terça-feira, 12 de novembro de 2024

O Açude Velho


Tudo na fazenda gira em torno dele. Principal reservatório do Tatu, a fazenda em que nasci, e que dispõe também do Açude Novo. O Açude Velho sempre marcou a vida naquele lugar, pela altura e extensão de sua parede, na qual transitaram comboieiros, viajantes e os primeiros automóveis da antiga estrada do Cariri a Fortaleza.

Nessa parede, em princípios do século XX, diante de chuva descomunal, dona Fideralina atravessaria madrugada inteira de angústia, a andar para cima e para baixo, em sua cumeada, de rosário nas mãos, a pedir que a cheia amainasse e mantivesse a barragem intacta, o que não aconteceria, pois antes de nascer o Sol seria essa a única vez em que a represa arrombaria, levando no eito toda safra de cana situada no brejo abaixo, prejuízo de um ano inteiro de trabalho.

Histórias outras transitam pela memória dos que viveram e vivem às margens daquelas águas, de vultos noturnos que desciam do beco do engenho e desapareciam no seu leito, sem deixar qualquer vestígio ou referência nas coisas materiais.

Nas três represas cobertas de capim de planta, no período de estio, e de aguapé e babugens, nas cheias, pululam marrecas, rachanãs, galinhas d’água, socós, num festival de sons, penas e cores, a torná-las parte dos mistérios profundos das águas insondáveis, avistadas quais espelho infinito do oitão da casa grande, lá no alto.

O banheiro limpo, na borda próxima da casa, ao qual meu avô descia ainda no lusco-fusco das madrugadas para a higiene matinal, serve de logradouro nas manhãs de domingo, alegria da meninada e ponto de encontro dos adultos em farra.

Nas águas do Açude Grande aprendi a nadar no estilo sem estilo dos caboclos, nos banhos coletivos, a jogar cangapé e me aventurar em travessias mais longas, a demonstrar coragem ou afrontar a sisudez dos mais velhos.

Há notícias de pessoas tragadas pelas águas, só encontradas no porão, lugar de maior profundidade, devido a vela acesa numa cumbuca, causando espanto às crianças que escutavam os relatos, sobretudo em noites estreladas, no alpendre da casa.

Certa ocasião, inícios da década de 60, levado por meu pai, presenciei uma pescaria em toda área do açude. As águas baixaram tanto, por conta de invernos deficientes, que marcaram data e trouxeram os habitantes da redondeza numa ação comum. Nunca vira tanta gente reunida quanto daquela vez, quase na lama, com água pelos joelhos; um formigueiro de pessoas, a fim de não perderem o peixe, no risco do total esvaziamento das águas.

Landuás eram os instrumentos mais usados, seguidos de tarrafas e galões, nas diferentes malhas. Ao peixe nenhuma chance se daria. Dentro de pouco tempo, as enfieiras, os sacos e outros recipientes esborrotaram dos exemplares de tamanho variado, curumatãs, trairas, piaus, pescadas, mandis, e até cágados e muçus; ali não existiam piranhas ou os atuais tucunarés, tilápias e tambaquis.

Em torno das águas do Açude Velho ainda hoje repousa a história da comunidade, que delas se alimenta, os poucos habitantes que ainda restam na fazenda, vida que nutre a vida que delas se nutrem há perto de três séculos, sem parar um único dia.

domingo, 10 de novembro de 2024

Palavras vivas


Tantas vezes a memória deseje conhecer a si mesma, nessas horas recorre às palavras, num afã de causar espanto aos menos avisados. Por isso, há infinidades de livros espalhadas no chão, desde sempre. No início em pedras, fiapos soltos de couros e sobras de vegetais envelhecidos; depois, nessa fome de continuar, vem a razão de quantas pelejas e inúmeras guerras siderais, desejo de muitos em contar do instinto da procura e das dores da ausência.

Talvez dadas essas justificativas, quer-se a todo custo achar um espaço à compreensão, enquanto, na verdade, são esforços desmedidos a conter o silêncio, este que jamais deixou de controlar as horas e dominar os pensamentos. Mas ainda que seja assim, lavas vulcânicas de sentimentos seguem a trilha do passado e invade os olhos dos humanos. Palavras, palavras mil, durante essa fome do desejo, susto de viver dos que estão feitos vultos assombrados na procura da Luz.

