terça-feira, 15 de maio de 2012

Minas em mim


Da primeira vez em que cruzara o Rio São Francisco, deixava, de pouco tempo, o Sertão da meninice e adolescência, paragens constantes daquelas fases, e me via rodando pela Rodovia Transnordestina rumo às Minas Gerais. Festival de Inverno de Ouro Preto de 1971, anos de chumbo. Éramos eu e Tiago Araripe, amigos de longa data. Estivéramos poucos dias em Salvador e avassalávamos de novo a estrada no destino a Belo Horizonte.

Lá havia uma ainda cidade jovem, planejada em pranchetas, bem ordenada, arrumada dentro de traçados das largas avenidas e belas construções, rodeada de montanhas no azul cinzento das pedras minerais, ao mundo das histórias fantásticas doutros planos, algo misterioso, aberto para a imaginação franca, encontro forte das raras culturas que povoaram o centro do Brasil das gerais, primeiras aventuras humanas estrangeiras no interior do Novo Mundo. Nítidas lembranças dessas paragens siderais as guardo comigo, o trânsito disciplinado, as belas e ricas lojas, povo vestido a caráter sob o clima frio de meio do ano, elegância e desenvoltura que tocaram de perto os meus conceitos da gente simples de que viera. A fala solta dos mineiros, sim, um apego a mais, no ritmo, na melodia, no bom humor permanente, reunidos sob a batuta da facilidade no dizer, no brincar, chistear efusivo.

Permanecemos só poucos dias ali também, visto o destino focado nas cidades históricas, convidados das escaramuças daquela época em transição e luta ideológica. Fase hippie, tempos reprimidos, senso de esperanças rasgadas nos conceitos pragmáticos dominantes. E nós, aves exóticas a sonhar nas ruas do Planeta com abertura, arte e possibilidades mil das aspirações de uma juventude macerada diante do inesperado, tacões do poder político.

Seguiríamos a Ouro Preto.

Levávamos carta de Figueiredo Filho a Antônio Pinheiro, cratense e diretor da Escola de Minas de Ouro Preto, que nos instalou numa das várias pousadas pertencentes à instituição, abrigo dos alunos no período letivo da escola.

Na antiga Vila Rica do herói Tiradentes, nos reunimos com outros amigos de Crato, José Esmeraldo Gonçalves e Pedro Ernesto de Alencar, em plano de viagem adrede montado por Tiago ainda no Ceará.
A quem conhecia essa parte do Brasil apenas de livro, oportunidade melhor tornava-se rara. Tudo era novidade nessa fase de intensas buscas existenciais ligadas a interesses psicodélicos, artísticos, literários. O período Médici, dos governos militares, agia com força total, ostensiva repressão para reduzir ao máximo o ânimo agregado desse festival que buscávamos. 

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