domingo, 9 de junho de 2024

Vertigem

                        

O sonho é o grão de trigo que sonha com a espiga, o antropoide que sonha com o homem, o homem que sonha com o que virá. Raymond de Becker

Sonhei, certa vez, que hoje sou apenas um sonho de alguém que dorme nalgum lugar do Paraíso, e que só despertará quando de minha volta e no nosso reencontro, e eu largar os apegos que me sustentam nesta visão do firmamento. Qual prisioneiro em mim mesmo, enquanto vago solto diante do Infinito, ele, ali, adormecido, apenas se contém na longa espera, nas mesmas horas, mesmos dias que vou vivendo.

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Vislumbre, pois, de circunstâncias vagas faz de mim ser isto, assim, de que tenho esse compromisso imortal. Cercado das tantas limitações da pequenez que carrego, virei, no entanto, de cumprir o dever de tal função, à medida do tempo que arrasta seres e objetos pelos mundos transitórios. A vastidão do quanto existe significaria essa jornada rumo às estrelas, ao Eterno. Sairei daqui lá qualquer dia. Arrodeado nas sensações que o corpo impõe, ora vejo os desafios, prazeres e oportunidades quais correntes que me sustentam. Desfar-me-ei feito quem desconhece o ser de que sou parte, ainda, vez em quando, que seja avisado, também nos sonhos, de realizar essa missão.

Qual perante uma responsabilidade, vou vivendo. Tal detentor dos instrumentos de libertação, apreendo pouco a pouco os meios de revelar a consciência no declive das sombras onde estou. Do sonho guardei isto, de poder, decerto, encontrar a saída de todas as indagações. São muitos empecilhos, vaidades e desejos de aqui permanecer, todavia sob o crivo da improvisação. Pequenos achaques falam disso, do quanto de provisória é a vida neste chão que se desfaz.


(Ilustração: Primeiro contato, de Pieter Bruguel, o Velho).

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