Conquanto meras letras mortas do Destino, essa multidão entontecida às noites sai no encontro de rever saudades agressivas e adormecem sobre o palco das lamúrias, querendo, qual seja, ao menos sustentar o sonho de sobreviver a qualquer custo. Bem nesses instantes, todos valores preenchem a barca do Infinito. São espécie de desencontros em face do inesperado, cientes, até, do que lhes possa vir da aventura incessante que transportam no peito, senhores de iguais e sórdidas penalidades do que seja desconhecer as razões de estar aqui bum só instante.

Nessas ocasiões de amargurar a solidão da própria alma, nesses momentos de susto e lucidez inevitável, elas, as palavras, gritam no coração a pedir paz, humildade, compreensão. E avançam caladas pela floresta escura do desconhecido, a rasgar derradeiros motivos de continuar e vencer o distanciamento vindo nas mesmas mãos que os sustentam nas dobras do mistério. Daí o fulgor que ilumina céus e terras, pelas folhas esquecidas de todos os livros abandonados nas ilhas do esquecimento. Nisto, regressam gerações inteiras, ao som das sinfonias esplendidas que alimentam e acalmam as angústias de existir.

sábado, 9 de novembro de 2024

Cores mais fortes


Surpreendentes e livres, feitas chapéus voando arrancados pelo vento das madrugadas, palavras escapolem no ar pedidos fervorosos de socorro, à busca súbita de outras cabeças onde repousem noutros pensamentos clandestinos. Aliás, pensamentos talvez digam pouco para expressar o ímpeto do coração nessa indefinição entre as trilhas do desejo e a matéria elaborada no forno da cabeça, para chegar à boca mecânica, indiferente. Isso que seja mais sentimento, invés de pensamento.  

Daí, na intenção original de quer falar, espécie de exanguidade em lua de mel, quando, por mais se insista em conter o desejo permanece, o coração andava cauteloso, sem querer abrir asas de liberdade, após experimentar emoções contraditórias de velhos desencontros. A presença dela, no entanto, encheu de oxigênio puro o peito, as fibras dos pulmões atrofiados na limitação oficial voltaram a folear com gosto. Compactados nos fios de pedra dos cânones, elas apenas seguiam sonhos em doses permitidas nas rodas oficias, beijos de mão e leves afagos nos braços descobertos da etiqueta. Nada que ultrapassasse a censura da impressão alheia.

Nisso, ela invade faceira o salão de baile das noites dimensionais e rasga as fibras cor de jambo dos tecidos cardíacos, rompendo no gesto o império bizantino do medo casto dos regimes ditatoriais. A primeira imagem que ressurge depois, no minadouro das ideias, seria, qual movimento de penetração solar nas fímbrias virginais do horizonte; albores das lindas manhãs de luz; intensas paixões desarvoradas. Laivos vermelhos, com riscas laranja e pomos de amarelo queimado, a brancos contornos precisos.

Ela, um dia de manhã, agora beleza sem precedente dos gestos inevitáveis da alvorada, havendo guerras, convenções, incertezas humanas; ela, explosão de suavidade gravada profunda nas paredes internas do infinito. Divina gazela no jardim do Paraíso, anda macio no meio de cactos, boninas, luares, marmeleiros, zumbido solto de linguagem cifrada, cumplicidade sideral das abelhas, riscos e desenhos magistrais de perfumadas flores, nas vestes esvoaçantes em corpo escultural.

Existem, sim, os refolhos do mistério, que abrem suas portas caprichosamente. Espécie de ser que desperta envolvido no líquido dos partos recentes, mexe o corpo no exercício da existência e acostuma em si o primor das possibilidades. Distende a silhueta enigmática num gesto harmonioso de incertos passos e ombros se erguem à certeza.

O coração, por sua vez, amacia o impacto dos primeiros raios sobre a superfície de cores vivas e deixa encrespar suas águas serenas, aquecendo a pele na lúcida imagem do céu que contorna de ramagens verdes um nascer bem devagar, e desperta feliz o dia de sol intenso.

