domingo, 28 de abril de 2013

Sociedade enferma


Nalgumas rápidas observações, medidas proporcionais a esses textos curtos da atualidade, na velocidade dos meios que se suporta, ninguém quer ler páginas longas, há que se falar qualquer palavra na sanidade mental da raça humana da qual fazemos parte principal, todos e todos.

Nós, comuns observadores da hora, talvez imaginemos algo a propósito da regularidade psíquica dos que agem vagando neste chão. Ainda não existe medida certa de sanidade mental que atenda aos sadios. Milhares, milhões, que trocam olhares, buzinadas, telefonemas; sob as diversas embalagens físicas, descem e sobem escadas de altos edifícios, aviões, ônibus; confabulam pelos cantos de bares, lanchonetes, inferninhos; enchem estádios, vaquejadas, templos; anônimos passageiros das barcas do Destino; e circulam soltos nas malhas dos acontecimentos, abelhas das colmeias oficiais.

E filmes que rolam nas telas das tevês ali retratam bem o quadro clínico da velha humanidade que caminha a passos lentos ao desconhecido. Os sintomas de febre coletiva demonstram as temperaturas dos canos das armas automáticas. As bailarinas agitadas dos programas da noite oferecem ilusão a preço módico. Penitenciárias de antigos filmes americanos, lixos industriais de décadas passadas, apontam as grades da prisão cotidiana entre arames eletrificados e latarias de automóveis engarrafados na liberdade artificial das avenidas iluminadas a velas.

Heróis atuais confundem os vilões julgados e nunca detidos de mídia política impaciente de artimanhas sensacionalistas que preencham os roteiros da programação sucessiva. Sem falar nas guerras programadas pelos pregões das bolsas de valores, mercados ora conquistados a exércitos e armas coloridas.

Enquanto multidões deliram ao som estridente de bandas frenéticas alucinadas ao peso dos eletrônicos de sucata, agressivos e inúteis, longe de ritmo, melodia e qualidade.

Porém vem de longe, das priscas eras da pré-histórica, nas sociedades tribais e nas escuras cavernas, bichos de gosto duvidoso que resolveram abriu os olhos ao Sol. Andam, por isso, arrastando as patas pelos desertos da consciência, na procura insistente da salvação do Reino.

Querer, assim, normalidade nos outros pesa um tanto, quando somos tripulantes do mesmo barco nas ondas de depois. 

sábado, 27 de abril de 2013

A Terra é nossa casa


A Terra se povoa como a macieira dá maçãs. As pessoas são produzidas da Terra como as maçãs das macieiras. Alan Watts

Como a denominação citada acima, A Terra é nossa casa, o cantor e compositor pernambucano Nando Cordel produziu, em dois volumes, essas dez historinhas educativas, material didático de boa qualidade.  Além dos cadernos coloridos, há dois CDs que compõem a edição ilustrada por Carlos Pinto, num projeto gráfico da Clã Comunicação.

Esses volumes trazem temas diversos, desde Escovar os dentes, Não chame palavrão, Agradecendo ao Criador, até vertentes doutrinárias qual A Paz, Respeite as pessoas, Respeite a Natureza, Drogas, Seja humilde, dentre outros importantes para vir ao público a que se destinam, professores e alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental I.

O que nos causa espécie nesse elaborado trabalho, cujo projeto, criação, redação e música coube a Nando Cordel, fica por conta do cuidado na transmissão às gerações atuais das preocupações de ordem prática e orientação dos valores essenciais ao viver com arte e sabedoria. Extensão de considerada obra artística nos discos e palcos pelo Brasil afora, esses livrinhos de A Terra é nossa casa consolidam o empenho do autor em conscientizar quanto aos deveres que visem a preservação da espécie humana e manutenção da saúde deste mundo em que vivemos. Daí sua afirmação textual de que O Planeta é nossa Casa, a família somos todos nós. Só com atitude no bem podemos ser felizes de verdade, que consta da capa de ambos os livretos.

Diante, por isso, da coerência qual segue na missão esclarecedora que abraçou através da música e das apresentações que realiza, Nando Cordel agora lança mão do instrumento permanente e prático do livro, no intuito de chegar aos educadores e propiciar meios de trabalhar ideias valiosas na formação dos nossos jovens, isto com a qualidade refinada que o caracteriza no decorrer de todo o sucesso de carreira já consagrada.

Aos que desejam adquirir a publicação informamos o contato de divulgação: Aconchego – Edições Musicais – fone: (81) 3361.5363; ou o endereço eletrônico do próprio artista: nando@nandocordel.com .br       

quinta-feira, 25 de abril de 2013

De lixos e tapetes


Será mesmo que aqueles de nós que andam às gargalhadas detrás dos vidros esfumaçados dessas naves prateadas, hermeticamente lacrados nas suas preocupações esclarecidas, imaginam andar nas nuvens acima do bem e do mal assim flanando indiferentes? Será mesmo que quando chegam aos pousos dormem a sono solto de virar noites longe das inquietações cotidianas e dos comentaristas dos programas policiais? Ou a frase restou longa a ponto de perder o sentido e abandonarem o texto antes de receber a carapuça?

E a sociedade a que pertence pertence a quem? A ninguém e a todos, quero imaginar. Os pedaços que sobrarem irão nutrir os cães dos senhores de governo, avalio, pois.

Outro título dessa matéria seria Cumplicidade indecorosa, ou Uma falsa cumplicidade, ou As avestruzes circulares...

Esse ranço folclórico é que hoje de manhã dei de cara com um pedinte jovem, preto, desgrenhado, largado, mal trajado, revoltado, e outros ados, porque as pessoas que lhe davam algum prato de comida haviam ouvido a língua de outros a que deixassem de fazer aquilo, que viciavam a pessoa, pois a família dele bem que podia custear seu sustento de mendigo pobre, e coisa e tal. Achava-se traído pela coletividade, que até então aceitou a condição dele pedir restos de comida e passar do jeito que a natureza dava oportunidade. Porém resolveu abandoná-lo de vez, que sua barriga (e mostrou a barriga quando levantou a camisa encardida) começara a reclamar. E agora a balança pareceu virar no sentido contrário... Que há cinco dias andava com fome, querendo a todo custo, um lenitivo de forrar a paz nas ruas onde anda livre, conformado.

Bom, o assunto é esse, apresentar o quadro qual tema do interesse e da participação de todos, até dos que fogem aos compromissos boêmios das religiões, sob o pretexto de cuidar dos afazeres, pagar impostos, manter a família, votar de dois em dois anos, guardando atenção às novelas, anestesias ausentes da realidade real, com história lá de longe via satélite.

