhidos, queira ou não queira, depois de tudo, função natural da Lei do Retorno. 


Quase que significar tempos atuais, avaliar o mundo qual resultado da ausência de equilíbrio dessas práticas do Ser, pronde dirigir os espelhos, ali moram desvarios tantos que pedem firmeza de juízo a fim de reestruturar diversos subprodutos das atividades humanas dias de hoje. O querer da Vontade até parece que perdeu sua autonomia, virando presa fácil dos instintos desses apelos deslavados. Os desejos viraram moeda solta das precipitações, que dói querer controlar a permissividade das gentes.

Bom, mas achamos que fica claro o valor da Vontade em exercitar o poder que possui de controlar ao instinto, espaço fértil de tantas vacilações. O querer da Vontade a pedir atitude dos habitantes do Chão, eis o mote maior das necessidades dagora. Trabalhar fontes de virtudes no coração; abrir espaço à Razão maior da Verdade; aceitar o desejo em lugar inferior, conquanto o instrumento da Vontade represente o caminho da Felicidade no equilíbrio pleno.

A Vontade é o Eu que deve, um dia que pode até ser hoje, sustentar em Si o ofício da disciplina do ego e refazer a história de tudo e de todos. Fosse tarefa desprovida dos mínimos interesses da paz, ainda assim mostraria alternativa diante da ausência de graça dos valores praticados agora.

Este objetivo principal dos motivos da raça, que pede, por isso, espaço fundamental de rever os sonhos da Humanidade, e trazer à tona o que de melhor houver durante o tempo inteiro da Eternidade.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Os Índios Tabajaras

Eis um fenômeno da arte musical que merece relembrar, Os Índios Tabajaras, dupla de músicos de cordas nascida em terras do Ceará, no município de Tianguá, na Serra da Ibiapaba, nos anos de 1918, filhos do cacique Ubajara, que foi pai de 34 filhos. Eles dois, Muçaperê e Herundy, receberam os nomes que significam respectivamente terceiro e quarto na língua nativa.

Em 1962, obtiveram sucesso mundial com a interpretação do clássico mexicano Maria Elena, que, durante 14 semanas, nos Estados Unidos, e 17, na Inglaterra, ficou entre os discos mais vendidos, indo à margem de 1,5 milhão de cópias. Chegaram a gravar 48 discos LP e chegaram aos 10 mais vendidos entre os sucessos norte-americanos daquela época.

Juntamente com a família, trazidos pelo tenente Hildebrando Moreira Lima, em 1933, viveram em Crato, no sul cearense, daí se deslocando pelos estados de Pernambuco, Alagoas e Bahia durante três anos; auxiliados pelo então governador baiano chegariam ao Rio de Janeiro em 1937. No caminho, conheceram violeiros e cantadores das feiras nordestinas e adquiram uma viola velha, que principiaram sozinhos a dedilhar.

Na Capital Federal, seriam registrados como Antenor e Natalício Moreira Lima, uma alusão ao militar que lhes auxiliara. No ano de 1945, se apresentariam na Rádio Cruzeiro do Sul e logo seriam contratados da emissora. Viajariam pelo Brasil com bem sucedidas apresentações, enquanto buscavam aperfeiçoar o conhecimento musical e desenvolver o talento artístico. Iniciaram desse modo a carreira exitosa que os levaria, em 1957, a outros países latino-americanos, quais Argentina, Venezuela e México, até visitar os Estados Unidos, aonde regressariam em 1960 e galgariam as paradas de sucesso.

Estudavam com afinco tanto música erudita, quanto música popular. Natalício (Nato) se dedicou à técnica do solo; Antenor voltou-se à harmonia. Incluíram no repertório obras dos compositores reconhecidos, Bach, Albeniz, Villa Lobos, etc., que, somados aos clássicos do cancioneiro das Américas, lhes dotariam de fina habilidade e rigor instrumental. Ganhariam a mais justa fama e respeitabilidade entre os nomes principais da história musical brasileira, respeitáveis representantes que foram do que há de melhor entre seus grandes intérpretes.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Novas histórias de Seu Lunga

Exemplo nordestino de tolerância zero, Seu Lunga chegou ao balcão de uma oficina de motores carregando nas mãos a bomba de água da sua residência. Antes de qualquer abordagem do freguês, o funcionário acha logo de  perguntar:

- Sim, Seu Lunga, trouxe a bomba da cisterna para fazer o conserto?!

De cenho grave, o sertanejo nem deixa esfriar a indagação antecipada e retribuiu em cima da bucha:

- Não, não, nada de conserto. É que a bichinha estava se sentindo muito só e eu trouxe pra ela dar um volta na cidade.

