No intervalo entre noite e madrugada, ao suave perfume das primeiras flores, antes mesmo do cantar dos primeiros pássaros, bem ali se dá o acorde dessa sinfonia dos que vivem as consciências. Albores de derradeiros sonhos riscam os céus. Vazio absoluto sacode a natureza, pondo-a definitiva neste algo maior que todas as grandezas. Isso, apenas voos rasantes de imaginação, luzes que apagam os derradeiros mistérios noturnos e refaz de desejos o movimento à busca do Sol.
Nesse mesmo jogo de sombras desfeitas nascem traços de toda
fisionomia do Universo. Vem de dentro dos bichos, das árvores, das nuvens a
deslizar desde Nascente uns espectros ainda adormecidos das horas que passaram.
Quando, só então, vêm os seres humanos, a tanger seus fantasmas que agora
despertam ao fervor das horas mornas da madrugada que desaparece pouco a pouco.
Conquanto à força de tantos instrumentos, iguais, porém, a
ausência de som que permanece pelas encostas e várzeas ora úmidas do orvalho
que se foi. Há tal que seja um fruir espontâneo
que invade o tempo, enquanto as pessoas conspiram, no instinto de vencer um outro
dia logo à frente. Persiste, sim, estranho caudal de notas infinitas pelas entranhas
do mundo em volta. Alguém impassível que rege, assim, o revirar dos
acontecimentos durante as existências enigmáticas presentes no instante
inevitável dos seres.
Pura aparência de quem busca o que seria inexistente perante
o trino impaciente dos pássaros, ruído insistente reconstrói o passado nas
formas e objetos, cores e harmonias.
Às vezes me pego a recontar emoções doutras épocas, de
filmes, peças teatrais, apresentações musicais, diálogos, romances, a invadir os
tecidos do meu pensamento e trazer sinais entre os dedos das lembranças. Quais
partes tão agarradas em mim, entes autossuficientes que correm pelos campos da memória
com tamanha desenvoltura, que chego a considerar vivam eles e eu apenas
acompanho seus significados. Disso reúno deles roteiros completos do busco
cumprir no decorrer de tudo em volta, tais a obedecer notas soltas de uma
melodia silente, abstrata.
(Ilustração: Referência de Rocksmith: Pentagrama ou pauta musical).
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