Consta
da tradição chinesa que, no século VII da nossa era, existiu um jovem conhecido
por Hui-neng, discípulo dedicado aos estudos das coisas religiosas de sua
crença a ponto de chegar ao posto de patriarca do Zen-budismo.
Lenhador
e analfabeto, sensível à vocação que abraçara, foi admitido no mosteiro da
ordem apesar de não possuir quase nenhum conhecimento literário das santas
escrituras da religião.
Desde
o noviciado o discípulo chamava a si toda a atenção do quinto patriarca, que
nele distingui o seu próximo sucessor.
No
entanto, sabedor das artimanhas dos outros monges e querendo prevenir os
efeitos característicos da inveja, esse cancro insano da humana natureza, na
hora certa, buscou transmitir em segredo a Hui-neng o manto e a tigela que
simbolizavam as funções de Grande Mestre da corporação monacal que dirigia.
Sem
alimentar qualquer esperança de natural aceitação dos demais pelo seu gesto, a
um só tempo orientou o devoto para que rumasse ao sul do país, afastando-se o
máximo da presença dos outros candidatos na sucessão do mosteiro.
Passados
alguns dias, margem suficiente a que o fugitivo percorresse larga distância, o
patriarca reuniu a comunidade e revelou, nos justos detalhes, o que acontecera.
Com isso, de logo, monges exaltados saíram ao encalço de Hui-neng, decididos
resgatar a tigela e o manto, prendas de graduação evolutiva na corporação,
considerando imprópria a medida do superior.
Quando
Hui-ming, ex-militar e um dos rebeldes dispostos a utilizar a força para obter
seus intentos, galgou chegar ao pouso onde o sexto patriarca se refugiara, este
jovem monge apenas largou sobre uma rocha dali os cobiçados objetos que consigo
transportava, ao instante em que buscou evadir-se, afirmando, contudo:
-
Este manto que me envolve representa o sagrado; não me sendo correto por ele
usar da violência em nenhuma hipótese.
A
seu modo, homem de força bruta considerável, Hui-ming correu em direção do
manto e da tigela. Aquilo a princípio tarefa das mais insignificantes tornou-se
improvável, porquanto, ainda que despendesse suficiente energia, nada resolveu
de retirar os objetos que se achavam como que integrados pela rocha.
O
fenômeno insólito assustou-o sobremaneira, alertando quanto aos aspectos
transcendentais da situação. Como inútil para repetir as tentativas, Hui-ming
só então observou o valor especial do novo patriarca, nunca tão indicado ao
título que recebera.
Cabisbaixo,
nessa hora mudou de atitude e exclamou:
-
Trabalhador, eu vim aqui pelo ensinamento, e não pelo manto!
Hui-neng
retornou ao ponto em que largara o desafiante, dirigindo-lhe saudação
respeitosa e pedindo que explicasse o ensinamento recolhido daquela
experiência, e resolveu por inteiro a crise que se esboçara.
Entre
os textos zen, esta história é conhecida como O sutra de Hui-neng, que serve de transmissão de preceitos há
vários séculos.
Tão lindo este rosto...tão querido... não sei se me impacta mais o texto ou quem escreve...
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