Ainda assim caberá parcela importante nesse mar infinito, nas horas das pequenas lembranças siderais, de desenhos trançados com os fios de teias semelhantes a mistérios de mundos orientais. 

Coisa Nostra


Lá na Bahia, década de 70, estudava no Curso de Comunicação da Universidade Federal. Desde adolescente nutrira o gosto pela fotografia, e se apresentava a oportunidade ideal de aperfeiçoar meus conhecimentos no assunto. Dispunha de equipamento profissional, câmara Pentax SP1000 com algumas objetivas variáveis. Ainda que apreciasse o trato da escrita, em Salvador escrevi pouco, só o necessário a cumprir as tarefas da escola. O interesse maior ficou por conta da fotografia. Havia duas disciplinas específicas da área, Fotojornalismo I e II, às quais dediquei com ênfase constante atenção.

Andava sempre com a máquina a tiracolo e fotografava quase todo dia. Em 1975, o ano de mais produção, devo ter reunido por volta de 500 a 600 imagens, cenas de ruas, praças, festas de largo, praias, folguedos populares, com prioridade em preto e branco, o que eu mesmo revelava em casa, onde possui pequeno laboratório.

Outros dois colegas também participavam desse entusiasmo pela arte fotográfica, Dilton Mascarenhas e Fábio Camelo, amigos sempre próximos, a realizar projetos diversos, porém integrados no objetivo comum. Nisso promovemos juntos uma exposição de nossos trabalhos na Escola de Arquitetura e em nossa própria Escola.

Além dessas mostras, compúnhamos o quadro de fotógrafos de um jornal mensal alternativa, o Coisa Nostra, fundado por Nildão, cartunista, poeta e designer paraibano vivendo na Bahia, e outros, que nos disponibilizava na derradeira página a coluna denominada Sem Pose, aonde os três, em edições diferentes, chegamos a divulgar as produções individuais.

Na edição que me coube usei fotografia que obtive quando, em dia de atividades normais do comércio, saí com Luís, um dos repórteres do jornal, à cata de matéria. Inexistia pauta prevista. A foto deveria representar cena de rua. E caminhávamos nas imediações da Baixa do Sapateiro, quando espécie de pé-de-vento correu pelo o ar, criando clima inesperado, envolvendo o espaço parecido com os redemoinhos do Sertão, e envolveu mulato baiano próximo da gente, que, de olhos fechados e qual em transe, começou a rodopiar a cabeça no chão enquanto seus pés e pernas abraçavam um poste da rede elétrica. A primeira impressão era que quisesse escalar, daquele jeito, o poste, isso ainda girando no solo, espécie de carrapeta humana com as pernas já no alto.

Luís me avisou: - É agora!

Rápido armei a câmara e em poucos segundos obtive a cena fotográfica que depois seria utilizada na contracapa do jornal. 

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Somos o que praticamos


No frigir de tudo, nossa cara reflete em cheio aquilo que somos, livres, pois, de querer levar na conversa os demais membros do grupo, qual querer passar tangerina por melancia. Na fase das imagens de laboratório dos agoras industriais, a tradição dos atos pesa além de quaisquer detalhes, face de a realidade prevalecer antes do que a propaganda dourar diferente do que se é na essência. Sobram famosos de fancaria, isso de pessoas ou coisas sem autenticidade, tipos vendilhões que enganariam, caso possível, até as próprias consciências doloridas e as sombras que projetam nas noites silenciosas da injúria. Vitrines das latarias entulham corredores de fama dos trastes artificiais que enfeiam as telas de led desse mercado persa chinês de hoje.

Ainda assim, no entanto, na cara do protagonista, prevalecem os acontecimentos que produzem e plantam. Pois as bestas feras agem que nem besta fera, ainda que diante dos palcos mais sofisticados. Então pintam a fisionomia das tintas acrílicas caras, no entanto fora dos propósitos, porquanto desconfiam das atitudes pessoais, sem admitir que rezem na cartilha postiça do faz de conta.

Podem até escovar os dentes, usar perfume francês de qualidade, andar em limusines último tipo, trajar paletós trazidos de Miami, falar fino inglês, conquanto besta fera que entra e sai, e revela a natureza de besta fera logo conhecida dos outros, devido a insistência do rabo aparecer quando menos esperam.

O travo na língua pesa quando fingem exigir mágicas sofisticadas a fim de apresentar fisionomias que destruam a imagem que vem de dentro, das criaturas aquelas de espécie buliçosa, sempre disposta a vender gato por lebre da verdade que mora dentro. Corações de bichos cruéis espalhados nas veredas dos noticiários de plantão.

Esses dias mesmos, ih!, que dói de doer saber das histórias daquilo que acontece dentro das criaturas desse chão, nos tais corações endurecidos.

Aqui somos o que praticamos a todo instante, orgulhosos ou humildes, porém retratos fiéis que revelam que trazemos íntima personalidade inevitável.    

terça-feira, 23 de abril de 2013

A consciência alimentar


Na nossa civilização do lucro a qualquer preço, existe uma máquina, que funciona de carga toda, em busca e manutenção de consumidores alienados, aonde quer que cheguem, costume desenfreado que denominaram marketing, ou a ciência do mercado.

Essa prática fria explode e rasga os olhos em todo quadrante, por vezes não considerando os valores comezinhos da ética mais elementar.

Vender, vender, vender, eis a palavra de ordem, repetida até na exaustão, ou nas doenças e na morte dos desavisados compradores compulsivos, aqueles mesmos cidadãos comuns em demanda dos seus inalienáveis direitos à tortura.

No que concerne aos produtos próprios do lazer, a coisa passa dos mesmos limites e prejudica o bolso e o tempo gasto no seu uso. Porém quanto à alimentação cidadã, os danos crescem cada ano por dentro do organismo do freguês e consequências invadem o prazer da vida, e entornam o bem-estar, a saúde indispensável e o estrago se completa no desaparecimento do valor maior da existência.

Fala-se de boca cheia no conhecimento qual gênero de primeira necessidade, porque dele vem o discernimento, isto é, a capacidade administrativa de selecionar o que se precisa, no caso do alimento que nutrirá o corpo.

Escolher alimentos sadios, quais verduras sem agrotóxicos, lacticínios sem aditivos químicos, cereais integrais, açúcares menos tóxicos, frutas da estação, produtos não genéricos, e usá-los nas proporções ideais a se sentir nutrido longe da saturação, numa digestão certa, dar-se-á como hábitos fundamentais de saúde em corpo sempre disponível e livre de doenças. A prática médica pessoal e preventiva de primeira hora ausenta dos atropelos da obesidade, mal crônico, sobretudo nos países ricos e consumistas.

