quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Lá de onde vem o Sol


A meio disso tudo, numa velocidade que causa espanto, as pessoas circulam pelas estradas na procura da humildade. Sei, sim, que, se ainda não encontraram, de certeza logo cedo acharão pelas calçadas da cidade, quem sabe?! no raiar de novos tempos. Ou mesmo ao abrir as janelas do dia e enxergar um círculo perfeito no alto dos céus. Nisso, misto de igualdade entre os seres, nascem os segredos ora espalhados pelo fervor da Criação.

As palavras chafurdam dentro da gente, querendo a todo custo dizer alguma verdade até então desconhecida. Elas sabem, porém das barreiras dos mistérios, e sacodem, anos a fio, o instinto de querer e iluminar a sombra que carregas consigo. Forçaram desvendar tantas vezes que numa delas há de revelar tudo, enfim. Daí esse movimento dos objetos pelas ruas, numa fúria nunca antes imaginada. Quer-se chegar, no entanto, e saber o destino que lhes aguarda no caminho.

Já se passaram incontáveis firmamentos, tantas refeições, viagens, histórias, e todos aqui nesse mesmo comboio a bem dizer infinito. Perduram, insistem, desejam, e dormem logo em seguida. Quantas sessões de cinema, livros inúmeros, séculos de transição à cata de sonhos. Enquanto isso, as florestas renovam a folhagem; animais procriam e somem; senhores de indústrias preenchem de peças renováveis a superfície do Chão.

Sob o teto das fábricas, um silêncio de gerações. Nas universidades, nos meios de comunicação, na Internet, olhos abertos ao Infinito, dali percorreram os séculos e guardaram consigo as lendas doutras civilizações desde sempre desaparecidas. Hoje, as letras viraram números e falam linguagens inteligíveis, numa transformação sem par. Afinal se reencontraram séculos depois das profecias reveladas; eles, os outros, nós mesmos.

Uma festa de reconciliação, quando desmancharam as armas em instrumentos de alimentação e modos de produção da fraternidade humana. Vistos que tal, a isto chegar-se-ia certa feita, à medida de uma nova consciência. Destarte, brilharão as luzes da realidade mais plena.

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Há que haver um destino


Caravanas imensas de criaturas espalhadas ao vento e essas indagações por demais, razão de tudo enquanto habitam a vastidão desse universo desproporcional às nossas ansiedades. Desde longe, e essas circunstâncias que insistem de querer continuar. Saturação do quanto existe, nisto moram os aspectos quais no tempo a atmosfera, nas leis da natureza humana, que gritam forte e pedem interpretação racional. Daí, as tantas filosofias, doutrinas, perquirições entremeadas de dúvidas e crenças, folguedos imaginários.

Em tudo por tudo, uma crença real consiste na força de prosseguir a qualquer custo. Na sede, no frio, a essência de caminhos vários do mesmo significado. As luzes na imensidão das consciências. O trino das espécies felizes. O brilho de um significado a custos exaustos, ser-se-ia algo além de um só desejo das multidões enfurecidas que procuram do céu as alturas.

Destarte, o peso das consequências. Esse desencontro de quantas histórias feitas a ferro e sangue. O sequenciado de todas as noites reveladas no cristal das sepulturas. Num instinto de confrontar consigo próprio, ressalvam-se os séquitos de muitas dores, nos amores desfeitos. Os filmes e suas coincidências atrozes. Versos. Grupos de menestréis que revivem o passar das gerações na alma das gentes.

Qual que sempre assim, os porquês depois largados lá fora, meros ardores de sóis, esmiuçados nas legendas de seus autores jamais esquecidos. Carências insanas. Postulados sórdidos. Litanias e horas lúgubres feitas de objetos insignificantes, sucatas dos extremos. Isso, esse jogo de claro/escuro que compõe as esquinas de todos os pecados, vidas e vidas. Conquanto, pois, clareiras abertas de todas as luas, ainda que tal deparamos sonhos construídos de metais e necessidades intensas.