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Livros são espelhos


Ao ler, lemos a nós mesmos através da projeção da visão e identificação, nas páginas escritas, projeção dos nossos conteúdos pessoais, pensamentos, cultura, conhecimento recolhido no decorrer do tempo. Vem daí a importância inigualável da leitura como fonte reveladora do Ser, quando revemos o que dispomos acumulado em nosso interior, recordando coisas aprendidas, movimentando reservas em nós depositadas nas sombras do passado que existirá sempre na mágica indestrutível da consciência individual. Essa consciência, que junta de si nos outros, forma bloco único e eterno das coisas a se revolverem no ato de ler, as quais são denominadas de inconsciente coletivo, nada além da formulação universal dessa Luz universal da Natureza maior.

É uma moeda que revela seus dois lados em apenas um só lado único, pois. Inexistirá divisão nesse padrão de todas as manifestações em consonância, representadas em face única e particular, o singular do que antes se supunha uma pluralidade infinita e múltipla. Milhares de faces de todo único individual, indivisível. Tudo e todos em um só e único, mesma face da moeda solitária a percorrer o cosmos em viagem sideral através das inúmeras consciências do único formato, entre si interligado por fibras internas da primeira essência.
Ler, portanto, percorrer a face de dentro do conhecimento em elaboração no lado íntimo das individualidades, atualiza essências anteriores da mesma face em novas revelações, constatação original da vez primeira em retorno às vezes outras que se repetem no ser individual-plural, no bloco indivisível de cada ser. Ato de procurar e encontrar a um só tempo, qual ente que desloca seu foco de consciência através da mesma rede imperecível que nasce da fonte perene do ser-conhecer em ação permanente.
Quando lemos, por isso lemos a nós próprios. Atualizamos causas primeiras e consequências posteriores da elaboração de pensamentos e discernimentos, configurando, outra vez primeira, as reações secundárias do que já foram ações primárias, nas letras, palavras e sentidos das novas edições do ato único de compreender que confronta a nós próprios.
Nesse processo da comunicação, as consciências se refazem muitas infinitas vezes, pelos seus próprios atos, no mistério persistente do ser em constante vir-a-ser, resistência, continuidade suspeitada de sobrevivência dos valores da unicidade nas coisas que se sucedem pela essência primeira, na continuidade de tudo em um foco perene, manifestado nas horas diversas e em imagens fragmentadas de futuro aparente, ilusões de particularidades que resultam das imagens únicas em movimento, porém indivisíveis, da mesma e só uma consciência do momento presente em cada lugar do imenso si mesmo todo tempo, e em cada um dos indivíduos atores, através dos quais se manifesta, portanto.
Nisto desvanece o princípio arcaico da multidão de subjetividades e se desvela o conceito pleno da indivisibilidade primeira e eterna do Uno, ser causa cáusica de tudo, Ser essencial, motor dos primeiros postulados, de quem derivaram todas as pretensões anteriores do dois manifestado e também existente, face dupla do Ser criador vivendo em nós, no entanto sem divisão.

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

Uma força misteriosa


Romance, uma palavra que lembra os tempos áureos da grande literatura e suas vertentes de variadas nuances, geração após geração, civilização após civilização, épicos períodos das sociedades guardadas em longas tiradas de felizes autores. O jeito de revelar o instante de cada povo, seus lugares, acontecimentos marcantes, imemoriais, ação ininterrupta e fértil, que depois geraria o campo magnânimo do cinema, em formidáveis e inesquecíveis superproduções, oráculo dos dias contemporâneos, ainda subaproveitado em toda sua potencialidade, sobretudo através da televisão, o monstro sagrado infiel da cultura.

Nisso, o tempo do romance jamais passará, porquanto transborda de força viva dos observadores que se revelam a cada tempo, de ritmo estrepitoso, cadenciado nos dramas cotidianos, revelações que carregam o multiforme da vida, por meio dos escritores de época e suas inspirações inolvidáveis.

Uns vêm e se encaixam no processo fluido da existência sem a coragem de ousar. Outros, no entanto, acreditam e insistem, até conseguir realizar o que lhes cabe. Um de nós há de fazer cada escolha pessoal. Um enigma isso de viver. Mais um dos tantos enigmas que se apresentam no passar das gerações.

À grandeza fica por conta das opções individuais, que responderão por si. Nisso, o próprio gesto de observar fenômenos em volta, seja no dia-a-dia, na digestão, nos movimentos da natureza, nas falas, nos animais, pessoas, clima, jornais, revistas, computadores, livros, filmes, tudo que compõe a enorme sinfonia de avaliação das moléculas do viver, da gente e dos demais em volta, a permitir que se promova uma leitura fértil e útil do panorama que se testemunha.

