quarta-feira, 8 de junho de 2011

A história do homem

Dentre os contos zen um existe que fala do rei Zemir, que viveu na Pérsia antiga. Ele chegara ao trono na flor da juventude e nutria esforço inaudito de conhecer as razões da vida humana.

Reuniu, certa vez, sábios das mais diversas procedências e resolveu custear a pesquisa sobre os propósitos últimos da história e transmitir aos súditos as conclusões desse estudo, o que saberia ser relevante para fixar os padrões da sociedade que comandava.


Escolhidos na função, pesquisadores renomados isolaram-se em província afastada durante 20 anos, a dedicar suas inteligências às possíveis e imagináveis notícias procedentes de todas as bibliotecas do Oriente, até formarem a primeira edição daquilo que seria o escopo da consciência individual, trabalho exemplar de erudição e engenho. No fim, levaram o resultado ao palácio do rei Zemir.

Transportaram em lombo de animais 500 volumes elaborados nas duas décadas de exames minuciosos.

O monarca abriu espaço nas suas obrigações e recebeu os sábios, em dia especial, cheio de pompa e movimentações, porquanto, coincidência ou não, a data assinalava os 40 anos do rei, motivo de maior alegria pelo resultado apresentado.

Mas qual o quê! Maior não poderia ter sido sua decepção. Achou por demais sofisticado o trabalho trazido, cheio de rebuscamento e pouco objetivo no sentido daquilo que propusera. Refugou desde logo toda a vasta literatura, aceitando, contudo, prosseguissem com a tarefa, reapresentando-a noutra ocasião.

Passados outros 20 anos envoltos no exílio da missão, belo dia retornam os pesquisadores, dessa vez munidos apenas do que fosse o resumo da humana aventura terrestre.

O rei mostrava feições já maceradas pelas sucessivas preocupações e dedicação que lhe impunha a responsabilidade sobre aquele povo. Recebia, no entanto, alegre os emissários, dizendo que seus olhos guardavam pouca energia de ler, e aguardava a síntese da história de há tanto esperada.

Nova contrariedade o invadiria, pois os escribas ainda traziam ao rei carga de três camelos prenhes de nutridas páginas, uma vez mais recusadas pelo soberano.

Também saturados em anos, pela terceira vez eles se recolheram às montanhas distantes, querendo de qualquer modo efetivar o tal resumo dos resumos, a fim de satisfazer Zemir.
Na próxima viagem, dez anos depois, um único elefante transportava o que sobrara de toda a obra, motivo da nova recusa do monarca, quase cego e alquebrado.


E cinco anos mais tarde, os poucos sábios que resistiam ao esforço decidiram cumprir derradeira entrevista perante o rei Zemir, ora recolhido ao leito, em grau de adiantada enfermidade.
Nesse dia, o principal responsável pela missão dirigiu-se ao soberano e falou próximo aos seus ouvidos:


– Alteza, enfim conseguimos abreviar em poucas palavras a história do homem que encomendaste. Veja só, ele nasce, sofre e, ao término, morre. – Ao escutar essas palavras, a sorrir, o rei exalou seu derradeiro suspiro.

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