...

Noutra ocasião, na Rodoviária de Juazeiro do Norte, já instalado em ônibus rumo a Fortaleza, quando entra cidadão apressado à busca de localizar a poltrona que adquirira, e vê lugar vazio bem ao lado de Lunga. Reconheceu o comerciante e perguntou:

- Tem alguém sentado aqui, Seu Lunga?

O tradicional personagem nem levantou a vista e revidou:

- Se tiver alguém aí eu estou ficando cego, porque não vejo ninguém nessa cadeira – e nisso fechou de vez a cara diante do recém chegado.

...

Ao chegar numa oficina mecânica na intenção de reparar algum defeito no carro e após descrever o desempenho do veículo da sua propriedade, Lunga ouviu do profissional a indagação que mexeu com os brios:

- E o desempenho do motor, seu carro tem algum barulho estranho? Ele ronca?

Nessa hora é quando lhe reviram as químicas orgânicas, respondendo com naturalidade:

- Se ele ronca eu sei, nunca ouvi, pois enquanto ele dorme na garagem eu fico lá no quarto dentro da casa, longe que nem escuto nada nada lá fora.

...

O célebre personagem do anedotário caririense encontrou amigo numa das ruas de Juazeiro, e esse que quis saber mais do seu passado mais recente:

- E aí, Lunga, por onde o senhor anda esses tempos? Dessa vez demorei a lhe rever...

- Eu? Ando só pelo chão mesmo, pois até agora não aprendi a voar, nem pretendo! 

Mundo vulgar

Onde tudo virou peça descartável e as pessoas já andam desconfiadas de que há dúvida não resolvida nas entranhas dos problemas. As instituições arrastam as patas no lodaçal das notícias diárias. Líderes, o que era bom e necessário, passaram aos investidores de bolsa quais outros quaisquer. A satisfação da existência neste chão pede transformações urgentes. Espécie de mal estar de civilização obsoleta, correr de quê e pra onde pouco importa. Cólica, preguiça de viver, parecer querer dominar a boca do estômago dessas quadras bicudas, cinzentas.


Esse humor anda nas ruas, nas largas avenidas de oito pistas, nos carros climatizados e lentos, presos aos enxames do asfalto. Nisso, as televisões controlam a massa humana de olhos fundos e bocas amargas. Assustariam mesmo os profetas que disseram que o mundo chegou a isso, emenda pior que o soneto, e muito.

Bom, mas o que interessa de verdade são as respostas siderais desse drama localizado no Planeta Azul que rola no firmamento longe de compreender a que se destina.

Querer as soluções significa pedido inevitável perante a fome desleixada dos políticos e outros donatários do poder temporal. Ninguém quer a responsabilidade que lhe cabe e buscou no contexto das massas. Clamor de indivíduos românticos isolados em grupos e ilhas, nas chamadas redes sociais, ganham corpo, contudo semelhantes a ídolos de filmes antigos. Por vezes até que aventuram sair nas praças, pintar a cara e carregar panfletos e faixas, agitar e crescer, e logo somem nos dias seguintes.

Reino da idolatria essa fase mercantil, os seres andam pelos shoppings de olhos vermelhos, assustados, explodem nos shows de rock e ocupam as academias de fisioculturismo, entretanto presos de desejos e guardados sob as nuvens que passam lá no céu à espera das chuvas. 

Quem quer fazer diferente a deve mergulhar nas entranhas da Besta e reviver na pele da alma os sonhos dos lendários da luz em volta das fogueiras acesas em luas da imaginação adormecida. As máquinas venceram e, agora, somos seres livres.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Vontade soberana do Poder

Diante desse projeto onde importa cumprir a determinação soberana do Desconhecido, que demonstra a todo instante que pode suficiente a realizar aquilo que se dispõe, na face da Natureza, sim, diante disso, do cumprimento desse projeto no qual tudo e todos estamos inseridos, há que ver (revelar a si) o papel dos indivíduos que também somos nós.

Num mar de três aspectos, o Criador, o ser inteligente e o resultado negativo, ou positivo, de tais funções, renasce forte a lembrança da trilogia básica das religiões, das filosofias e da ciência. Brahma, Vishnu e Shiva. Pai, Filho e Espírito Santo. Tese, Antítese e Síntese. Próton, Elétron e Nêutron.

Aonde correr, e dá de cara consigo mesmo, face a face com o Universo infinito e lúcido amém. Escamotear de nada significaria, portanto. Mar descomunal de fenômenos e nós dentro dele a surtir os efeitos de nossos instintos, pensamentos e atitudes. Correr de onde e para onde? Só um silêncio abissal de horas incansável do processo vida responderá, e os frutos das sementes que plantamos, na resposta incessante da Lei.

