terça-feira, 18 de abril de 2017

O sonho do impossível

Impossível no aqui do rés do chão, onde habita a desilusão da carne de endereço já conhecido. Aqui, pátria em que o limite do perecível se desmancha no ar feito matéria dos sonhos gastos. A gente alimenta a perenidade do prazer, e prazer nega fogo, quase inexistência, não virasse assunto só de memória, leito frio do passado. Nisso, correr para onde? Passado, inexistência acumulada. Futuro, expectativa. Só o presente, silêncio, teimoso, a contorcer as entranhas do desejo e alimentar os becos da solidão.

Vêm os mestres e noticiam a esperança. Nutrem a vontade e a fé, sussurram do inexistente as notícias, mesmo que diante das maquinações da sorte que insiste deslizar das nossas mãos. 

No entanto heróis sobrevivem na história, sustentam ideais ainda que impossíveis. Resistem naquilo que defendem face ao desconhecido. Avistam o que outros não vêem. Indicam alternativas nos reinos de outros mundos. Revelam municípios estranhos à ordem daqui debaixo. Dão mesmo a própria vida em favor dos segredos que contaram aos homens adormecidos. Falam de mares profundos na alma do Inconsciente. Demonstram a ciência da certeza de persistir depois que passam, portais da imortalidade plena.

Falam do que ninguém pode falar sob o peso da matéria densa do corpo só físico. Noticiam de universos imaginários inimagináveis. Dão, por isso, a vida nesta dimensão de impossibilidades, aonde chegam e voltam todos os dias os milhões de corpos físicos. De coragem admirável, eles mergulham no mistério e regressam contando de sonhos reais lá de onde não existe a morte. Além disto, equilibram o vazio na força do caráter, da seriedade, dignidade. Os místicos, salvadores e únicas alternativas perante a inexistência. 

Novidades eternas só vindas de fora, doutros ares que não desses, lá de onde o impossível inexiste, e o sonho prevalece. Reinos felizes, mundos divinos para sempre.     

(Ilustração: Wassily Kandinsky).

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