Portanto, inúmeros achaques físicos e psíquicos serão abafados logo no nascedouro, quando adotados mínimos cuidados alimentares, simples e corretos, enquanto estudos da ciência desenvolvem novas orientações saneadoras da fome industrial, em vigilância aos excessos da fome comercial que avassala meios de comunicação de massa em forma de publicidade enganadora.

A consciência alimentar, por isso, minimizará muitas dores nos que a adotam por método seletivo qual norma de boa conduta pessoal e maior sabedoria. Melhor prevenir do que só remediar.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Adelino Moreira


As fases da vida marcam a memória da gente com pessoas, coisas, sentimentos. Outras lembranças se formam sobre as que antes apareceram, desse modo gerando novas elaborações no tempo, em camadas por cima das anteriores, crescendo blocos de experiência, personalidade, conhecimento, valores, hábitos, saudade, muita saudade.

Consideramos essas avaliações para abordar um acontecimento verificado na semana que passou, quando, aos 84 anos, desapareceu Adelino Moreira, compositor da música brasileira responsável por grandes sucessos do gênero romântico do cancioneiro popular no Brasil.

Entre os anos 50 e 70, as rádios repetiam com freqüência músicas desse português, nascido no Porto, que com um ano a família trouxera para viver em Campo Grande, no Rio de Janeiro. Sem arroubos excessivos, confirmamos a sua posição de um dos principais autores da trilha sonora daquelas décadas.

Nesse período, nenhum bom amante, farrista, seresteiro, que se preze, esqueceu peças quais Fica comigo esta noite, A última seresta, A volta do boêmio, Deusa do asfalto, Meu dilema, Escultura, Meu vício é você, Flor do meu bairro e Negue, na interpretação de Nélson Gonçalves; somadas a Devolvi e Solidão, com Núbia Lafayette; e Cinderela, com Ângela Maria; isso para que citemos tão só as mais conhecidas do grande público.

Adelino Moreira iniciou-se na música tocando bandolim e depois guitarra portuguesa. Chegou a gravar seis discos na Continental, sob a produção de Braguinha. No ano de 1952, passou a se dedicar às composições que lhe consagraram dentre os autores destacados de sambas-canções e boleros de nossa música, início da vitoriosa parceria com Nélson, desfeita em 1964.

Ainda hoje existem pessoas que votam preferência incondicional à tradição desse estilo de arte desenvolvido com o surgimento do disco e do rádio, no decorrer do século que passou.

Ressalte-se, ainda, que as raízes de tal predileção esportiva também surgiram das transmissões radiofônicas, assuntos, por isso, que demonstram alguma afinidade. E dentro de uma época quando o Rio de Janeiro gerenciava a cultura de massa em nosso meio.

Desse modo, nomes significativos perpassam a história das gentes e, por vezes, caem no ostracismo das horas vagas, nesse mistério infinito da existência. Porém a gratidão sempre deverá permanecer no rol das virtudes mais nobres, além das consagrações oficiais. Nunca haverá saudade das coisas ruins. As lembranças agradáveis que chegam, permanecem na alma em forma de sonhos, melodias e eternas emoções. Artistas, quais artesões da esperança, participam dessa construção de futuro, nutrindo a beleza daquilo que justifica a continuação de tudo...      

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Fim e recomeço


Dentre as inúmeras narrativas budistas que falam na busca incessante da suprema realização do Ser empreendida através dos caminhos do mundo, uma existe que descreve com nitidez a longa peregrinação para encontrar a Verdade.

Desde bem jovem, devoto se pusera nas estradas da Índia querendo encontrar Sidarta Gautama, o Buda. Viajou anos seguidos com esse propósito, exposto às aventuras que oferece a vida nômade.

Em radiosa manhã, chegou ante as águas caudalosas do Rio Ganges necessitando de cruzá-lo, pois entre os viajantes se dizia que nas terras da outra margem o Santo reunia discípulos e ministrava o Conhecimento, toda razão da procura do incansável andarilho.

Depois de negociação demorada com o barqueiro a fim de atravessar o rio perante a cheia intensa, seguiu a pelejar nos riscos da embarcação nas águas pardacentas.

Já chegando a meio passo do trajeto, o religioso observou fardo escuro que ali boiava sobre as ondas revoltas do rio rumando na direção do barco.

Mediante a aproximação, notou surpreso o cadáver emborcado de um homem. Então  fez mais atento e procurou traços na figura sem vida, tendência natural dessas horas.

Ao desemborcar o corpo, inquietou-o ver no rosto do morto a sua própria fisionomia. Era de mais ninguém senão dele, portanto, o cadáver que, vagaroso, abandonado, descia no leito das águas onde navegavam!

Num instante, inesperada angústia lhe sacudiu as entranhas nisso de presenciar ele mesmo sem vida, enrijecido, inerme descendo naquela correnteza.

De imediato perdeu qualquer domínio sobre seus modos e, num berro monumental, deixou explodir tétrica e sonora gargalhada, que empalideceu de susto o barqueiro, pressupondo agora transportar passageiro sem juízo, perdido entre as fronteiras da lucidez ao desvario.

Em seguida, gesto semelhante, ambos se largaram no fundo da frágil embarcação, extáticos diante da cena, atitude em que demorariam longos minutos de torpor, sob o céu aberto de poucas e fumarentas nuvens de chuva.

Ao término da patética ocorrência, o monge vislumbrara no íntimo da alma que começava a encontrar de libertação com o Buda, o que viria a completar por inteiro ainda nas próximas horas, depois de pisar o solo firme da margem oposta e achar o recanto onde o Mestre transmitia seus ensinos magnânimos.

Em definitivo, nesse dia efetuara valiosos avanços na jornada espiritual para o Sempre.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

A reinvenção do real


Alimento um prazer largado de apreciar a literatura artesanal produzida à margem do circuito oficial dos livros industriais que enchem as prateleiras das livrarias. Esses livros despretensiosos nascidos silenciosos e que retratam a alma da gente, no afã de contar aventuras pessoais, retratos singelos dos que reagem forte ao anonimato pelas produções independentes, edições particulares, às vezes sem registro na Biblioteca Nacional. Para mim, eis neles a verdadeira literatura, a que forma as bases das obras clássicas dos gênios considerados nos concursos, recolhidos e prestigiados nas academias; neles a fonte original da excelência dos grupamentos humanos. Autores autênticos, tais escritores significam a carne viva dos percursos individuais saídos a lume nas caladas dos interiores e subúrbios.

Bom, essas emoções quis colher de mim após ler, agora recente, Caminhos e atalhos, do jornalista Luiz Carlos de Lima, o qual me ofertara desde novembro de 2011, ocasião de haver participado de seu programa Tribuna Livre, dele e de Vasques Landim, na Televisão Verde Vale, em Juazeiro do Norte.

