segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Sem título IX


Entre as paisagens mentais ali é que correm livres as palavras. Trazem de volta lugares distantes, memórias antigas; refazem as histórias ouvidas naqueles pousos de antanho e reclamam atualidade constante dos pensamentos, à busca de compreender razões perdidas nalgum momento qualquer. Persistem tais donatários de espaços definidos, nesse rateio do passado lá de dentro que sobrevive ao transcorrer dos dias. Quais pedaços lançados ao vento das lembranças, seguem soltos, à cata dos motivos de vir à tona e dizer aquilo de antes, no desejo de dominar a todo custo. Conquanto deixassem de existir em realidade, ainda assim perseguem o instinto de ocupar todos os lugares do pensamento e nisso contar as lendas fincadas nas emoções ausentes. Saudades. Dores. Paixões. A gente quase caminha só a servi-las, espécies de animais de transporte das gerações sucessivas.

Por mais pretendam redefinir essas recordações e trazê-las a contextos de situações diferentes, amenas, no entanto perdem-se facilmente sob as garras daquelas imagens vividas, fixadas nas marés de um juízo acostumado aos detalhes já entranhados no íntimo. Destarte, exigem-se encontrar outras visões e resistir com ênfase ao poder de outros encontros, mas as palavras tratam logo de esquecer os novos argumentos e sucumbem contrafeitas. São milhões de vidas numa única delas, cordel interminável de narrativas desfeitas à medida dos esforços inúteis.

Talvez seja parecido também nas outras pessoas esse querer fugir das velhas repetições dessas ilusões ritmadas pelo tempo, todavia detidas no furor das lembranças tão só saboreadas naquilo que sumiu nas encostas de antigamente, restos mórbidos e sem vida dos cascalhos.

Depois disso, feitos fantasmas escondidos em si mesmos, percorrem as cavernas do Infinito às apalpadelas nas paredes da própria alma, visagens errantes aos sóis, pois, de uma herança individual tão poderosa, ficaram as vilas e florestas do ser que ora seja, sombras insistentes da consciência agora inevitável do que fora. Nessa hora, então, luta inglória, os animais sombrios farejam o senso da existência e adormecem nos braços indomáveis da imaginação.

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