Solitário, usufruía do gosto pela fotografia, que me acompanha desde menino. Montava um laboratório na cozinha por cima da pia, banheiras, ampliador. Quando revelava ou ampliava as fotos, em preto e branco, naquele dia fazia fora as refeições, em restaurantes macrobióticos, donde trazia pão integral, tahini (pasta árabe feita de gergelim), leite, frutas, com que abastecia a geladeira e rivalizava o uso entre os químicos da fotografia. Entrava forte nas noites o som, ligado em Frank Sinatra. Gilberto Gil. Luiz Gonzaga. Caetano Veloso. Maria Bethânia. Gal Costa. Elomar. James Taylor. Carole King. Neil Diamond. Ella Fitzgerald. Gonzaguinha. Tomzé. Louis Armstrong. Outros e outros. Eram longas viagens noite adentro, no ventre do silêncio. Espécie da saudade do que ou de quem nem sei mais dizer. Recorria aos artifícios das possibilidades e dialogava junto aos barulhos distantes, nas ruas, nos carros que ocasionalmente transitavam rumo à Ladeira da Barra, ou à Rua Princesa Isabel. Ninguém, vivalma, a não ser tais ruídos harmoniosos e a escuridão dominando a câmara improvisada do laboratório. Exausto, lá pela madrugada, recorria aos lençóis e dormia insistindo em conhecer o mundo interno de mim.
Quando, agora, ouço algumas músicas, lembro daquela fase de tempo, a rasgar as sombras da escuridão e chegar bem próximo de meu coração ainda impaciente na faina de existir a qualquer custo diante da beleza dos acordes. Enquanto a saudade, muita saudade, percorre as estrelas, a Lua, que vagam pelos céus, nos ventos da Serra que, então, deixara atrás no Cariri. Isso a revelar fome intensa de viver e sonhar de que tanto me conta a arte e a cultura, nas dobras do sentimento.
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