A madrugada ia alta quando o 23.º Batalhão, estacionado em Sousa, mantenedor da legalidade na fronteira da Paraíba com o Ceará face às movimentações da Revolução de 1930, teve sua aparente calma rompida pela aproximação de um automóvel que trazia as definições do conflito. Logo na chegada, parando o veículo, Juarez se dirigiu à sentinela, transmitindo ordens para o oficial da guarda.
- O batalhão se acha rendido, quero disso
assegurar - foi dizendo. - E avisem ao comandante que vim receber o posto;
espero urgente resposta. A guarnição deverá, pois, obedecer às minhas
determinações.
Sem demora, aquela mensagem seguiu até a casa
do comando, na praça ao centro da povoação. Bem nesse instante, frio metálico
percorreu a espinha dos combatentes, qual rastilho de pólvora, enquanto friagem
cortante ritualizava as bordas do alvorecer sertanejo. Era a gravidade do
momento em via de solução, após dias angustiados de espera.
Despertos no roldão da tempestade, os militares
agiram rápidos a compor o fardamento, meio tontos de sono passado, corpos
oscilantes, envoltos no clarão fumacento das lamparinas dependuradas no teto.
Agitação desconformada estonteava os homens.
Na sala de visitas, o titular da tropa, olhos
baixos, semblante grave, refletia o extremo da situação. Reunira todos;
impunha-se uma decisão frontal: entregar armas, apanágio dos guerreiros, ou ao
máximo resistir.
Depois de vistos em detalhe todos os
acontecimentos, foi ouvido, sem exceção,
quem restava presente. A tendência de rendição parecia inevitável, quando, num
ímpeto, a voz rouca do oficial de comando se fez ouvir:
- Não tenciono me render; ouçam isto como à
minha palavra final. Tem outra coisa além dessa; vou explodir o paiol - em
Sousa ficava situado depósito de munição suficiente para causar danos num raio
de vários quilômetros, caso fosse pelos ares. - Quem quiser me acompanhar, irá
ver agora mesmo.
Falou e, de pronto, se ergueu no prumo de um
dos cantos do cômodo escuro, onde duas latas cheias de gasolina davam azo à manipulação
pretendida. Debalde procuraram os outros milicianos dissuadir o comandante de
qualquer gesto tresloucado, ainda que em vão resultassem os esforços, talvez
pela falta de habilidade, dir-se-ia; assim, não dominaram o suficiente para
impedir outras atitudes. Ele, armado de dois revólveres, abriu de chofre as
rótulas da porta principal do casarão, saindo a esmo na busca dos inimigos,
Juarez Távora e os demais que juntos vieram, para efetuar, no depois, carga de
sucessivos disparos, sendo atingido pelo fogo de resposta e levado exangue ao
solo já vermelho nas claras do dia vindouro.
A viúva desse soldado, residente em Fortaleza,
ao receber telegrama que o dizia preso após rendição, ignorou a notícia,
observando conhecê-lo o suficiente para saber que jamais se entregaria vivo; e
admitiu haver sido o marido morto numa ação de luta aberta, como aos bravos
cabe sobrevir.
(Ilustração: Reprodução (https://www.facebook.com/VictorFidellis/).
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