quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Música no ar

Tempos esses das circunstâncias que lembram cena derradeira do filme Ran, de Akira Kurosawa, o clássico diretor do cinema japonês. Os dois clãs que atravessaram toda a história em constantes entreveros, ao término, no confronto se digladiam na batalha monumental. Em longa planície recoberta de verde vegetação acontece o momento da grande luta. 

Os exércitos exaustivamente bem equipados partem um contra o outro. Guerreiros. Cavalos. Flâmulas ao vento. Armas afiadas aos moldes do período feudal no Japão. Metais. Gritos. Armaduras. Esfacelamentos. Sons de fantasia. Dores. Agressão. Temor. Terror. Marchas de entrega à destruição quais desejos de fatalidade agregados no bloco da extrema agonia.

Na ocasião da película, a fotografia, que enquadrava todo cenário dos exércitos no transe fatal, diminui suavemente a vista dos elementos e começa subir, subir para longe no alto, distanciando o quadro e ampliando a perspectiva da visão inicial. Lado a lado com esse afastamento do campo de batalha, o som principia também desaparecer até chegar a silêncio absoluto. Quase invisíveis, bem longe, minúsculos seres ainda fervilham na paisagem colorida tais pequeninos insetos num desaparecimento gradativo. 

Adiante, certa feita, ao ser indagado quanto o que representava, na linguagem do filme, o distanciamento e o silêncio posteriores daquele momento, Kurosawa diria ser assim que interpretava o modo de Deus observar as criaturas humanas e suas aventuras fugazes neste chão. 

...

Semelhantes estações que afastam, das jornadas pela vida, os quadros cotidianos somem da cena e ficam perdidos na dimensão dos sonhos, esquecidos, pendentes das memórias que esvoaçam, pois tudo passa. Objetos. Situações. Emoções. Lugares. Pessoas. Planos. Espécies de nuvens de céus imensos vêm e vão à velocidade dos astros, nas gravitações do firmamento, dias e dias, noites e noites. Que antes parecia meteoros descomunais viram meras luas de mundos ora inexistentes, reinos ou farsas de personagens largados ao silêncio mais absoluto dessas cenas que se sucedem. 

3 comentários:

  1. Que texto! Estações que se afastam , das jornadas pela vida... sonhos esquecidos , que permanecem em nossa memória , apesar do tempo que passa. O decorrer do tempo em nossa vida vai deixando suas marcas nos mais diferentes estágios. Presentes em acontecimentos, lugares, e pessoas. Tudo num emaranhado de lembranças, saudades e marcas que fazem parte da nossa história de vida. E não se vão como nuvens, pelo contrario permanecem vivas em nossa memória e de lá fazendo parte por toda uma vida. Belo texto. Um abraço ao querido amigo Escritor E,Elson Monteiro.

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  2. desculpas: meu amigo escritor EMERSON MONTEIRO, corrigindo.

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  3. Sobre filmes japoneses conheço pouco, daí não ter como emitir parecer sobre o tema.

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