Nessa hora, fechado o pano do Infinito, eis-nos agora face a face conosco a decantar milhões de atitudes inúteis, porém estradas abertas do desconhecido. Ao longe, os atores dos dramas se lavam à beira dos abismos. Olhares profundos insistem nas cantigas siderais e alimentam de ânsias os reencontros logo ali, passados que sejam os espasmos disso tudo que ora existimos nas barras do horizonte aceso.

sábado, 13 de setembro de 2025

Um anoitecer no Sertão


Ali, depois do apito do fim do dia no engenho, havia qual instante de reflexão, na paz de um silêncio avassalador. Calma nos afazeres. Animais sem as cangalhas de transportar a cana. A descarga do vapor acumulado na caldeira. E as luzes do poente distante levam consigo os restos de sol daquela vez. Espécie de hora neutra no tempo em volta. As próprias fisionomias, quais a se recolher, mostravam sinais doutros lugares lá de dentro, nesse momento assim raro de solenidade.

Nisto, no longe do Açude Velho logo próximo, de cuja parede avistava-se o sombreado da derradeira claridade, vinha o trinado das galinhas d´água, das marrecas, rachanãs, escondidas pelas represas. Aquela paisagem sonora mexia com a gente, falava noutras linguagens, doutra solidão. Dizia mistérios até então serrilhados nas dobras invisíveis das lembranças.

Mais um pouco, daí a escuridão tomaria conta de tudo, enquanto as mesmas presenças também sumiriam na direção de suas casas e o silêncio regressaria contundente, coberto dos sons imaginários da noite sertaneja.

Diante, pois, dessas recordações vivas que resistem, crescem, agora, outros instantes envoltos dos mesmos e antigos pendores daqueles de antigamente, isso que vira indagações, ânsias de saber, que em todos existe, do quanto tocar os sóis em movimento nas réstias íntimas das criaturas humanas. Outro tempo, novos sonhos, outras histórias, nos céus assistem resignados o correr das viagens, naves abertas de sempre na alma e nos pensamentos.

A estender o olhar naquilo de antes, vem o desejo de perguntar pelos dias que virão depois. O que esperar das gerações, e o que estas contarão das transas em torno das gentes. Quantas máquinas, quantos deslumbramentos na vertente inevitável que persistirá, queiram ou não, porém precursora dos destinos ora atrelados ao firmamento.

As perguntas constantes, nascidas dos fervores, dos amores, e quer-se, de certeza, um nexo que rege a todos e os alimenta da vontade de viver nas várzeas daqueles dias afastados, donde vem o pio insistente das aves dos fins de tarde, no anoitecer dos sertões.

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Cinema de janela


Quando criança, um dos divertimentos que adotava, nas tardes do sítio onde vivi até os quatro anos, era permanecer num dos cômodos da casa a observar, no escuro, as sombras invertidas das pessoas e dos bichos, que transitava lá fora, a se projetarem na parede defronte a uma das janelas. Nessa brincadeira me demorava boas horas, admirando o movimento da luz e suas imagens inversas que causavam espécie na minha imaginação, a criar histórias mágicas daquelas figuras animadas.

Depois de muito tempo, soube que o cinema se faz dentro da mesma concepção ótica. Através do espaço exíguo da fresta das janelas se dava a recriação do mundo lá de fora, em processo físico da inversão, qual na objetiva das câmaras. A decomposição das imagens e o sistema de elaboração dos fotogramas estabelecem o discurso do filme.

Desse modo, avalio os textos que enfeixei no corpo deste livro. Desde a posição pessoal do indivíduo, abri meus olhos a testemunhar as coisas que vão aqui em forma de prosa. Histórias que ouvi dos meus avós, li nos livros, ouvi e ouço de meus pais, irmãos, amigos, conhecidos; lendas populares, fábulas, contos da tradição oral; ocorrências presenciadas nas ruas, nos sonhos; e tantas avaliações decodificativas da imensa realidade que me cerca a todo instante.

