Era uma vez um mestre carpina de nome Pedro que vivia com sua família em pequena povoação do interior sertanejo. Tirava o sustento das artes da madeira, fabricando peças primorosas, admiradas por quem as conhecesse, fama que propiciava constantes trabalhos.
Além de dedicar-se com carinho ao trabalho, mestre Pedro demonstrava profundo interesse pelas coisas religiosas, praticando o bem, zelando pelos semelhantes, orientando, servindo e dando exemplos daquilo no que acreditava.
Certa feita, recebeu em sua morada ilustre caravana de pessoas ligadas ao governo querendo que ele fizesse a porta de templo em construção numa cidade distante. Essa peça deveria merecer cuidados especiais, porquanto a tal igreja representaria agradecimentos ao santo padroeiro pela cura de uma das filhas de homem poderoso.
O artífice aceitou o pedido a ser feito em madeira de lei, a cumprir com folga o projeto da porta bem trabalhada.
Alguns meses se passaram até localizar na floresta um tronco adequado à encomenda. Movimentou pessoas e trouxe para a oficina mogno linheiro e maciço. Outro tempo demorou serrando e planando as tábuas, quando, belo dia, iniciou a montagem, juntando e colando as peças em lastro precioso.
Medidas exatas, acabamento esmerado, polimento e acabamento... Restava cumprir o desenho que imaginara fixar no rosto da madeira, fruto dos detalhes de um sonho do qual acordara no meio da noite cheio de júbilo, com o que só enriqueceria a beleza do artefato encomendado.
A porta do céu deteria características de semelhante perfeição, imaginavam extasiadas as pessoas, querendo ver de perto o efeito magistral conseguido pelo mestre na superfície da madeira.
A essa altura dos desdobramentos, haviam transcorrido três anos. O profissional ultimava os apuros do trabalho, pousado sobre os joelhos e cotovelos, suado, afilando formas milimétricas, quase invisíveis, com estilete afiado a sulcar nas riscas das tábuas, daí resolveu erguer a peça de lado para, pela primeira vez, observa-la na posição vertical.
Ao levantar a porta do chão, no lugar onde ela ficara tanto tempo abriu-se fenda de proporções iguais ao seu tamanho, cratera de fundura ilimitada.
Diante daquilo e face ao impacto do inesperado, mestre Pedro caiu no espaço aberto, sumindo cavidade adentro, sem que ninguém presenciasse o acontecimento.
Fim da tarde e só então os familiares notaram-lhe a ausência. Vieram à oficina procurar por ele. Nada encontraram além da porta confeccionada com esmero e as ferramentas deixadas pelo chão e o mais completo silêncio em volta. Nenhum sinal que fosse do artista, apesar de examinarem toda a redondeza e espalharem a notícia do misterioso desaparecimento.
Alguns contemporâneos do mestre Pedro quiseram admitir, no entanto, que depois daquele dia, sempre nos inícios de noite, sobre a humilde oficina brilhava estrela de cintilações intensas, a clarear por bons momentos os céus da redondeza.
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