Daí a obra de arte e o gosto que as pessoas sentem ao querer acompanhar aquilo que se produz, juízos mais que suficientes a se formar um mundo mais sábio e mais humano. Este o dever das almas, dos herdeiros do Universo.

Há tempo em tudo


Quando me vêm as lembranças ocasionais, livres de serem chamadas, e me tocam os pensamentos e sentimentos, claramente observo que quem passa somos nós e não o Tempo, que permanece altivo nas lembranças acesas, a regressar quais seres em si independentes. Nisso, tais habitantes de um mundo próximo deste, no entanto vivo, indestrutível, a bem dizer eterno, sobrevivem em tudo e seguem adiante dotados de qualidades até aqui ignoradas. Minérios de subsolo gigantesco, compõem o quadro das horas e sustentam a estrutura firme do Universo de que também somos parte.

Num esforço descomunal, se deseja resistir aos caprichos desse Infinito poderoso, todavia mero empenho que, de novo, desaparece ao mesmo tempo donde tudo viera, nós, inclusive. Resta, nisto, a substância da memória, que fertiliza o subsolo da imaginação. Fragmentos, pois, dessa trilha inigualável do Tempo, somos testemunhas daquilo que nos faz, dia a dia, também senhores de um resultado perene, a soma de todos os instantes, que só aparentemente transcorrem, dessa aquarela maravilhosa da Natureza.

A conta disto, formulamos as mais diversas composições de perfazer existências, enquanto assistimos submissos o fluir das gerações, e nós e os nossos momentos em volta. À medida em que desfazemos a história, somos assim desfeitos, em contrapartida, pela sequência inevitável das horas, atores e diretores de peças estonteantes nos palcos da visão que logo se desmancham pelos ares.

Tanto pedem, contudo, que não seja, e que pudéssemos prevalecer face ao destino, sonho por demais elaborado que constitui a luz da Consciência na busca da perfeição, no sentido das filosofias, religiões e inspirações. Conquanto lá, então, desejemos tamanha esperança, somamos os pensamentos e sentimentos trazidos pelas lembranças, no sonho de realizar a plenitude desde sempre alimentada.

segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Dimensões


Vez em quando me pego, de novo, a olhar o céu a querer avistar o Infinito logo ali, no entanto, quando difícil. E saber que existe algo além na profundidade da visão, ainda que isso apenas suma por vezes sem conta no azul lá longe, longe, bem longe. Será que há nuvens no Cosmos iguais as daqui? Querer saber, essa vontade esdrúxula, estranha qual essa palavra esdrúxula, que teima em nos acompanhar onde seja que estivermos. Tal ânsia de perguntar a quem?, à busca de respostas soltas pelo ar, tais blocos de palavras e pensamentos largados, que fossem, no firmamento cá de dentro da gente, de algum Autor...

Isto das dimensões que tendem crescer nos horizontes dos dias afora, busca insana de conhecer e ter de seguir adiante, mesmo sem as constatações mais suficientes, porém. Um céu vasto, ao dispor das criaturas... Mundos ignotos... Universos distantes, na vastidão que nos envolve nos sonhos vagos de outras histórias, outras gentes, naturezas, lugares, paisagens, sóis, luas, estrelas, gravidades, criações...

Nisso, as vidas que se sucedem em movimento e que estabelecem novas emoções nas novas criaturas; seres misteriosos a nos contemplar de seus lugares, sob outros critérios de avaliações e interpretações, linguagens. Suas naves, suas cores, formas, linguagens, imaginações, enquanto aqui persistem os níveis de sensibilidade e atitude face ao insólito dos tempos, dos motivos de existir, das nossas limitações.

Querer, por isso, reduzir à pequenez dos humanos as possibilidades de tudo, enfim, eis o teto da visão que persegue gerações inteiras no decorrer da História. Perante a sede do conhecimento há quase que o domínio da razão material a todo custo, na certeza do inalcançável dagora, qualquer desistência prudente. Tateantes espécies tão só fustigam, pois, os desejos da superfície e das ilusões, e dormem consigo próprios sobre os restos da véspera, nas condições de meros espectadores do próprio anonimato. Talvez esse fervor, certo dia, abrirá nos sentidos à real compreensão e signifique o motivo exclusivo que faz estar agora neste roteiro desde sempre traçado de Alguém a nos contemplar dalguma eternidade até então desconhecida.