Qual janela aberta ao mundo daí de fora, me ponho neste cômodo que sou eu a contemplar o movimento da luz dos acontecimentos a se projetar nas paredes de mim mesmo; e transformo em palavras, frases, idéias, contextos, blocos de significados contínuos, na intenção de estabelecer relações inteligíveis com o mundo, na mágica do conhecimento humano.

Pois somos testemunhas privilegiadas do Universo. Muitos contam logo a experiência; outros a guardam para contar noutras ocasiões mais indicadas. Uns escrevem; outros desenham, pintam, fotografam, filmam, cantam, bordam, colam; passeiam, compram, vendem, guardam, esquecem, conversam, arquitetam, esculturam, reproduzem; vivem...

A vida, enfim, encarta essas experiências de ler na luz da existência as figuras que se projetam cá dentro da gente. Através da infinita comunicação buscamos transmiti-las aos outros seres, no objetivo de somar e dividir a um só tempo, oportunidade ímpar de conhecer, se conhecer, interpretar e comungar da essência de viver com intensidade que o mundo oferece a cada dia.

Eis o motivo de denominar CINEMA DE JANELA a mais este livro que ora deposito em suas mãos, naquilo que consegui reunir de resgate dos meus dias já passados e das melhores imagens que deles retive na consciência.

Juntos, vivamos a experiência rica de existir.       

quinta-feira, 11 de setembro de 2025

O espelho das palavras


Quais respiração do Tempo,  nos tocam e pedem auxílio, aqui. Contrafeitas, sustentam o ritmo dos destinos e se desfazem logo em seguida. Nisso, padecem as criaturas e deslizam pela superfície do inevitável, aos pedaços distantes das consciências. Cores, trinados, luas; conquanto sujeitos das artimanhas do presente inextinguível, e sustêm a válvula da Criação, desde sempre. Vêm, narram e somem. Marcam as faces de tatuagens, suas rugas amorfas, gotas do orvalho da visão que se apaga nas ausências.

Lá longe, no entanto, pelas calçadas escuras do inexistente, bem ali, atravessam as muralhas da solidão de todos eles, a querer dizer do uso que façam delas, das mesmas palavras que lhes alimentaram a solidão. Desfazem os sentimentos por meio disso, da necessidade urgente de narrar as dores do firmamento, sem saber mesmo o que esteja por trás dessa visão insistente de falar e ver acontecer. Eles, elas, testemunhas do Infinito, na história deles, delas.

Porquanto estejam em tudo, são quem vive e não as pessoas, pois estas somem e aquelas hão de permanecer ao longo das lendas, ruas e estradas afora. Acesas, impõem condições de que nem os raros dispõem desse poder de sobreviver; elas assim permanecem de junto do Ser eterno. Descrevem, depõem, oferecem meios outros que nem só os momentos fugidios dos corações.

Nisto, as massas humanas contemplam a paisagem dos dias e obedecem ter de seguir em frente. Deixam suas cicatrizes nas palavras, hálito do mistério de existir e desaparecer. Vive-se, pois, de contemplar a sequência dos desertos e das areias de tal segredo que é o transcorrer do quanto existe. Numa delas, fosca massa de manobra dos trâmites ocorre a cada segundo e, passadas que seja disto tudo, sobrevivem à voragem do definitivo. E sorriem por dentro, feitas de visões escondidas nas lembranças; a fala das palavras, resquícios dos amores e sonhos que virão depois de haver sido.

(Ilustração: Hieronymus Bosch).

quarta-feira, 10 de setembro de 2025

O preço da virtude


Exemplos não faltam. A todo tempo isso do impacto que causa querer transformar a mediocridade a favor de harmonizar os mistérios dessa vida. Quase incrível o descaso sobre aqueles que buscarem meios de evoluir. Disso modelos existem desde sempre na forma do sacrifício dos poucos audaciosos que desejam a paz, o desenvolvimento e a evolução da espécie. Um chão sem conta rasga as vistas através dos tantos largados fora no decorrer da História. Depois retornam em forma de livros, filmes, monumentos, adoração, modelos e lembranças tardias.