Essa forma de agir e demonstrar firme a que grau transformamos experiência em realidade, flores em produtos. Tua alma, tua palma, diz o povo. E que instrumento utilizar, pois. Com qual levedura multiplicarmos os pães da sorte, com qual fermento revisitarmos os mistérios e os milagres?

Esse ser tão esdrúxulo, egocêntrico, por vezes invejoso, ganancioso, petulante, a revelar rosto no fundo das cavernas deste mundo, espelhos de tantas e bizarras condições... Qual a vontade que usar ao vender a alma que nem era sua no mercado da ambição? A vontade dos demônios, ou a vontade dos deuses? Doce amargura deixar as fornicações imprevidentes e receber o galardão das almas fiéis?!

Algo semelhante à linguagem dos profetas desvairados, entretanto refletida nas artes egoístas dos condenados às galés destes tempos sombrios dos que buscam a Salvação já prometida aos justos.

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Aguentar sofrer

Por si só somos a Eternidade... E pensar nisso é mera ilusão. Sustentar esses padrões de continuidade diante dos impasses de sentido nas peças que caem constantes das prateleiras da sorte, e sorrir definitivamente de olhos acesos na real felicidade, dia após dia, hora após hora de prêmios acumulados. Seguir na marcha batida dos condenados, porém soltos ao vento do prazer quais atores dos improvisos. Achar que levou a melhor durante o cerimonial da morte dos outros enquanto não chegava a própria morte, enganados de curto prazo a responder aos mesmos relatórios das casas de detenção.

Uns vestem as túnicas de sacerdotes, mestres do ritual da prestação de contas. Outros manuseiam os instrumentos de prolongar o desejo de pretensos contemplados na loteria do futuro que nunca virá vez que tudo é hoje e pronto. Mas, no fundo, bem no fundo, todos trajando os véus da ingenuidade artificial. Acreditam andar fora do sofrimento, que, no dizer de uma cigana, seja apenas aprendizado. Descobrir a porta de saída que permite sair os atores e tomarem café na praça esperando o momento de também serem executados na roleta da feira.

Se eu não aprender dessa vez não aprendo nunca mais, mas aprendo sim, porque logo na frente há um pelotão de fuzilamento aguardando a chegada dos retardatários, daqueles que se imaginam isentos de topar face a face com o drama das praças de execução. Porquanto o Universo inteiro gargalha nas nuvens da precisão dos mortais de lá desenvolver a decantada realização da paz nos corações.

Serão noites e noites de angústia, música, expectativa de tranquilidade no âmbito aberto dos sentimentos, vida longa aos seres que esperam localizar o milênio da paz na caverna dos encantos. Todos vêm e vão, vão e vêm, função espontânea das camas e muitas vidas sucessivas, à busca de cumprir o roteiro feliz da jornada em ritmo de silêncio e justiça para sempre.

(Ilustração: Pieter Bruegel, o Velho).

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Consciência da unidade

Quero falar nisso, da integração com o todo, fugir das divisões e dos limites que em tudo impõe distinguir os objetos. Enquanto que há integração absoluta em vigor. Os limites sendo, pois, a preocupação de dividir para reinar. Fazer de conta que sabe onde termina e recolher o que sobrar nos cofres da ambição. Limitar, o nome já vem dizendo. Inclusive a que se limita. Quando, em verdade, existe tão só integração e nada mais. Achamo-nos prisioneiros do tempo e do espaço, durante o tanto de aguentar que assim seja. 

Mas persiste um conceito místico de que o momento é para sempre, eterno e puro. Um todo absoluto em tudo. Restará, no entanto, revelar a si este perceber. Mais do que uma entrega, descobrir o valor do presente que representa a principal descoberta das existências perdidas lá atrás. Conhecer a nós mesmos de dentro pra fora e agora. Trabalho de gigante, eis a porta da salvação dos incidentes de vida e morte. 

É isto unidade. Adquirir o poder de dominar o instante e mergulhar de corpo e alma o mistério do instante, única comunhão na diversidade através da percepção individual. Vêm daí os nomes em que falam as escolas, as religiões. O Espírito Santo, a Realização do Ser, a descoberta do Si Mesmo, a Iluminação, a Salvação, etc. Noutro sentido, a totalização do processo vida em todas as horas.

E obter a consciência no aqui e agora, que perfazem juntos, e sem nome, a resposta às perguntas principais. O segredo mora no íntimo das criaturas. A luz rasgará as trevas da impossibilidade de conquistar a paz que projeta no desespero as ilusões. Dos redutos bem interiores da pessoa nascem os superheróis das sonhadas ficções, santos, conquistadores e líderes de continuar a experiência eterna do Ser. 

