quinta-feira, 27 de abril de 2023

A religiosidade natural


Seres que somos à procura de nós mesmos através de tudo quanto dispomos a todo o momento. Animais soltos na floresta dos instintos, pisamos as folhas secas das gerações e do rastro ali persistente juntamos os elementos da formação dos caminhos. Alimentamos de frutos, insetos e lagartos, sustentando o desejo fervoroso de encontrar o troféu da libertação a qualquer custo, apesar das perdições que se sucedem. Reunimos fragmentos de falas, testemunhos largados ao léu, colhemos belas flores, arrumamos o fardo de levar de volta o infinito dos mistérios que trazemos em nós. Assim o somos, uns quase nada, porém dotados desse poder da consciência que vigia nossos passos pelas jornadas reinante das revelações.

Isto, resquícios da sorte à procura de nós mesmos. Todos possuímos a certeza de estar aqui, de, no mínimo, respirar, de constituir um ser. Guardamos conosco essa convicção plena de dalgum jeito, Nisto as condições inolvidáveis dos tantos existires no decorrer da Eternidade sempre presente. Daí a cada um haver em si uma memória viva, persistente e individual. Dela constituímos o que ora divisamos na escuridão da noite em fermentação. Elaboramos nossas epopeias e virtudes à medida do tempo. Vêm crenças, homilias, tratados, litanias, enfim a herança dos astros que passaram e deixaram suas marcas profundas nas manhãs de sol e arrastaram as multidões desordenadas também a braços com os anseios plenos de felicidade em germinação.

Essa vontade bizarra de interpretar a vida, motivo de estar, de existir, continuar, sumir, forma bem o que seja esse passado inesquecível dos mestres, santos, taumaturgos, autores e produtores do ideário dos seres em queda livre. Nem de longe alguns aceitariam só vir e desaparecer. Quer-se, grosso modo, interpretar os sonhos, arrecadar princípios, defender teses, construir monumentos e deixar pelas estradas algo que jamais despareça, sirva de razão de ter paz no coração das gentes. Nisso há heroísmo claro e por demais latente nestas humanas criaturas, de não apenas transcorrer na história sem alimentar vestígios do quanto de bom houve de viver neste chão das almas e sirva de transe aos que chegam em seguida.

(Ilustração: Ao deus desconhecido (bibliotecabiblica.blogspot.com)

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