Quanta satisfação a de percorrer as páginas de livro aparentemente passageiro, no entanto sincero até dizer basta naquilo de contar detalhes da história de vida de quem transita no rádio juazeirense de décadas, testemunha privilegiada dos momentos solenes deste setor rico de valores e realizações do nosso Cariri progressista. Uma escola de profissionais inesquecíveis da reportagem diária e do rádio esportivo, bem nos moldes da radiofonia mundial, meio quente de comunicação de largos méritos, na civilização contemporânea.

Textos geniais os pude divisar ao conhecer este que é o segundo livro de Luiz Carlos, já que antes publicara Surfando nas ondas do rádio, outra pérola de resgates insuperáveis.

Desde ensaios de cunho filosófico e psicológico, analisando tipos populares da Meca Caririense e da Região, as recordações da infância e da juventude, amigos, acontecimentos marcantes, memórias cotidianas, avaliações gerais quanto aos trâmites da atualidade, a incursões ao reino da ficção, transitando pela crítica social e política, nisso páginas felizes afloram do trabalho consistente do escritor.

Na intenção de situar textos nos quais identifiquei sabor próprio da obra Caminhos e atalhos, de Luiz Carlos de Lima, destacarei sobremodo alguns:  A nossa rua São Francisco, Cego também sonha, De volta para o futuro, Outras reminiscências e Um daqueles dias de cão, dignos de figurar nas antologias da melhor literatura caririense.

Enquanto isto, evidencio o senso de humor e leveza do estilo quais qualidades que caracterizam este autor, que reinventa com sobras tempos de nossa realidade guardadas no íntimo da costura das suas palavras.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Mister Frank Soules


Esse o nome de um americano que viveu em Crato na década de 60, pastor presbiteriano que foi meu professor de Inglês em curso que funcionava à noite no prédio da Escola Natanael Cortez, à Rua José Marrocos, acima da Estação Ferroviária e próxima da casa dos meus pais.

Era amigo de um amigo nosso, José Fernandes, pessoa ligada à minha família, o que permitiu minha aproximação desse missionário vindo de Chattanooga, cidade do estado americano do Tennessee. Conhecera também seus filhos Dale e Terry, o segundo, anos depois, desapareceria entre as baixas da Guerra do Vietnam. Dale colecionava selos, atividade que eu desenvolvia naquela fase da juventude. A minha escolha recaía nos selos estrangeiros já carimbados.

Visitei-os uma vez no Bairro do Pimenta, residência onde notei telas de naylon em todas as portas e janelas, a fim de evitar a presença de insetos, cuidados devidos aos trópicos, na mentalidade dos que chegam de outros países.

Essa família desempenhava o apostolado protestante no interior do Brasil. Era a época crítica que antecedia os anos da Revolução de 1964. Recordo quando, após uma das aulas, ao voltar para casa, encontrei meu pai de ouvido colado no rádio escutando os inflamados e tensos discursos do Comício da Central do Brasil, de trágica memória. João Goulart, Miguel Arraes, Francisco Julião, Lionel Brizola, definiriam os destinos da Pátria nas reações de consequências radicais.

Estudara a Língua Inglesa nalgumas outras ocasiões mais, do que guardei o suficiente para atender aos chamamentos dessas tecnologias dagora.

Transcorridos esses anos todos, cinco décadas, a lembrança desse religioso, que deixara sua terra querendo conquistar fiéis e amigos noutros lugares, se configura de modo atual. Magro, longilíneo, óculos claros, fino trato, refletia alma sincera, palavras bem posicionadas e facilidade na aproximação com as outras pessoas.

Imagino, por vezes, quantos mestres surgem pela vida afora, sem que notemos a importância de tais personalidades e influências, sujeitos a demorar até que consideremos o valor desses tipos humanos em nossa formação. Pessoas elas dotadas dos propósitos de civilização necessários ao aprimoramento de evolução, sem que disso demos conta. Eis qual considero hoje a figura de Mister Frank Soules, de quem nunca mais, desde então, saberia das notícias e do paradeiro. 

domingo, 14 de abril de 2013

Aqueles dias nebulosos


A parecença com o momento de agora fica por conta da dominação que sacode a área externa de mundo convulso e suas ameaças de guerra. Naquela fase, 1966, a bola da vez prenunciava escalada vietnamita de largas proporções, o que se verificou nos princípios da década de 70. O Brasil vivia de desânimo libertário, pois perdia espaço nas ruas, praças, escolas, o ímpeto de transformação democrática a sumir nos calabouços e na clandestinidade desesperadora.

Em Crato, achávamo-nos à frente do Grêmio Farias Brito, do Colégio Diocesano. Encenávamos a peça Um chalé à beira da estrada, sob a direção de Alzir Oliveira, nosso professor de História e amigo dos alunos. Declamávamos poemas modernos nas solenidades, através do Jogral Pasárgada, formado de sete componentes: Zadir, Pedro Antônio, Gilva, Eros Volúsia, Clenilson, Bebeto e eu.

Resolvemos, então, publicar um jornal mural, O bacamarte, depois ampliado a órgão mimeografado a tinta, o Nossa opinião, do qual tiraríamos até 100 cópias e ficou só nos dois primeiros números, abafado logo no seu nascedouro pelas ameaças daquele trágico período cinza.

Nesse mandato, estivemos ao lado de Aglézio de Brito, Presidente da União dos Estudantes do Crato, e de José Terto, Presidente do Grêmio do Colégio Estadual, em congresso do Centro dos Estudantes Secundaristas do Ceará - CESC, em Fortaleza, realizado sob fortes contenções da repressão.

Espírito de contestação impunha atitudes rebeldes à maioria de nós. De noite, após reuniões de acalorados debates e informações desencontradas, saíamos a pichar as paredes com dizeres políticos alusivos ao momento de expectativa, no fogo consumidor do turno da existência. 

É um tempo de guerra, é um tempo sem sol. É um tempo de guerra, é um tempo sem sol. Sem sol, sem sol, tem dó. Sem sol, sem sol, tem dó, eram alguns dos versos que cantávamos, em segundo plano, característica das apresentações do jogral. Enquanto Pedro Antônio, à frente, declamava em altos brados:

- Só quem não sabe das coisas é um homem capaz de rir! – seguindo com outras palavras de poema de Bertolt Brecht.

