domingo, 20 de outubro de 2024

Um tempo na Bahia


Na noite de 28 a 29 de janeiro de 2006, revi num sonho alguns lugares da Bahia, em Salvador, onde vivi de agosto de 1971 a março de 1977 e retornei, por sete meses, em 1978, e três vezes mais, durante períodos de curta permanência, em 1983, 1985 e 1986.

Queira recordar de pessoas e lugares de Salvador, dessas ocasiões, e nenhuma dificuldade terei, porquanto moram em mim torrentes de imagens e momentos ali experienciados, quais jóias raras incrustadas na memória. Integraram-se dentro da minha história quais elementos essenciais, a ponto de revê-los ao menor gesto, a deslizar feitos fotogramas de película indelével, de largo teor afetivo agradável e valioso desta existência.

A cidade e sua geografia, entrelaçadas na bela e privilegiada locação da paisagem natural, fácil, fácil, dominam a visão dos que observam, o que, de tempo em tempo, volta nos meus sonhos com nitidez de causar admiração.

Desta vez, andava pelas ruas do Comércio e da Cidade Alta, em meio a seus prédios elaborados no estilo colonial português das Grandes Navegações e colonial inglês do século XIX, assim como quem passeia por sítios antes seus conhecidos. Entrava e saia nesses edifícios, encontrando personagens do cotidiano, observando o movimento e lembrando que me achava apenas em visita, realidade atual mesclada nos tons do pretérito, mecanismo típico da atividade onírica.

O mar é presença constante em toda Salvador. A refulgência das águas dispostas na Baia de Todos os Santos até a Ilha de Itaparica, fosso extenso e pano inevitável da cena, em certos momentos dos dias de sol intenso e das noites de lua cheia, impressiona deveras a todos, através da mágica da luz que reverbera na própria alma e causa alegria só conhecida em pousos elevados que dominam o mar, tipo a capital baiana e suas colinas em forma de espinhaço, por onde se distribui de modo harmônico e colorido.

Com o sonho, fui lembrando de coisas precedentes, depositadas no mistério da consciência. A agência do Banco do Brasil em que trabalhei, na avenida Estados Unidos e os colegas de várias origens, mais dos Estados do Nordeste. O Convento do Carmo. O Elevador Lacerda. O Plano Inclinado Gonçalves. O Gabinete Português de Leitura. Pontos esses do meu percurso diário. Os prédios soturnos das escolas que freqüentei. Os monumentos principais espalhados na geografia soteropolitana e sua imponência da austera origem européia colonizadora. As igrejas envoltas no lodo escuro de décadas e as cerimônias típicas do culto católico, recorrente tantas horas do dia, no meio dos claustros e do turismo avassalador.

Quão preciosas lembranças sobrenadam o ser interior ao se transcorrer cenas gratificantes de uma vida as quais se viveu com sentimento e distante solidão. Resolvera morar na Bahia sem conhecê-la, apenas pela influência da literatura, da música e do folclore daquela civilização, berço do Brasil, nascida na miscigenação das influências sobretudo de africanos, portugueses e espanhóis.

Diante da emoção do sonho, querendo preservar a voltagem dos bons sentimentos da hora, em gesto preliminar, pois, vim ao papel e registrei, nos poucos detalhes assinalados, estas considerações de um tempo rico de vivências. Enquanto isso, tributo de jeito rápido meu reconhecimento ao o povo baiano face ao modo hospitaleiro com que me recebeu nesse tempo, citando que daquela raça procederam os primeiros civilizadores do Cariri, vindos da Casa da Torre de Garcia D’Ávila, no Ciclo do Couro, fins do século XVII, princípios do século XVIII.

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