quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Viver o presente

 

Isto que indicam os mestres espirituais: Achar um meio definitivo entre o que passou e o que virá, e nesse ínterim assentar bases de sustentar o senso e persistir contente pelas abas do Destino. Tarefa por demais, eu sei, sim. Conquanto os âmbitos de existir, saber-se-á, só define a tal finalidade. Sobreviver, por certo, viver acima de um agora intermitente, inextinguível; estabelecer as próprias estruturas no chão da infinidade desses vultos vagos escondidos na imensidão dos céus.

Disso provém deixar à margem tanto dramas quanto comédias do que restou nas caminhadas e permitir, debaixo dos acontecimentos, a medida do que tragam e depositem no tempo dagora esse fluir sem conta.

Assim, repassar a vista pelo dorso dos livros das estantes, que significa teclar nas vivências bem ali guardadas dos muitos autores, senhores daqueles instantes escorregadios vistos de longe, de soslaio. São as palavras a consistir de igual compreensão. Fazem reviver no coração das pessoas emoções acumuladas e trazidas de volta à baila pelo mistério das consciências. Ditos, conclusões, depois nada mais senão meros fantasmas do que se foi sumindo debaixo das esteiras do Infinito, numa ausência solene, mordaz.

Escrever tem essa mágica, contar da gente, das horas, do som, dos rios descendo pelas encostas, chuvas, pássaros canoros; galos a cacarejar o dia todo; falas, música distante, teclas insistentes, impacientes; histórias, sinais de outros espectros abandonados de dúvidas; esse tanger de estruturas nas paredes lá de dentro das criaturas invisíveis. Buscar razões de estar e dizer, e fazer, ou calar; permitir o transe do que aconteceu e atravessar os depois sem pausas, nem rimas.

Lembrar, eis o que as palavras, escutar silenciosamente as passadas no dorso dessas relíquias vendidas a preços módicos nas lojas de quinquilharias, nesse mundo afora. Conduzem o rebanho das recordações e arrastam consigo certezas várias de escriturar na alma o desejo audaz de sempre existir nalgum instante que seja do além.

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