segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Instinto e consciência

Nesse tempo já saturado de alimentação artificial, em que adotam confundir o sistema original dos corpos com engrenagens das máquinas e dos motores, ocasionando resultados indesejáveis à saúde, causa de excessos, produzindo obesidade, diabetes, males cardíacos, degeneração precoce, etc., etc., quando o belo instrumento de servir a vida inteira dura tão só poucas décadas, juventude perdida nos balcões e bares, isso traz à lembrança dois temas.

Primeiro, a definição dos filósofos gregos quando classificaram o ser humano por bípede sem penas (segundo Platão), ave graúda, montada nos dois pés, e destituída de plumagem, descrição aceita na Antiguidade Clássica.

Em contrapartida, naquela época mesma, Diógenes ridicularizaria o conceito. Depois de depenar um galo, o soltaria em praça pública dizendo: - Eis aqui o homem de Platão!

Segundo tema, o conto chinês do zen-budismo que fala de um pássaro de duas cabeças. Desde cedo, a cabeça da direita demonstrava maior poder de encontrar os alimentos, e dominava todo tempo a satisfação do único corpo, interesseira e agressiva que era. Enquanto a outra cabeça, lenta no raciocínio e nos reflexos, perdia as chances, ainda que quisesse, de desfrutar prazeres do bico.

Viviam competindo entre si pelo direito de comer. Quase nunca a cabeça da esquerda levava a melhor. Insatisfeita no jogo, a perdedora descobriu onde havia saborosa planta, todavia ofensiva à saúde. Sem medir consequências, daí conduziu a outra cabeça a experimentar do fruto proibido, no que se fartou intoxicando o corpo e as duas cabeças. Naquilo, imaginara vencer a concorrência por meio da avidez da adversária, esquecendo, contudo, serem comuns os frutos da indigestão que eliminou também a si própria.

No procedimento equivocado desapareceriam as duas cabeças, sobrando, ao final, nem vencido nem vencedor. Algo semelhante à sede das corporações mercantis de hoje, que acarreta toxinas em doses cavalares oferecida livremente nas lojas das tentações gastronômicas. Num lado, o instinto do prazer desmedido. No outro, a inabilidade das consciências ainda inocentes.  

(Foto: Jackson Bola Bantim).

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