sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O exercício do poder

Inícios dos anos 70, quando o Cariri recebera os primeiros sinais de televisão, e assisti, na TV Tupi, a uma matéria do polêmico apresentador Flávio Cavalcanti. Constava de entrevista com antiga cozinheira do Palácio da Alvorada ao tempo do presidente João Goulart.

Então pedira o entrevistador que dita senhora contasse qualquer detalhe das experiências vividas à época junto do Presidente depois afastado pelo golpe militar de 1964. Ela lembrou ocasião quando indagara de Jango dos seus sentimentos quanto ao exercício do cargo de primeiro mandatário da Nação:

- Presidente, é bom ser o Presidente?

Goulart ouviu a pergunta daquela senhora simples, responsável pela preparação dos alimentos de que se servia na residência oficial do Governo, em Brasília. Guardou silêncio durante alguns instantes e de olhos estendidos no vazio da imaginação avaliou:

- Sim, é bom ser o Presidente, mas há momentos em que não gosto nem um pouco desta função. E ainda acrescentou: - Isso porque nunca sei que são os amigos e inimigos. Ali na frente, todos se desdobram para agradar, mostrar serviço, querendo aproximação, atenção. Por trás, ninguém sabe o que acontece dentro deles, dos que privam da nossa confiança, do nosso convívio pessoal.

Com isto, guardei na memória as palavras do estadista maior do País em fase crítica e contraditória, vítima posterior das demaches políticas que lhe destituíram do cargo de modo arbitrário e o jogaram ao exílio uruguaio, onde pereceria sem direito de regressar ao Brasil.

O poder impõe condições assim, exclusivas e solitárias, segregando líderes a reduto de cidadelas inalienáveis, camarilhas mantidas a sete chaves pelos apaniguados, cordões sanitários dos interesses particulares. Sobremodo em épocas de conflitos, nas lutas típicas de comando, há negror e conspiração da parte de assessores íntimos dos governos, de si já distantes em as relações com o povo. Insistem nos métodos tecnológicos recentes na montagem de pesquisas, estatísticas por vezes forjadas nos gabinetes maquiavélicos a peso de ouro e custeadas pelo erário. 

A propósito de tais reflexões, Jango fora ministro e discípulo herdeiro do trabalhismo de Getúlio Vargas, presidente brasileiro que também amargurara a decadência do poder e final melancólico, dez anos antes, capítulo de nossa história de tantas indagações a responder.

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