Esse ente que somos nós até que nós o sejamos, e que vive
ali dentro, escondido e agindo solto feito eminência parda, a comandar todos os
gestos, eis que predomina e faz da cena o seu repasto. De memória farta, guarda
de tudo no reservo de suas lembranças, e constrói o próprio castelo de sonhos
onde habita. Vive e espreita todos os gestos, sentimentos, pensamentos,
emoções, desejos; se acredita que lhe atendem, faz de conta que nem existe.
Impera, simplesmente. Tal ente clandestino nas próprias leis deixa acontecer
dia após dia o fluir das gerações.
Quando, no entanto, deduz de suas dúvidas que algo não
corresponde ao que deixara escrito nas hostes do amanhecer, parte, vai em cima,
quebra, arrebenta, faz e acontece, feito vilão contrariado dos filmes de bang-bang.
Torna-se o que chamaríamos de nefasto, indiferente, arruaceiro.
Daí, esses farrapos que cruzam as linhas das melodias de
sofrência; tristeza só, arrependimento, angústia, e tudo enquanto. Um
adversário perigosíssimo do cotidiano das almas destronadas. Produz a cada
gesto. Põe na perdição os galãs, desespera, deprime. A isto que dizem ser o
mal do século, a depressão, disso ele significa o autor intelectual. Comanda e
desmanda.
Bom, assim visto sob o prisma da contrariedade, o
Inconsciente, que acumula todo o passado das criaturas sem deixar fugir nada
que fosse, fica ali detrás do espelho dos dias e determina silencioso. As
visões psicológicas já definiram com fartura sua existência, uma espécie de si
mesmo que mora no âmbito das pessoas que precisam de vir a conhecê-lo e ser ele
mesmo, e de seus caprichos se libertarem. Daí estarmos existindo onde quer que
estejamos. A função primordial, pois, de todo vivente será sua descoberta e
dominação, numa atitude de quem reconhece um ser interior que lhe preenche em
toda sua grandeza, aceitando de bom grado vir a ocupar o espaço da Consciência,
que, desde sempre, aqui estivera e que dele ainda não se dera conta.
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