segunda-feira, 23 de maio de 2022

O dragão e o riacho

                                                                                                           


                                                                          Dedicado ao meu neto Ian
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Ainda pequeno, sairia nessas aventuras de primeira vez; o dragãozinho mergulhou na floresta. Anda que anda, e logo enxerga o brilho claro de um riacho entre troncos e folhagens. Tímido, medroso, aproximou-se devagar daquelas águas brilhantes, sonolentas, suaves. O riacho, de começo, fez de conta que não avistava ninguém. Nisso o dragãozinho chegou mais perto, mais perto. Experimentou as águas limpas do pequeno rio, depois lavou o rosto, bebeu um pouco do líquido e tomou susto quando o riacho lhe deu um “bom dia” cuidadoso.

- Que fazes nessas bandas, seu menino? – perguntou o riacho.

Sem saber direito o que responder, o dragãozinho quis correr, mas demorou um pouco e resolveu aceitar a conversa.

- Vim ver até onde vão dar os caminhos da floresta – retrucou desconfiado.

- Então quer aprender dos encantos das matas – acrescentou o riacho, - apreciar o que a natureza tem de belo.

- Sim, e descobrir como crescer, voar, do jeito que voam os meus pais.

- Que bom. Só com o tempo resolverá este desejo.

Nisso, ao escutar algum barulho mais forte vindo das ramagens em volta, o dragãozinho correu pela mesma estrada de onde viera, afastando-se do riacho.

...

Dias e dias, na primeira oportunidade que surgiu, ele busca aquela direção em que encontrara o riacho. Desta vez com outra disposição, agora compreendendo que ali havia alguém conhecido, quem sabe um amigo?!

- Bom dia, seu riacho! – animado, gritou ao chegar próximo. 

- Bom dia, dragãozinho – ouviu de resposta.

Daí, foram conversando, conversando:

- O que o senhor pretende nessa viagem que sempre faz com suas águas? – quis saber a criança dragão.

- Bom, dentre outras vontades, a maior delas é que quero chegar ao oceano, longe, longe daqui, de quem ouço as melhores notícias. Um lugar enorme, sem fim, espalhado pelo mundo afora. Azul, movimentado, animado – respondeu o riacho. – E você, dragãozinho, qual sua grande vontade maior?

- Ah, quero aprender a voar, qual lhe falei da outra vez. Com isso, pretendo chegar no Sol, ali no alto, bem nas vistas – em poucas palavras o dragãozinho desenvolveu seus pensamentos.

- Isto, que bons seus planos. Acredite neles, pois. O maior motivo de viver é saber aonde quer chegar. Ter um sonho. Viver esse sonho.  – suspirou o riacho.

...

Desses vieram vários outros encontros deles dois, do dragãozinho e do riacho. Na verdade fizeram estreita amizade, que seguiu crescendo e trazendo bons frutos, bons ensinamentos.

...

Passados que foram alguns anos, eis que certa vez o dragãozinho, numa voz forte de quase gente grande, informa ao riacho haver aprendido a voar.

- Que notícia boa, meu amigo! – exclamou eufórico o riacho. – E agora, quando pretende realizar sua viagem, visitar o Sol? – quis saber.

- Sim, sim, será meu próximo passo. Estou juntando uns mantimentos e praticando exercícios, e você saberá o dia dessa nova experiência – ouviu do dragãozinho.

...

Dias continuaram e o riacho a marulhar suas águas sucessivamente, enquanto esperava paciente a ocasião de ver o seu grande amigo subir no azul do céu e chegar na superfície do Sol, o que custaria um tanto mais das suas águas a escorrerem na direção do Oceano.

Até que esse momento, a bem dizer impossível, veio acontecer numa manhã de intensa luminosidade, com pássaros cantando felizes e ventos primaveris soprando agradáveis.

Ao observar o alto de montanha próxima, eis que um vulto pequenino ganharia as alturas e subiria aos céus numa coragem jamais vistas naquelas proximidades. Era ele, o amigo, o dragãozinho, agora maior, um dragão já feito, que deslizava pela imensidão no objetivo maior de conhecer bem de pertinho o Sol, o rei do Universo.

...

Ninguém sabe dizer de quem foi maior a emoção, se dele, do dragão, ou do Sol propriamente dito. Foi um abraço que ganharia as histórias de todos os tempos na imensidão cósmica. No princípio, nem souberam direito o que dizer um ao outro. Só no transcurso de alguns instantes conseguiriam solta a voz:

- Quanta maravilha, seu Sol, vir lhe ver de perto, sentir o calor de suas emoções, de sua bondade, seu poder... – assim que conseguiu, o dragão desse modo expressou seus sentimentos comovidos.

- Ora, ora, imagine o quanto da minha felicidade vejo aqui – falou o Sol também dizer do que sentia -, eu que vivo tão distante, tão solitário, de tal maneira, agora ao receber visita de quem acreditou no seu sonho precioso de vir até aqui, isto representa uma hora única na vida de tantos infinitos.

E desenvolveram boas conversas, as quais ecoaram pelo firmamento, ouvidas na distância do silêncio da água do pequeno riacho, a comungar de igual felicidade inédita dos dois lá em cima.

Com isto, o dragão permaneceu alguns dias na companhia do Sol, vivenciado a rara chance daquele primeiro encontro. Quando satisfeito de haver realizado seu maior desejo, o dragão buscaria o Sol e lhe perguntou aonde ficar instalado naquela superfície tão abençoada, rica de paz e amor.

- Bom, agora que me conhece, que pode vir até aqui sempre que pretender e fizemos amizade sem fim – veio respondendo o Sol -, lembre-se daqueles que ficaram lá embaixo precisando encontrar a resposta das vidas que vivem no tapete escuro do Chão.

Atencioso, o dragão foi escutando: - Agora organize sua viagem de volta e regresse aos seus, na intenção de dar minhas notícias daqui, e que eles possam, um dia, realizar tamanha travessia e vir me conhecer, como fizeste com a exatidão dos que amam.

Até meio tristonho, porém obediente, o dragão se sentiu de novo pequenino e embalou seus pertences para, de novo, levantar o voo de volta ao firmamento e pousar no mesmo lugar de onde partira naquele dia de rara beleza.

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Tempos de cumprir a distância de muitas horas, a primeira lembrança das que deixara atrás antes de partir veio a ser o leito suave do seu amigo, o Riacho, que lhe recebeu de braços abertos, numa felicidade sem par.

   

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