Conquanto submissos, desativaremos os juízos à luz da esperança da mais recente felicidade em nós mesmos, os mocinhos da história. Noutras palavras: Não há passado, não há futuro; vivemos um eterno presente.

(Ilustração: Hieronymus Bosch).

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Duas dimensões e uma só realidade

Quanta divisão nesse mundo de tantas guerras. Pronde se vira, alguém espreita a vitória pelas armas sobre todo mundo. Ninguém quer ser do tamanho que tem. Quantos equívocos à procura da paz sonhada. Tudo, porém, fruto da mesma realidade. Uns veem de um jeito diferente do jeito que outros veem, e tome rock pauleira nos ouvidos desavisados, nas matas virgens, nos rios e mares. São os frutos do pomar da ingratidão desse bicho homem, disposto a mandar no sítio que não conhecem ainda e destruir em nome da dominação, da ganância. Nem importa o custo que acarreta, querem prevalecer.

Bom, mas pretendo nisso encontrar a outra dimensão, bem diferente dessa, no entanto presa a tais vinculações. Aqui do lado, ligada nessas vacilações dos mandachuvas, existe outro aspecto. Menos egoísta, menos agressivo. Equilibrar o barco, pedir clemência e viver a felicidade... Largar de fora o desejo só do prazer e cuidar do que seja proporcional à largura dos passos. O ego, também de dentro da pessoa humana, merece o seu lugar, contudo posto nas horas certas da virtude. Um ego virtuoso, hegemônico, feliz. Dizem os místicos que ele, o ego, é ótimo servo, entretanto péssimo senhor. Exatamente o contrário do Eu espiritual, a seu turno ótimo senhor e péssimo servo.

Esquecêssemos a cólica infeliz do prazer desordenado, e acharíamos, logo ali na primeira esquina, os motivos da esperança dos dias melhores de que falam desde o Paraíso. Víssemos o gosto de viver com sabedoria, e teríamos há tempos edificado o grande edifício da realização do Ser por meio da fraternidade e justiça social.

Será assim, então, produzir o próprio universo das luzes nascido da alma da gente. Desvendar o painel das certezas de que andaremos na estrada perfeita, à medida dos princípios e valores da boa vizinhança. Apenas estirar as mãos aonde existe realidade, e surgirá espontâneo o sonho explícito de justa proporção e amabilidade sem fim.

(Ilustração: Vicent van Gogh).

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Os segredos do caminho

Em vista de serem indivíduos, todos têm um lugar seu. A proclamada solidão envolve tudo. Os lugares são dela preenchidos. Ainda que em grupo, o indivíduo anda só, vive só, ao crivo das próprias impressões de viagem. Trabalha, por vezes, no sentido de transformar o intransformável. Quer a todo custo alimentar o sonho de expandir o espaço aos outros espaços, ânsia incontida do desejo. 


Mas o caminho, mesmo solitário, engloba todos os caminhos. A presença do ser dispõe desse poder, de expandir ao infinito a individualidade através do sentimento de pertencer ao grande todo. 

E nisso o que era solidão passa a envolver o Universo inteiro em si. Esta a potencialidade do ser, energia inteligente, dotada de consciência, fator agregador de todos os sistemas em única individualidade. Eis a razão de tudo, o motivo da existência de tantas consciências, plural em missão de singular. 

Desse jeito, a dor da solidão ganha sublimidade dentro da alma das criaturas e as cores regressam à origem. A claridade do amor soma os movimentos em movimento de luz e refaz a Criação na razão indivisível da Paz. Será de tal forma que estabelecerá a ordem no caos e a luz nas trevas. Desde a isolada compreensão individual nascerá o poder de aclamar a intensidade da solidão através na tranquilidade dos corações que a tudo regem.

Importa, sim, quando outros, até nos lugares mais distantes, tal agora no Oriente Médio os habitantes da Síria, que sofrem e tocam a nós mesmos de dores atrozes desse parto de sofrimento. O parto dos novos dias significa a massa enorme de experiências que machucam esse mundo por vezes hostil há de libertar o espírito santo da pureza humana e apresentar dias de harmonia e felicidade, ainda que a violência exija atitude atual e prudência.

domingo, 8 de janeiro de 2017

Tempo de alegria

Os exemplos da natureza falam às portas da existência. Aonde seguir, haverá as cores, a brisa suave das manhãs, formas e vida em movimento. Sons de pássaros que harmonizam o silêncio dos instantes. Árvores, água e liberdade nas nuvens do céu imenso, a indicar presença de equilíbrio e perfeição. 

