quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Dias nublados aqueles

Naquela fase, em 1966, a bola da vez prenunciava escalada vietnamita de largas proporções, o que se verificou nos princípios da década de 70. O Brasil vivia o desânimo libertário, pois o ímpeto de transformação democrática perdia espaço, nas ruas, praças, escolas, a sumir nos calabouços e na clandestinidade desesperadora.

Em Crato, achávamo-nos à frente do Grêmio Farias Brito, do Colégio Diocesano. Encenávamos a peça Um chalé à beira da estrada, sob a direção de Alzir Oliveira, nosso professor de História e amigo dos alunos. Declamávamos poemas em pontos diversos da cidade, através do Jogral Pasárgada, formado de sete componentes: Zadir, Pedro Antônio, Gilva, Eros Voluzia, Clenilson, Bebeto e eu. 

Resolvemos, então, publicar um jornal mural, O Bacamarte, depois ampliado em órgão mimeografado à tinta, o Nossa Opinião, do qual tiraríamos até 100 cópias e ficou só nos dois primeiros números, abafado logo no nascedouro pelas ameaças do período cinza.

No desempenho do mandato, estivemos, ao lado de Aglézio de Brito, presidente da União dos Estudantes do Crato, e de José Terto, presidente do Grêmio do Colégio Estadual, num congresso do Centro dos Estudantes Secundaristas do Ceará, em Fortaleza, realizado sob as fortes conotações repressivas.

Espírito de contestação impunha atitudes rebeldes na maioria de nós. À noite, após reuniões de debates acalorados e troca de informações desencontradas, saíamos pelas madrugadas a pichar as paredes, nas ruas centrais, com dizeres relativos ao momento, fogo consumidor de um turno de existência.  

É um tempo de guerra, é um tempo sem sol. É um tempo de guerra, é um tempo sem sol. Sem sol, sem sol, tem dó. Sem sol, sem sol, tem dó, eram os versos que cantávamos nas apresentações do jogral, a título de característica, enquanto Pedro Antônio, à frente, declamava, em altos brados: - Só quem não sabe das coisas é um homem capaz de rir! – seguindo outras palavras de poema do poeta alemão Bertholt Brecht.

Esses são alguns quadros da época em que partilhamos experiências culturais de um Cariri fervilhante, de jovens promessas e movimentações apreensivas, lembranças que retornaram que revi José Esmeraldo Gonçalves, velho amigo desse tempo em que, juntos, elaboramos, nas madrugadas, o Nossa Opinião. Ele depois seguiria estudos de Comunicação no Rio de Janeiro e hoje desempenha funções de destaque na mídia impresa do Sudeste.  

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