Esses alguns quadros da época em que partilhamos experiências culturais de um Crato fervilhante de jovens promessas e movimentações apreensivas, lembranças que retornaram ao reencontrar José Esmeraldo Gonçalves, velho amigo desse tempo quando, juntos, elaboramos o Nossa opinião de quantas esperanças. Ele que viera ao Cariri na ocasião do aniversário de 90 anos de sua genitora, dona Maria Lassalete Gonçalves Norões. Hoje mora no Rio de Janeiro e trabalha na mídia. Dispõe de raros intervalos semelhantes para voltar à Região e ver os amigos.  

sexta-feira, 12 de abril de 2013

A vitória de Pirro


Dias recentes, lembrei de história da Antiguidade Clássica registrada por Plutarco, que conta do Rei Pirro, do reino de Épiro, quando venceu os romanos em duas violentas batalhas, Ásculo (270 a.C.) e Heracleia (280 a.C.), de danos inestimáveis a ambos os lados, naquilo que resolveram denominar Guerra Pirrica, homenagem ao monarca vencedor.

- Outra vitória como essa me arruinaria por completo – eis, segundo Dioniso de Helicamasso, qual respondera Pirro a um vassalo que lhe dirigia palavras elogiosas sobre os resultados da pugna, logo após a segunda batalha. Daí nasceu a expressão vitória de Pirro, utilizada nas situações dos que ganham, mas não levam os produtos da vitória.

Em meio de profundas perdas em homens e armas, o Rei se rendia ao desastre dos confrontos em que os prejuízos vultosos, desmandos e mortes de amigos e guerreiros valiosos, feriram lhe até o desânimo, abatido de marcas profundas no sofrimento.

Isso numa época quando os artefatos militares causavam bem menos estragos na comparação com as atuais ogivas nucleares, inquestionável  perdição do gênero humano na Terra. Ainda assim, Pirro se via longe da pátria e os aliados das proximidades começavam a retirar o apoio inicial que recebera nas escaramuças. Inexistiam outros meios de formar novos soldados diante das sérias perdas sofridas.

Após a Segunda Guerra Mundial, indagado quais armas a humanidade usaria no próximo conflito de iguais proporções, o historiador inglês Arnold Toybee respondeu sem pestanejar:

- Na próxima guerra, eu não sei. Porém na seguinte a essa, as armas utilizadas serão o arco e a flecha, pois quase nada sobrará.

Porquanto nas guerras inexistem vencidos ou vencedores. Todos saem derrotados perante a verdadeira consciência do crescimento real. Os tais exércitos vencedores nisso também acumulam perdas irreparáveis em todo sentido, desde destruições de vidas humanas a atrasos em termos de organização dos seus povos, esfacelando o que antes obtiveram, causando dores atrozes.

A ilusão das aparentes vitórias entusiasma momentaneamente, enquanto destrói, pela falta de jeito, a sonhada paz, matriz dos dias de amizade e definitiva solidariedade.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

O Memorial da Imagem e do Som


Sonho antigo do Instituto Cultural do Cariri, se acha em fase de realização o Memorial da Imagem e do Som no âmbito da instituição, com a denominação de Luiz Gonzaga de Oliveira, dos primeiros fotógrafos da Região. Netos do artista, Jackson, Janildo e Janedson dedicam esforços na montagem de espaço das exposições e acervo de peças das artes caririenses nas galerias do ICC, onde também reúnem objetos da história e dos costumes de nosso povo.

Luiz Gonzaga de Oliveira, um dos patronos de cadeira do Instituto, demonstrou, ao seu tempo de profissão, idos de 1885 até 1939, talento destacado para captar o cotidiano através de equipamento Kodak Full Screen, com isso registrando cenas valiosas d e tal período. São dele muitas das fotografias antigas encontradas no Museu Histórico do Crato, formando acervo inigualável de instantâneos de época. A família do fotógrafo teve a sensibilidade de preservar as imagens raras do Cassino Sul-Americano, do Seminário São José e da Praça Juarez Távora, dentre outras que retratam a geografia urbana de um Crato dos inícios do século XX.

Este Memorial da Imagem e do Som concretiza, pois, a ideia original do Dr. Jefferson Albuquerque, que, já na década de 70, quando esteve à frente do Instituto Cultural do Cariri, pretendeu instalar um museu da imagem e do som, e cujas primeiras entrevistas, com José Geraldo da Cruz, Pedro Maia, Ramiro Feio, Filemon Teles, Almir Carvalho e Antônio de Alencar Araripe, chegaram acontecer, em áudio e fotografia, pelo jornalista Antônio Vicelmo e por mim, sem, contudo, ganhar impulso, material esse que desapareceria na voragem de outras iniciativas.

Agora, ao seu modo, esses netos de Gonzaguinha concretizam proposta consistente, fornecendo às novas gerações elementos de estudo e exemplo válido. Segundo o folder inicial dos trabalhos, é um espaço onde pulsam vivos cinema, fotografia e música, demonstrando a riqueza da alma caririense, nordestina, brasileira.

Além da cessão das instalações, o ICC preservará o patrimônio que, inclusive, reunirá materiais audiovisuais cedidos em caráter provisório por famílias e demais interessados em contribuir na exposição permanente, semelhantes aos descendentes do Mestre Elói Teles de Morais e de Hilário Lucetti, que permitiram a utilização na mostra de peças importantes do patrimônio desses pesquisadores da cultura popular e do cangaço, respectivamente.

A data de inauguração do Memorial da Imagem e do Som Luiz Gonzaga de Oliveira, no Instituto Cultural do Cariri, será dada a público dentro de breves dias.  

Os animais


Já transcorreram décadas de quando morava na fazenda. Vida junto de uma natureza agreste guardava características distantes do mundo de hoje nas cidades. Essa mudança do campo ao universo urbano significou o que costumam chamar de transição do feudalismo ao modelo industrial exportador, no Nordeste brasileiro. 

Porém foi verdade real, experimentada pela geração que cumpria missão de atravessar o choque cultural inevitável do progresso, talvez face de marcas sentimentais profundas, tanto nas famílias quanto na história individual. E os sintomas das tais consequências retornam através dos sonhos, espécie de tratamento natural.

Vez por outra, presencio emoções resistentes daquela época, lembranças dos bichos, dos habitantes, lugares, matas; de invernos, sequidões, estradas desertas; moagens, riachos, açudes; pescarias, diversões, acontecimentos ocasionais da religiosidade; viajantes que passavam e pousava alguns dias; tipos esquisitos dos andarilhos sem rumo; as noitadas prenhes de luas e muitas estrelas, de brilho típico do sertão; as narrativas de aparições das visagens e os ancestrais desaparecidos penados; a brisa fria das manhãs; o mormaço nos fins de tarde; as flores coloridas e perfumadas, cultivadas nos jardins de minha mãe; as quermesses de minha avó, nas datas da igrejinha; o canto dos pássaros e suas evoluções nos céus do verão; o silêncio contundente; o calor do meio dia até três, quatro horas das tardes causticantes; e os imprevistos.

