quinta-feira, 27 de abril de 2023

Castelos de cartas


Quando senti a vontade insistente de reunir no texto o que significasse os sentimentos, nisso vieram as primeiras pretensões de sustentar o pensamento, juntar palavras e dizer dessa dimensão interna que somos. Visões, voos de aves assustadas, rastros de estrelas no céu da consciência, sobras do banquete das gerações. Qual assim, tem outro jeito não senão dizer, contar dos destinos em movimento nesta hora, luzes que acendem e apagam lá longe no Infinito de que lemos tão só mínimos fragmentos dispersos. Isso, essa mania esdrúxula, persiste ainda hoje. Telas vazias do passado que voltam arrevesadas, espécie de requentados de tramas e mergulhos pelos mares da existência. De tal modo vêm os textos e querem falar dos lances doutras histórias, do que se leu, se viu e permanece largado nos lixões da gente mesma, bem isso que transportam os caminhões da limpeza, deixando pitadas de otimismo, coragem, desejos e cicatrizes.

A gente abandona os tais procedimentos no miolo das páginas, as quais ganham vida própria e também desaparecem, barcos de papel em manhãs de chuva pelas sarjetas deste mundo disforme. Nem de longe a pura contrição de revelar qualquer motivo além do susto de se perder nas florestas esquecidas, escuras, vazias. Um gesto a mais na circulação das ruas de cidades apenas fantasmas em vias do desaparecimento inevitável.

Bom, numa ação orquestrada desconheço as origens, daí nascem os rios das palavras prisioneiras desses caprichos inanimados das letras vagando nas várzeas recônditas do que ficou e jamais voltará. Isto de querer dalguma forma gritar sem voz as agruras dos séculos que desaparecem das nossas mãos e circulam pelos leitos abandonados de noites antigas, absortas ao vento. Todavia falam de esperança, otimismo, certeza, fé e poder em formação no mistério dos seres humanos.

(Ilustração: Sábio iraquiano (reprodução).

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