O século XX renovou as possibilidades da expressão artística, quebrando de uma vez por todas com a tradição de que apenas houvesse jeito único de se perceber a realidade. Por causa disso, o indivíduo médio pôde externar com independência seu jeito de mundo sob padrões estéticos livres da camisa-de-força que predominava na arte mundial até aquela data.
Essa conquista de expressão rompeu as rédeas do conformismo e trouxe
alternativas ao gosto clássico e à comunicação. Nos campos da pintura, por
exemplo, os criadores das obras impressionistas forçaram e conseguiram impor,
na tela, outras figurações, usando de técnicas inéditas de representar a imagem
real.
Aquilo de copiar a forma tridimensional do espaço transferiu-se às mãos
de fotógrafos e cineastas, por força dos meios técnicos recentes. Enquanto que,
ao talento dos pintores, coube o rompimento das barreiras do visível infinito.
Nesse período, as duas grandes guerras reviraram pelo avesso os dogmas
da cultura, sobretudo na Europa. Desestabilizaram do poder a senhora vaidade,
dona absoluta das leis do cotidiano. Viam-se, pois, perdidos a perenidade e o
insustentável que prevalecera durante largos séculos.
Tal estilo transformador de reinventar o olho levou os artistas a
conquistar territórios inimagináveis, na história da beleza representada.
Todavia, por conta dos acontecimentos dessa primeira metade de século,
afloravam os mais diversos confrontos de opinião. Reações contrárias às
aquisições da estética explodiam em quantidade, nos salões e nas ruas.
Grandes mestres da
pintura, quais Salvador Dali, Picasso, Van Gogh, Gauguin, Renoir, Modigliani,
dentre outros, amarguraram penas dolorosas, no afã de mostrar as suas
conquistas ao grande público.
A propósito desse clima estabelecido, registrou Stephen Nachmanovitch,
no seu livro Ser Criativo, incidente verificado, certa vez, numa viagem
de trem, quando cidadão francês reconheceu, no passageiro ao lado, nada menos
do que o célebre pintor Pablo Picasso, responsável por inúmeras produções bem
características da época revolucionária.
No instinto de aproveitar da oportunidade, o viajante principiou a
resmungar e dizer o que bem pensava da arte moderna. Mostrava-se impiedoso
quanto à forma dela representar a realidade. Que não dispunha de precisão, de
fidelidade naquilo a que se propunha.
Nessa hora, paciente, o pintor espanhol reagiu para indagar do homem o
que ele considerava ser “uma representação fiel da realidade”.
Na mesma hora, o
interlocutor sacou da carteira uma fotografia da própria esposa e indicou:
- Eis aqui. Isto é
o que considero “uma imagem real”.
Picasso segurou a foto, analisou-a de vários ângulos... Frente, verso,
lado... Por fim argumentando:
- Mas como a sua mulher é pequena! E, acima de tudo, chata, posso, com
certeza, concluir – daí, então, devolveu ao parceiro sua fotografia e o
silêncio de novo fez-se presente no lugar.
(Ilustração: Pablo Picasso, Paisagem do Mediterrâneo).
Somente um gênio teria um argumento tão forte para calar seu interlocutor!!! Aplausos pra ele, aplausos pra você que lembrou de me mandar esta pérola tão valiosa!!!
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