Sim, os bichos, animais de tração, de montaria, os bois de bagaço do engenho, as vacas de leite, os movimentos do curral, chocalhos batendo pelo escuro misterioso das madrugadas, latidos de cães tresmalhados, alvoradas alegres, torreões de nuvens grandiosas, a formar imagens contundentes no firmamento longínquo. Sonhos pelo ar livre da infância que sumiram remotos de um período infantil.

Contudo, o que toca com maior força o teto dessas saudades corre nos rebanhos ovinos, carneiros, ovelhas, marrãs e borregos que os meninos conheciam e batizavam.

Havia dois currais a curta distância, um dos carneiros de meu pai e outro dos de meu avô, divididos nas assinaturas das orelhas, perversidade que todo ano acontecia, cortes de peixeira que sangrava o chão dos cercados e salpicava na gente. Independente de acompanhamento, os bichos conheciam seus apriscos, e a eles se dirigiam na volta do pasto aos fins de tarde, momento agradável de vê-los regressando à segurança das casas, guarnecidos da onça e doutros riscos noturnos.

Logo cedo retomariam o caminho, sozinhos e apressados, quais quem regressa ao trabalho, lá na manga do São Luiz. Eu, da varanda de casa, os via deslizar na paisagem querida e aproveitava esses instantes de paz a coletar na alma as minhas melhores recordações do tempo de menino.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

A pequenez das atitudes humanas


Provas repetem os passos comuns quando demonstram a redução das ambições da grandeza dos seres humanos suas mesmas atitudes, ansiedades e fraquezas cotidianas, desde gestos administrativos de líderes dos países poderosos, aos crimes cometidos no claro das horas pelo mundo inteiro.

Tibiezas mil demonstram a tese da incapacidade humana de chegar aos píncaros da glória, aos padrões do sucesso eterno decantado nos poemas. O menor empurrão ocasiona uma luta de palavras, solavancos de emoções, dúvidas na sobrevivência. Isto sem querer lembrar os interesses contrariados, as disputas financeiras e os repasses de crises, molas mestras da geopolítica, todo tempo.

Ontem assim aconteceu, hoje, amanhã... Acontece... Acontecerá. Dores das gentes essa ausência de razões justas na definição dos valores e seus resultados. As páginas da história demonstram com saturação a pobreza de comportamento na fragilidade da paz que ora agita o Planeta, cheio de guerras em diversas localidades, longe do respeito mútuo, motivos pessoais.

Ninguém que se preza abre mão das picuinhas do poder temporal já lotado dos fantoches grosseiros da corrupção e da ganância. De não ter dimensões a falta de critério na utilização das conquistas da inteligência, dos recursos naturais, nos quatro quadrantes, quando aprimorar armas com o sentido de dominar outros vira rotina dos parques industriais e ameaça de destruição em massa, chantagem crepuscular das diplomacias do faz de conta.

Bom, nessa crítica perdida na multidão das palavras jogadas fora habita o firme desejo de que houvesse alternativa ao instinto da agressividade grosseria dos primatas, feita moeda de troca qual habitássemos no centro das irresponsabilidades, apesar dos tratados impotentes que nada controlam da desorganização dos débeis mentais que ocupam os tronos das nações.

Isso em tom de desabafo perante a inutilidade dos discursos que dominaram o tabuleiro das ações. Vontade fraca resulta destruir a melhor parte daquilo que poderia chamar felicidade, uma sociedade mais justa e próspera, voltada aos estudos de fórmulas inovadoras de viver em harmonia, na família geral dos viventes.

No entanto quer parecer espécie de alienação até acreditar nas coisas em ordem neste chão, que vêm e desaparecem aos passes de mágica dos tempos. Sonhar, por isso, com níveis elevados de consciências superiores, de cunho espiritual, recorda as doces palavras do Messias, ao considerar: Meu Reino não é deste mundo

terça-feira, 9 de abril de 2013

Mestre Vicente Marques II


Iniciada no governo municipal de Raimundo Bezerra de Farias e concluída no de Moacir Soares de Siqueira, a reforma da Praça Francisco Sá, em Crato, evidenciou a beleza daquele que muitos consideram o nosso logradouro mais pitoresco, que na segunda metade do século XX vivia decorada com jardins alegres e benjamins recortados em variadas figuras.

Também conhecida por Praça da Estação, pois nela chegavam as composições da linha férrea, guarda no seu centro a Coluna da Hora, encimada pela escultura do Cristo Redentor de braços abertos para o lado Nascente, em dimensões proporcionais às do Corcovado, no Rio de Janeiro.

A edificação desse monumento de bela expressão e bom gosto se deveu ao prefeito Alexandre Arraes de Alencar em 1938, sob a orientação do arquiteto e escultor Agostinho Balmes Odisio, mestre italiano responsável pelo trabalho, segundo consta em placa numa das faces do pedestal.

No entanto, vale aqui destacar uma observação que ouvi de Raimundo Nonato Marques no decorrer dos dias da Exposição cratense deste ano de 1999. Afirmou ele que nos créditos dados ao escultor da imagem do Cristo existe a omissão de um nome que jamais deveria estar ausente. Trata-se de Vicente Marques da Silva, imaginário nascido em 06 de janeiro de 1908, na cidade de Juazeiro do Norte, e que morou em Crato por longo tempo, um dos irmãos de Raimundo Marques, Mundinho, autor da Samaritana, uma das fontes da mesma praça, inaugurada em 21 de junho de 1952. Mundinho também se destacou como goleador emérito do futebol de antanho, falecido vítima de acidente de automóvel num dos cruzamentos centrais da cidade.

Segundo Nonato Marques, artista plástico nascido em Crato no ano de 1945 e que vive em Salvador, nono filho, dentre os 22 de Vicente Marques, o seu pai começou a laborar na arte da marmorearia aos nove anos, logo cedo evidenciando talento especial como aprendiz do Prof. Agostinho Odisio, esse que fora contratado através de sua firma para edificar a obra da estátua do Cristo Redentor, transferindo ao seu aluno Vicente a responsabilidade exclusiva pela execução primorosa da obra.

Na produção do trabalho foram feitas, primeiro, as várias peças, em 18 pedaços no total, em barro cerâmico, sendo delas confeccionadas as formas de gesso nas quais faria a fundição de cimento e, por fim, a montagem definitiva no ponto em que agora persiste, mérito dos habitantes do lugar.

