domingo, 10 de abril de 2016
A responsabilidade das palavras
Pois a elas caberá testemunhar os anseios das pessoas daqui desse chão. Trazer verdades bem mais linheiras do que todas as angústias. Penetrar as estâncias da essência do ser. Indicar os caminhos pelo o ar nos riscos de giz escritos nas ondas do mar. E nisso pisar de leve as plantinhas do mato nos traços das passadas incertas dos aventureiros ali perdidos, esquecidos. Oferecer respostas aos tribunais da Inquisição. Aumentar o desejo dos amantes. Refrear o instinto dos animais enfurecidos nas jaulas da matéria. Nutrir de esperanças vadios abandonados pelas ruas das cidades zoadentas. Suprir os mercantis de seus produtos industriais, ração das semanas sem fim. Conduzir as caravanas nesse deserto de amizades, ou não, que elas existem sim. Alimentar a vontade inesgotável do prazer naqueles vultos largados nas frias e insones madrugadas. Acalmar a saudade agressiva das horas que fogem pelos dedos sem deixar vestígio das pessoas tão amadas. Solfejar as melodias que dão conta dos momentos mais felizes e ligeiros das fitas de cinema e loterias ilusórias. Compensar assim emoções fortes dos romances esquecidos. Salvar os seres aflitos dos incêndios da paixão desenfreada. Caminhar junto dos solitários que esqueceram aonde seguiam no meio do rebanho e apenas olham vazios quais espécimes largados ao sabor do clarão nas alvoradas. Versos e reversos que tudo dizem na forma das palavras, raízes dos pensamentos, e entregam ao silêncio vigoroso o poder de renunciar aos transes lá do outro lado que espera de olhos bem abertos as multidões impacientes. Quão doce o verbo em forma de canção. Quanta possibilidade no rever dos instantes que se foram e voltam ao gosto dos melhores alimentos desta vida de palavras tantas. Nunca se está só quando elas chegam amáveis e sinceras, e envolvem os filhos diletos do perdão de novas oportunidades. Há intensa a responsabilidade nas palavras ditas ao fervor da devoção, porquanto todas as religiões são verdadeiras quando praticadas com amor.
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