Conquanto dizer sinais da continuidade nas luzes dos dias, e tons indicam sentimentos bons, verdadeiros, diversos das atitudes ainda equivocadas de seres que apenas perseguem um jeito de felicidade, mas trabalham duro e rendem pouco, uma vez alimentar as vaidades humanas.

No entanto a tônica dos elementos vitais determina fórmulas de ativar os sistemas e notar o crivo da felicidade. Por que sofrer sem transcender, sem crescer e superar? Animar e abraçar o mistério de vencer as circunstâncias difíceis, eis assim a sabedoria na prática do bem. Lembrar nós próprios e contar no espaço infinito com a revelação das horas amargas em pomos plenos da melhor tranquilidade.

Obedecer, soberano, pois, as modificações positivas, providenciar as trilhas amenas onde possamos chegar aos reinos encantados da percepção ideal. Ativar as funções da própria matéria no sentido de responder aos desafios com afirmações inteligentes. Trazer aos horizontes das manhãs iluminadas os resultados da paz e da fraternidade, campos vastos de amor e luz.

A responsabilidade nisso de acertar os passos no caminho de construir alegria através dos tempos significa ações distantes das práticas equivocadas do egoísmo. Aceite viver em sintonia com o eterno e verá as consequências benfazejas que sobreviverão a tudo e todos, e ofereça meios necessários a concretizar os desejos sadios da esperança. Abrace o direito à plena realização do Ser, razão principal das motivações universas, e desfrute da sensação do dever cumprido. Cabe só a si obter êxito neste ponto vital.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Das funções da literatura

Cabem algumas considerações quanto ao valor das palavras no lado prático dos acontecimentos. Notar a importância das verdades filosóficas ora utilizadas em profusão pelos meios eletrônicos nas redes sociais. Reaviver os escritores em recortes curtos, e que alimentam o dia a dia em forma de mensagens. Quem diria regressassem de forma tão objetiva?!  Vemos nomes quais Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Cora Coralina, Mário Quintana, Carl Jung, Sigmund Freud, Franz Kafka, Machado de Assis, Chico Xavier, Rubem Braga, Patativa do Assaré, Oscar Wilde, Gandhi, Manuel Bandeira, Leon Tostói, Darcy Ribeiro, Luther King, isto falando também nos versículos bíblicos, livros religiosos, filosóficos, e muitas e muitas atualizações.


Numa fase de tempo restrito ao essencial, os autores apresentam normas que aprenderam no decorrer das dificuldades. Agora alumiam as consciências através de interpretações frontais do que viveram e produziram. Bem que talvez nem imaginassem épocas de tanta carência de pensadores lúcidos, quando todos correm pela sobrevivência e exercitam resistir diante dos embates contemporâneos. 

Mas a arte humaniza, diviniza... A fim de neutralizar a frieza dos dias, calha bem ler e ouvir, publicar, compartilhar, acrescentar a uma imagem as palavras ditas com sabedoria imensa lá no passado distante. Bem poética, prosaico, transmitir aos amigos e conhecidos o jeito de ver o mundo de investigadores da alma que permaneceram na cultura e agora realimentam os sonhos dos dias atuais. Gosto renovado de haver escrito com amor e realizado os dons que possuíram.

Aos nos deparar com esses nomes consagrados pela beleza da fala, vindos de lugares os mais diversos, nosso cotidiano traz familiaridade e paz inestimável de atravessar as horas cinza e incertas. Bom contar sempre do nosso lado com a herança das letras, a indicar o que oferece a criação literária. Eis o quanto eles, os escritores, já sabiam do quando reserva a sensibilidade em obras para sempre eternas, no amor continuado. 

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Mundo de dentro

Moramos do lado de cá, onde, na verdade, é que tudo acontece, e disso pouco se sabe. Sabe nos sonhos, mas deles esquece logo cedo. Ficam
as emoções deixadas, escondidas em seguida ao despertar. Quase em tom de traquinice, esquecemos os sonhos. Ou eles nos esquecem, feitos saltimbancos brincalhões que só regressam nas noites seguintes. Trarão de volta a logística de pregar novas peças. A gente tem certeza que viu a luz dobrar as esquinas, mas luta de lembrar, e raramente vence o esquecimento. Ainda assim, ficam as sensações, os sinais, avisos. Quando bons, melhor. 