Os cratenses daquele tempo ainda sobreviventes recordam de Vicente Marques e seus familiares que, na década de 50, migrariam para Manaus, deixando em Crato a oficina de marmorito onde exerciam essa arte, à Rua José Carvalho, por trás da Sé Catedral. Lá na capital do Amazonas, em 17 de junho de 1994, se deu seu falecimento.

Ficam aqui, portanto, as informações consignadas, no sentido de propiciar, depois de quantos anos, justos instrumentos de pesquisa na memória dos que estudam a história urbana da Princesa do Cariri cearense, onde há lugar para as pessoas de boa vontade, qual afirma dístico fixado aos pés da coluna da hora, na Praça do Cristo Rei.            

domingo, 7 de abril de 2013

De carona com o destino


... Você foi o caso mais antigo, o amor mais amigo que eu já vivi - do rádio fanhoso, na mercearia a lado da pista, escutava Roberto Carlos descrever seus mesmos sentimentos. Fim de tarde de domingo mormacento, quando retornava de sesta feliz junto da namorada. Pousava de bom moço, contudo a história muitos sabiam.

Comerciário, homem casado, pai de filhos, dois menores e dois maiores, inclusive a esposa conhecia detalhes do romance rural que lhe aparecera a sacolejar as monotonias do cotidiano.

Dizem existir as coisas de fatalidade, quando acontecem amores, acidentes, fortunas, surpresas. Deva preferências às agradáveis, em que enquadrara a doce namorada, moça bonita, carinhosa, de amofinar coração desencantado.

Nisso de pensamentos sonhados deslizava na brisa morna do anoitecer, aguardando transporte defronte da estrada que o levaria de volta ao lar oficial. A clandestinidade às vezes lhe desconfortava o juízo, porquanto não esquecia a esposa nos devaneios. Persistia dúvida atroz... Dividir as afeições na cama parecia lenda feia... Traição? Remorso. E os filhos... A namorada, no entanto, já esperava o primeiro... Lá por no meio remexia algo semelhante a cólica, porém a altura do peito mostrava só dor esquisita.

Nisso de pensar, um carro parou ali próximo. Ia no itinerário. Pediu carona quando o dono voltava da bodega apertando na boca resto de uma laranja azeda.

E desceram ladeira a baixo, rumo da cidade. O homem calado iniciou apertando o pé no acelerado do veículo bem usado, zoadento e oscilante no vento.

Pouco a pouco cresceram na velocidade. Aquele carro não lhe parecera próprio para correr assim. As aparências enganam, pensou. A mata passava ligeira, mais ligeira... Olhou desconfiado o motorista. Bota estranho naquilo. Figura agora sinistra, olhos fundos, vermelhos... Cabelo desgrenhado. Riso fixo nos lábios repuxados, o que depois virou uma gargalha sardônica, zombeteira. Indiferente, imprimia ao fusca idoso seu gozo sinistro. Cento e poucos quilômetros, cento e vinte, talvez.

Para resumir, fechava as curvas cantando pneus e jogando terra na coxia, enquanto o motor resfolegava; só saltar fora da carcaça. Cinto que é bom, nada, apenas a máquina perigosa passava fervendo nas cerâmicas do Monte Alegre e segua o sentido das curvas da Batateira.

No percurso, lhe confortava todo o tempo o Salmo 23 que pusera na linha da imaginação (pois bom cabrito não berra). Acalma de verdade, desacalmou, istou sím, embaixo, no barranco, pois forçava a porta querendo escapar andando da lataria retorcida e fumegante do velho automóvel virado. Na testa, escorria sangue a encobrir os olhos ardidos. Chegou em casa a pé. Recordava as letras dos filmes que diziam qualquer semelhança com personagens reais é mera coincidência.

Caso o homem durasse longo tempo depois do acidente, ouviria na intuição que de uma escapa cem anos vive. Na hora do acidente, apenas deu as costas e deixou atrás a poeira da barra das calças escuras. Reclamava do sem jeito da boa sorte, a subir da ribanceira.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Escola e realidade


Face de algumas situações verificadas na atualidade, cabe reavaliar a prática pedagógica dos estabelecimentos públicos e privados de ensino, pelo exemplo de uma mãe pobre brasileira, que, vivendo as severas imposições da desigualdade social, tem que trabalhar fora de casa para manter a família e matricular os filhos numa escola de periferia. Ao chegar receber a bolsa-escola, depara-se com a dura contradição de saber que perdeu o benefício porque os filhos não compareciam às aulas, frustando-lhe a certeza da pensão escolar prevista no dinheiro mensal.

Em outro momento, alunos de escola particular, em sucessivas ocasiões, desobedecem aos coordenadores de disciplina, por ignorar regras mínimas da educação doméstica. Os pais, profissionais liberais universitários, autênticos representantes da classe média, passam mais tempo no trabalho externo do que em casa, para onde já voltam exaustos, desfalecidos, depois do expediente tirano e fatigante. De feições abatidas no jogo da competição em que redundaram os projetos pessoais de sucesso, querem lazer a qualquer custo, olhos afeitos à tevê por assinatura, revistas, livros, ou sedentos de bebidas quentes, passeios e churrascos de final de semana.

Os filhos de ambos, adrenalina a mil, pouco ligados ao drama universal cotidiano, turno inverso, saem à cata de emoções fortes pelas pistas da cidade. Vivessem na época dos nativos selvagens, jogar-se-ia selva adentro, escola aberta de tempo integral. Hoje, no entanto, defrontam as carências da sociedade, era complexa de passividade e divisão fragmentária do trabalho.

Por isso, aos pobres os punhos agressivos da cara desigual e pontiaguda de bodegas, bares, ruas barulhentas, lixões, jogatina, pornografia, solidão, passadores de droga, ou encontros fortuitos e arriscados com outros jovens do mesmo teatro olímpico dramático.

No patamar dos aquinhoados, a seu turno, facilidades do vício e seus aspectos multiformes, junto das máquinas ligeiras, passeios e sexo livre ausente de orientação, porquanto a escola resultou nessa corrida espermática do funil-vestibular a qualquer preço. Sabe-se lá depois o que traz a douta civilização dos antropoides delirantes.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Inácio Arruda propõe Região Integrada para o Cariri-Araripe


Nesta quarta-feira 20 de março de 2013, após tramitar com sucesso na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, a Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo, do Senado Federal, aprovou a criação da Região Integrada de Desenvolvimento do Cariri - Araripe (RICA), cujo Projeto de Lei 122/2009 é da autoria do senador cearense Inácio Arruda.

Agora o próximo destino da propositura será o Plenário da Casa Legislativa, quando será votada essa criação de mecanismo que visa o desenvolvimento de 70 municípios dos estados de Ceará, Pernambuco, Piauí e Paraíba, correspondentes à região do Cariri - Araripe, numa área territorial de aproximadamente 46 mil km2 e uma população de 1 milhão e meio de habitantes, em números redondos.

