quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Pelas ruas da cidade II



O que mais me surpreende é reviver tantas e tantas lembranças ao passar nos mesmos lugares onde antes andei. São muitas as cenas, muitos os personagens; as mesmas histórias que, ali, dantes, aconteceram e as presenciei, ou vivi. Sem tirar ou acrescentar, vejo nisto memórias, trançado de figuras conhecidas lá dos idos anteriores, que agora fincam os pés naquele chão onde pisaram. Nisto, lhes acompanham os desdobramentos, as situações; por vezes ingratas, talvez. No entanto, persistem, ainda que, decerto, hajam seguido a outros planos de depois. A cidade permanece viva desde sempre nalgum lugar das presenças, relatando, horas a fio, os enredos, quais filmes já exibidos nas salas de projeção dali de perto.

Quero crer ser assim com quem insiste andar pelas ruas das cidades onde, noutros tempos, viveu suas ocasiões de estar aqui. Nisto, o que mais espanta são elas, as pessoas que foram continuar ligadas à gente, a uma espécie de sobrevivência de qualquer custo.

Dentre elas, estão amigos, conhecidos, tipos populares, criaturas preservadas nas entranhas, tais habitantes doutros momentos e também destes. Nessa memória viva estariam todos e suas contrições. Viventes perenes daquilo que foram, entranhados pelas vestimentas do tempo ficam existindo. Conquanto se pretenda achar só perante esse contingente de visagens, nos veem indiferentemente, em um arremedo calcado na ausência de, nem de longe, pretender serem avistados por quem quer que seja.

Independente, pois, da estação em que isso ocorra, às vezes cresce no íntimo impressão de ser desse jeito que passam as gerações, e que, apesar das contingências já terem preenchido as paisagens das épocas, delas ficaram a bem dizer daquilo proprietárias inalienáveis.

Porém sinto essas marcas consistentes dessas tais pessoas vagando nas calçadas, nas praças, lugares outros, fantasias em movimento incessante na alma dos seres dagora. Basta apenas fixar os entremeios de casas, comércios, e o traçado das ruas e, dali, os intérpretes doutras ocasiões se fazem presentes sem a menor cerimônia. Quiçá fruto das recordações, dos estilos e sentimentos, cores, sons, fisionomias, daí, na constância dos dias, insistem permanecer e morar lá dentro de cada um que ora exista.

(Ilustração: chat.mistral.ai).

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