Felizes são os que conhecem as plagas sertanejas no tempo de invernada - época das chuvas regulares. Toda energia guardada pelas sementes adormecidas explode como quentura de fêmea jovem no cio, verdejando toda a mata - revestindo de veludo cor de musgo a garrancheira informe, como se acordada num susto.
Até o gado muda de comportamento, nos pastos ou em meio aos currais enlameados que rebrilham metálicos, mistura matinal de lama e bosta, de cheiro característico e forte. O leite espumejante nas vasilhas de zinco ainda reflete os pingos de orvalho, que caem do céu carregado de nuvens escuras.
- Viva o sertão! Viva Deus, o autor de tudo! - hora solene de agradecer.
No entanto, mostrar apenas estas fotografias da beleza de um mundo alegre não define com exatidão a realidade dos que vivem muitos dramas pouco conhecidos. Os preços, por exemplo, dos gêneros da agricultura, frutos difíceis das mãos calosas do caboclo, aviltam qualquer humana atividade. O valor do trabalho nordestino vem sendo espoliado, tanto nos baixos salários que sofrem, quanto nos ganhos de produção.
Conceitos de felicidade variam de pessoa a pessoa. Somos seres econômicos, apesar de também sociais e espirituais. Temos fome. E o matuto sabe que jamais encontrará noutros lugares o contentamento que deixou distante, no torrão natal. Nossa música fala disto com inigualável propriedade; quem ouve A triste partida (obra prima de Patativa do Assaré) pode bem se recordar.
A síntese da seca é o retirante, que nos invernos não teve justiça no preço do que plantou e colheu; não podemos fugir desse testemunho. Os homens públicos devem, por força da obrigação, assumir a cumplicidade moral desta culpa secular.
Enquanto isso, nas cidades, acrílicos chamativos e sons estridentes mantêm a raça grudada nos apelos coloridos da ilusão totalizante. Nossa civilização deverá ser repensada pelas próximas gerações, para que se esquive do fim ignóbil já decantado por profetas antigos e atuais. A indústria do supérfluo mata mais que a da seca.
Que bom o retorno de uma temporada de chuvas regulares (chuvas de verão nesta área geográfica, segundo os livros) ao interior do Nordeste! Em tudo volta a boa paz, a beleza original. O Cariri friorento, azulado, com névoa encobrindo as abas da serra, quais mechas desfiadas de algodão, lembra que a vida se alimenta de agricultura e trabalho.
Melhor reconhecimento seria impossível tivéssemos equidade nas coisas do campo, das cidades, e a satisfação estaria completa, nas épocas sadias.
O sertão agora é aqui, Emerson. 37 graus à sombra é demais. Adorei seu texto, fluente, bem escrito, um tanto poético.
ResponderExcluirLi o livro que vc me ofertou e adorei. O soneto é a minha forma poética preferida. Agora, começo a ler os seus textos.
E estou de volta à blogosfera, não sei até quando.
Beijos e abraços,
Renata
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirTuas palavras me alegram, vindo de quem vêm, sobremodo. À distância te observo com admiração dada qualidade dos teus textos e pelo amor que demonstra pela literatura, pela arte. Grato, amiga.
ExcluirAbraços e beijos,
Emerson.
Tuas palavras me alegram, vindo de quem vêm, sobremodo. À distância te observou com admiração dada a qualidade dos teus textos e o amor que demonstra pela literatura, pela arte. Grato, amiga.
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Emerson.