quarta-feira, 19 de abril de 2023

Aquele fosso das vaidades


Quando chegar nalgum lugar deste Universo, aqui, ali, acolá, e demonstrar o que aprenderam no chão das almas, todos terão oportunidade principal de demonstrar a que vieram. Bem justo, bem sobre-humano. Um jogo de dados assim qual no tempo das lesmas que deslizavam e deixavam marcas nos rochedos. Olhos acesos nas fortes cenas de amor, largas histórias de lagartas e borboletas, guisados de frutas raras, lâminas afiadas nos primórdios das aventuras e dos impérios e dramas febris de epopeias dos santos que viravam crâneos levados ao vento; tudo, afinal, num festival de dores e cores. Ali, espíritos contritos naquilo de que mais gostaram quando carne, um a um desfazem a valise e sacodem no mesmo tabuleiro as tantas notícias que levaram do abismo das visões individuais.

Uma verdadeira festa de artesanato posta nos meios técnicos das invenções que sacodem o tempo nos corações abandonados. Isso a não dizer uma farra do melhor que havia no conceito das mentes, porquanto recipientes donde regressavam e tinha suas paredes hermeticamente isoladas do grande todo, só pessoas, e pronto. Cada qual no seu pequeno quarto de pensão, adormecidos sob o efeito das doses cavalares que acharam pelos cantos. Barrigas cheias de supostos conceitos, arrevesados pelas paradas de sucesso, eles que dormiram sobre o feno que lhes servia de cama e repasto.

De inúmeras vírgulas, parâmetros e leis, disso que fizeram o caminho de traçar suposições naquela hora de depois, olharão outra vez o quanto de chances todos tiveram e deixaram atrás, nos sóis mornos, já adormecidos. Nem mais, nem menos que isto, esforço único de crescer, sair das matas de canibais aonde foram pôr os pés sem saber do real motivo, porém numa extensa folha de serviços a fim de obter o salvo-conduto da Salvação. 

Explicar torna-se razão desnecessária, vez que o que resta seja contar o mínimo de desvantagem e superação do que o ser trazia em si, motivo de vencer a fome da visão e dos desejos. Silenciaremos, então, o choro e o ranger de dentes, nessa ocasião. Só isto, bem isto, portanto, o sol da Liberdade.

(Ilustração: A divina comédia, de Gustave Doré).

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