Nasci numa fazenda (o Tatu) no município cearense de Lavras
da Mangabeira. Próximo da casa de meus pais havia uma capela em volta da qual,
aos finais das tardes, acorriam bandos de andorinhas em dança festiva a formar
coreografia insistente que envolvia o escurecer num ritual misterioso, nuvens
mágicas das aves em chilrei que, ainda hoje, ecoa pelos corredores da minha memória.
Lembro como sendo vivência recente a observar admirado os volteis aéreos dos
pequenos pássaros na sua escrita primorosa dos céus quase escuros. As calçadas em
volta eram de tijolo nu bem no tom avermelhado dos barros do sertão, de cujos
espaços vazios cresciam pés de carro santo, planta de verde musgo e folhas
espinhentas. Sentado nos batentes da pequena igreja, contemplava essa paisagem
do poente aonde o Sol descia com reflexos derradeiros sobre as águas do Riacho
do Meio, lá embaixo logo depois dos canaviais do brejo.
Recordo essas cenas muitas vezes no decorrer dos dias. Sem
nenhuma intenção, me vejo, de novo, nos entremeios da memória secundária que
nos acompanha toda hora, a presenciar a pureza rara dos entardeceres daquelas
calçadas da igrejinha. Ali de junto havia, também, um sombreado fícus benjamim,
o chiqueiro das ovelhas, defronte às pedras de antiga construção que se perdera
no tempo e, vizinho, a casa de Seu João Preto, o morador responsável pela criação.
Assim, involuntariamente, de comum, ao reviver esses retalhos
de passado distante, vêm de junto histórias guardadas sob os refolhos de mim mesmo,
a pedir atenção, e que termino por narrar pouco a pouco no desejo insistente de
procurar o nexo de tudo isso que chamam existir.
Vejo essas percepções, também, ao escutar algumas músicas
que trazem de volta lembranças bucólicas de vidas sertanejas dos compositores e
poetas, matéria prima dos sonhos da infância de quando viveram as doçuras dos rincões
interioranos, o que lhes acompanha vidas inteiras.
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