Isto, sim, bem significam os motivos históricos, os equívocos das gerações, a ingratidão desses esquecidos no tempo, fora do painel dos bons e sucedidos.

Chega-se a imaginar ser esse o destino de quem queira rever a pauta dos acontecimentos e, portanto, merecer a excomunhão que cabe aos deserdados, o amargor das tramas e sacrifícios vários. Tal seja o preço a custear, quem sabe?, a dor das tradições. O lenitivo dos crédulos. Os calendários, que andam cheios desses nomes mais conhecidos de heróis e heroínas.

Daí, abordar as consequências de quem, lá um momento, desejou escrever diferente o alfabeto das conquistas humanas. E por isso amarguraram o coro dos indiferentes. Mesmo que tal, no entanto, há de se tocar em frente o trilho da solidão desses poucos atores do anonimato. Porém restam as palavras, os trechos das narrativas, o impulso de querer dizer a toda hora que os avanços da raça vieram assim, das duras penas. e trazem consigo o custo dessa indiferença.

Bom, aqui perfaz o esforço de registrar essa característica representativa do heroísmo renegado ao longo das tradições. O panteão cresce no transcorrer do quanto existe, se não aonde buscar tantas estrelas espalhadas pelo céu, aonde fomentar o exemplo dos raros que produziram a continuidade do que ora representar esse todo da humanidade?!

(Ilustração: Rolling Stone Brasil).

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Cativos da imaginação


São infinitas essas tradições a que tantos se submetem nas entranhas de si mesmo. Epopeias por demais desencontradas. Viagens sem conta aos painéis da inexistência. Sobem, descem os penhascos do imaginário e, logo em seguida, buscam refazer os credos dali impostos, descobertas só parciais. Nem sendo assim, terreno pegajoso das ficções, deixam por menos o empenho de continuar. Aceitam, crescem nos próprios cascos e avançam furiosos nos apegos alimentados desse eu turbulento, pretencioso.

Isto que seja o instinto de ficar aqui com tanto empenho. Fome de prosseguir através daquilo que cria, imagina, prepondera mente a dentro. Lances de curta duração, no entanto alimentam o furor da consistência de viver. Padecem a fome dos desejos e nela sobrevivem alguns dias. Constroem castelos de cartas e se escondem nos porões da continuidade de tudo.

Saber-se, pois, doutros universos, contudo presos aos laços de perdições exacerbadas. Vítimas, por isso, da fúria de sustentar as teses do inevitável, dormem sobre os colchões da fama, do poder provisório. Usufruem, urram às portas doutros paraísos que mesmo sejam cobertos de andrajos.

Distantes, de si, seguem aos ecos do destino. Horas, significam visagens, seres aquáticos, animais desaparecidos na neve do impossível. Bem isto, caricaturas doutros heróis desde então inexistentes na alma das gentes. Filas imensas deles acionam esses artefatos perversos à cata das ilusões que lhes viviam. Destruir, que virou ganância de quantas gerações espalhadas desde o passado mais remoto.

Espécie de autocrítica de uma raça esquisita, simboliza os anseios dalgum tempo novo que venha de vir nalgum momento. Por mais queiramos mistificar esses aspectos sombrios do que persiste desde longe, os resultados consistem nessa herança que aí estar. Cicatrizes profundas de aventuras desencontradas. Rastros lamacentos de muitas histórias perdidas. Vontade sem conta de novas harmonias ao coro dos contentes.

Daí, essa interpretação de quantas expectativas e poucos frutos ao sabor da consciência. Isso a subsistir aos percalços e acreditar em dias melhores que sempre hão de vir.