Dalgum jeito ouve-se o sussurro desse ente maior que preenche o espaço tanto de dentro quanto de fora da percepção das pessoas. Em tudo quanto há, o Tempo demonstra o senso das escrituras e fala na alma das criaturas, a dizer desse infinito generalizado que percorre suavemente as vísceras dos acontecimentos a cada instante. Espécie de ser imaginário além do próprio mistério, e circula livremente nas sombras, a falar dos credos e sonhos que invadem a distância numa velocidade jamais comparada senão através de fórmulas ininteligíveis e surdas. Multidões de vultos persistem na ânsia dos duendes que formam as nuvens e deslizam pelo azul das consciências; apenas aceitam o inevitável e adormecem à sombra de ilusões sucessivas.
Os tais seres encapuzados, que presenciam o afã dessa força
enigmática do Tempo, saem à solta feitos fagulhas a envolver os momentos e
desaparecem logo em seguida. Longe de conhecer a existência em toda sua
luminosidade, aguardam suarentos as consequências do que existe e que lhes devorarão
as entranhas sob determinações infalíveis. A sentença da liberdade é bem esta,
de usufruir os fatores que enchem a História de zilhões de fragmentos, páginas
soltas deste livro oculto das gerações, numa soma expressiva dos destinos em
decomposição visível feitos lâminas e cicatrizes.
Quiséssemos, pois, ouvir do Tempo suas canções e dormiríamos
contentes, mesmo na face obscura do que ainda não admitimos e que nos devora a todo
passo, na tal decadência dos séculos. Seremos desse modo só os observadores das
circunstâncias e senhores da solidão pessoal. Marcaremos de monumentos a
sequência dos sóis que nos seguem apressados de não saber aonde chegar, que
trazem manchas e modificam os fenômenos ao sabor dos seus caprichos.
Enquanto isto sustentamos a luz dos sentimentos puros no íntimo de nossas
individualidades.
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