quinta-feira, 11 de setembro de 2025

O espelho das palavras


Quais respiração do Tempo,  nos tocam e pedem auxílio, aqui. Contrafeitas, sustentam o ritmo dos destinos e se desfazem logo em seguida. Nisso, padecem as criaturas e deslizam pela superfície do inevitável, aos pedaços distantes das consciências. Cores, trinados, luas; conquanto sujeitos das artimanhas do presente inextinguível, e sustêm a válvula da Criação, desde sempre. Vêm, narram e somem. Marcam as faces de tatuagens, suas rugas amorfas, gotas do orvalho da visão que se apaga nas ausências.

Lá longe, no entanto, pelas calçadas escuras do inexistente, bem ali, atravessam as muralhas da solidão de todos eles, a querer dizer do uso que façam delas, das mesmas palavras que lhes alimentaram a solidão. Desfazem os sentimentos por meio disso, da necessidade urgente de narrar as dores do firmamento, sem saber mesmo o que esteja por trás dessa visão insistente de falar e ver acontecer. Eles, elas, testemunhas do Infinito, na história deles, delas.

Porquanto estejam em tudo, são quem vive e não as pessoas, pois estas somem e aquelas hão de permanecer ao longo das lendas, ruas e estradas afora. Acesas, impõem condições de que nem os raros dispõem desse poder de sobreviver; elas assim permanecem de junto do Ser eterno. Descrevem, depõem, oferecem meios outros que nem só os momentos fugidios dos corações.

Nisto, as massas humanas contemplam a paisagem dos dias e obedecem ter de seguir em frente. Deixam suas cicatrizes nas palavras, hálito do mistério de existir e desaparecer. Vive-se, pois, de contemplar a sequência dos desertos e das areias de tal segredo que é o transcorrer do quanto existe. Numa delas, fosca massa de manobra dos trâmites ocorre a cada segundo e, passadas que seja disto tudo, sobrevivem à voragem do definitivo. E sorriem por dentro, feitas de visões escondidas nas lembranças; a fala das palavras, resquícios dos amores e sonhos que virão depois de haver sido.

(Ilustração: Hieronymus Bosch).

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