sábado, 25 de maio de 2024

Só o amor é eterno

 

Às vezes lembro de quando entrávamos nas sessões das 16h dos domingos do Cine Moderno, em Crato, à busca de ver os filmes de sucesso, na maioria norte-americanos ou europeus, que chegavam antes nos cartazes apostos nas vitrines, a nos deixar de água na boca. Uma emoção forte nos levava a isto, querer saber o que vem depois. De almas em punho, na sala escolhíamos orgulhosamente as cadeiras e aguardávamos o toque característico da sereia ao instante de iniciar a função cinematográfica.

Daí viajávamos mundos afora, na ânsia de obter o tão sonhado prêmio que aclamasse o desejo do novo, do belo, do real, nas virtudes cênicas. Sempre era isto, ao final saíamos assim meio tontos aos primeiros claros da noite, caminhando de volta à casa. Íamos digerindo as histórias, por vezes dramas sem solução, aventuras errantes, epopeias intermináveis, tudo no sabor daquele tempo das produções que circulavam o mundo em latas vazias de maiores sentimentos, motivos de dúvidas e apegos. Eram os ídolos de outras terras, doutros valores; quase a transpor as barreiras do mistério e tocar as nossas faces arredias e distantes, noutras terras.

Tentas esperas foram ali desfeitas; quantos romances inacabados rebobinados em fitas; expectativas de novos sonhos, amores derramados pelas luas grudadas na memória. Ora vejo, então, o quanto de ocasiões as transportamos no ser, dias afora; acontecimentos fortuitos que vêm e vão ao sabor de nossos passos vacilantes, expectadores fieis dos destinos individuais. Os mil recomeços de belas quermesses, agora feitos tão de uma única história sem fim. As músicas, os romances, contos, lembranças acesas de nunca mais apagar, no coração da gente.

Fortes instintos de encontrar conosco próprios numa dessas esquinas dos séculos que nos carregam em seus braços perenes, metálicos. As pessoas, inúmeras fisionomias a contemplar o longo trecho do caminho pelos céus. Isso dos reinícios continuados, dias e dias, cada vez de horas intermitentes, magnéticas, imaginárias, febris. Enquanto que apenas forcejamos de leve as portas do Infinito, qual quem virá em seguida logo termine a exibição dos roteiros da dúvida e habitemos o território dos felizes eternos.

(Ilustração: Casablanca, sucesso de Hollywood).

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