sexta-feira, 25 de abril de 2014

Montes e Feitosas

Era o início da presença do homem branco nas terras do Novo Mundo. Duas famílias de origem lusitana, instaladas no Sertão dos Inhamuns, adquiriram a posse do território e a confiança dos silvícolas, que atraiam às suas hostes na disputa territorial, Montes e Feitosas. Não tardariam as primeiras escaramuças que abalariam o sul do Ceará na primeira metade do século XVII.

Ali próximo do rio Jucá, os irmãos Lourenço e Francisco Alves Feitosa, provindos de Alagoas por volta de 1707, obtiveram algumas das sesmarias distribuídas pelo Reino, o que expandiriam até as margens do rio Jaguaribe e do Icó, ampliando a pulso o poder original. Antes desses, vindos de Sergipe, haviam chegado os Montes, em 1682, se fixando no Icó sob a liderança do coronel Francisco do Monte Silva, o patriarca da família.


Ambos os troncos familiares, unidos, até combateriam os índios que enfrentassem a presença estrangeira, mas discórdia surgira segundo alguns historiadores em face do casamento de Francisco Feitosa com viúva irmã do coronel Monte. Outros, no entanto, justificam a desunião vista a ambição pelo poder das terras.

Nisso, de 1710 a 1720, propagandas a épocas seguintes, explodiriam os confrontos de sangue, com assassinatos de índios e vaqueiros, combates abertos, emboscadas, saques, destruição gerando os piores descalabros, indicando a pouca valia dos meios administrativos daquele período. 

O agravamento das hostilidades envolveria o próprio ouvidor do Ceará da ocasião, José Mendes Machado, que tomaria o partido da família Feitosa, merecendo daí a alcunha de Tubarão e se incompatibilizando com o capitão-mor da capitania e com a Câmara de Aquiraz. As fraquezas morais daquela autoridade só agravariam o estado das coisas, que, em 1715, chegaram a clímax insustentável diante da invasão do Icó pelas tropas feitosistas sequenciadas que foram pelo mesmo Tubarão. Os Montes, então, realizaram revide em largas proporções ao reduto dos Inhamuns, sem, contudo, levarem de vencida o adversário, visto o equilíbrio entre aquelas forças bélicas.

Apenas por volta de 1725, o capitão-mor Manuel Francês conteria os ânimos dos dois clãs, os obrigando a depor armas sob ameaça de pena de morte e confisco dos bens.

O rescaldo das lutas final da luta revela graves perdas humanas, dizimação de tribos inteiras de nativos, isto com raras punições de responsáveis. Houve também o empobrecimento dos Montes e preservação da riqueza dos Feitosas, num capítulo de tristes das lembranças nos primórdios da civilização nordestina.     

2 comentários:

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  2. Pequenos Apontamentos
    Emerson, com todo respeito, sou obrigado a fazer alguns comentários, não por soberba, nem por pavonice, mas pelo simples compromisso com a ciência histórica e com tudo o que se aproxime com a verdade nesta mesma seara.
    Conheço o produto de sua pena e de seu punho, que, aliás, é de muito boa qualidade, e, por conseguinte, como é natural aos bons escritos, espalha-se rápido, alcançando longas distâncias e propagando-se no tempo. É uma grande responsabilidade ser um escritor do seu calibre.
    Então, sobre a “Guerra entre Montes e Feitosas”, é inevitável a paixão pelo tema, principalmente para gente como nós, descendentes diretos desses gladiadores do sertão. Porém, este assunto vem sendo tratado de forma inexata, principalmente na internet, onde os fatos são distorcidos e oferecidos ao público em dose cavalar, contaminando as massas com foros de verdade.
    Sei que a verdade é relativa, e alcançá-la seria quase impossível, mas aproximar-se dela pode ser uma tarefa executável, principalmente com o uso do método científico, com investigações escafandristas.
    Ultimamente, velhos fatos têm ganhado novas narrativas, sendo a história recontada a cada gole dado diretamente na fonte. A exatidão do documento e a capacidade da crônica em preencher hiatos, quando cimentados pela interpretação histórica, possuem o condão de gerar apreciável verossimilhança, promovendo uma maior aproximação da realidade.
    O seu belo e bem escrito texto, sobre o referido conflito clânico, é uma obra de arte. Mas, data vênia, preciso fazer algumas ressalvas.
    1- Os Feitosa que chegaram ao Ceará eram nascidos no Brasil, e o pai destes era português;
    2- Os Montes eram de origem espanhola;
    3- O conflito entre as duas famílias não se deu na primeira metade do século XVII, mas na primeira metade do século XVIII;
    4- Para a maioria, os Feitosa eram Pernambucanos, vindos de Serinhaém, da Fazenda Currais de Serinhaém. Alguns afirmam que eram sergipanos, da Fazenda do Buraco. Outros acreditam que eram Alagoanos, de Penedo;
    5- O primeiro patriarca dos Montes em terra cearense foi Jorge de Montes Bocarro e não o Coronel Francisco de Montes (Famílias Cearenses, p. 279);
    6- João de Montes Bocarro, pai do Coronel Francisco de Montes Silva, era natural de Penedo/AL (Idem);
    7- As primeiras sesmarias dos Feitosa foram dadas entre o Icó, Iguatú e os Cariris Novos;
    8- As causas da contenda entre as famílias se deram pelas terras do Cariri, pelo menos no primeiro instante da luta;
    9- A luta armada começou depois de 1716, com a morte de Manoel Rodrigues Airosa, cessando em 1719 agosto de 1724, quando ocorreu a maior batalha, resultando muitos mortos da parte dos Montes;
    10- O Capitão-mor Manoel Francês foi, na verdade, subornado pelos Montes;
    11- O Bacharel José Mendes Machado (1º juiz do Ceará e Ouvidor-geral), foi obrigado a buscar aliados contra os Montes, pois estes tinham a intenção de rasgar os processos elaborados pelo ouvidor, bem como assassiná-lo. Assim, há época, os Feitosa aram a mais forte opção;
    12- A Câmara de Aquiraz era dominada pelos Montes, como, por exemplo, o Licenciado Domingos Ribeiro, casado com uma integrante da família Montes;
    13- A guerra não teve fim no ano de 1725, com as ameaças do Capitão-mor, mas muitos anos depois, entre o final de 1730 e início de 1740;
    14- Os Montes eram muito ricos, e seus bens não se dilapidaram como dizem os cronistas. O que ocorreu foi a dissolução do clã entre outras famílias, pois, posso provar que, ainda hoje, as antigas elites no Cariri têm algum parentesco com os Montes.
    Emerson, desculpe-me se eu estiver sendo ofensivo, pois esta não é a minha intenção. Meu único compromisso é com a pesquisa. E para provar tudo o que afirmei, estou te enviando um texto, no qual transcrevo o mais antigo relato sobre a batalha, narrado por testemunhas oculares.
    No mais, um forte abraço, com demasiada admiração:
    Heitor Feitosa Macêdo



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