Recordo a fase de quando viemos morar em Crato vizinho à serraria que meu pai iniciara em sociedade com o meu Tio Quinco, irmão de minha mãe, ali pelos inícios da década de 50. Dada a proximidade, era minha: Escola, casa e serraria. Lá conhecia todos os operários, fazendo-os meus amigos. Zé Doca. Assis. Edmilson. Mestre Manoel. Mestre Elias. Joza. Pedro. Chapeuzinho. Mestre Mulato. Borginho. Prancha. Zé de Sousa. Gregório. Mestre Raimundo Nascimento. Eles aperfeiçoavam a madeira e faziam linhas, caibros, ripas, portas, janelas, etc.
Às segundas-feiras, nos intervalos do expediente, havia quem
deles fosse ao centro da cidade e comprasse cordéis, sempre vendidos na feira semanal
daqueles dias. Nisso, no decorrer da semana, ao médio dia, um deles fazia a
leitura de um desses livretos de feira, a que denominavam versos. E eu
ali, deitado na raspa das madeiras, escutava atentamente as histórias. Atento,
logo que concluíam a leitura, (já sabiam), de pronto corria e pegava o verso
lido guardando comigo, nisto formando uma coleção. Durante um bom tempo foi
minha primeira biblioteca, que escondia, clandestinamente, na gaveta da mesa
das refeições lá de casa, na sala de janta.
Nalgumas ocasiões, eles pediam de volta até fazerem a
releitura dos mais apreciados. Eram produzidos em larga escala pela Gráfica Sáo
Francisco, em Juazeiro do Norte, escritos por autores destacados da oralidade
nordestina, entre os quais Patativa do Assaré, Cego Aderaldo, Leandro Gomes de
Barros, João Martins de Athayde, dentre outros. Ainda lembro alguns dos
títulos: As proezas de João Grilo, O romance do Pavão Misterioso e Triste
Partida.
Apreciava com gosto as histórias, as rimas, o ritmo, e na
voz sertaneja dos operários isto se tornava por demais misterioso, diferente
das aulas da escola que também tratavam de livros. Hoje, então, quando sinto na
literatura um mundo que me fascina, recordo esse primeiro instante de haver conhecido
as letras também da cultura nascida na alma do povo do Sertão.
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