Do espaço nebuloso das lembranças, consigo reconstituir a primeira imagem que gravei do Seminário São José, vista de baixo, da Rua José de Alencar, entre as ruas Pedro II e José Carvalho, trecho onde primeiro morei em Crato quando chegara de Lavras da Mangabeira, em l953, ano do Centenário da Cidade.
O tradicional estabelecimento católico lá em cima se afigurava qual prédio sombrio, enegrecido pelas marcas do tempo escorrido na pintura a cal amarelecida, com manchas de lodo pela parede fronteira, meio encoberto por cortina de eucaliptos depois cortados. Destas árvores, quais frutos insólitos, balançavam ao vento urubus friorentos, vindos das imediações onde ficava o antigo matadouro público, lá nas bandas do Alto da Independência.
Outro aspecto nítido, que não me esqueço desse Crato de algumas décadas, o footing da Praça Siqueira Campos, desfile das pessoas a circular o passeio onde afluía surpreendente multidão aos sábados e domingos à noite.
Uma expectativa quase incontida perpassava a semana inteira, sobretudo de rapazes e moças. Tão logo se punha o Sol, movimento inusitado ativava a população. De todos os lados, nos melhores trajes, jovens e adultos preenchiam as ruas do centro.
O logradouro não demorava a fervilhar de gente, qual numa quermesse mágica. Luzes fortes, jardins bem cuidados, dezenas de carros parados em volta, o Cine Cassino movimentado e o som da Amplificadora Cratense, a envolver dramas e comédias, desencontros e encontros, numa algazarra multiforme.
As mocinhas, de braços dados, principiavam a girar; grupos de três, quatro, ou até mais, num animado carrossel, enquanto os homens, atentos e conversadores, se postavam em torno, nas laterais do circuito humano, olhos acesos na beleza feminina.
Da observação espontânea que se estabelecia, se davam as trocas de interesses, nos chamados flertes, aos primeiros toques de simpatia.
Só depois, com as mudanças trazidas pelo progresso, princípios dos anos 70, junto dos sinais de televisão que chegavam, sumiria essa festa interiorana, após deixar rastro de uniões feitas ou desfeitas, nas histórias familiares dos que ali se conheceram em momentos inesquecíveis. De se olharem, confirmadas as preferências, os rapazes acompanhavam a escolhida em mais outra volta da praça, seguindo ambos, depois, no sentido da Praça da Sé, onde quase sempre havia bancos vagos para o início dos namoros, umas vezes, fugazes; outras, prenúncio de casamento.
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