Olhar em volta e chegar a determinadas conclusões claro que magoa o conforto, sobretudo quando nos vemos nisso envolvidos. Olhar e ver, invés de passar por cima. Ver o quanto os instrumentos se voltaram contra os artesões das novas modas. As peças com que contávamos de modificar o sistema, oferecer meios de viver melhor, deram na senzala que ora toma conta desse mundo. Quiseram investir na tecnologia, e a tecnologia parece haver dominando seus investidores. Trabalharam teoremas e fórmulas, e a física moderna rendeu o que agora invade o território das liberdades e fez do homem boneco de papel nas ilhas do faz de conta.
Aceitassem ver, saber-se-ia a que distância andávamos da sonhada felicidade. O carro, por exemplo, comedor das dimensões, controla as ruas e praças, sequenciado das motos, síndromes de estatísticas e sustos que avassalam. Prisões, currais, viraram o Planeta de cabeça no chão, afã de manter em funcionamento as máquinas rebeladas. A extensão dos lares, o ventre das baleias das cidades, gerou fome de lugares, parques de estacionamento, campos de concentração contemporâneos, sujeitos ao domínio dos ditadores anônimos, ativos em algum ponto da propaganda; um Estado fora de qualquer controle. Aquele cidadão médio dos humanismos não mais existe. Nuvens isoladas de poder apenas agitam membros isolados, na ilusão de conduzir processos abstratos e sórdidos de administração pública. Ainda inexistem rotas de fuga. Dependência extrema impõe tais condições inevitáveis, pois as drogas escravizam.
Tudo representa a apreensão dos profetas dos livros antigos; Moloc habita lá no alto da pirâmide, entretanto invisível, talvez inexistente; números, ondas elétricas, fábricas, resultados matemáticos de instituições arcaicas e frágeis. As ficções do século XX bem que descreviam o que hoje acontece, sob o olhar flamejante dos visionários. No presente, os quadros aí demonstram, sem precedentes, os escravos da própria criação, criadores das ferramentas que viraram enigma, neocativos de outras revelações em vias de acontecer.
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