quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Uma luta chamada futebol

Houve um tempo quando até se falava em futebol arte. Vieram as copas do mundo, com o Brasil ganhando algumas e perdendo outras. Só então os meninos passaram a ver na bola o pino do meio-dia da fortuna. - Pé na bola, meu filho! – diziam, ansiosos, os pais diante da fortuna dourada do futuro, depois de sermos os campeões em 1958.

Depois, o tempo correu atrás da bola, também. Vieram os campeonatos brasileiros, as taças, campeonatos estaduais e locais, maratona de jogos que pedia anabolizantes, transmissões ao vivo de rádio, cota de tevê, vôos a todo lado,  norte a sul, leste a oeste.


Pelés, Garrinchas, Vavás, Gérsons, Ronaldos, Zicos, Amarildos, Romários, viraram artigo de exportação. Aquilo de pensar (sonhar) em jogar bola virou carreira de gladiador, corrida de criar massa muscular a todo custo. Primeiro, a academia; em seguida, as quatro linhas. Do pescoço para baixo, tudo virou canela.

Os meninos, artistas magistrais dos dribles, passes e gingas, caíram nas garras dos empresários e das torcidas; japoneses, árabes, espanhóis, italianos, a peso de ouro, carrões fantasiosos, sétimo céu da fama e amantes, assim correntes glamourosas escravizaram os santos da pelota.

Hoje, o que se diz: Houve um tempo quando até se falava em futebol arte. Lealdade, companheirismo, respeito profissional, passaram a ser história de moleza e frouxidão, pura melancolia romântica.


– Entrar em toda bola, seja por baixo ou pelo ar - exigem técnicos de clubes deficitários para manter a frente da tabela, ou ficar fora da zona de rebaixamento, - que futebol é coisa de homem.


O menino que saiu da várzea à busca dos estádios cheios significa autor de pernadas, carrinhos, velocidade pela lateral infinita, disparadas em prol do gol impossível, da fama, ainda na fase em que o corpo aguentar os bicos contundentes dos zagueiros pegadores da adversidade.


Os gramados já refletem arquibancadas lotadas de outros jovens aventureiros, noutras pelejas insanas, em mundo de que fugiu pelos túneis sentimentais do passado. As chuteiras viraram instrumentos de contatos mortais nas guerras dos coliseus sem trégua, entre a fome e a esperança, que rasgam a pele dos dias, nas noites das arenas contemporâneas. Novos autores de histórias gloriosas, infantes latino-americanos, sozinhos, solitários, apenas ouvem distante aquilo que iniciara tudo isso, lá no começo dourado. Nos campos da Suécia, as lágrimas de um Pelé adolescente antecipavam o que o rio da sorte fácil conduzia em suas águas turvas, essa desembalada disputa cruel dos jovens de chuteiras no reino modernoso do futebol. Toda a beleza dos passes longos e suas conclusões maravilhosas se tornaram aflição e desespero dos cartolas, no banco dos reservas, matreiros agentes dessa modalidade.



Futebol, eis o nome da nova luta que pariram as emoções da multidão nas tardes memoráveis de sucesso humano e suas experiências coletivas.

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