Isto de querer contar histórias bem significa vontade extrema de preservar o que se foi... e nunca mais. Chega quase sempre no escuro das noites essa fome incontida que existe de continuar o tempo em si qual fator de sobrevivência da espécie; um desejo enorme de ouvir pela primeira vez os contos orientais, as mil e uma noites, Aladim e a lâmpada maravilhosa, O tapete mágico, Ali-ba-bá e os quarenta ladrões, etc. Sonhos assim tais sumiram na voragem, feitos bichos ariscos nas florestas ausentes.
Certa ocasião, participei de uma oficina de contos e quis iniciar as histórias sem usar o Era uma vez, no que contestou a professora, a defender com força a ideia de que as histórias só devem começar a ser contadas desse jeito único, se não deixariam de transportar a pureza dos entes originais que as fizeram da primeira vez. Sei que me rendi àquele argumento, porém imaginando um modo de abrir espaço a outras criatividades naqueles inícios de contos.
São tantas as vivências que dariam quantas e quantas noitadas e filmes. Depois é que vieram os contos clássicos dos autores que admiro, Kafka, Tchecov, Maupassant, Machado de Assis, Alphonse Daudet, Luís Borges, Cortázar, O. Henry, Hemingway, a espalhar movimentos que ficariam eternos na literatura; longas viagens a marés desconhecidos. Com os volteios na imaginação, ali fixaram permanência pelas paredes da memória, e volta e meia, na mesma intensidade dos argumentos dos filmes, alimentam estados de alma dali adiante.
As palavras vivem disso, do desejo aflito de continuar a qualquer custo pelas veredas que nos levam a sonhados destinos. Inexistisse a arte nem saberia dizer a que viemos, pois, face a face dos sumidouros e das rochas cinzentas deixadas ao acaso. Tudo, então, pedaços guardados entre as dobras dos roupões amarelecidos, largados fora nas ruínas. Essa busca constante de um sentido a tudo ocasiona os gestos humanos e alimenta o mistério vivo de que somos parte. Mais seremos do que fomos um dia. Era uma outra vez... os instantes esquecidos.
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