Diante dos estudos geológicos que já dão conta da existência de petróleo na Bacia Sedimentar do Araripe relativa a municípios do Cariri Cearense, de Pernambuco, do Piauí e da Paraíba, o projeto de lei fundamentará os meios de conduzir processo de exploração das riquezas na região e delineará possíveis fonte de financiamento de progresso e ampliação da industrialização da importante área geográfica, sem levar em conta outros setores a serem favorecidos, cultura, turismo, ecologia, ciências, etc.

Assim, virão recursos da União e os estados e municípios que formarão a Região Integrada de Desenvolvimento receberão acompanhamento proporcional aos novos tempos, com ações produtivas de reconhecimento e conservação ambiental.

Eis os municípios correspondentes à Região Integrada do Cariri – Araripe (RICA): Abaiara, Altaneira, Antonina do Norte, Araripe, Assaré, Aurora, Baixio, Barbalha, Barro, Brejo Santo, Campos Sales, Caririaçu, Cedro, Crato, Farias Brito, Granjeiro, Ipaumirim, Jardim, Jati, Juazeiro do Norte, Lavras da Mangabeira, Mauriti, Milagres, Missão Velha, Nova Olinda, Penaforte, Porteiras, Potengi, Salitre, Santana do Cariri, Tarrafas, Umari, Várzea Alegre, no Estado do Ceará; Araripina, Bodocó, Cedro, Exu, Granito, Ipubi, Moreilândia, Ouricuri, Santa Cruz, Santa Filomena, Serrita, Trindade, no Estado de Pernambuco; Acauã, Alegrete, Belém do Piauí, Betânia do Piauí, Caldeirão Grande, Campo Grande, Caridade do Piauí, Curral Novo, Francisco Macedo, Fronteiras, Marcolândia, Padre Marcos, Paulistana, Pio IX, São Julião, Simões, Vila Nova, no Estado do Piauí; e Bom Jesus, Bonito de Santa Fé, Cachoeira dos Índios, Cajazeiras, Conceição, Monte Horebe, Santa Inês, São José de Piranhas, no Estado da Paraíba.

A dor da queda na libertação


Existe um poema inglês, de Rudyard Kipling, denominado Se que traz algumas considerações a respeito da vida e suas experiências extremas e dolorosas, a fim de indicar a essência principal das aulas necessárias à personalidade dos fortes que defrontam a realidade e nisso recolhem a melhor parte: Se consegues constringir o teu coração, /nervos e força / para te servirem na tua vez / já depois de não existirem, e aguentares / quando já nada tens em ti / a não ser a vontade que te diz: Aguenta-te!  

E o poeta descreve as agruras dos limites dessas tempestades morais, a lembrar vicissitudes próximas da caminhada de Jesus ao deparar as ingratidões dos adversários da Luz nas vésperas do sacrifício da Cruz, e antes fora contado entre os malfeitores, no Monte das Oliveiras. Daí, chorou lágrimas de puro sangue.

Nessas horas críticas de dor, que impõem marcas profundas naqueles que as passam rumo ao aprimoramento espiritual, desencanto da natureza carnal, ninguém queira tapete mágico na busca da Salvação, porquanto de nada aprenderia do desencanto dos prazeres e vaidades deste chão.

Deus ama os homens caídos diante da dor, vez vítimas da própria incúria, a descerem às masmorras da ingratidão dos milênios. A longa estrada inutiliza a soberba e o ímpeto da mesma queda. São testes que a história obriga de fazer das almas os restos de esperança de vidas inteiras.

No passo, ninguém se vanglorie das certezas incertas do futuro, sobretudo quando descuidaram no plantio das boas ações e palavras de crescimento a si e aos outros. Dizem os sábios que o conhecimento só chega pela Dor ou pelo Amor, o que condiciona evoluir diante de todas as vivências humanas sem exceção.

De um autor clássico da pátria portuguesa, Francisco Otaviano, eis em poema célebre (Ilusões da vida) o presente de tantas antologias escolares, na tal verdade ganha corpo:

Quem passou pela vida em branca nuvem, / E em plácido repouso adormeceu; / Quem não sentiu o frio da desgraça, / Quem passou pela vida e não sofreu; / Foi espectro de homem, não foi homem, / Só passou pela vida, não viveu.

Poucos sobreviveriam aos impactos do confronto desses obstáculos definidores inexistisse a força interior da Fé e do maior Amor, que houve de considerar os religiosos na nomenclatura de o Poder de Deus que a tudo norteia em busca da Eterna Felicidade.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Hoje só amenidades


Lembrar só assuntos leves, copa do mundo, bonecas de pano, canções de ninar, sorvetes de damasco, luas de agosto, praias e fins de semana em serras virgens, discursos de aniversários entre amigos consagrados, docinhos bem casados, crianças educadas em brincadeiras de bom gosto, cursos de línguas conhecidas, chocolates meio amargos, sonhos bons nas tardes frias de inverno, as feiras de artesanato, churrascos e amigos super agradáveis, sempre animados ao nos verem chegar e contrariados quando nos despedimos, as rodas de conversa dos temas de auto-ajuda, compotas de doce das vovós um brinco de pessoa, os ritos das religiões conhecidas, passeatas pacifistas na frente dos palácios lotados de políticos honestos e corretos nas atitudes. Os feriados grudados nos finais de semana, um queijo e uma fatias de goiabada juntos em forma de coração, sanduíche de paixão. As marcas de batom que permanecem depois das camisas perderam a cor. Os lençóis cheirosos nas manhãs ensolaradas, longe do despertador. As risadas dos esquilos, nos desenhos animados da garotada em vesperais de domingo. Os convites de aniversário de criança, prenúncios de bolos de ameixa e castanha. Ondas sucessivas de mar suave no sol das nove e meia, com areia limpa e coqueiros sacudidos ao vento. Penumbra dos inícios das sessões de cinema dos filmes positivos ao lado de quem a gente ama. Bater pernas nos inícios de noite, nas praças ajardinadas, ainda de olhos intumescidos do cochilo domingueiro. As notícias agradáveis do sucesso, nas cidades interioranas, certos de usaram som compatível à saúde humana, educados cantores da nova música popular brasileira. As bolinhas de queijo ainda quentes, grudadas no céu da boca longe dos pensamentos negativos, enquanto preocupações inexistem no juízo lá mais acima. Tudo de bom que possível às lembranças. A vida qual motivo de inteira felicidade. Esquecer outras razões de parar e ler, quando o desejo pede que vivamos em paz e no prumo da inteira tranquilidade.