Esse Inconsciente consciente mora conosco, vive as 24 horas conosco, no entanto nós não dominamos suas histórias. Elas nascem, crescem, nos levam aos lugares, contudo dominam e não as dominamos. A frustração do sensacionalismo vem disso, da ausência de concretização desse domínio sonhado que pertence a outro, ao desenrolar dos acontecimentos. Nossa parcela é mínima de participação. Quais folhas ao vento, vencemos as etapas do desconhecimento e contamos peças que sobram de cada momento, as imagens do sonho da existência. Cavaleiros andantes, aventureiros da sorte, andarilhos da solidão, aqui tangemos o rebanho das horas. Heróis da busca incessante de realização pessoal, vivemos, habitamos o todo invisível.

Porém um mundo envolve o mundo visível, e vem dele o quanto acontece em volta. Tantas vezes olhamos a paisagem, e sabemos ser apenas a aparência do que na verdade se desenvolve no íntimo do mistério. Somos, pois, atores de peças de que nem conhecemos o enredo, o texto, o diretor, e encenamos num teatro que enche e esvazia à medida do tempo. Vem e vão as gerações, e com elas os momentos. 

Quais testemunhas da realidade abstrata das abstrações, sem dela conhecer ou dominar, participamos ativos das somas finais de Tudo, parceiros da construção das maravilhas do Infinito.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Irmã Santinha

Todos na cidade conheciam Irmã Santinha, guardando dela as melhores impressões, dado suceder que o nome fazia a mais correta justiça à religiosa, de conduta irrepreensível e total dedicação aos pobres, sempre disponível a quem lhe viesse pedir conselho ou reclamasse a sua caridade. Era voz geral que existindo Céu a amável freirinha lá possuiria lugar garantido.

Aconteceu, nesse tempo, que veio à presença da freira um dos homens mais ricos do lugar em busca de orientação. Noivo de bela e prendada jovem, precisava, no entanto, para decidir as núpcias, ouvir alguma conselho.

- Irmã, gosto muito da minha noiva. Ainda assim não tenho certeza de sua integridade, - esclareceu com reserva o interessado. - Por isso vim saber da senhora, pessoa virtuosa e boa, se aquela com quem pretendo casar é mesmo virgem, como tem me assegurado.

Após minutos de recolhimento, a Irmã lhe respondeu que a noiva podia ser ou podia não ser virgem.

O noivo retirou-se e pegou a matutar no que ouvira, interpretando que a religiosa dera aquela resposta evasiva por deduzir que ele não tivesse condições emocionais de ouvir de frente toda a verdade, concluindo não ser mais virgem a mulher de seus sonhos, condição inarredável para esperadas núpcias. Em face disso, contrafeito, rompeu o noivado, vendeu todo seu patrimônio e resolveu sair pelo mundo. Antes, porém, reservou uma parte dos recursos arrecadados e depositou nas mãos da Irmã Santinha.

Muitos anos se passaram. Uma década ou mais depois, o homem, enfastiado de vagar sem destino, retorna à povoação para rever antigos conhecidos. Foi, então, que soube da morte da Irmã Santinha, ocorrida há pouco tempo. De imediato, lembrou-se do dinheiro que com ela deixara e procurou o padre responsável pela freguesia no sentido de saber como agir naquela situação. O pároco desconhecia o assunto, mas sugeriu que a melhor solução seria procurar falar com a própria freira no mundo invisível:

- O senhor vai meia noite à porta da igreja e chama a chama em voz alta. Daí saberá as notícias do que pretende - afirmou.

Meia noite, na porta da igreja ouviram-se os gritos insistentes e repetidos daquele homem: - Irmã Santinha, Irmã Santinha. E ninguém lhe atendeu.

Logo cedo, no outro dia, de novo o sacerdote a receber o ex-noivo querendo ajuda para localizar a freira.

- Mas o senhor não conseguiu falar com Irmã Santinha no Céu? - admirou-se o padre. E contrafeito disse: - Pois meia noite vá ao cemitério e, de novo, faça o mesmo, em frente do portão principal, que ela deverá vir à sua procura.

Outra vez os mesmos gritos e nada... De volta ao padre, este ficou ainda mais admirado de a freira não se achar nem no Purgatório, segundo suas palavras. 

- Bom, desta vez o senhor terá o que procura - informou. - Vá meia noite à porta do mercado e chame por ela, que será respondido, porque nesse local se comunicam aqueles que vivem no Inferno, único canto que resta procurar.

Assim se deu. Uma pequena demora sucedendo aos gritos e uma voz distante a se aproximar correspondeu ao chamamento pela Irmã Santinha. Voz fanhosa, tristonha, disse onde se achava guardado o dinheiro, numa laje solta que havia sob a cama do quarto onde a freira dormia.