(Ilustração: https://www.blogger.com/blog/post/edit/8950443997481616897/7127238050837953631).


domingo, 3 de novembro de 2024

A ratoeira


Outro dia li uma dessas histórias tradicionais que circulam pela Internet e agora resolvi recontar:

Numa fazenda, certo dia ao observar o movimento da casa, um rato notou que o patrão desembrulhava uma caixa e dela retirava possante ratoeira. De imediato, o roedor assustou-se. Estudou, então, algum modo de enviar as consequências daquele instrumento. Nisso, foi ao campo e reuniu os animais que achou, uma vaca, um carneiro e uma galinha, participando o ocorrido e sua apreensão. Mas qual não foi a surpresa ao ouvir da vaca:

- Sim, rato. Sei do que está querendo se defender. Porém isto diz respeito a você e aos seus, pois nunca entrei na casa, nem pretendo. Resolva por si.

Cabisbaixo, o camundongo, contrariado, olhou na direção do carneiro, que, despreocupado, pastava em volta. - E o senhor, Seu Carneiro, que tem a dizer.

- Hum, penso parecido com Dona Vaca, que esse assunto diz respeito a você e sua família. Nossa freguesia é outra. Dê seu jeito, por isso.

Quase fora de cogitação, fixou os olhos assustados à galinha, e esta foi dizendo:

- Penso igualzinho. A gente cuida de nós e dos nossos. Já tenho obrigações por demais todo tempo.

Bom, desfeita a reunião, o rato, triste, regressou ao seu esconderijo.

À noite, acionada que fora a tal armadilha, vem lá uma cobra peçonhenta e prende o rabo na dita ratoeira. Ferida de dor, o jeito imediato que viu foi picar a dona da casa, que dormia ali por perto.

Um transtorno geral na fazenda. Correram e chamaram um médico. Este, além das medicações de urgência, pediu que preparassem uma canja de galinha. Mais que ligeiro, pegaram a galinha no quintal e créu, feita a sopa.

No entanto só isto não resolveu, porquanto a patroa fez foi piorar, talvez por conta de alguma alergia medicamentosa. E logo dias depois o doutor pediu que providenciassem um pirão de mocotó de carneiro. Correram no chiqueiro e sacrificaram o carneiro.

Dia vai, dia vem, e a mulher não resistiu. Visto o inesperado, juntaram a família numerosa e tiveram de executar a vaca no almoço das exéquias.

O rato, de longe, apenas pode assistir o movimento, ainda lembrando de seus companheiros de jornada, sem que nada pudesse fazer.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Os sonhos do imprevisível


Quando a ignorância é destruída pela Sabedoria do Eu, a Sabedoria, como o Sol, resplandece revelando a Suprema Verdade. Bhagavad Gita (O Cântico do Senhor)

Sei que há sofrimentos, dificuldades. Mas existem possibilidades outras, eu sei, sim. Defrontar as circunstâncias. Viver o que a vida impõe. Isto em um mundo por demais contraditório, cheio de dúvidas, esquisitices. Qualquer que seja o perigo, conquanto submissos às garras da Eternidade, divisamos perspectivas a todo instante frutos de nossos empenhos. Sempre nascerá o Sol. Nascerão as criaturas. Isto de fugir dos impasses torna-se profissão, religião viva no correr das persistências.

Nisso, busco rever os conceitos do desencanto e plantar em mim algo que seja o senso da certeza dos dias perenes de pura paz de que tenho notícias nas abas do firmamento. Construir o caminho da certeza na floresta da Consciência de que somos fruto. Bem isto, o sonho da claridade que mora no íntimo e renova de possibilidades as contradições vazias espalhadas pelo chão. O exemplo disso são as estampas de alegria presentes nas mesmas dúvidas que ficaram na estrada.

As próprias palavras transportam em si o véu da renovação a todo instante. Busquemos nos instrumentos em volta, nas atitudes positivas, os gestos de beleza das artes, dos bons sentimentos donde nascem humanos e universos, daí o prisma da plena felicidade em destaque no coração da gente.

Qual ritmo do pêndulo em que sejamos o eixo, descobrir-se-ia, lá um tempo, fórmulas mágicas de rever o sistema e refazer a história, razão de estarmos aqui a todo instante.