quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Ato de bravura



Era pouco antes da meia-noite da segunda-feira, 04 de agosto de 1930, quando o apito da maria-fumaça ecoou na Estação Ferroviária, dando partida na composição da Rede Viação Cearense que levaria o efetivo do 23.º Batalhão de Caçadores, sediado em Fortaleza, com destino a Lavras da Mangabeira, no inteiro do Estado. A missão ainda não revelada do contingente viria a ser de vigiar o acesso ao Estado da Paraíba, onde, na cidade de Princesa, ocorreram confrontos ameaçadores da ordem federal.

Sob as ordens do tenente-coronel Pedro Ângelo Correia, o 23.º BC se deslocaria até Sousa, levando no seu bojo, porém, inoculados germes da conspiração entre os oficiais, que logo engajariam na revolução a se alastrar no País inteiro.

Contudo, o comandante da tropa seria o maior entreve a essas movimentações rebeldes, dado seu zelo ao posto e o rigor no cumprimento do dever militar, firme vontade e enérgico nas atitudes, o que demonstraria mais adiante, face ao desenrolar dos acontecimentos.

Às 17h15 do dia 06 de agosto, o batalhão chegou a Lavras. No dia 12 daquele mês, às 6h30, voltou aos trilhos com rumo ainda ignorado pela soldadesca, às 13h adentrando a cidade de Sousa.

Naquele dia se fechava o cerco à Paraíba pelas tropas do Exército, no sentido de evitar o levante armado que fermentava no Estado após a morte de João Pessoa, alimentado com armas e munições que cruzavam diversos pontos da fronteira.

Iniciavam-se, no entanto, as defecções entre os diversos níveis da guarnição. Pensasse que não e o movimento tenderia a crescer, originário de outras fontes externas, no próprio oficialato de outras corporações.

Na madrugada de 04 de outubro, ouviu-se um disparo de fuzil efetuado pelo primeiro-sargento Manuel Francisco de Lira, fiel ao comandante. Desde então ações desencontradas mobilizariam o Posto de Comando. De início, os insurretos pretenderam anular pela força física Pedro Ângelo e evitar maiores conseqüências. Após aquele tiro as coisas se precipitaram.

O comandante chegou na porta do posto, local de imediata afluência dos soldados e oficiais, e quis saber a razão do barulho inesperado.

- O batalhão está sublevado sob o meu comando, e o senhor considere-se preso de ordem do general Juarez Távora – foi a resposta do tenente Ary Correia.

Indignado e reafirmando a sua condição superior, Pedro Ângelo lhe fez fogo à queima-roupa, gerando daí celeuma intensa, tanto dentro, quanto fora do prédio.

Algumas horas mais e o claro da manhã que se aproximava evidenciou outras escaramuças, nas quais sairia ferido com gravidade o major João César de Castro, caso testemunhado pelo único sobrevivente da hora, o soldado Clóvis, sua ordenança. O comandante Pedro Ângelo Correia resistiria com denodo aos rebelados.
Segundo descreve Otacílio Anselmo e Silva, à época integrante daquele batalhão, no artigo O Ceará na Revolução de 30, publicado na revista Itaytera n.º 1, de 1955, do Instituto Cultural do Cariri, Crato CE: 

O soldado Clóvis ouviu o derradeiro brado do herói: Não morrerei acuado como um cão. Vou morrer no campo da honra.

Vimo-lo reaparecer no meio da área e penetrar no banheiro ao lado oposto de onde saíra, após executar um disparo. Uma bomba arremessada sobre o teto afugentou-o dali. Ao sair, foi colhido por uma descarga no centro da pequena área, junto ao portão de ferro. Tombou fulminado, em decúbito ventral. Tinha à mão direita uma pistola Parabellum, sua arma regulamentar; no bolso traseiro da calça estava o seu inseparável Smith & Wesson com o cano voltado para cima; e a seu lado, não muito longe, o mosquetão que lhe saltara das mãos. Seriam sete horas da manhã.

Ao ser notificada, por emissário do 23.º BC, de que Pedro Ângelo se achava preso e com saúde após a rendição do batalhão que comandava em Sousa, sua esposa, ciente da coragem e obediência do companheiro, dissera aos filhos do casal:

- Filhos, botemos luto; vosso pai morreu... – de acordo com o texto acima citado.

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