O homem tratou de demonstrar o seu reconhecimento pela honestidade e preocupou em saber do motivo dela ter ficado em lugar tão degradado, posto que vivera vida cheia de gestos de pura bondade.

A freira escutou sensibilizada a pergunta e demonstrando profunda infelicidade acrescentou:

- Lembra o senhor de uma consulta que me fez a propósito da virgindade da pessoa com quem, certa feita, esteve noivo? Eu não guardava a certeza da resposta e respondi com insegurança. Resultado, como a sua interpretação errada precipitou os acontecimentos e terminou prejudicando a moça, ela, de desgosto, caiu na prostituição e morreu anos depois vítima das doenças do mundo.  Quando soube disso, era tarde demais e tenho agora, para reparar o dano causado, de suportar as calandras do remorso nesse buraco perdido.

Em seguida, silêncio maduro comprimiu a noite. Cedo da manhã, o homem localizou, no ponto determinado, integral, a quantia que deixara nas mãos da freira. Num gesto de gratidão, buscou a igreja e depôs boa parte do dinheiro no cofre das almas, ocasião em que agradeceu e se despediu do padre. Gesto contínuo, sem mais demora, partiu indo embora pela estrada aonde viera. 


(Conta popular que ouvi de Manoel Ferreira da Silva (Manu).

As portas do abismo

Viver é responder desafios, sendo esses ainda mais sofisticados nos dias de hoje, desde doenças transmissíveis até desigualdades sociais nos lances da violência urbana. Originários da ausência de formação moral, índices de crescente agressividade e utilização indiscriminada de substâncias preocupam sobremodo.

Neste ponto, exageros se apresentam com tamanha dominação que muitos se deixam abandonar diante das armadilhas, quais meros escravos da destruição: crack, cocaína, maconha, nicotina, álcool, etc.

O senso crítico bem que pode prevenir desde a infância os jovens no dispor de estrutura para superar o sugadouro em que se transformou o mundo, tendo ao comando o entretenimento e os meios destruidores da comunicação de massa, espécies de tóxico permitido à luz do dia. Força inimaginável, instrumentos do desequilíbrio, esse outro tipo de droga quase sempre usa modos equivocados para vender o sensacionalismo, tolerados que são, acima de qualquer suspeita.

Dizíamos os jovens que têm de descobrir desde cedo como criar a firmeza de atravessar o pântano das chamas, independentes da opinião de terceiros, pois a peleja é, na verdade, missão individual.  O juízo, sim, peça chave do equilíbrio para cumprir a realização pessoal.

Quando sabem agir, fruta rara, os moços exercitam a superioridade no embalo de todos esses fatores adversos. Põem-se a par dos valores da lucidez e constroem um sonho novo, a esperança dos tempos futuros.

Contudo, nem sempre possuem as condições de vencer o mar tormentoso das tentações, porém devem fazê-lo, custe o que custar de sacrifício, em favor da própria sobrevivência. 

Avaliemos com carinho essa perspectiva de manter a sobriedade e veremos como as reservas obtidas serão suficientes. Só então se perceberá o quanto de sabedoria existe nos mistérios da Natureza.

aOs moços abrem seus olhos devagar, que devem saber de sobra o quanto de risco há neste chão. Sonhos, porém de olhos bem abertos. 

O lado da sombra

Quem vive corre perigo. Por mais se ache acima do bem e do mal, mora tão só um dedo abaixo dos riscos deste mundo frágil. Guarda as proporções até quando reage do jeito menos previsto, e mete os pés pelas mãos, e mata, e morre. Verniz de pudor e perfeição, diante das provocações, aí descobre o quanto guardava dos velhos trastes imundos de antigamente no peito de sete chaves. São as guerras, os embates cruciais nas noites de angústia dos guardiões da luz. Vilões da sombra, entram em cena e mordem agressivos os mocinhos da normalidade democrática e detonam chacinas, vulcões e circunstâncias. Mocinhas honestas, honradas, bem comportadas, restam desnudas sujeitas a tribunais de línguas sujas, quais livres antes fossem de todas as contradições. 


Pudessem apenas mudar, e pronto viveriam mar de felicidade. Porém circunscrevem variações sem conta no decorrer das idades. Diversas fases da divindade pessoal significam, pois, aprendizados constantes, vez que a sombra ocupa o outro lado de si mesmo, vizinha de quarto e parceira de cama dos mortais. A sombra de vez em quando põe de fora as garras e fere o paladino da paz, um herói bem quisto, isento de qualquer suspeita, porém objeto de iguais limitações. Ninguém conhece ninguém, nem a si próprio.

