quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Fragmentos

Cascalhos dessa velha estrada dos tempos que restam em pequenos indícios do que passaram nas outras caravanas, diante do sentido único do correr dos dias, fiapos das existências. Cacos permanecem largados, agarrados folhas, nos garranchos, nas encostas, feitos meros pedaços da história nos quais há que se ler os escritos da humanidade e suas tantas intenções. Por vezes bem sucedidas intenções; noutras, só experimentos de inutilidade e amenas oportunidades engolidas no seio da ilusão. 

Reza a tradição dos judeus que a tribo de Dã, um dos doze filhos de Abraão, mantinha de costume permanecer atrás das outras caravanas, quando iam fazer longas jornadas. A orientação seria na disposição de recolher os restos que as outras tribos fossem deixando pelas estradas, inclusive as sobras das orações balbuciadas, que lhes serviam de acréscimos aos rituais que também realizavam. 

Quase nunca os derradeiros imaginam a virtude dos que caminham no final das longas caminhadas, dispostos que estejam de chegar primeiro na beira do poço, qual dizem, quem vai na frente bebe água limpa. Mas no transcorrer das epopeias humanas há valores discutíveis nos tempos e costumes. Porquanto, também o dizem, a pressa é inimiga da perfeição. Valorosos contrastes deste chão. As cenas que se sucedem e a história que repete os feitos da ambição. Sob os conceitos místicos, correr dificulta a compreensão daquilo a que viemos buscar.

E nisso examinar os fragmentos fala alto às consciências face dos embates apressados e vitórias dos que imprudentes. As páginas voam e as lições ficam bem guardadas nos astros e nas criaturas. Quantos quebram a cara no dizer e perder logo além. Agoniados habitantes do Chão. Senhores das angústias e de correr aos precipícios de nada permanecer quando cruzar as horas e triturar os bens imagináveis... 

Fragmentos do inútil desejo, fagulhas de paixões e sobejos da sorte nas mãos do destino. A pressa, essa inimiga figadal da Perfeição. Resta ler nas entrelinhas do horizonte o segredo que vive esperto escondido na alma de tudo o que sempre viverá.

2 comentários:

  1. Quando perdemos as folhas mantemos o mais importante que são as nossas raizes que nos dão sustentáculos para seguir em frente. Fragmentos de desejos, de amores, sempre farão parte da nossa existência. Amores vividos, amores sonhados, desejos contidos, valores preservados, das mais diversas ordens sempre permanecerão. Mas não nos impede de sonhar. Sonhar torna mais leve os fardos que carregamos daquilo que deveria ser e não foi. Contrastes. Sim, mas é assim, na vida não podemos ter tudo. Parabéns! Que belo texto! Sentido, conteúdo, especial. Obrigada por nos proporcionar momentos especiais ao ler os seus textos. Um carinhoso abraço amigo poeta Emerson Monteiro. Boa noite.

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