A sombra, esse lado escuro da realidade interna das criaturas, repousa calada no colo das primeiras damas e representa o tratado de boa convivência dos céus na amabilidade dos humanos. Enrosca a cauda, no entanto, no cerne da individualidade, porquanto raros, eles, os santos, resolvem confrontar o tentador do alto das torres dos templos, e postular lugares sagrados no astral da bondade absoluta. Raros, raríssimos, os santos, saem vitoriosos.

Contudo ora desliza o comboio da claridade ao sabor dos mortais que somos. Transcorre bem aqui de junto o trilho da virtude, neste mar das oportunidades. Quem dá mais, quem dá mais: a sombra ou a luz? Quem dos dois há de vencer o temporal das horas certas desta geração?!

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

As vozes de dentro

Por mais que achemos ser a vida só lá fora, torrentes de pensamentos e sentimentos mexem por dentro a todo instante, milhões todo dia. Aonde se virar, multidões de novos interesses exigem que sigamos caminhos por vezes difíceis, doutras menos graves. De comum, são eles que dominam invés de lhes dominar. 

Nesse procedimento de constante atividade, surgem ideias, notícias da alma, contos, sonhos, necessidades, desejos e as paixões desenfreadas, voluptuosas, intranquilas ou verdadeiras. Apegos, os apegos nas voragens desse chão. Pretensões inconfessáveis. Ânsias inalcançáveis. No que vamos limpando o teto da consciência e abrindo as clareiras de viver com sabedoria. Tranquiliza daqui, acalma dali, revisa dacolá, e o barco segue rumo da cachoeira dos dias.

As pessoas tocam de perto no trote das ações internas e recebem do jeito que puder o gesto dos demais, a ponto de Jean-Paul Sartre afirmar de boca cheira que o Inferno são os outros. Ao que direi: o Inferno e o Céu são os outros. Porquanto tanta maravilha na presença das pessoas do nosso lado. Quão gostoso quebrar a solidão dos momentos junto de quem amamos de plena felicidade. 

Felizes seriam esses de merecer a companhia de criaturas de bem com a vida. Obter na certeza a chance única de merecer o bem que planta no modo intenso da alegria que possa causar a que esteja próximo. Um vulcão ativo da melhor felicidade, pois, contar presenças agradáveis, que gostem da gente de igual pra igual, nos teatros desse mundo.

A paisagem ilumina, o som virá música, as companhias enchem o horizonte de esperança e as horas transcorrem numa velocidade por demais surpreendente. Sílabas tônicas do sabor de leite e mel unir as falas às belezas das almas inteiras, dos que nos amem e nós os amemos. Isto feito eterno, eis a fonte inesgotável do bem verdadeiro.

O tempo da Eternidade

Há paz no olho do furacão. Pouco importa o movimento nas extremidades, vez habitar suavidade imperecível bem no íntimo das contradições, ali onde sobrevive a esperança dos dias melhores. Observar, pois, as bordas da boca e controlar o que ingere e dominar as palavras que nelas passam. Porquanto viver é preciso saber. Mas ouvir importa tanto quanto refletir, apresentar o colo da inspiração ao sabor das madrugadas de frio e alegria dos lençóis quentinhos. 

Isso de aperrear e querer falar os nomes, os outros, de insistir revisar o firmamento, parece motivo de cobração dos descontroles, fofoca, fuxico, falsidade. Querer mandar nos outros sem mandar em si, apontar defeitos e fustigar as revisões quais perfeitos sendo, no entanto dos nos entantos quais

o quê, sujeitos de miolo mole, mudar o mundo e não mudar primeiro a si próprio, até quando sei lá não sei, vales inúteis. Olhar pra dentro e achar que espera nas curvas do caminho só na intenção de achar defeito, valha-me Deus, meu São João.

Novas luas preparam o céu às novas aventuras do tempo, que dorme na barriga da mãe Eternidade que não passa, quem passa é a gente nos ponteiros impacientes dos relógios, moleques apressados de mostrar a que vieram, e nós não. Ela, Dona Eternidade, a seu modo, observa calada o destrupiço dessa gente agoniada de vender e lucrar, a fim de correr caminhos e fazer poluição. 

Dois ou mais ainda é pouco na velocidade dos ventos que varrem a sola dos pés. Os passantes ansiosos sabem pouco de quase nada, e desesperam nas horas que caem todo tempo. O tempo, esse senhor da razão, que nem explica tanta preguiça de viver que comprime o peito dos orgulhosos. E deixa que pratiquem o desejo, depois vem buscar os atrasados. 

Ah, tempo filho da Eternidade mãe de tudo quanto... 

Há paz no olho do furacão.